Acórdão nº 942/09.8BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 15 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução15 de Setembro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO R..., LDA (doravante R...

ou Recorrente), interpôs recurso da sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, que julgou improcedente a impugnação deduzida contra o ato de liquidação de Imposto sobre Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) do exercício de 2004, no montante de €4.773,30, e respetivos Juros Compensatórios (JC), no montante de €557,21.

A Recorrente formulou as conclusões que infra se descrevem: “A. Por sentença datada de 27/01/2022, o Tribunal Administrativo e Fiscal de Sintra julgou improcedente a impugnação apresentada da liquidação n.º 20088310037507, referente ao IRC do exercício de 2004, no valor de 4.773,50€ (quatro mil, setecentos e setenta e três euros e cinquenta cêntimos), dos quais 557,21€ (quinhentos e cinquenta e sete euros e vinte e um cêntimos) correspondem a juros compensatórios.

  1. A sentença a quo deu como não provada que a sociedade comercial denominada “A..., Ldª” tenha procedido à prestação de serviços à Recorrente, serviços estes desconsiderados para efeitos de determinação da matéria tributável, com fundamento na inexistência material dos serviços prestados pela referida sociedade.

  2. Acontece que, como decorre do Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, de 24/01/2008, proferido no processo n.º 02887/04, quando forem apurados pela tutela indícios sérios e credíveis de que determinada operação comercial titulada por uma factura não é real, cabe ao contribuinte o ónus da prova da veracidade dessa transacção.

  3. Ora o Tribunal a quo, entendeu por provado, que a tutela tributária em sede de inspecção, demonstrou que a operação titulada pelas facturas emitidas pela sociedade comerial “A..., Ldª” não correspondiam a uma operação real, porém, a conclusão a que chega o Tribunal não poderia ter sido formulada nos termos e com os fundamentos em que assenta.

  4. Cumpre salientar que a empreitada sita em Sesimbra, resultou da adjudicação à Recorrente, pela sociedade comercial denominada V..., Lda, a 22/03/2004, quase duas décadas antes da produção de prova testemunhal, pelo que os inquiridos, que lidam com a construção civil diariamente, não consigam, atentas as regras da experiência normal, recordar em pormenor, que actos concretos efectuou uma sociedade subcontratada para uma empreitada.

  5. Resultou expressamente da fundamentação do julgamento, que a testemunha Francisco Costa, confirmou ver o legal representante da sociedade “A... Unipessoal, Ldª” no local da empreitada, acrescentando que o mesmo coordenava trabalhadores naquela empreitada.

  6. Da mesma forma, decorreu do depoimento da testemunha Manuel Pereira, que a sociedade “A... Unipessoal, Ldª” prestou serviços na empreitada em Sesimbra, acrescentando que o legal representante da mesma transportava vários trabalhadores para o local de obra.

  7. Tanto assim é, que foi dado por provado, na al. F) do probatório, que “A..., trabalhou na obra de Sesimbra e fazia o transporte de trabalhadores para trabalharem nesse local (cfr. depoimento das testemunhas)”.

    I. Temos por isso, que é dado como provado que existiram efectivamente operações reais, quando simultaneamente é dado por provado que a tutela tributária cumpriu o ónus da prova quanto às conclusões que retira em sede de procedimento, de onde se lê: “estamos perante a regularidade formal dos documentos, contrapondo-se à inexistência material da operação (…)”.

  8. Pelo que, a decisão ora recorrida manifesta erro de julgamento, na medida em que assenta na distorção da realidade factual, traduzindo-se o decidido numa apreciação que não corresponde à realidade ontológica, razão pela qual se encontra viciada de nulidade nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC.

  9. A contrario, deveria ter sido dado por provado que não estava cumprido o ónus da prova que competia à Autoridade Tributária e Aduaneira nos termos do art.º 74.º da LGT, por ser sido demonstrado que não estava em causa a inexistência material das operações tituladas pelas facturas, mas antes, operações reais, prestadas e facturadas pela sociedade A... Unipessoal, Ldª à Recorrente.

    L. De acordo com a norma do art.º 23.º, n.º 1 e n.º 2, al. a) do CIRC, para determinação do lucro tributável, são dedutíveis todos os gastos e perdas incorridos ou suportados pelo sujeito passivo para obter ou garantir os rendimentos sujeitos a IRC incluindo os gastos incorridos com a aquisição de serviços, matérias utilizadas, mão-de-obra, energia e outros gastos gerais.

