Acórdão nº 2758/20.1T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 13 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | ANTERO VEIGA |
Data da Resolução | 13 de Outubro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães.
H. J., veio intentar a presente ação de processo comum contra: “X – Companhia de Segurança, Ltª.”, e “Y – Prevenção e Vigilância Privada, Ltª.”, Pedindo: - que seja declarado ilícito o despedimento do A.; - que, sem prescindir, se declare a validade da oposição à transmissão da empresa; - que as RR. seja condenadas a pagar ao A. a quantia global de €10.292,33 a título de créditos laborais, à qual acresce a indemnização em substituição da reintegração, acrescido de juros à taxa de 4% desde a citação e até integral pagamento.
Ambas as RR. apresentaram as respetivas contestações, nas quais defendem a improcedência da ação quanto a elas.
Realizado o julgamento foi proferida sentença nos seguintes termos: “Assim, e face a tudo o exposto, decide-se: Absolver a R. “Y” dos pedidos contra si formulados: Condenar a R. “X” a reconhecer a ilicitude do despedimento do A. e a pagar-lhe: - a quantia de €10.311,25 a título de indemnização pelo despedimento ilícito; - as retribuições que o A. deixou de auferir desde 19/8/2020 até ao trânsito em julgado da presente sentença, estando já em dívida a este título a quantia de € 15.336,92 (ao montante assim devido terá que ser descontado o que o A. tenha eventualmente recebido a título de subsídio de desemprego, para o que se oficiará oportunamente à S.Social); - a quantia de €1.531,14 a título de férias e subsídio de férias; - a quantia de €956,96 a título de proporcionais de férias, subsídio de férias e de Natal; - a quantia de €353,60 a título de formação profissional não proporcionada; - juros de mora, vencidos e vincendos, à taxa de 4%.
Vai esta R. absolvida de tudo o restante peticionado.
(…)” Inconformada a primeira ré interpôs recurso concluindo em síntese: 1 – … Quem era a sua empregadora à data, realidade esta que dependia, por sua vez, da existência, ou não, de uma transmissão do estabelecimento entre as RR ao abrigo do artº 285º do CT; 2 - Para considerar inaplicável ao caso tal regime baseou-se o Tribunal a quo, em síntese, no entendimento segundo o qual no sector da vigilância o fator essencial para se afirmar que existe uma transmissão de estabelecimento consiste na circunstância de nova empresa desenvolver a atividade com recurso a todos ou grande parte dos trabalhadores que já aí desempenhavam as suas funções; 2 – Tal petição de princípio no que se refere ao regime do artº 285º do CT negligencia dois aspetos que prejudicam o mérito da solução dada ao caso concreto, designadamente; 3 - A existência de alguma contradição intrínseca nos termos do Acórdão que transcreve e no qual se estriba, resultante deste admitir – como aliás é pacífico na Doutrina e na Jurisprudência (nacional e europeia) – que para caracterizar uma unidade económica se ter de considerar casuisticamente outros fatores, como a existência e relevância dos equipamentos que se mantêm no âmbito da prestação do serviço e a continuidade dos mesmos; 4 - E o facto (provado) dos serviços anteriormente prestados pela R serem os mesmos que passaram a ser prestados pela co-R, sem descontinuidade alguma, e ambos visceralmente dependentes de um conjunto de equipamentos que se mantiveram e continuaram a ser utilizados por esta última (números 8, 12 e 15 da Fundamentação); II – Da impugnação da decisão sobre a matéria de facto (págs. 3 a 13).
5 – Para melhor relevar a importância deste último dado, para além do já fixado na Sentença, cumpre ter presente o artº 44º da sua Contestação e os depoimentos das testemunhas L. C. e M. R., ambos localizados e transcritos no corpo das presentes alegações nos termos do artº 640º do CPC; 6 – De acordo com os quais deve ser dado como provado parte do teor daquele artº 44º, o qual deve ser integrado na matéria fixada nos autos para efeito de fundamentação material com a seguinte numeração e redação: “19 - Os serviços de vigilância humana referidos em 12 depende, estruturalmente, dos equipamentos no mesmo referidos.” III – Do direito.
