Acórdão nº 307/20.0T8CHV.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 29 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelALCIDES RODRIGUES
Data da Resolução29 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães I. Relatório Hotel ..., Lda interpôs ação declarativa, sob a forma de processo comum, contra X - Engenharia e Serviços, SA, peticionando a condenação da Ré a proceder ao pagamento da quantia global de € 17.085,00, a título de indemnização por danos decorrentes da circulação de veículo desta na rampa de acesso à garagem do hotel explorado pela autora.

Para tanto alegou, em resumo, que, com o intuito de proceder à recolha de resíduos do hotel, o veículo pesado de marca Mercedes, com a matrícula NH, destinado àquela actividade e ao serviço da ré, circulou sem a autorização necessária e o cuidado devido na rampa de acesso exclusivo à garagem do hotel explorado pela autora, o que causou o desabamento do pavimento da via.

O peso do veículo e a condução imprudente provocaram o abatimento da aludida rampa provocando à A. um prejuízo no valor de € 11.685,00 que aquela despendeu para reparação da rampa e € 5.400,00 a título de lucros cessantes decorrentes da impossibilidade dos hóspedes do hotel utilizarem a garagem a eles destinada.

*Citada, a ré apresentou contestação/reconvenção, pugnando pela total improcedência da acção e peticionando, a título de reconvenção, a condenação da A. no pagamento da quantia de € 2.028,27.

Em abono da sua defesa alegou que a responsabilidade do sinistro se ficou a dever àquela que não procedeu às obras de conservação necessárias na rampa, tendo sido apenas devido ao mau estado daquele acesso que o pavimento alui e o camião ficou imobilizado no buraco.

O camião pertença da Ré sofreu danos no valor de € 2.028,27, uma vez que o comando central do veículo ficou danificado e teve de ser reparado, reclamando o seu pagamento pela A.

Mais requereu a intervenção acessória provocada da seguradora Y Portugal, Companhia de Seguros, S.A, sustentando para o efeito que, por ter transferido para esta a responsabilidade civil emergente do veículo interveniente nos factos, é a mesma responsável pelo pagamento em que a Ré venha a ser condenada, tendo direito de regresso contra a mesma.

*A Autora apresentou réplica, concluindo pela improcedência da reconvenção.

*Admitida a intervenção principal provocada da Y Portugal S.A., veio esta contestar a acção, impugnando o teor da PI e acompanhando a contestação apresentada pela R..

*Dispensada a audiência prévia, foi proferido despacho saneador, em que se afirmou a validade e regularidade da instância; foi admitida a reconvenção e fixado o valor da causa; de seguida foi identificado o objeto do litígio, enunciados os temas da prova e admitidos os meios de prova.

*Procedeu-se à audiência de discussão e julgamento.

*Posteriormente, a Mm.ª Julgadora “a quo” proferiu sentença, nos termos da qual, julgando a acção parcialmente procedente, decidiu:

  1. Condenar a Interveniente Y Portugal, Companhia de Seguros, S.A. a pagar à Autora Hotel ..., Lda. a quantia de € 11.685,00 a título de danos patrimoniais, a que acrescerão juros de mora calculados à taxa legal de 4%, desde a data da citação até efectivo e integral pagamento, absolvendo a Interveniente do restante peticionado.

  2. Absolver a Ré X – Engenharia e Serviços, S.A. dos pedidos formulados pela A.

    - Julgar a reconvenção deduzida pela Ré X – Engenharia e Serviços, S.A. totalmente improcedente, com a consequente absolvição da Autora do pedido reconvencional.

    *Inconformada, a interveniente Y Portugal – Companhia de Seguros, S.A.

    interpôs recurso da sentença e, a terminar as respectivas alegações, formulou as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. Afigura-se à recorrente que o ponto e) do elenco dos factos não provados deveria ter sido considerado provado, ainda que com redacção diferente, o que se impõe em face da prova produzida em audiência de julgamento; 21 resulta claramente que a recolha dos resíduos a partir da rampa do hotel aconteceu por diversas vezes, incluindo no período de cerca de 8 meses em que o hotel se encontrava em obras, como se alcança dos depoimentos:

  3. Do motorista do camião, a testemunha C. A. (Audiência 23-09-2021 | 14:05:10 – 15:54:06 - Ficheiro: 20210923150509_1391484_2871893 00:00:00 – 00:48:56) – nomeadamente nas passagens de 00:01:33 a 00:05:11; b) Do depoimento da testemunha A. C., cantoneiro (Audiência 23-09-2021 | 16:10:41 – 16:31:32 - Ficheiro: 20210923161041_1391484_2871893 de 00:00:00 a 00:20:50) nomeadamente nas passagens 00:01:07 a 00:02:21 e 00:04:42; c) Do depoimento da testemunha M. O., supervisor do serviço de recolha dos lixos Audiência 18-11-2021 | 14:48:20 – 15:04:37 - Ficheiro: 20211118144819_1391484_2871893 de 00:00:00 a 00:16:16), na passagem de 00:01:17 a 00:02:57 e 00:10:37 a 00:11:30.

