Acórdão nº 045/13.0BUPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 12 de Outubro de 2022
Magistrado Responsável | JOSÉ GOMES CORREIA |
Data da Resolução | 12 de Outubro de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Vem interposto recurso de revista por Banco A…., S.A, com os sinais dos autos, ao abrigo do disposto no artigo 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), do acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte de 16 de Dezembro de 2021, que negou provimento aos recursos interpostos da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgara parcialmente procedente a impugnação judicial de IRC relativa ao exercício de 2000.
Inconformada, Banco A…., S.A.
apresentou alegações que rematou com o seguinte quadro conclusivo: III.1 Do acórdão recorrido 1.ª Entende o Recorrente que estão verificados os requisitos de que depende a admissão do presente recurso de revista; 2.ª Em face do decidido em segundo grau de jurisdição considera o Recorrente verificar se a violação de lei substantiva na interpretação conferida às disposições consagradas nos artigos 17.º e 33.º do Código do IRC, no Aviso n.º 3/95 e na Instrução n.º 4/96, ambos do Banco de Portugal, e no Plano de Contas para o Sistema Bancário, conjugados com os artigos 104.º, n.º 2 e 266.º da CRP, 4.º, n.º 1, 55.º e 58.º da LGT e 6.º do RCPIT, cumprindo dilucidar da obrigatoriedade de efetuar a anulação do proveito correspondente às despesas com créditos vencidos, quando se conclua pela desconsideração fiscal da provisão, colocando-se, em concreto, a questão de saber se os artigos 17.º, n.º 1 e 33.º, n.º 1, alínea d), do Código do IRC, em conjugação com a disciplina contabilística e normativa do Banco de Portugal, devem ser interpretados no sentido de que se impõe a anulação do proveito correspondente a uma provisão para despesas de crédito e juros vencidos que haja sido objeto de desconsideração fiscal, sob pena de ilegalidade do ato tributário, tendo presente que não surge controvertido que tais despesas não se encontravam garantidas e que, independentemente da percentagem de provisionamento, a sua cobrança não se realizou até ao final do terceiro mês posterior ao vencimento do crédito; 3.ª Mais considera o Recorrente que, em face do decidido pelo TCA Norte se verifica a violação de lei substantiva na interpretação conferida às disposições consagradas nos artigos 99.º da LGT e 13.º, n.º 1, do CPPT, conjugadas com os artigos 74.º da LGT, 100.º do CPPT, 20.º e 268.º da CRP, cumprindo apurar se os artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT, em conjugação com os artigos 74.º, n. º1, da LGT e 100.º do CPPT devem ser interpretados no sentido de que, numa situação em que o contribuinte sindica contenciosamente a legalidade da desconsideração do reporte dos prejuízos fiscais que havia sido autorizado a utilizar – correção cuja existência é incontroversa – a falta de prova relativamente ao montante desconsiderado deve ser determinante da anulação daquela correção e da liquidação na qual a mesma se materialize, sob pena de manutenção de um ato tributário ilegal no ordenamento jurídico; III.2 Da verificação dos pressupostos de admissibilidade do recurso de revista 4.ª Encontram-se preenchidos os pressupostos de admissibilidade do recurso de revista previstos no artigo 282.º do CPPT, quanto a ambas as questões suscitadas no presente de revista. Da questão da anulação contabilística do proveito correspondente às despesas com o crédito vencido; 5.ª No que concerne à questão de saber se, quando se conclua pela desconsideração fiscal da provisão para despesas para crédito vencido, tal implica a anulação do proveito correspondente às despesas com créditos vencidos, e se, não tendo tal anulação sido levada a cabo pela administração tributária, a mesma implica a ilegalidade da liquidação em causa, tal questão consubstancia matéria com amplo interesse objetivo, isto é, que torna manifestamente útil a presente revista; 6.ª Resulta evidente a relevância jurídica da questão e que assume igualmente importância fundamental, já que não se trata de uma questão meramente teórica, mas de verdadeira utilidade prática, estando em causa a aplicação de um regime contabilístico a que têm sido atribuídas determinadas consequências fiscais e que tem funcionado numa relação de simetria entre custo e proveito, sendo que a interpretação do Tribunal recorrido vem pôr em causa a existência dessa relação de simetria; 7.ª Impõe-se, assim, clarificação sobre o alcance da anulação dos proveitos correspondentes aos custos fiscalmente desconsiderados quando aos mesmos não subjaz uma despesa efetivamente incorrida, mas uma antecipação/previsão da despesa; 8.ª A litigiosidade em torno desta questão não tem conduzido à mesma resposta, o que antecipa a necessidade de revista para uma melhor aplicação do direito; 9.ª Com efeito, se o Tribunal recorrido considerou que não se impunha a anulação do proveito correspondente à provisão fiscalmente desconsiderada, o Recorrente já obteve em sede arbitral resposta diametralmente oposta, em situação exatamente idêntica, ainda que referente ao outro exercício, na decisão proferida no processo arbitral n.