Acórdão nº 140/19.2T8VRM.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 15 de Setembro de 2022
Magistrado Responsável | MARGARIDA ALMEIDA FERNANDES |
Data da Resolução | 15 de Setembro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam no Tribunal da Relação de Guimarães I – Relatório X, Lda., com sede na Rua …, Centro Comercial … Barcelos, instaurou a presente acção declarativa de condenação, com processo comum, contra M. S.
, residente no Lugar … Vieira do Minho, pedindo a condenação do réu a pagar à autora a quantia de € 11.765,47 correspondente ao restante preço da obra que ainda não pagou, acrescida de juros, à taxa legal, desde 01/10/2014 (data da Factura nº 1/2014), no valor de € 2.275,73, e vincendos.
Para tal alegou, em síntese, que o réu contratou a autora para finalizar a obra de reabilitação e construção da habitação unifamiliar sita no Lugar …, Vieira do Minho, iniciada por terceiro.
A autora emitiu a factura nº 1/2014 de 01/10/2014 no valor de € 16.765,45. O réu apenas pagou € 5.000,00. Apesar de interpelado o réu não pagou a quantia em falta de € 11.765,47.
Ao longo da evolução dos trabalhos o réu nunca apresentou qualquer reclamação.
*O réu contestou referindo que a autora nunca lhe prestou quaisquer serviços pelo que nada deve.
Refere ter celebrado contrato de empreitada verbal com E. M., Unipessoal, Lda. no valor global de € 50.000,00 tendo pago a esta a quantia de € 48.000,00. Assim, aquando do abandono da obra, os trabalhos por executar não excediam a quantia de € 17.000,00. A. F. apresentou o orçamento nº 31/2013 que foi aceite pelo réu. O réu entregou a esta a quantia de € 5.000,00 por cheque à ordem de Y, Lda.; € 10.000,00 por transferência para a conta desta sociedade e € 3.500,00 em numerário entregue a A. F.. Em Outubro de 2014 Y, Lda. abandonou a obra tendo a obra sido concluída por M. B. a quem pagou € 12.000,00.
Pede a condenação da autora como litigante de má-fé por faltar conscientemente à verdade.
*A autora pronunciou-se acerca da excepção.
*Foi dispensada a realização de audiência prévia, foi proferido despacho saneador, foi identificado o objecto do litígio, enunciados os temas da prova e admitidos os requerimentos probatórios.
*Procedeu-se a audiência de julgamento, após a qual foi proferida a seguinte decisão: “Pelos motivos expostos, decido: 5.1.- Julgar a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, condeno o réu a pagar à autora a quantia de trezentos e vinte euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento da fatura (01-10-2014) até integral pagamento.
5.2.- Custas a cargo da autora e do réu na proporção do decaimento, sem prejuízo do benefício do apoio judiciário concedido à autora. (…)”*Não se conformando com esta decisão veio a autora dela interpor recurso de apelação, apresentando alegações e formulando as seguintes conclusões: “I. A sentença recorrida decidiu julgar a presente ação parcialmente procedente e, em consequência, condenou o réu a pagar à autora a quantia de trezentos e vinte euros, acrescida de juros de mora, à taxa legal, desde a data de vencimento da fatura (1-10-2014) até integral pagamento.
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Para o efeito, deu como provados os factos constantes da sentença (4.1) dos n." 1 a 20. E como não provados os constantes no 4.2 da sentença que ora se recorre.
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Baseando a sua decisão no fundamento de que: "a autora nunca poderá receber, para além dos confessados cinco mil euros, o remanescente do valor total desse orçamento ... não ficou assente, nem se apurou, o preço total das obras efetivamente realizada pela autora no âmbito desse acordo com o réu e que teve na sua base o dito orçamento n." 31/2013 ... como não foi possível apurar o valor real dessas obras realizadas pela autora, impõe-se a sua fixação segundo um juízo de equidade, com recurso à regras da experiência comum e de normalidade, e tendo em atenção, na concretização desse valor, a natureza das obras orçamentadas que foram concluídas por um terceiro e o valor que o réu pagou a esse terceiro para a conclusão das obras orçamentadas pela autora – cfr. artigo 1211°, ex vi artigo 883°, do c.c.
