Acórdão nº 390/20.9T8STC.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelISABEL DE MATOS PEIXOTO IMAGIN
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam no Tribunal da Relação de Évora I – As Partes e o Litígio Recorrente / Autor: (…) Recorridos / Réus: (…) e (…) Trata-se de uma ação declarativa de condenação no âmbito da qual o A invocou o incumprimento culposo por parte dos RR do contrato-promessa celebrado, já que o Notário suspendeu a realização da escritura por existirem incongruências nos elementos documentais apresentados pelos RR promitentes-vendedores – na certidão predial, o destino do prédio consistia em edifício destinado a hotel. Não obstante interpelados para tanto, os RR não promoveram a alteração da referida designação.

Foram formulados os seguintes pedidos: - que seja declarada a resolução do contrato promessa de compra e venda celebrado entre os Autores e os Réus; - que seja julgado procedente o incumprimento definitivo e culposo do contrato- promessa de compra e venda pelos Réus e, consequentemente, serem os Réus condenados a restituir aos Autores o sinal em dobro, na quantia de € 15.000,00, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% desde a citação, até efetivo pagamento; - subsidiariamente, que seja declarado resolvido o contrato-promessa celebrado, e os Réus serem condenados de forma solidária a restituir aos Autores a quantia recebida a título de sinal no montante de € 7.500,00, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% desde a citação, até efetivo pagamento.

Em sede de contestação, os RR invocaram que, antes da celebração do contrato-promessa, foi dado conhecimento do teor de todos os documentos; que a fração está abrangida pela licença de habitação concedida pela Câmara Municipal; que não têm possibilidade de, só por si, alterar a designação da fração (destinada a unidade de alojamento) constante do título constitutivo de empreendimento turístico; que, tendo tomado conhecimento da existência de tal título na sequência da objeção apresentada pelo notário, constataram que o contrato-promessa é nulo, atento o disposto no artigo 54.º, n.º 7, do D-L n.º 39/2008, de 7 de março – diploma que regula o regime jurídico da instalação e funcionamento dos empreendimentos turísticos.

Concluem pugnando pela improcedência do pedido de restituição do sinal em dobro, apenas sendo devida a devolução do sinal recebido.

II – O Objeto do Recurso Decorridos os trâmites processuais legalmente previstos, foi proferida sentença julgando a ação parcialmente procedente, conforme segue: «julgo parcialmente procedente a presente ação por provada e, em consequência, declaro nulo o contrato-promessa celebrado entre Autor e Réus e em consequência desta, condeno os Réus (…) e (…) a restituir ao Autor a quantia de € 7.500,00, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% desde a citação, até efetivo pagamento, absolvendo-os do demais peticionado.» Inconformado, o A apresentou-se a recorrer, pugnando pela revogação da decisão recorrida, a substituir por outra que julgue improcedente a nulidade invocada e, decidindo pelo incumprimento do contrato-promessa por parte dos Recorridos, condene estes a pagar a quantia de € 15.000,00 correspondente ao dobro do sinal prestado, acrescido de juros de mora calculados à taxa legal de 4% desde a citação até efetivo pagamento. Concluiu a alegação de recurso nos seguintes termos: «I. Consideram os Recorrentes que os meios de prova valorados, declarações do Recorrido, Testemunhas, e documentação apresentada, impunham uma formulação de juízo probatório diverso daquele que incidiu sobre os mesmos; II. Os Recorrentes entendem que a reapreciação dos meios de prova produzidos terão de conduzir a uma solução decisória diversa da alcançada relativamente às questões fundamentais submetidas pelas partes à apreciação do Tribunal; III. Vêm os Recorrentes impugnar a matéria de facto assente como provada e não provada, porquanto houve provas produzidas nos autos e em audiência que não foram consideradas na sua apreciação e fixação.

