Acórdão nº 01324/10.4BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 26 de Outubro de 2022

Magistrado ResponsávelJOAQUIM CONDESSO
Data da Resolução26 de Outubro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

ACÓRDÃO X RELATÓRIO XO DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA deduziu recurso dirigido a este Tribunal tendo por objecto sentença proferida pelo Mº. Juiz do Tribunal Tributário de Lisboa, constante a fls.827 a 870 do processo físico, a qual, além do mais, julgou procedente a presente impugnação intentada pela sociedade recorrida, "A……….. Seguros, S.A.", anterior "B......................., S.A.", visando acto de liquidação adicional de I.R.C., relativo ao ano de 2006 e no valor total a pagar de € 15.825.885,12.

XO recorrente termina as alegações do recurso (cfr.fls.873 a 892 do processo físico) formulando as seguintes Conclusões: a-Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a Impugnação Judicial procedente sendo que a matéria deste recurso, o thema decidendum de que depende o respetivo mérito, é exclusivamente jurídica e reconduz-se a dois fundamentos: i) à nulidade por condenação além do pedido e ii) à concreta questão da interpretação e aplicação do regime consagrado no parágrafo 2) da al.ª c), do n.º 4, do artigo 45º do CIRC (na redação ao tempo em vigor que é a que se refere nestas alegações), no sentido de saber se o reinvestimento parcial do valor de realização obtido na transmissão de partes sociais de sociedades com relações especiais tem de ser forçosamente na realização do capital social da sociedade adquirente das mesmas.

Da nulidade da sentença b-O ato de liquidação adicional de IRC, que constitui o objeto dos autos de impugnação judicial sub judicie, foi emitido no seguimento da ação de inspeção tributária, externa de âmbito geral, realizada através da Ordem de Serviço n.º OI200900052, com referência ao exercício de 2006.

c-No âmbito do referido procedimento inspetivo foram efetuadas várias correções técnicas em sede de IRC conforme relatório de inspeção e identificadas no ponto 12.º da P.I., pelo que a liquidação n.º 2010 8310000911 e a respetiva demonstração de acerto de contas n.°2010 00000118750, relativas ao exercício de 2006, na qual foi apurado um montante total a pagar de €15.825.885,12 são o reflexo de todas as correções efetuadas.

d-No ponto 19.º da petição inicial apresentada pela Impugnante é delimitado o objeto da impugnação, e é referido expressamente que «o objecto da presente impugnação judicial prende-se com a análise da legalidade da correção efectuada na rubrica de reinvestimento das mais-valias decorrentes da transmissão de partes de capital, bem como o ajuste ao reporte de prejuízos fiscais, correcções com a qual a Impugnante não pode concordar…».

e-Complementado no ponto 142.º da P.I., referindo-se à correção do montante de € 8.552.795,77, refere expressamente que «não pretende a Impugnante contestar a correção acima referida quanto à parte que respeita a liquidações adicionais relativas a exercícios anteriores, não podendo, contudo, deixar de discordar da restante correcção, pelos motivos acima expostos».

f-E com toda a clareza e simplicidade formulou um pedido muito concreto: «i) a anulação parcial da liquidação de IRC do exercício de 2006 objecto dos presentes autos, em virtude da anulação da correção efectuada no valor de EUR 28.754.018, com fundamento em vício de violação de lei, em concreto do regime de reinvestimento de mais valias previsto no artigo 45.º do CIRC à data dos factos tributários, e inconstitucionalidade material do referido preceito por violação dos artigos 18º, n.º 2 e 104.º, n.º 2 da CRP; ii) a anulação da correção do montante de EUR 14.295.414,38 referente a prejuízos fiscais gerados na esfera da C………………, bem como a correção do montante de EUR 8.552.795,77 relativo a prejuízos fiscais apurados na esfera da Impugnante com os fundamentos melhor explicitados no presente articulado (…)».

g-Como é sabido, o tribunal está limitado pelo princípio do pedido, isto é, a sentença não pode condenar em quantidade superior ou em objeto diverso do que se pedir (art. 609º/1 do CPC).

h-No entanto, verifica-se que o Tribunal a quo decidiu a impugnação procedente e determinou em consequência a anulação da liquidação de IRC impugnada, ou seja, condenou em quantidade superior ao do pedido o que é causa de nulidade da sentença nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. e), do CPC ex vi artigo 2.º, al. e), do CPPT.

i-Estando em causa apenas as correções referentes ao reinvestimento das mais-valias decorrentes da transmissão de partes de capital e ao ajuste do reporte de prejuízos fiscais e tendo concluído pela procedência da ação, deveria o Tribunal a quo ter decidido pela anulação parcial da liquidação adicional de IRC, conforme foi pedido pela impugnante.

j-Assim, entende a Fazenda Pública que tendo decidido pela anulação total da liquidação de IRC, a decisão ultrapassa o pedido formulado o que leva a concluir que a douta sentença enferma de nulidade nos termos do artigo 615.º, n.º 1, al. e), do CPC ex vi artigo 2.º, al. e), do CPPT, motivo pelo qual não deve ser mantida na ordem jurídica a sentença ora colocada em crise, devendo antes ser declarada nula.

k-Em face do supra exposto, deve a sentença ser declarada nula, com todas as legais consequências.

