Acórdão nº 3540/19.4T8CBR.C1 de Court of Appeal of Coimbra (Portugal), 13 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelFERNANDO MONTEIRO
Data da Resolução13 de Setembro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Coimbra (Portugal)

Acordam na 2ª secção do Tribunal da Relação de Coimbra: AA instaurou ação contra BB, CC e mulher, DD, pedindo: 1. Seja declarada a existência e vigência actual de um contrato de arrendamento rural celebrado, há mais de 20 anos, entre o falecido marido da A., EE, e o primeiro réu (ou seus antecessores), sobre os respectivos prédios rústicos, compostos de terra de semeadura e arroz, sitos em (extinta) freguesia do concelho ..., os quais, por força do emparcelamento da margem esquerda do Baixo Mondego, ocorrido no ano de 2015, correspondem ao actual prédio rústico/lote nº ...80, situado na (actual) União das Freguesias ..., ... e ..., daquele concelho; 2. Seja declarado que a Autora é a actual arrendatária do referido lote e titular do contrato de arrendamento; 3. Seja o contrato de arrendamento celebrado entre os RR., sobre o lote ...80, declarado nulo e de nenhum efeito e ineficaz em relação à A., sendo legalmente inválido; 4. Sejam os RR. condenados a reconhecer os três anteriores pedidos, e a restituírem à A., livre de quaisquer bens ou culturas que lhes pertençam, o lote ...80, bem como a não impedirem ou absterem-se de perturbar a Autora, por si ou por outrem a seu mando ou em sua representação, seja por que meio ou modo for, de cultivar o referido lote; 5. Sejam os RR. condenados a pagar à A., solidariamente, a quantia de € 1.341,05, por não ter podido exercer, sobre o lote em causa, nos anos de 2016, 2017 e 2018, os direitos de que é titular; 6. Sejam os RR. condenados solidariamente a indemnizar a Autora dos prejuízos decorrentes da falta de rendimentos pelo não cultivo do lote ...80 nos anos de 2016 e 2018, no total de € 3.609,62; 7. Sejam os RR. condenados solidariamente a indemnizar a Autora pelos prejuízos, seja qual for a sua proveniência, a partir do ano de 2019 (inclusive), até que o lote ...80 lhe seja restituído ou entregue para cultivo, a liquidar em execução de sentença; 8. Sejam os RR. condenados a pagar juros em relação aos valores de sua responsabilidade, à taxa legal, contados desde a citação, até efetivo ou integral pagamento.

Alega, para tanto, em síntese: Foi casada com EE, no regime da comunhão geral de bens, tendo o marido falecido no dia .../yy/2016, no estado de casado com ela, sem testamento ou qualquer disposição de última vontade, tendo deixado, como únicos e universais herdeiros, a autora, sua viúva, e um filho do casal, FF.

Há mais de 20 anos, antecessores do 1º réu, por este continuado, deram de arrendamento ao marido da autora, por contrato verbal, vários prédios rústicos de que eram proprietários, mediante o pagamento de uma renda anual, a pagar no final de cada ano.

O falecido marido da autora era agricultor e desde a celebração do contrato até ao final do ano de 2014 explorou os arrendados.

No ano de 2015, decorreu uma operação de emparcelamento que abrangeu os terrenos; para permitir essa operação de emparcelamento, os prédios explorados pelo falecido marido da A., ficaram em pousio em 2015, tendo sido acordado com a Direcção Geral da Agricultura e Desenvolvimento Rural (DGADR) receber uma indemnização no valor de € 62.327,01.

Após a operação de emparcelamento, o objeto locatício passou a ser o lote ...80.

Entretanto, o marido da A. adoeceu, tendo entregue ao filho, FF, a gestão ou administração da sua vida, tendo outorgado procuração na qual conferiu amplos poderes de administração.

As rendas dos anos de 2015 e 2016, relativas ao lote ...80, foram pagas em dezembro do respetivo ano.

