Acórdão nº 00777/15.9BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 16 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelPaulo Ferreira de Magalhães (Por vencimento)
Data da Resolução16 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I - RELATÓRIO AA, e BB [devidamente identificados nos autos; herdeiros habilitados mediante decisão judicial proferida nos autos, por força da morte do marido e do pai dos Autores, respectivamente mulher e filho] Autores na acção que foi intentada contra o Estado Português [devidamente identificado nos autos], na qual foi requerida a sua condenação a pagar [ao então Autor, CC, marido e pai dos futuros Autores, respectivamente, ora Recorrentes] a quantia de 50.000,00 euros, acrescida de juros contados desde a citação, a título de indemnização por danos morais causados pelo atraso na decisão do Processo n.º 1897/04.0BEPRT identificado nos autos, inconformados com a Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto [pela qual foi a acção julgada parcialmente procedente, e condenado o Réu Estado Português a pagar aos Autores, a quantia de €9.000,00, a título de indemnização pelos invocados danos morais, vieram apresentar recurso de Apelação.

* No âmbito das Alegações por si apresentadas, elencaram a final as conclusões que ora se reproduzem: “[…] 1. O tribunal recorrido não ponderou, no arbitramento da indemnização que atribuiu à aqui recorrente o próprio atraso injustificado dos presentes autos.

2. Para esse arbitramento completo importa apreciar os seguintes factos: a) Em 5 de Março de 2015 foi submetida a petição inicial que deu origem aos presentes autos; b) Em 3 de Junho de 2015, quase 3 meses depois, foi o réu citado para, querendo, contestar; c) Em 30 de Junho de 2015 o réu requereu a prorrogação do prazo para contestar por 30 dias; d) O réu, aqui recorrido, submeteu aos autos a sua contestação em 14 de Setembro de 2015, mais de seis meses depois do início destes autos; e) Em 23 de Setembro de 2015 o mandatário do então autor deu conhecimento aos autos do seu falecimento; f) Em 30 de Setembro de 2015 foi proferido despacho a determinar a suspensão da instância; g) Em 17 de Dezembro de 2015 vieram os aqui recorrentes requerer a sua habilitação na qualidade de herdeiros do autor; h) O Ministério Público, citado para o efeito, não contestou, requerendo a junção da cópia da “respectiva escritura e que se encontra em falta”; i) Em 26 de Janeiro de 2016 responderam os então requerentes nos termos que melhor resultam do seu requerimento de tal data, afirmando, nos termos dos arts. 353º e 354º do CPC que a existência de uma escritura de habilitação não é condição para a procedência do incidente de habilitação de herdeiros.

  1. O tribunal, ignorando o que já então constava dos autos, notificou os aqui recorrentes, em 9 de Junho de 2016, para procederem à junção da certidão de habilitação de herdeiros no prazo de 10 dias.

  2. Os recorrentes comunicaram aos autos não terem efectuado a habilitação de herdeiros por falta de condições económicas para o efeito.

  3. Em 24 de Janeiro de 2017 determinou o tribunal que fosse oficiado à Direcção de Finanças do Porto o requerido pelo réu em 5 de Abril de 2016, 8 meses antes, portanto.

  4. Essa informação foi junta aos autos em 23 de Maio de 2017, quase 4 meses depois.

  5. Nessa sequência, em 27 de Junho de 2017, mais de um mês depois determinou o tribunal ser necessário proceder à audição das testemunhas por forma a comprovar a inexistência doutros herdeiros, designando o dia 12 de Julho de 2017 para esse efeito.

  6. O Magistrado do Ministério Público requereu a designação de nova data por estar impedido.

  7. Em 5 de Julho de 2017 foi designado o dia 11 de Julho de 2017.

  8. A inquirição das testemunhas foi realizada no dia 11 de Julho de 2017, pelas 14h00.

  9. A sentença foi registada no dia 18 de Julho de 2017.

  10. No dia 1 de Setembro de 2017 os herdeiros, já habilitados, responderam à contestação apresentada pelo réu e pronunciaram-se quanto aos documentos juntos.

  11. Em 1 de Fevereiro de 2018, 5 meses depois, foi designado o dia 22 de Março de 2018 para a realização da audiência prévia.

  12. Nessa data foi acordado designar nova sessão para continuação da presente audiência prévia, a fim de definir a matéria de facto assente e os temas da prova, dia 7 de Junho de 2018.

  13. Nessa data foram as partes notificadas, considerando os temas da prova fixados, de que dispunham do prazo de 20 dias para, querendo, apresentarem meios de prova actualizados.

  14. Em 12 de Julho de 2018 foi designado o dia 19 de Outubro de 2018 para a realização da audiência de discussão e julgamento.

  15. O julgamento realizou-se tendo sido declarada encerrada a audiência nesse mesmo dia pelas 15:09 horas.

  16. Em 9 de Setembro de 2019, quase um ano depois de concluída a audiência de discussão e julgamento, os autores requereram que fosse proferida decisão.