Do reinvestimento das mais valias decorrentes da transmissão de partes de capital l-O tribunal a quo decidiu que não existe obrigação legal de que o reinvestimento parcial do valor de realização obtido na transmissão de partes sociais de sociedades com relações especiais tenha de ser forçosamente na realização do capital social da sociedade adquirente das mesmas, soçobrando assim os fundamentos vertidos pelos SIT nesta parte.

m-Salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública concordar com tal entendimento.

Vejamos, n-Atendendo à regra geral constante na primeira parte da norma constante n.º 2 da alínea c) do n.º 4 do art.º 45.º do CIRC a mais-valia apurada na transmissão da B..............V efetuada pela B.............. ao D....................., sendo entidades em situação de relações especiais, não podia beneficiar do regime do reinvestimento.

o-Contudo, a segunda parte da referida norma exceciona os casos em que as transmissões onerosas e aquisições de partes de capital se destinem à realização de capital social, caso em que o reinvestimento considerar-se-á totalmente concretizado quando o valor das participações sociais assim realizadas não seja inferior ao valor de mercado daquelas transmissões.

p-Isto é, verificando-se a exceção pode o regime do reinvestimento ser aplicado, considerando-se a mais-valia da transmissão totalmente reinvestida se: - (condição n.º 1) – destinada à realização do capital social e; - (condição n.º 2) – quando o valor das participações sociais assim realizadas não seja inferior ao valor de mercado daquelas transmissões.

q-Aplicando esta norma ao caso em apreço, verifica-se, desde logo, que não foi cumprida a condição n.º 1 - a transmissão das participações sociais da B..............V efetuada pela B.............. ao D..................... ser destinada à realização do capital social.

r-De facto, a transmissão efetuada pela B.............. das participações sociais da B..............V não se consubstanciou (na correspondente aquisição por parte do D.....................) na realização do capital social.

s-Ao invés, foi obtido um valor monetário - 237.500.000,00 € - relativamente ao qual o Sujeito Passivo declarou a intenção de reinvestir o montante de 85.000.000 €.

t-Efetivamente, no caso em apreço, a transmissão efetuada pela B.............. não se consubstanciou (na correspondente aquisição por parte do D.....................) na realização do capital social, aquilo que se verificou foi, tão só, uma transmissão de partes de capital entre entidades relacionadas, o apuramento de uma mais-valia com essa transmissão, e a intenção declarada de reinvestir parcialmente o valor de realização dessa mais-valia.

u-A norma prevista no n.º 2 da alínea c) do n.º 4 do art.º 45.º do CIRC não determina que o reinvestimento do valor de realização das mais-valias apuradas entre entidades em situação de relações especiais deve ser efetuado na realização de capital social, o que o supracitado dispositivo legal determina é que a própria transmissão em si (e não o valor de realização que resulta da mesma) deve ser efetuada para a realização do capital social.

v-É pois deste modo que a própria transmissão (que origina a mais-valia) se consubstancia na realização do capital social da adquirente, que a norma supra referida determina que, caso o valor das participações sociais assim realizadas não seja inferior ao valor de mercado daquelas transmissões, a mais-valia apurada é considerada como totalmente reinvestida.

w-De facto, é a própria transmissão em si, e não o valor de realização que vier a resultar dessa transmissão, que deve ser destinada à realização do capital social.

x-Com efeito, uma operação em que a realização do capital de uma sociedade relacionada é efetuada com entradas em espécie, determina a concretização imediata do reinvestimento do valor de realização. (Na medida em que as entradas no capital da sociedade adquirente, tem como contrapartida (para a sociedade transmitente), como “pagamento” dessas entradas, a consequente (imediata) participação no capital social da sociedade adquirente).

y-Igual entendimento encontra-se vertido no ofício circulado n.º 20151, de 2011-05-24, relativo ao «ARTIGO 48. °, Nº. 4, C), 2) - REINVESTIMENTO DOS VALORES DE REALlZAÇÃO RELATIVOS A PARTES DE CAPITAL TRANSMITIDAS A ENTIDADE COM RELAÇÕES ESPECIAIS».

z-Face ao exposto, entende a Fazenda Pública que a tributação da mais-valia apenas se consideraria afastada, caso a transmissão das participações sociais da B..............V por parte da B.............. para o D....................., tivesse sido efetuada com o objetivo de realização de capital do D..................... (se se tivesse efetiva e diretamente consubstanciado na realização do capital social do D.....................), o que se verificaria se a B..............V tivesse funcionado como uma entrada em espécie no capital do...

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