No início de 2016, quando o filho da A. se aprestava para cultivar o lote, verificou que o mesmo se encontrava cultivado. Em 29 de agosto de 2016, foi enviada ao R./proprietário uma carta registada, dada a conhecer aos 2ºs RR., onde se deu nota da ocupação indevida do terreno por estes RR e de que, no ano seguinte, o filho da A. tencionava cultivá-lo.

Na carta enviada foi também solicitada a redução a escrito do contrato.

Até hoje nenhuma resposta houve às cartas e o contrato não foi reduzido a escrito.

Entretanto, o marido da A. faleceu no dia .../yy/2016, tendo deixado como seus únicos e universais herdeiros a Autora e o filho do casal, FF.

Após o óbito, foi o filho quem, em nome da A., e com o seu conhecimento, continuou a gerir e a administrar todo o património existente.

Em .../kk/2016, o filho da A., em nome e com o conhecimento desta, enviou ao proprietário/1º R. uma carta registada, com aviso de recepção, por ele recebida, em que lhe deu conhecimento do óbito do pai e o notificou da pretensão da A. de assumir a titularidade no contrato.

No ano de 2017, a Autora, por intermédio do filho, cultivou o lote em apreço.

No ano de 2018, após o filho da A. preparar o terreno para o semear, foi confrontado com uma decisão proferida em providência cautelar requerida pelo 2º R. marido; por força desta, a Autora, a partir do ano de 2018, ficou impedida de cultivar o lote ...80.

A partir de 2018, são os 2ºs RR quem está na posse do lote, quem cultiva e retira dele todos os rendimentos, com a cumplicidade do 1º R.

Entretanto, a Autora teve conhecimento que o 1º R. terá dado de arrendamento aos 2ºs RR. o referido lote.

A situação gerada pelos RR. causou prejuízos à Autora, que enumera.

Os réus contestaram, em síntese: Em .../12/2014, o falecido marido da Autora procedeu de livre e espontânea vontade à entrega das terras de que tinha sido arrendatário rural ao proprietário, 1º réu, assim pondo termo ao respectivo contrato, verbalmente, tendo o senhorio recebido as terras que assim lhe foram entregues, aceitando o termo do contrato de arrendamento.

O marido da autora pôs termo ao contrato de arrendamento antes de ter constituído o seu filho como procurador, pelo que, ainda que este tivesse poderes de representação do seu pai, já não podia desfazer o que pelo representado estava feito.

Relativamente à renda de 2015, o que sucedeu foi que o 1º réu não conhecia o filho da autora, pelo que não o reconheceu quando este lhe apareceu, no final desse ano, e aquele também não se identificou, dizendo apenas que vinha pagar as rendas das antigas terras, ficando o 1º réu erroneamente convencido que se tratava do pagamento da renda devida pelos arrendatários de um outro lote de que também é proprietário.

Quando se apercebeu do erro, quis devolver a quantia indevidamente recebida a título de renda ao filho da autora, mas não sabia sequer quem este era ou onde morava e, tendo pedido ajuda a terceiros, foi informado de que era escusado devolver-lhe o dinheiro que ele não o aceitaria senão em tribunal.

No que concerne ao suposto pagamento da renda de 2016, o cheque foi devolvido.

Relativamente às cartas de .../xx/2016, as mesmas não obtiveram resposta, porquanto os seus destinatários estavam cientes e convictos que o falecido marido da autora não era já arrendatário, pelo que tal comunicação era absurda.

No ano de 2016, o lote ...80 começou a ser cultivado pelo 2º Réu, com autorização para tal do 1º Réu.

A autora não é arrendatária de tal lote, uma vez que o seu marido havia posto termo ao contrato de arrendamento anteriormente existente que não se transmitiu, por sua morte, à sua mulher. Não sendo arrendatária, a autora não podia cultivar o lote ...80, pelo que não sofreu quaisquer danos por ter sido impedida, através do seu filho, de continuar a cultivá-lo.

Entretanto, foram proferidas decisões que julgaram habilitados FF, como sucessor da autora AA, e GG, HH, II e JJ como sucessores do réu BB.

Realizado o julgamento, foi proferida decisão que julgou a ação totalmente improcedente, absolvendo os Réus do...

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