Acórdão nº 441/20.7GAOLH-A.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 25 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelEDGAR VALENTE
Data da Resolução25 de Outubro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Criminal do Tribunal da Relação de Évora: I - Relatório

No Juízo de Instrução Criminal de … (J…) do Tribunal Judicial da Comarca de … corre termos o processo de instrução n.º 441/20.7GAOLH, no qual, mediante despacho judicial, foi rejeitado o requerimento para abertura da instrução (1) apresentado pela arguida AA, com fundamento na sua extemporaneidade. Inconformada com essa decisão, recorreu tal arguida, terminando a motivação do recurso com as seguintes (transcritas) conclusões: “ 1. Vem o presente recurso interposto do douto despacho da M.ª Juiz de Instrução Criminal que rejeitou o requerimento para a Abertura de Instrução, apresentado pela recorrente, por ter sido considerado manifestamente extemporâneo

  1. A douta decisão recorrida, sustentada na inaplicabilidade à arguida do prazo concedido ao assistente para requerer a abertura de instrução, com base na interpretação da norma contida no n.º 14 do art.º 113.º do C. P. Penal, constitui, no entender da recorrente, um erro de interpretação 3. O direito que à arguida assiste para beneficiar do prazo contado a partir da data da notificação do assistente nestes autos, decorre, também, e especialmente, do disposto no n.º 10 do mesmo art.º 113.º do CPP

  2. Ressalta do conteúdo da norma que emerge do n.º 10 do art.º 113.º do CPP, que, sinteticamente, quando ocorrerem obrigatoriamente as notificações aos arguidos, assistentes e partes civis, e correspondentes advogados ou defensores nomeados, o prazo para a prática de ato subsequente conta-se a partir da data da notificação efetuada em último lugar

  3. Princípio (ou sentimento …) que surge arreigadamente “cultivado nos corredores” das secretarias judiciais

    No caso dos autos; 6. A notificação da arguida foi efetuada em 24 de março de 2022, mediante depósito de carta no recetáculo postal, pelo que, nos termos do n.º 3 do art.º 113.º do CPP, se considera notificada em 29 de março de 2022. (fls. 705 dos autos); 7. O assistente foi notificado pessoalmente no dia 5 de abril de 2022, por autoridade policial. (certidão a fls. 710 dos autos); 8. Atento o disposto na parte final do n.º 10 do art.º 113.º do CPP, o prazo para o assistente e a arguida requererem a abertura de instrução correria pelos 20 dias seguintes, contados a partir notificação efetuada em último lugar (5 de abril de 2022), tendo em conta que o prazo correria em férias judiciais nos termos do N.º 2 do art.º 113.º do CPP, aplicável por força do art.º 28.º da Lei n.º 112/2009 de 16 de setembro

  4. É muito relevante referir que daquela norma não emerge qualquer limitação, ou negação, a que o intérprete considere que a expressão “notificação efetuada em último lugar” respeita a qualquer uma das notificações ali referidas, seja no início seja na parte final do texto do n.º 10 do art.º 113.º do CPP, tendo em conta a utilização da forma plural quando impõe, “…/… as quais, porém, devem igualmente ser notificadas …/…” 10. Feitas as contas, o termo do prazo ocorreria no dia 25 de abril de 2022, dia feriado nacional, pelo que a data-limite de apresentação do requerimento de abertura de instrução, pelo assistente ou pela arguida, ocorreria, sem recurso ao dispositivo constante no art.º 139.º do C. P. Civil, com as especificidades decorrentes do art.º 107.º-A do C. P. Penal, no dia 26 de abril de 2022

  5. Foi nesse dia que a arguida apresentou o requerimento de abertura de instrução, ao abrigo do disposto na alínea a) do n.º 1 do art.º 287.º do C. P. Penal

  6. E fê-lo, por isso, dentro do prazo que a lei lhe confere. 13. Não podia, pois, a M.ª Juiz de Instrução Criminal rejeitar o requerimento apresentado, por extemporâneo

    QUANDO ASSIM NÃO SEJA ENTENDIDO POR ESTE VENERANDO TRIBUNAL; 14. A M.ª Juiz de Instrução Criminal sustentou a sua douta decisão como se transcreve, com o devido respeito, que é muito: “Com efeito, o preceituado no art.º 113.º, n.º 14 do CPP, atendendo à ratio legis que lhe é subjacente (possibilidade de preparação de uma reação conjunta por parte dos arguidos perante um despacho de acusação ou de uma acusação conjunta pelos factos praticados, por parte dos assistentes, no caso de ter sido proferido despacho de arquivamento), não permite a um grupo de sujeitos processuais (i. é. à arguida) aproveitar o prazo concedido a outro grupo de sujeitos processuais (i. é, o assistente, notificado a fls. 710), o que significa que “um arguido só pode beneficiar do prazo que termine mais tarde para outro arguido, assim como um assistente só pode beneficiar do prazo que termine mais tarde para outro assistente”. (sic) 15. Entende a recorrente que a M.ª Juiz interpretou de forma deficiente a norma contida no n.º 14 do art.º 113.º do C. P. Penal, porquanto: 16. Desde logo, deitando mão do conteúdo do art.º 9.º do Código Civil, que dispõe: 1. A interpretação não deve cingir-se à letra da lei, mas reconstituir a partir dos textos o pensamento legislativo, tendo sobretudo em conta a unidade do sistema jurídico, as circunstâncias em que a lei foi elaborada e as condições específicas do tempo em que é aplicada

  7. Não pode, porém, ser considerado pelo intérprete o pensamento legislativo que não tenha na letra da lei um mínimo de correspondência verbal, ainda que imperfeitamente expresso. 3. Na fixação do sentido e alcance da lei, o intérprete presumirá que o legislador consagrou as soluções mais acertadas e soube exprimir o seu pensamento em termos adequados

  8. E será com total observância dos princípios consignados neste normativo que importará interpretar o que se estabelece no n.º 14 do art.º 113.º do C. P. Penal...

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