Acórdão nº 2644/21.8T8PDL.L1-7 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 27 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | ALEXANDRA CASTRO ROCHA |
Data da Resolução | 27 de Setembro de 2022 |
Emissor | Court of Appeal of Lisbon (Portugal) |
Decisão Texto Parcial:
Acordam na 7ª Secção do Tribunal da Relação de Lisboa: RELATÓRIO: A… e B… intentaram acção declarativa, com processo comum, contra o Município C…, D…, L.da, E… e F…, L.da, pedindo que os RR. sejam condenados a: “- Reconhecer que a propriedade dos AA, a sul e nascente, se estende por mais 50 centímetros em toda a extensão do muro divisório mal construído pela 4.ª R e esta ainda a corrigir o muro divisório em toda a extensão que infletiu erradamente para norte, de molde ao velho portão ali ser colocado e a funcionar, bem como o A a poder manobrar a viatura referida em 5 supra, como sempre fez, respeitando e devolvendo a área de que se apropriaram.
- a primeira R. a afastar o nicho do contador da água do muro divisório, referido em 10 supra, de modo a impedir que a casa dos AA fique devassada, nos termos do Regulamento Municipal 174/2016 de 18 de fevereiro, nos seus artigos 66 e 107.
- A primeira e terceira RR a reduzir a largura da sua servidão para 2,50 metros de largura, em todo o seu trajeto de 48 metros de extensão”.
Para tanto, alegam, em síntese, que: 1.–São proprietários de determinado prédio urbano; 2.–O seu prédio confronta a sul com uma servidão de passagem, para pessoas, animais e veículos, através de uma faixa de terreno com a largura de 2,5 metros e o comprimento de 48 metros, encontrando-se a servidão registada sobre prédio da 2ª R., a favor de prédio do 1º R.; 3.–O prédio de que os AA. são proprietários, na confrontação com a via pública, possui um portão de ferro, com a largura de 2,8 metros, que sempre foi, durante mais de 20 anos, usado pelos AA. para acesso ao seu quintal e garagem; 4.–Os RR. expandiram a servidão referida em 2 para 4 metros de largura, dos quais 50 cm foram à custa do prédio dos AA., impedindo que na entrada da casa destes caiba o portão mencionado em 3, por tal entrada ter ficado reduzida daqueles 50 cm.
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–Tal resultou de a 4ª R. ter sido contratada pelos AA., em 2019, para construir o muro divisório entre o prédio referido em 1 e o caminho mencionado em 2, mas aquela R., mancomunada com os 2ª e 3º RR. e com o consentimento tácito do 1º R., não ter construído tal muro segundo o acordado, mas sim de modo a reduzir aquela entrada.
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–Pela abertura, onde agora não cabe o portão, entram pessoas estranhas e animais vadios, fazendo desacatos e danos.
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–O 1º R. mandou construir no caminho de servidão um nicho, tipo armário de blocos de cimento, a fim de ali instalar um contador de água, construção que permite o acesso à propriedade dos AA. dos “drogados e bêbedos” que enxameiam as instalações da 2ª R., para além de desrespeitar a regulamentação de tais construções.
A R. D…, L.da, contestou, invocando a excepção de caso julgado e pedindo, em reconvenção, a condenação dos AA., como litigantes de má fé, no pagamento de uma indemnização de € 1.440,00.
A R. F…, L.da, contestou, alegando que se limitou a construir um muro divisório, o que fez a pedido dos AA. e de acordo com as instruções que lhe foram dadas pelo advogados dos próprios AA..
O R. Município C… contestou, defendendo ser parte ilegítima em relação ao primeiro e terceiro pedidos, por não ter tido qualquer intervenção na construção do muro em causa. Por outro lado, em relação aos factos que suportam o 2º pedido, defende que os mesmos respeitam a uma relação jurídica que nada tem a ver com os factos que suportam os 1º e 3º pedidos, ocorrendo coligação ilegal de RR., sendo ainda certo que a construção em causa, tendo sido efectuada em prédio da sua propriedade, não proporciona qualquer galgamento do muro dos AA.. e não viola quaisquer normas regulamentares.
O R. E… contestou, alegando que o tribunal é incompetente, em razão da matéria, para conhecer do 2º pedido, dado tratar-se da actuação de uma entidade pública, no âmbito das suas competências, em alegada violação de Regulamento Municipal, sendo competente para o apreciar o tribunal administrativo. Por outro lado, pretende ser parte ilegítima, por ser totalmente alheio aos factos invocados pelos AA.. Mais invoca a ilegalidade da coligação de RR.. Alega, ainda, que a causa de pedir e o pedido foram já judicialmente apreciados, pelo que ocorre caso julgado. Finalmente, pretende existir abuso de direito, decorrente do facto de os AA. terem concordado com a edificação em causa. Pede a condenação dos AA. como litigantes de má fé, por terem deduzido pretensão cuja falta de fundamento não deviam ignorar, omitido factos relevantes para o apuramento da verdade e feito do processo um uso reprovável.
Os AA. replicaram, em relação à reconvenção da R. D…, L.da, pugnando pela sua improcedência e defendendo que é esta R. quem litiga de má fé.
A convite do tribunal, vieram ainda os AA. responder às excepções invocadas pelos RR., defendendo a sua improcedência.
Em 13/4/2022, foi proferido despacho saneador, que fixou à causa o valor de € 17.316,00, e absolveu todos os RR. da instância – o 1º R., em razão de excepção dilatória de incompetência absoluta do tribunal, a 2ª R., em razão de excepção dilatória de caso julgado e os 3º e 4ª RR., em razão de excepção dilatória de ilegitimidade.
Não se conformando com esta decisão, dela apelaram os AA., formulando, no final das suas alegações, as seguintes conclusões: “a.-Valor da causa: como não está apenas em causa o valor matricial dum dos imóveis dos autos mas também as consequências da sua devassa, a conflitualidade com vizinhos desrespeitosos, o valor das obras no muro divisório mal colocado, o valor atribuído é o que deve prevalecer, pois o disposto no artigo 299 do Código do Processo Civil, em que assenta esta decisão, não reflete todos os valores em causa, devendo prevalecer o que os Recorrentes lhe atribuíram e que não foi impugnado pelas partes.
b.-Incompetência em razão da matéria: a douta decisão recorrida, na parte em que considerou os tribunais comuns incompetentes materialmente para julgar a questão posta, impondo a intervenção dos tribunais administrativos, não fez a melhor interpretação do disposto na Constituição e no artigo 1.º do ETAF, pois aquela respeita apenas a direitos reais do foro civil, pelo que deve ser (salvo o devido respeito)...
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