  1. Assim como, foi produzida prova bastante para que o Tribunal a quo tivesse considerado outros factos de especial importância para a ponderação e decisão da matéria de facto provada e não provada, que se absteve de conhecer, e que permitiriam a obtenção de conclusões contrárias, que determinarão a anulação da sentença, V. Vem o presente recurso interposto da douta sentença, que julgou a ação parcialmente procedente, e declarou nulo o contrato-promessa celebrado entre o Recorrente e os Recorridos e em consequência desta, a condenação dos Recorridos restituir ao Recorrente o valor pago a título de sinal.

  2. O conhecimento da nulidade resulta da arguição na contestação pelos Recorridos da nulidade do contrato promessa de compra e venda, por vício de forma.

  3. Acedendo ao pedido formulado pelos Recorridos, o Tribunal a quo decidiu declarar a nulidade do contrato promessa de compra e venda, por vício de forma, considerando que o objeto do contrato é de facto uma unidade hoteleira.

  4. Consequentemente, o Tribunal a quo escusou-se de conhecer o pedido formulado pelo Recorrente: declarar o incumprimento culposo do contrato promessa de compra e venda pelos Recorridos.

  5. Decidindo como decidiu, salvo o devido respeito, a douta sentença não fez correta aplicação do direito, pois crê-se que os documentos e prova trazidos aos autos só por si implicam necessariamente decisão diversa da proferida.

  6. Caberia ao Tribunal a quo analisar a conduta controversa dos Requeridos, que ao arrepio dos princípios da boa-fé vieram arguir a nulidade do contrato promessa de compra e venda.

  7. Houve por parte dos Recorridos uma utilização abusiva do pedido de nulidade do contrato-promessa em causa.

  8. Os Recorrentes agiram em Abuso de Direito na modalidade de venire contra factum proprium, como veremos adiante.

  9. Resulta da matéria de facto provada Q) e R), e das declarações de parte do Recorrido que os Recorridos consideraram sempre que a fração objeto do contrato promessa tem como destino a habitação.

  10. Aliás, nada consta dos autos, não foi alegado, nem foi produzida prova de que as partes queriam transacionar o imóvel como se de uma unidade hoteleira se tratasse.

  11. Deveria o Tribunal a quo concluir que as partes queriam de facto celebrar um contrato de compra e venda de uma fração que se destinava a habitação, pela correta apreciação dos factos, nomeadamente do depoimento de parte do Recorrido.

  12. Do depoimento de parte do Réu, o Recorrido confessa que sempre tratou o imóvel prometido como habitação, confirmado pela testemunha (…), mediadora imobiliária que promoveu anteriormente a venda do imóvel.

  13. O Recorrido confirmou ter comprado e vendido o imóvel objeto do contrato de compra e venda como habitação, sendo esse o destino inscrito nas escrituras outorgadas.

  14. Os Recorridos ao invocar a nulidade do contrato promessa adotam uma conduta contraditória com tudo o que alegam, em manifesto abuso de direito, e que cabia ao Tribunal a quo ter adotado outro entendimento, que não o conhecimento da nulidade.

  15. O Recorrido agiu em Abuso de Direito, na modalidade de venire contra factum proprium.

  16. Resulta da matéria de facto, que nunca os Réus trataram da venda deste imóvel como unidade hoteleira, e é o que deveria resultar das conclusões do Tribunal a quo, e não conhecer a nulidade do negócio.

  17. O próprio Réu confirma que o Autor só realizaria a escritura de compra se o imóvel se destinasse para habitação! XXII. Os Recorridos, na posse do sinal do Recorrente, lograram vender o imóvel a terceiros, tendo sido vendido em Casa Pronta como destino a habitação.

  18. Resulta do exposto que os Recorridos ao invocar a nulidade do contrato por erro de forma, considerando que o contrato promessa de compra e venda teria como objeto uma unidade hoteleira e não para habitação, fizeram-no em manifesta má-fé, uma vez terem vendido esse mesmo imóvel como habitação, poucos meses depois da resolução do contrato com o Recorrente.

  19. Deveria o Tribunal a quo concluído que, comprando, utilizando e vendendo posteriormente o imóvel como habitação a terceiros, é ilegítimo ao Recorrido considerar que o imóvel se destina a unidade hoteleira ou turística, e arguir uma nulidade pela falta de forma do contrato promessa, nos termos da...

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