º 29/2012-T, em 15.06.2012, que correu termos junto do Centro de Arbitragem Administrativa, em que o Tribunal determinou, numa interpretação conjugada dos normativos contabilísticos e dos princípios e regras que norteiam a atividade da administração tributária, que se impunha a anulação contabilística do proveito correspondente à despesa com crédito vencido; 10.ª Deste modo, afigura-se ao Recorrente que a presente questão interpretativa se move num terreno de nebulosidade e indefinição que, a julgar pelo número de litígios que ainda aguardam decisão, permite concluir pelo agravamento dessa indeterminação; 11.ª A relevância jurídica das questões objeto de revista é, ainda, particularmente evidente por estarem em causa normas que versam sobre direitos e garantias dos contribuintes, com destaque para os princípios do inquisitório e da verdade material, bem como o princípio da tributação do lucro real e o princípio da justiça, com consagração constitucional (cf. artigos 104.º, n.º 2 e 266.º, n.º 2, ambos da CRP); 12.ª No que respeita à relevância social, tal surge reforçado considerando: (i) a relevância fiscal das provisões no setor bancário; (ii) a premência de, com os tempos de crise económica e financeira que se vêm vivendo em Portugal e com as dificuldades e constrangimentos que publicamente se assiste no seio de grandes instituições financeiras, que a relevância fiscal dos seus dados contabilísticos se afirme como uma matéria clara, isenta de dúvidas e que reflita uma tributação do lucro das instituições financeiras tão real quanto possível; (iii) o aumento muito significativo da constituição ou reforço de provisões para crédito vencido (atualmente designadas de imparidades); (iv) a suscetibilidade de as dúvidas interpretativas se repetirem em vários litígios, quer atendendo à disseminação da prática por diversas instituições financeiras; (v) que, no caso do ora Recorrente, a anulação do proveito correspondente às despesas com crédito vencido provisionadas e fiscalmente não relevadas já deu origem à dedução origem à dedução de diversas impugnações judiciais, pedidos de pronúncia arbitral e recursos contra as liquidações adicionais emitidas pelos serviços de inspeção tributária, maioritariamente ainda pendentes de decisão nos tribunais administrativos e fiscais. Tratam-se de impugnações judiciais, recursos jurisdicionais e pedidos de pronúncia arbitral, que correm termos sob os números 931/06.4BEPRT, 530/08.6BEPRT junto do Tribunal Central Administrativo Norte, e sob os números 967/11.3BEPRT, 1584/11.3BEPRT, 1388/12.6BEPRT junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, 1874/05.4BEPRT junto do Supremo Tribunal Administrativo e 1913/05.9BEPRT junto do Centro de Arbitragem Administrativa; 13.ª Trata-se o caso concreto claramente de um tipo, porquanto para o ora Recorrente (e para qualquer instituição financeira) o tratamento fiscal das provisões para crédito vencido e as consequências fiscais da sua desconsideração são temáticas essenciais, pelo que se afigura inequívoca a relevância social de importância fundamental; 14.ª Por outro lado, a matéria em apreço seguramente transpõe os limites do caso concreto e se repetirá em futuros casos, tratando-se o caso concreto claramente de um tipo, porquanto para o ora Recorrente (e para qualquer instituição financeira) o tratamento fiscal das provisões para crédito vencido e as consequências fiscais da sua desconsideração são temáticas essenciais, pelo que se afigura inequívoca a relevância social de importância fundamental; 15.ª Considera o Recorrente que a interpretação proferida em segundo grau de jurisdição é suscetível de se aplicar em numerosos novos litígios administrativos e judiciais, gerando uma avultada incerteza e instabilidade e fazendo antever como objetivamente útil a intervenção do Supremo Tribunal Administrativo para uma melhor aplicação do Direito; Da questão dos limites do inquisitório no âmbito da desconsideração do reporte dos prejuízos fiscais; 16.ª No que concerne à segunda questão em equação, a mesma traduz-se na interpretação da norma ínsita nos artigos 99.º da LGT e 13.º do CPPT, em conjugação com os artigos 74.º, n.º 1, da LGT, 100.º do CPPT e 20.º e 268.º da CRP, no sentido de apurar se, a ausência de elementos de prova suficientes relativamente à quantificação de uma correção fiscal desfavorável, cuja ocorrência não é controvertida e cuja ilegalidade é suscitada pelo contribuinte em sede de impugnação judicial, deve ditar a procedência dessa mesma impugnação e consequente anulação da liquidação em crise, quando o Tribunal entenda que o seu dever do inquisitório não lhe impõe diligenciar pela comprovação relativa ao montante do reporte dos prejuízos fiscais desconsiderado pela administração tributária; 17.ª A revista impõe-se, também quanto a esta segunda questão, para uma melhor aplicação do Direito, uma vez que a decisão emitida pelo Tribunal Central...
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