Acórdão nº 4197/18.5T8ENT-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 27 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelJOS
Data da Resolução27 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

ACORDAM OS JUÍZES DA 1ª SECÇÃO CÍVEL DO TRIBUNAL DA RELAÇÃO DE ÉVORA: I – RELATÓRIO Nos presentes autos de embargos de terceiro a embargante AA reagiu contra uma penhora realizada nos autos de execução de que estes são apenso, e em que são exequentes Xmmt Financing e Banco Comercial Português e são executados BB e outra.

Diz a embargante, em resumo, que a penhora recaiu sobre um imóvel que foi pertença dela e do executado, seu ex-marido, mas que entretanto lhe pertence apenas a ela, por adjudicação na sequência do divórcio, e que nele habita, com a convicção de ser a única proprietária.

Peticiona que seja levantada a penhora da fracção habitacional devidamente identificada nos autos.

A pretensão da embargante foi contestada, tanto pelo exequente BCP como pelo executado BB, refutando essencialmente o direito de propriedade invocado, até por força da presunção resultante do seu registo em nome dos ex-cônjuges.

Após julgamento, veio a ser proferida sentença que julgou procedentes os embargos e em consequência determinou o levantamento da penhora.

*II –

  1. O RECURSO Não se conformado com o decidido, o executado deu entrada ao presente recurso de apelação, que resumiu nas seguintes conclusões: “a) O presente recurso é interposto contra a sentença proferida em 12.05.2021, impugnando quer a decisão sobre a matéria de facto, quer a decisão sobre a matéria de direito.

    1. O tribunal a quo equivaleu a ocupação, pela embargante, da casa objeto de penhora a atos de posse, considerando verificados os requisitos do corpus e animus.

    2. A incorreta apreciação deste ponto ditou a procedência dos embargos, com a qual o embargado recorrente não se conforma.

    3. Consideram-se violadas as seguintes normas jurídicas: 1251.º, 1252.º, n.º 2, 1256.º, estes do CC; 62.º, n.º 1 da Constituição da República Portuguesa; art.º 7.º do Código do Registo Predial 607.º, n.º 4 e 5 do CPC.

    4. Entremos, primeiro, por razões de precedência lógica e processual, na impugnação da decisão da matéria de facto.

    5. Os factos estabelecidos nos n.º 4.1.7 e 4.1.8 não deviam ter sido considerados provados.

    6. Sobre o 4.1.7, importa primeiro notar que o período relevante que cumpria ao tribunal apreciar é o período anterior à dedução dos embargos, quanto ao pagamento de despesas da casa, nomeadamente o IMI.

    7. Nesse contexto, só relevam os factos anteriores a 03.04.2019 e não factos verificados em janeiro de 2021, nas vésperas da audiência de julgamento, como decorre da fundamentação da sentença aqui impugnada.

    8. Do período anterior a 03.04.2019, resultou demonstrado que a embargante não procedeu ao pagamento do IMI nos anos de 2015 a 2019, levando de resto a que fossem iniciados processos de execução fiscal.

    9. É o que decorre desde logo da confrontação dos documentos juntos pela embargante em 24.01.2021 com o documento n.º 1 do requerimento de 15.04.2021, apresentado pelo embargado.

    10. A embargante foi notificada em 2019 da existência de execuções fiscais, para proceder ao pagamento do IMI da fração em causa e não o fez. Conformou-se com a continuação daqueles processos executivos.

    11. Os processos executivos que constam da notificação de 2019 são aqueles que a embargante liquidou em 20.01.2020, nas vésperas da audiência de julgamento agendada para o dia 27.01.2021.

    12. A não demonstração do facto vertido sobre o n.º 4.1.7 resulta igualmente das declarações de parte do embargado, acima transcritas no item n.º 33 e constantes dos minutos 05:09, 06:08 e 09:11 (depoimento, de acordo com a ata de 12.05.2021, se encontra gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática do Tribunal, H@bilus média studio, com início às 10h11m30s e términus às 10h36m04s).