    1. Dos trechos acabados de sinalizar relativos aos depoimentos das testemunhas C. A., A. C. e M. O. (este com especial credibilidade, uma vez que era o responsável pelo serviço de recolha do lixo e superior hierárquico dos outros dois), resulta evidente que o percurso habitual para a recolha do lixo no hotel era pelo lado das termas (traseira do hotel), mas que, pelo menos durante um período de cerca de 8 meses e em virtude de estarem a decorrer obras, a 22 recolha foi feita pela rampa de acesso às garagens.

    2. Daqui resulta que tal fosse dado como provado, embora com uma redacção restritiva, tal como seguidamente se sugere: “e) Para a recolha dos resíduos e pelo menos durante o período de duração das obras (cerca de 8 meses) foi utilizada a rampa de acesso à garagem do hotel, com autorização dos seus responsáveis”.

    3. Esta formulação é a que está mais de acordo com a prova produzida e não interfere, no entendimento da recorrente, com o que ficou provado nos pontos 10, 11 e 23, relevando no entanto para a solução de direito no que tange ao suposto desconhecimento da autora.

    4. Entende a recorrente que os pontos 13 e 14 do elenco dos factos provados não deveriam ter sido considerados como tal, ou, pelo menos, deveriam ter sido alvo de uma redacção restritiva.

    5. No ponto 13 imputa-se ao condutor do veículo seguro na recorrente uma “condução imprudente” na sua circulação, atribuindo-se a isso e ao peso do veículo a causa do abatimento do piso da rampa de acesso às garagens; no entanto, afigura-se à recorrente (salvo o sempre devido respeito por melhor opinião) que a expressão “condução imprudente” não constituirá um facto, 23 mas antes um conceito de direito, como tal insusceptível de ser levado ao elenco da matéria de facto.

    6. No elenco dos factos provados não se vislumbra qualquer facto concreto que possa levar à qualificação da condução do motorista do veículo como “imprudente” e que tenha a ver com a circulação do veículo; sendo certo que na fundamentação de Direito (pág. 14, 3º parágrafo da sentença) se refere que “tratando-se de uma rampa estreita apenas de acesso à garagem do hotel e por isso a veículos ligeiros, de acordo com as regras da experiência comum agiu com culpa, na modalidade de negligência o condutor do veículo da ré ao ali circular com um veículo pesado daquela natureza” (sublinhados nossos), a verdade é que não foi dado como provado – nem sequer foi alegado - qualquer facto relativo à largura da rampa de acesso, daí que não possa dizer-se que a mesma é “estreita”.

    7. Acresce que como vimos supra relativamente à alínea e) dos factos não provados, a circulação do veículo naquela rampa tinha ocorrido por diversas vezes ao longo do período de 8 meses em que o hotel esteve em obras, com a autorização dos seus responsáveis e do supervisor do serviço de recolha dos lixos, afilhado de casamento do então director do hotel – a testemunha M. O..

    8. Por outro lado, no ponto 14, afirma-se (por simples adesão ao articulado pela 24 autora na p.i.) que “o peso do veículo provocou o abatimento do pavimento”, no entanto, não existe qualquer facto dado como provado que nos diga qual era o peso do veículo, nem tal foi sequer alegado pela autora, sendo certo que ficou dado como provado que no local não existia qualquer sinalização que proibisse a circulação de veículos pesados ou de peso superior a determinada tonelagem (facto 37), ou que limitasse a circulação aos veículos dos clientes do hotel (facto 36).

    9. A redacção adoptada para os factos provados 13 e 14 enferma de manifesta falta de objectividade, traduzindo, não factos, mas conclusões, pelo que se sugere a alteração da redacção daqueles pontos, de modo a que fique a constar o seguinte: “13. Quando o referido veículo ali circulava, o pavimento da via de acesso à garagem do hotel explorado pela autora aluiu,” “14. Provocando o abatimento do pavimento da rampa de acesso exclusivo à garagem do hotel e a consequente inutilização da mesma”.

    10. A autora instaurou a presente acção invocando ser concessionária do estabelecimento de hotel “W”, juntando o respectivo contrato de concessão de exploração; tal documento é o que define o âmbito e demais condições em que tal cessão será exercida; não consta do título qualquer menção ao parque de estacionamento e à rampa de acesso à garagem.

    11. Do alvará de licença de exploração turística emitido para o estabelecimento – que delimita fisicamente a sua constituição e utilização - não consta sequer a garagem, nem o parque de estacionamento nem a rampa de acesso à garagem.

    12. O objecto da cessão de exploração não é o imóvel em si, mas sim o estabelecimento como um bem unitário, compreendendo a globalidade dos elementos que o integram e a sua destinação ao prosseguimento de uma dada actividade mercantil, não se confundindo com o arrendamento do imóvel.

    13. Incumbia à autora alegar e fazer a prova de que esses bens (parque de estacionamento garagem e rampa de acesso) faziam parte do estabelecimento e foram incluídos no contrato de concessão, o que não fez, pelo que ainda que pudesse afirmar-se tratar-se de “propriedade privada”, afigura-se que não se encontra demonstrado que a aqui autora possa arrogar-se detentora da rampa de acesso e muito menos sua proprietária, pelo que o veículo seguro na ora recorrente, ao circular na rampa de...

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