Acórdão nº 01286/22.5BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelRicardo de Oliveira e Sousa
Data da Resolução16 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte:* *I – RELATÓRIO P..., UNIPESSOAL, LDA., com os sinais dos autos, vem intentar o presente RECURSO JURISDICIONAL da sentença promanada pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou “(…) o pedido cautelar parcialmente procedente e, em consequência, suspende[u] (…) a eficácia do despacho proferido em 09.06.2022 pelo Vereador do Pelouro das Finanças, Atividades Económicas e Fiscalização, na parte em que ordenou a demolição total do edifício sito na Rua ... - P..., e a reposição do terreno nas condições naturais (demolição da obra de construção efetuada sobre a área de domínio público marítimo, designadamente do edifício, da esplanada e da escada de acesso ao areal, incluindo toda a estrutura de suporte e estacaria de betão, limpeza final da área de intervenção e transporte a vazadouro, devidamente autorizado, de todos os produtos da demolição e limpeza), nas condições da informação NUD/...22/CM_, no mais improcedendo a ação (…)”.

Alegando, a Recorrente formulou as seguintes conclusões: “(…) 1- A recorrente recorre da parte da sentença do Tribunal a quo de decisão de não suspensão do ato administrativo de encerramento da atividade comercial da recorrente.

2- Com o presente recurso, a recorrente requer a reapreciação da matéria de facto e das questões de direito que se lhe seguem.

3- A recorrente requer aos Venerandos Desembargadores se dignem atribuir efeito suspensivo ao recurso, com os seguintes fundamentos: Se a atividade comercial da recorrente for suspensa ou encerrada até decisão final deste recurso, haverá graves prejuízos para a recorrente, quer pela falta de faturação comercial, quer pela suspensão dos contratos de trabalho dos 8 trabalhadores ao serviço da recorrente; quem pagará aos trabalhadores os seus salários durante o período de suspensão dos contratos de trabalho não havendo faturação da empresa? E quem pagará aos prestadores de serviços fundamentais (água, eletricidade, comunicações) no entretanto? Pede-se a suspensão do fornecimento? E os produtos alimentares que estão nos frigoríficos? Perecem? 4- Faz todo sentido a dedução deste recurso ter efeito suspensivo na sua receção até decisão final. Acresce que da suspensão não haverá qualquer prejuízo para a entidade recorrida, nem para o público.

5- A sentença do Tribunal a quo está muita bem escrita, muito esclarecedora, bem fundamentada, quer de facto, quer de direito, a meritíssima Juíza analisou muito bem a causa, os factos, os documentos e o Direito, a sentença está muito completa e muito bem redigida, com exceção, com o devido respeito, da análise dos factos que servem de base à decisão de não suspensão do ato administrativo de encerramento da atividade comercial da recorrente e respetivas consequências.

6- A entidade recorrida invocou sempre a falta de licença de construção para fundamentar a recusa (desde 2006) de emissão de licença de utilização à recorrente, a qual, ao contrário do descrito na douta sentença recorrida, foi pedida por diversas vezes pela aqui recorrente à Câmara Municipal ..., estando prova documental destes pedidos nos autos.

7- Como a licença de construção existe sem qualquer sombra de dúvida e está feita prova documental neste processo, a entidade recorrida não pode usar esta justificação para a não emissão da licença de utilização para restauração e bebidas e, consequentemente, não pode o Tribunal de primeira instância decidir pela possibilidade de a agora recorrida ordenar o encerramento a atividade comercial da recorrente com fundamento em inexistência da licença de utilização, pois foi sempre a recorrida a causadora da sua não emissão e essa recusa foi-o sem fundamento legal.

8- De notar que a recorrida considera que a recorrente tem condições para a obtenção da licença de utilização, já que concedeu à recorrente a permissão para laborar plena e legalmente no ano de 2021, de 1 de janeiro a 20 de setembro (e até a recorrida concedeu tacitamente à recorrente a permissão para laborar plenamente até 8 de junho de 2022) e só não concedeu a dita licença de utilização por considerar desde 2006 (erradamente) que a agora recorrente não tinha licença de construção e por isso não poderia exercer a sua atividade comercial.

9- De realçar que a alegação da agora recorrente na providência cautelar que a CM_ concedeu à P... a permissão para laborar livre e legalmente no ano de 2021 não foi impugnada pela então requerida na sua oposição e é matéria assente na sentença.

10 - Resulta do processo elementos que permitem concluir que o não decretamento da suspensão do ato administrativo de encerramento da atividade comercial da recorrente pela recorrida poderá provocar prejuízos de difícil reparação ou mesmo irreversíveis.

11 - Prejuízos tais como a suspensão dos contratos de trabalho dos 8 trabalhadores, a falta de pagamento aos fornecedores dos serviços alimentares, o perecimento dos produtos alimentares e a falta de manutenção do edifício.