  17. Em 14 de Fevereiro de 2020 foi lavrada cota com o seguinte teor: “Nesta data consigno que os autos acima indicados e encontram na posse da Drª DD, Juiz Desembargadora, a exercer funções no Tribunal Central Administrativo Sul desde 01/01/2019, a fim de ser proferida sentença, conforme sua comunicação, datada de 21/01/2019, à Exmª Senhora Presidente deste tribunal.” aa) Em 14 de Abril de 2020 os autores, de novo, requereram que fosse proferida decisão, 17 meses que estavam decorridos sobre a abertura de conclusão com vista à prolação de sentença.

bb) Requerimento que repetiram em 12 de Agosto de 2020 e em 30 de Outubro de 2020, desde logo alegando que a demora era já absolutamente injustificada e irrazoável – cfr. documento nº ...58.

cc) Em 23 de Novembro de 2020 foi ordenada a notificação do requerimento acima referido à Senhora Juíza Desembargadora Dra DD bem como à Exma. Senhora Juíza Desembargadora Presidente, Dra EE.

dd) Em 14 de Setembro de 2021, ou seja quase 3 anos depois de encerrada a audiência de discussão e julgamento, a sentença de que ora se recorre, não tinha ainda sido proferida.

ee) Mais: a Drª DD, notificada em 4 de Dezembro do requerimento datado de 30 de Outubro de 2020, nada disse.

ff) À data tinham já decorrido seis anos e meio desde o início destes autos.

gg) Em 27 de Setembro de 2021 os aqui recorrentes requereram a junção aos autos de missiva submetida ao Conselho Superior dos Tribunais Administrativos e Fiscais.

hh) Em 21 de Outubro de 2021 foi proferida a sentença de que ora se recorre.

3. Todos estes factos são factos de que o tribunal tem conhecimento por virtude do exercício das suas funções, pelo que devem os mesmos ser considerados (artº 5º, nº 2, al. c) do CPC), e todos eles resultam demonstrados por documentos, pelo que, em ampliação da matéria de facto provada, deverão ser os mesmos considerados pelo tribunal ad quem ao abrigo do disposto no artigo 662º, nº 1 do CPC, aplicável ex vi do artigo 1º do CPTA.

4. Como resulta destes próprios autos, a própria acção de indemnização fundada na violação do direito dos autores à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável teve atrasos manifestamente excessivos e injustificados.

5. Tais atrasos, excessivos e injustificados, têm que ser considerados no âmbito da indemnização a arbitrar, sob pena de a presente acção de indemnização ficar absolutamente desprovida de sentido e impondo aos aqui autores a propositura de nova acção, mas agora para aferir da responsabilidade do réu/recorrido no que concerne ao atraso verificado nestes próprios autos, num ciclo vicioso sem fim.

6. É cristalino que nestes autos indemnizatórios verifica-se, pelo menos, um atraso injustificado de 3 anos e meio, impondo-se a modificação do montante arbitrado pelo tribunal recorrido, incluindo-se um valor suplementar a esse título.

7. Tal atraso, seguindo o critério operado para a violação do direito à obtenção de uma decisão em prazo razoável verificada no âmbito do proc. nº 1897/04.0BEPRT, gerador da responsabilidade de indemnizar face aos danos não patrimoniais sofridos, danos esses que não só se presumiam como também resultaram provados (cfr. factos provado 1º, 2º, 3º e 4º por referência à Base Instrutória [fls. 21 e 22 da decisão recorrida]), não pode ser indemnizado com valor inferior a 2.000,00 euros por cada ano de atraso, num total de 7.000,00 euros.

8. A decisão recorrida violou assim, por erro de interpretação e aplicação, o disposto nos arts. 20º, nº 4 e 22º da CRP, 6º, nº 1 da CEDH, 12º, 7º e 9º da Lei 67/2007, devendo ser revogada e substituída por outra que, nos termos do art. 202º da CRP, reconheça a violação do direito dos recorrentes à obtenção de uma decisão judicial em prazo razoável no âmbito destes autos indemnizatórios, atraso injustificado esse computado sempre em, pelo menos, 3 anos e meio, e que seguindo o mesmo critério indemnizatório da decisão recorrida, condene o réu/recorrido em 2.000,00 euros de indemnização por cada ano de atraso, num total de 7.000,00 euros, assim condenando o réu/recorrido no montante global de 16.000,00 euros.”.

** O Recorrido Estado Português apresentou Contra alegações, das quais para aqui se extraem as respectivas conclusões, como segue: “[…] 1º Os Autores, alegadamente não se conformando com a sentença proferido nos autos em 21 de outubro de 2021, contante a fls. 521 do SITAF, que julgou parcialmente procedente a presente ação administrativa e, em consequência, condenou o Réu Estado apenas na quantia de 9000€, a título de indemnização pelos danos morais em virtude da demora na obtenção de decisão no processo n.º 1897/04..., vieram interpor recurso.

  1. Contudo, lido o recurso, verifica-se que o objeto do mesmo não tem que ver com a apreciação da responsabilidade civil extracontratual do Réu Estado Português pela circunstância de o processo nº 1897/04.0BEPRT ter demorado cerca de 10 anos, dos quais 4 e meio foram considerados de atraso excessivo e injustificado, nem com o quantum da indemnização arbitrada, 3ºMas com a fixação de uma eventual indemnização, suplementar, a acrescer à de 9.000€ já fixada (e com a qual se conformam), pelo atraso, que consideram injustificado e computam em 3 anos e meio, na obtenção da sentença que foi proferida neste...

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