Acórdão nº 596/19.3T9STR-C.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA FIGUEIREDO
Data da Resolução25 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam os Juízes na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

Nos autos de instrução com o n.º 596/19.3T9STR, que correm termos no Juízo de Instrução Criminal-J… e que constituem o processo principal, vieram os assistentes suscitar o presente incidente de recusa da Juíza de Direito titular de tal processo, nos termos do artigo 43º, nºs 1 e 3 do CPP

Para fundamentar o seu pedido, alegaram os requerentes que: “Oportunamente os ora requerentes interpuseram o competente recurso do despacho de rejeição do requerimento de abertura de instrução, proferido pela Mmª Juiz (despacho com a refª: …). – Juntam cópias do RAI, do referido despacho e do recurso interposto

Por Decisão sumária do Tribunal da Relação de Évora transitada em julgado – de que junta cópia para instruir o presente requerimento – decidiu-se: a) conceder provimento ao recurso interposto pelos assistentes, revogando o despacho recorrido e declarando aberta a fase de instrução”

Em 07/09/2022, a Mmª Juiz visada pelo presente requerimento de recusa, proferiu o despacho com a refª …, – de que se junta cópia - no qual começou por referir: “Só por estrita obediência ao Tribunal Superior, face ao que foi a nossa posição anterior, que se mantém, apesar da decisão do Tribunal Superior, se passa a proferir o despacho abaixo de recebimento do RAI:…” Posto isto impõe-se concluir que: A Mmª Juiz cumpre de forma apenas formal a decisão do Tribunal superior - proferindo despacho de recebimento do RAI

Faz expressa menção de que mantém a posição anterior – enunciando desde logo o desfecho de Instrução

Fá-lo em termos que se podem considerar, no mínimo, de desrespeitosos para com o Tribunal superior – declarando que mantém a sua posição anterior

Certo é que, o Tribunal superior entendeu, na esteira do parecer do MP junta do Tribunal da Relação, que o RAI continha os requisitos legais para ser aberta a fase de instrução, concedendo, pois, provimento ao recurso

Pelo que, receber o RAI, declarando desde logo que se mantém a posição anterior, representa o retirar do sentido à decisão do Tribunal superior

Trata-se de uma decisão parcial, em que a Mmª Juiz não atende a outros argumentos e revela um juízo preconcebido, que anuncia de forma ostensiva

Como de resto continua a fazer, quando, de seguida, no mesmo despacho, a Mmª Juiz admitiu, “por se tratar de acto obrigatório”, a requerida inquirição da assistente, tendo tecido as seguintes considerações: “Por se tratar de acto obrigatório, admito a inquirição da assistente, embora a mesma não seja médica nem tenha conhecimentos médicos e a dependência da falecida, o seu acamamento e o seu estado de saúde, à data do seu óbito já resultar sobejamente da documentação clinica junta aos autos, relatório de autopsia, perícia médico legal realizada nestes autos de fls. 246 e segs./fls. 184 e segs. e de fls. 166 e segs., 217, e demais elementos probatórios constantes dos autos (artigo 292º, nº 2 do CPP).”

Quanto às demais diligências instrutórias requeridas a Mmª Juiz visada, indeferiu as mesmas nos seguintes termos: “Pelas razões invocadas, não se julga nem pertinente nem útil a inquirição do marido da assistente, dado o manancial de prova já constante dos autos, de onde resultam os factos que se visam prova – estado de saúde da falecida, sua dependência e acamamento -, pelo que se indefere tal inquirição, ao abrigo do Artigo 289º, 290º, 291º e 292º, todos por referência ao nº 1 do C.P.P.

… Não admito a realização de qualquer nova perícia médica ou legal ou invocado impropriamente de “parecer médico”, ao nexo causal, porquanto já foi realizada perícia médica nos autos, quanto a tal questão, conforme fls. 166 e segs., havendo cabal resposta do Exmº Perito, ao aludir a um conjunto de factores causadores de trombose pulmonar, parte dos quais a falecida reunia e parte dos quais inerentes à sua condição prévia e outros dependentes de actuação de terceiros (v.g. desidratação), concluindo este pela não verificação de nexo causal entre o acidente e morte, com segurança

Mais, tal perito, afirma que o acamamento e complicações inerente pode ser reduzido com imobilização frequente da paciente

Não se admite esclarecimentos ao perito, porquanto francamente, não se vislumbra onde se encontram as omissões, imprecisões ou outros pontos que haja que esclarecer. O mesmo claramente indica que o acamamento constitui um dos factores que pode contribuir para a trombose, em abstracto. Porém, não único e não conclui que em concreto tal contribuição efectivamente exista ou tenha existido, aludindo mormente a um conjunto de procedimentos que podem ser realizados para minorar tais complicações, sendo conhecida a utilização de anticoagulantes e alude a um conjunto de factores de risco que a falecida tinha a si associados

… Finalmente, não é despiciendo fazer notar que não foi alegada a causa de morte, não foram elencados os problemas prévios de saúde da falecida, não foram elencados os cuidados na instituição onde a falecida se encontrava internada adequados a minorar as complicações derivadas de acamamentos prolongados, afastando-se assim a actuação de terceiros causal da aludida trombose, o que se impunha, porquanto a mera alusão ao facto de a morte ter derivado do acidente e suas lesões/sequelas e do acamamento prolongado é, obviamente, conclusiva

Assim sendo, indefere-se a realização de qualquer nova perícia médico legal ou a realização de esclarecimentos ao perito que realizou a perícia nos autos, tudo ao abrigo do disposto nos Artigos 289º, nº 1, 290º nº1, 291º e 292º, todos por referência ao nº 1 do C.P.P…” Conclui designando data para o debate e instrutório e tomada de declarações à assistente

Isto é, a Mmª Juiz rejeita todas as diligências instrutórias requeridas, apenas admitindo a única obrigatória (tomada de declarações à assistente), que desde logo desqualifica a pretexto da mesma não ser médica

Já relativamente ao perito médico, o que os requerentes requereram no RAI foi: “Mais se requer sejam tomadas declarações para esclarecimento do relatório pericial, ao autor do referido relatório, o Perito Médico Dr. BB: Declarações/esclarecimentos que deverão versar sobre o melhor esclarecimento da última das conclusões de tal relatório: - “DO EVENTO RESULTOU, EM CONCRETO, PERIGO PARA A VIDA DA EXAMINADA”; - a sua conexão com a conclusão anterior: “Do evento resultaram para lesada consequências permanentes, que lhe afectaram, de maneira grave, a capacidade de trabalho, as capacidades intelectuais e a possibilidade de usar o corpo e a linguagem.”; e - O parecer médico de perito relativamente ao processo mórbido em que a falecida incorreu e que é reconhecidamente habitual na sequência de lesões traumáticas de pessoas idosas, determinantes de um acamamento continuado.”

A Mmª Juiz rejeita esta diligência (esclarecimento do relatório pericial e parecer médico de perito relativamente ao processo mórbido em que a falecida incorreu), não obstante, o facto de, ao referir-se à assistente, desvalorizar a utilidade das suas declarações por “não ser médica nem tenha conhecimentos médicos …”

Ora, a questão central a discutir e apreciar com indubitável relevo para a decisão instrutória e...

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