12 - Se existe uma forte probabilidade (fumus boni iuris) de a aqui recorrente vencer a ação principal contra a CM_ de o edifício não ser demolido - quer com base na existência de licença de construção, quer com base na douta sentença da providência cautelar - porquê permitir o encerramento da atividade comercial da recorrente? 13 - Qual o objetivo de o edifício ficar vazio e devoluto para sempre, já que não haverá a possibilidade de ser demolido? 14 - Da existência de fumus boni iuris ou probabilidade de procedência da ação principal: A recorrente acredita que a ação principal lhe será favorável, por todos os motivos aqui descritos: o cumprimento pelo estabelecimento comercial de todos os requisitos para concessão da licença de utilização; a legalidade da construção e a continuação da sua existência (projeto aprovado pela APDL, conforme prova documental e matéria dada como provada na douta sentença da providência cautelar); a não violação de qualquer norma ambiental; a não retroatividade de aplicação do Plano Diretor Municipal de 2021 à situação do edifício existente desde o ano 2001; a continuação da existência do imóvel, ao abrigo do princípio da igualdade em relação a outros imóveis na mesma situação e no local da orla costeira marítima da cidade ...; a expetativa jurídica criada pela recorrente na sua existência desde 2001; a inexistência de qualquer prejuízo para o público ou para a entidade recorrida (nem alegado, nem concretizado prejuízo concreto pela recorrida em todo o processo); o benefício que o restaurante proporciona aos clientes (local lindíssimo, principalmente no verão); o benefício que o estabelecimento comercial proporciona ao local ao dar assistência à praia, aos banhistas, aos nadadores salvadores (foi sempre a aqui recorrente que pagou do seu bolso aos nadadores salvadores da praia), a limpeza da praia que sempre foi paga pela recorrente, etc.

15 - Os tribunais administrativos têm entendido que deve ser recusada a adoção das providências cautelares quando se anteveja a possibilidade de existir um “excecional ou grave prejuízo para o interesse público”.

16 - Ora, a recorrida não concretiza em momento algum das suas muitas alegações nos autos da providência cautelar quais os prejuízos graves para o interesse público, quer da existência do edifício, quer da continuação da atividade comercial da P...; nem alega e muito menos prova.

17 - Igualmente, o Tribunal recorrido não decide na sua douta sentença da existência de graves prejuízos para o interesse público.

18 - Não há prejuízos sofridos pela recorrida; não há prejuízos sofridos para o público; não há prejuízos sofridos por terceiros.

19 - Pelo contrário, está demonstrado em todo o processo o benefício púbico da existência da atividade comercial da recorrente.

20 - Tal como alegou a agora recorrente no seu pedido ao Tribunal de 1ª. instância, o qual nunca foi posto em causa: "A requerente está a poluir a praia? Não. Nunca o fez; nunca a areia foi contaminada; as instalações têm saneamento, cumprem todas as normais sanitárias e ambientais e a requerente nunca, em 22 anos de atividade, foi autuada por provocar danos ao ambiente.

A atividade da requerente é prejudicial à sociedade? Não; pelo contrário: os clientes adoram ir à P..., os produtos alimentares são bem confecionados e de boa qualidade e há higiene em todo o estabelecimento.".

21 - Como muito bem decide e fundamenta a douta sentença da providência cautelar: "Assim, a entidade requerida limita-se a alegar, de forma conclusiva, vaga e genérica, "prejuízos" para a saúde pública e proteção dos consumidores, sem os concretizar, além de que tal alegação se reporta apenas ao funcionamento do estabelecimento, nada contendo com a não demolição do edifício.".

22 - Ora, no entender da recorrente, se esta fundamentação e esta decisão se aplica à não demolição do edifício, tem que se aplicar forçosamente, por maioria de razão, ao não encerramento da atividade comercial da aqui recorrente, tanto mais que a falta de concretização e falta de prova dos alegados prejuízos vagos pela recorrida se aplicam a ambas as situações (…)”.

* Notificado que foi para o efeito, o Recorrido Município ...

produziu contra-alegações, que rematou com o seguinte quadro conclusivo:”(…) QUESTÃO PRÉVIA DO PEDIDO DE ATRIBUIÇÃO DE EFEITO SUSPENSIVO AO RECURSO DE APELAÇÃO A.

Pretende a Recorrente que seja atribuído efeito suspensivo ao seu recurso de apelação. Contudo, tal pretensão está condenada a soçobrar por manifesta ausência de fundamento legal.

Com efeito, B.

Resulta do artigo 128.°, n.° 1 do CPTA, a proibição da Administração executar um ato administrativo uma vez citada de uma providência cautelar de suspensão de eficácia de ato administrativo.

C.

Salvo no caso da emissão de Resolução Fundamentada, a que se reporta a segunda parte do n.° 1 do artigo 128.° do CPTA, a proibição de executar o ato administrativo mantém-se até que seja proferida decisão sobre o pedido...

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