… 9 – Nas designadas atividades de mão-de-obra intensiva, como é o caso da vigilância, a mera sucessão de prestadores de um mesmo serviço a um determinado cliente/contratante é passível de ser enquadrada como transmissão de estabelecimento desde que discernível a existência de uma unidade económica; 10 – O critério decisivo para constatar a existência de tal unidade económica e manutenção da sua identidade, reside na transmissão de alguns dos elementos essenciais antes adotados pelo anterior operador (cedente) para a prestação do serviço, e na retoma daqueles serviços e destes elementos por parte do novo operador (cessionário); 11 – E para o efeito, tal como melhor dilucidado no corpo das presentes, basta que o novo operador, independentemente de não contratar, ou não querer assumir a maioria dos trabalhadores da anterior operadora (é indiferente), os serviços continuarem a ser os mesmos e dependerem de uma infraestrutura única e comum de equipamentos (bens corpóreos) que também se mantêm; 12 - Face à interpretação conforme consagrada pelo TJUE, é total, completa a absolutamente inadmissível qualquer aplicação do artº 285º do CT que sufrague o entendimento (liminar e preclusivo) segundo o qual nos negócios/atividades de mão-de-obra intensiva, só há lugar à aplicação daquele quando a transmissária, fica com a maior parte ou com parte relevante dos trabalhadores da transmitente; 13 - Seria adotar como petição de princípio que não é possível discernir uma unidade económica para o efeito, ainda que outros elementos relevantes a considerar casuisticamente se verificassem, como é o caso dos bens corpóreos imprescindíveis para a prestação dos serviços, o cariz similar destes a sua continuidade, bem como da sua clientela alvo; 14 - Face à interpretação conforme do regime consagrado pelo TJUE parece-nos total, completa a absolutamente inadmissível qualquer aplicação do artº 285º do CT que sufrague ou pressuponha o entendimento segundo o qual nas atividades de mão-de-obra intensiva, só há lugar à aplicação do regime da transmissão do estabelecimento quando a transmissária, fica com a maior parte ou com parte relevante dos trabalhadores da transmitente; 15 - Seria adotar por via da interpretação daquela norma legal, a regra (jurídica) segundo a qual não existe uma unidade económica relevante para o efeito, ainda que os outros elementos relevantes a considerar casuisticamente - como por exemplo os bens corpóreos imprescindíveis para a prestação dos serviços e a manutenção dos mesmos, o cariz similar destes e sua continuidade, e da sua clientela alvo – se verificassem no caso; 16 - Semelhante tese, elevada a critério jurídico-legal liminar para a (in)aplicabilidade do regime da transmissão do estabelecimento do artº 285º, nº 1 do CT em sector como o da vigilância, para além de contrária ao Princípio da interpretação conforme (supra explanado), é o violador do Princípio da Igualdade, imanente ao nosso Estado de Direito tal como ele resulta do previsto nos artº 13º, 17º e 18º, nº 1 a 3 da CRP; Logo e portanto, inconstitucional e inaplicável pelos Tribunais (artº 277º, nº 1 e 204º da CRP).
17 - E isto porque excluí de forma injustificada e desproporcionada – sem critério objetivo pertinente e de igual relevância ou dignidade constitucional - um conjunto de trabalhadores que, de outra forma e com apelo aos demais elementos relevantes segundo a boa hermenêutica jurídica, seriam abrangidos por aquele regime de tutela do posto e do contrato de trabalho.
18 - E é disto que se trata perspetivando o regime do artº 285º do CT à luz Direito ao Trabalho consagrado no artº 58º, nº 1 da CRP, integrado que está nos Direitos, Liberdades e Garantias da nossa Constituição, aqui considerado na sua importante dimensão negativa ou de proteção, que se projeta no direito à “segurança no emprego”; ou seja, no direito a não ser privado do posto de trabalho que alcançou; 19 - Levando semelhante entendimento e peregrino critério às suas ultimas consequências, teríamos uma completa inversão da ordem dos fatores ao permitir que aquilo que reveste, ou revestia, as características de uma unidade económica ex-ante, seja descaracterizada ex-post pelo facto do novo operador, pura e simplesmente, ao não contratar os trabalhadores do antigo operador, advogar que já não existe estabelecimento, parte de empresa ou unidade económica equiparável para efeito do artº 285º, nº 1 e 2 do CT.
20 - Com a devida salvaguarda e respeito, mas dar guarida a semelhante entendimento como critério de aferição e decisão judicial, não faz sentido algum, e muito menos Justiça ii. Os dados do caso e sua apreciação e decisão conformes (págs. 18 a 25).
21 - Os vigilantes ao serviço da 2.ª Ré, continuaram a utilizar os mesmos sistemas de vigilância, de alarme, de anti-intrusão, e de incendio, e demais equipamentos que eram anteriormente utilizados pela 1.ª Ré e Apelante, tal como fixado nos nº 12 e 15 dos factos provados; 22 - Bens corpóreos esses que são essenciais para o exercício da atividade de vigilância concretamente em causa, o que fundamenta a convicção de que se verificou efetivamente a transmissão de uma unidade económica entre ambas as Rés 16 Em sentido idêntico, cf. Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 24-11-2021, proc. n.º 18771/20.6T8LSB.L1-4, rel. Francisca Mendes, e Acórdão do Tribunal da Relação de Évora, de 28-01-2021, proc. n.º 959/18.1T8BJA.E1, ambos disponíveis em www.dgsi.pt.
23 - O serviço de vigilância prestados no local pela Apelante, e após nova adjudicação do cliente, pela co-Ré, são os mesmos (i), foram-no sem descontinuidade alguma (ii), no mesmo local (iii), para o mesmo cliente (iv), e com base na mesma infraestrutura e equipamentos (v); 24 - Em termos práticos, a estrutura material / equipamento fundamental e determinante do serviço prestado, e no qual assenta e depende a vigilância humana, corresponde aqueles equipamentos; 25 - Face ao exposto, havia toda uma infraestrutura corpórea que suportava e continuou...
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