    13. Nessas declarações, o embargado refere, inclusive, um acordo com as Finanças, o qual incluía o IMI da fração em causa, tendo iniciado os respetivos pagamentos, mas que interrompeu uma vez que a embargante não procedeu aos pagamentos da sua quota de responsabilidade.

    14. Igualmente indemonstrado está o facto referido no ponto 4.1.8 da matéria de facto, sobre a atuação da autora na convicção de ser dona da fração.

    15. Nesse sentido: depoimento de parte da embargante, tendo esta afirmado que sabia que não podia vender a casa por não ser a única proprietária e que apenas concluído o processo de partilha poderia fazê-lo vide transcrições acima no item n.º 38 e constantes dos minutos 28:53 e 32:36 (depoimento que, de acordo com a ata de 28.04.2021, se encontra gravado no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática do Tribunal, das 10:37:13 horas às 11:11:29), declarações de parte do embargado, explicando que a residência da embargante na casa era a título de atribuição da casa de morada de família, após o divórcio de ambos (declarações de parte do embargado, acima transcritas no item n.º 38 e constantes dos minutos 00:22, 04:25 e 09:45 (declarações, de acordo com a ata de 12.05.2021, se encontram gravadas no sistema integrado de gravação digital, disponível na aplicação informática do Tribunal, H@bilus média studio, com início às 10h11m30s e términus às 10h36m04s).

    16. A tudo isto acresce o facto do documento n.º 3 da petição de embargos, relativo à sentença homologatória do processo de divórcio, corroborar que a embargante ocupa a casa a título de morada de família.

    17. Daí que, conforme supra propugnado, devam ser eliminados os factos dados como provados sob os pontos n.º 4.1.7 e 4.1.8 e ser, antes, estabelecida a seguinte factualidade: (i) Desde a data do divórcio, a embargante reside na referida fração apenas com a sua filha, em resultado da atribuição a seu favor da casa de morada de família, conforme definido no Processo n.º 1878/14.6TMLSB, Juiz 5, 1.ª Secção de Família e Menores, Instância Central de Lisboa, do Tribunal Judicial da Comarca de Lisboa; (ii) A Embargante ocupa a casa, desde o divórcio e até à data da entrada dos presentes embargos, sem a convicção de ser dona da fração.

    18. Quanto à decisão da matéria de direito, impõe-se a sua alteração, quer proceda ou não a impugnação da matéria de facto.

    19. Se estabelecidos os factos, tal como aqui sustentado, não subsiste qualquer factualidade que demonstre a prática de atos típicos de dominus e, não existindo posse, os embargos deverão improceder.

    20. Se a decisão sobre a matéria factual for mantida, apesar do que decorre do ponto 4.1.8 da sentença a embargante atua na convicção de ser dona da fração sempre se deverá concluir pela existência de erro de direito.

    21. Sendo consensual entre as partes a pendência da partilha e respetivas vicissitudes até porque decorrem da prova documental que a comprova, note-se que a sentença homologatória da partilha foi proferida em 03.10.2019.

    22. E a mesma não só não se tornou definitiva senão após o trânsito em julgado de acórdão do Supremo (proferido em 20.04.2021 e por isso bem depois da dedução dos embargos em 03.04.20219), como a partilha, aos dias de hoje (29.06.2021) ainda não foi concretizada.

    23. Acresce que apenas relevam iteramos os atos da embargante no período anterior à dedução dos embargos, para perscrutarmos se se comprova a existência de posse.

    24. Posse é o poder que se manifesta quando alguém actua por forma correspondente ao exercício do direito de propriedade ou de outro direito real.

    25. E quer a doutrina, quer a jurisprudência são consensuais em retirar deste instituto jurídico dois pressupostos cumulativos: (i) animus, ou seja, a convicção de estar a atuar como proprietário; e (ii) corpus, o exercício sobre a coisa de atos típicos de proprietário.

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    26. Ora, dos autos resulta que a embargante sabe que: (i) a casa não é só sua e que tal situação ainda não está definitivamente...

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