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A autora subscreve a matéria factual dada como provada e não provada na douta sentença, sendo que, somente se insurge contra a subsunção dos factos ao direito feita pela douta sentença. A decisão proferida deveria ser diferente em função da matéria dada como provada e não provada.
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Pois que, não basta para a decisão a proferir, o mero juízo de realização ou não da totalidade das obras previstas no orçamento nº 31/2013 outorgado entre as partes, pois que as consequências da desistência da empreitada por parte do réu, obsta a que se possa seguir um juízo de equidade em função do resultado do que efetivamente foi feito pela autora. Importa também retirar as consequências jurídicas e na decisão a proferir a final do proveito que poderia tirar autora na execução da obra.
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Tanto mais, resulta dos factos provados que o réu nunca chegou a resolver licitamente o contrato de empreitada que outorgara com a autora e aquele aceitou o orçamento nº 31/2013 apresentado por esta. Pese embora a autora não tenha realizado todas as obras identificadas no orçamento nº 31/2013.
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O simples facto da fatura nº 1/2014 não ter sido paga e de ter servido para se fazer pagar a autora pelos serviços prestados no contrato de empreitada com o orçamento nº 31/2013, certo é que a matéria factual assente impõe um valor a arbitrar à autora razoavelmente superior ao que ora foi arbitrado. Pois que, se devem seguir as consequências previstas no artigo 1229° do CC.
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Pois que, também os pagamentos que o réu confessadamente efetuou à Y, Lda., em nada contribuem para o apuramento do valor em dívida à autora e o contrato celebrado entre a autora e o réu é um contrato de empreitada nos termos do o preceituado no artigo 1207º do C. Civil. Estamos, por conseguinte, no caso em apreço, perante um contrato oneroso e sinalagmático, ou seja, à realização da obra pelo empreiteiro correspondente ao pagamento do preço pelo dono da obra.
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Se é certo que deve ser cumprido o disposto no artigo 406°, do C. Civil, do cumprimento integral dos contratos, certo é também que, o presente contrato de empreitada, como já se foi aflorando não foi licitamente resolvido pelo réu e daí deveria a douta sentença ter tirado as devidas ilações.
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Só é possível a resolução de um contrato de empreitada, desde que se torne impossível a prestação, por causa imputável ao devedor (artigo 801º, nº 1); por perda de interesse do credor, em consequência de mora daquele; ou pela recusa de cumprimento pelo devedor dentro do prazo razoável, que lhe tenha sido fixado pelo credor (artigo 808°, n," 1 ambos do CC).
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No caso sub judice não existiu nenhum prazo concedido pela intimação admonitória, nem resulta que tal tenha ocorrido. Pelo que, não se resolveu a relação contratual por impossibilidade na realização da prestação ou por perda do interesse do credor.
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Pese embora o réu tenha contratado um empreiteiro terceiro para finalizar a obra, este nunca declarou ao autor a vontade de resolver o contrato, e pese embora não venha referido na sentença, mas deve-se retirar da leitura da mesma, que ainda hoje se deve pressupor que o mesmo se mantém válido, pelos pedidos que formularam a autora e o réu, nenhum deles de resolução.
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Não decorre dos factos provados a possibilidade de aplicação do disposto naqueles citados artigos 801° e 808°, do C. Civil, tanto mais que não se indicia, sequer, perda de interesse do réu (pelo contrário, até a prosseguiu, encarregando um outro empreiteiro de o fazer) ou concessão de um prazo razoável.
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O réu, de modo informal e tácito, o que fez foi desistir dos serviços do autor. Depois...
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