  10. Pelo que, os custos em que a Recorrente incorreu com a prestação de serviços da sociedade A... Unipessoal, Ldª, são dedutíveis para efeitos de determinação do lucro tributável.

  11. In casu, para a empreitada adjudicada a 22/03/2004 e como resulta do artigos D) e E) do probatório, a Recorrente tinha apenas 4 ou 5 trabalhadores que executavam o trabalho de pedreiro, pelo que era naturalmente necessário que se socorresse de outros prestadores de serviços, estando preenchido o critério da indispensabilidade do custo, bem como o critério da comprovação, que resultou claramente da produção a prova testemunhal.

  12. No caso concreto, os indícios eventualmente recolhidos pela Autoridade Tributária e Aduaneira (que são manifestamente omissos no procedimento de inspecção) não se afiguram suficientes para se concluir que as facturas em causa não titulam serviços reais, como se verificou pelos factos dados como provados.

  13. Ora no caso, “não basta uma fundamentação formal, sendo necessário verificar se os autos contêm elementos, ou melhor dizendo, se a administração tributária recolheu elementos demonstrativos dos pressupostos em que fundou o seu juízo, de modo a permitir que o tribunal sindique se os mesmos se verificam ou não.”.

  14. Com efeito, se os gastos foram deduzidos pela Recorrente para o exercício de 2004, constavam da contabilidade – contabilidade esta que goza de presunção de veracidade como impõe a norma do art.º 75.º, n.º 1 da LGT - presunção esta que não foi afastada.

  15. A contabilidade da Recorrente espelhava correctamente a imagem real da situação patrimonial, financeira e das receitas da sociedade, pelo que, os custos que em referência à empreitada de Sesimbra foram suportados com a operação correspondente à prestação de serviços da sociedade A... Unipessoal, Ldª poderiam ter sido deduzidos para os efeitos a que se referem as normas dos art.º 17.º e seguintes do CIRC.

  16. Ora se os custos incorridos pela Recorrente correspondem a operações efectivamente reais e não simuladas como defendeu a Autoridade Tributária e Aduaneira, as correcções efectuadas em sede de inspecção tributária, que originaram a liquidação n.º 20088310037507, são manifestamente ilegais, T. E com esse fundamento, a sentença do Tribunal a quo, que julgou a impugnação improcedente por provada, padece de erro de julgamento, que traduz um erro de raciocínio lógico que conduziu à aplicação de uma decisão contrária à que seria imposta pelos fundamentos de facto e de Direito, porquanto o que resultou da produção de prova, deveria ter resultado necessariamente numa decisão em sentido oposto estando por isso a sentença viciada de nulidade nos termos do art.º 615.º, n.º 1, al. c) do CPC ex vi o art.º 2.º, al. e), pelo que deve ser revogada, substituindo-se por decisão que julgue a impugnação procedente por provada.

    Termos em que, requer que o presente recurso seja julgado procedente por provado, revogando-se a sentença do Tribunal a quo e à final, anulando-se a liquidação n.º 20088310037507, referente ao IRC do exercício de 2004, tudo, com as devidas consequências legais.” *** A Recorrida DRFP optou por não apresentar contra-alegações.

    *** O Digno Magistrado do Ministério Público (DMMP) teve vista nos termos do artigo 146.º do CPTA e emitiu douto parecer no sentido da improcedência do recurso.

    *** Colhidos os vistos dos Exmos. Juízes Desembargadores Adjuntos, cumpre, agora, decidir.

    *** II-FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO A sentença recorrida julgou provada a seguinte matéria de facto: “III-1- Factualidade provada: Dos documentos e elementos constantes dos autos, com interesse para a decisão da causa, atentas as soluções plausíveis de direito, julgo provada a seguinte factualidade:

  17. A Impugnante desenvolve a atividade de “Construção de Edifícios”, com CAE – 45211 (cfr. pág. 6 do Relatório de Inspeção Tributária –RIT junto com a p.i.); B) A Impugnante encontra-se enquadrada, em sede de IRC, no regime geral de tributação (cfr. pág. 6 do...

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