Acórdão nº 01369/12.0BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução07 de Setembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo I - Relatório 1 – A…………, S.A., com os sinais dos autos, impugnou no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto as liquidações adicionais de Imposto sobre o Valor Acrescentado (IVA) e dos correspondentes juros compensatórios, relativas aos anos de 2008, 2009, 2010 e 2011, no montante global de €463.351,91.

2 – Por sentença de 17 de Agosto de 2020, o TAF do Porto julgou procedente a impugnação e anulou os referidos actos de liquidação.

3 – Inconformada com aquela decisão, a Fazenda Pública recorreu para este Supremo Tribunal Administrativo, rematando as suas alegações com as seguintes conclusões: «[…] A. Vem o presente recurso interposto por considerar a F.P. que o Tribunal a quo, ao julgar procedente a impugnação judicial e anular os atos tributários de liquidação adicional de IVA e JC, incorreu em erro na aplicação do direito, por incorreta interpretação do disposto nos art. 18º e 27º do CIVA e da verba 2.27 da Lista I anexa ao CIVA.

B. Na base das liquidações impugnadas encontra-se a não aceitação, pela AT, da aplicação da taxa reduzida do IVA aos serviços de reparações e remodelações de elevadores realizados pela impugnante, enquadrados na verba 2.27 da Lista I anexa ao CIVA, em violação do disposto nos art. 18º e 27º do CIVA.

C. A sentença ora recorrida decidiu considerar, aplicando os conceitos civilísticos, que “os elevadores são parte integrante dos edifícios nos quais se integram (…) Perante tal entendimento, não parece de ser excluída a taxa reduzida relativamente a reparações e manutenções de tais elevadores, desde que, realizados ao abrigo dum contrato de empreitada, tal como a norma em causa prevê, e apenas aplicada à mão-de-obra.” D. Ora, os SIT procederam a uma análise detalhada à verba 2.24 da Lista I anexa ao CIVA, assim como à sua evolução legislativa à luz do direito comunitário, dada a introdução da Lista I ter resultado da transposição para o ordenamento nacional das previsões legais criadas ao nível da Comunidade Europeia, análise essa expressa no Capítulo III do Relatório.

E. No âmbito da ação inspetiva credenciada pela OI201105208, detetou-se que o sujeito passivo apresentava uma situação tributária irregular por estar a aplicar a taxa reduzida aos serviços por si prestados, relativos à remodelação e reparação de elevadores, e que, segundo a Administração Fiscal, não têm esse enquadramento, devendo ser-lhes aplicada a taxa normal.

F. O IVA é um imposto geral sobre o consumo, aplicado às atividades económicas que implicam a produção e a distribuição de bens e a prestação de serviços. As disposições relativas à criação do sistema comum do IVA da União Europeia (UE) são codificadas, desde 01/01/2007, pela Diretiva 2006/112/CE, de 28/11 - Diretiva IVA – que reformulou a Diretiva 77/388/CEE, de 17/05 – 6ª Diretiva, harmonização absolutamente essencial para a criação do Mercado Interno, objetivo da criação da atual União Europeia, e a introdução no CIVA da verba 2.27 da lista I anexa ao CIVA, acima referida, resulta da transposição para o ordenamento nacional das previsões legais criadas ao nível da União Europeia.

G. Relativamente à natureza dos serviços em causa neste caso, a Diretiva 1999/85/CE, do Conselho, de 22 de Outubro de 1999, que alterou a 6ª Diretiva, veio possibilitar aos Estados-Membros a aplicação de uma taxa reduzida a serviços com alta intensidade do fator trabalho, enumerados no Anexo K, por um período experimental e numa base facultativa.

H. Dado o carácter experimental desta medida, a aplicação da taxa reduzida estava estritamente limitada no tempo e seria apenas aplicável aos serviços previstos no Anexo K adicionado à Diretiva 77/388/CEE, a referida 6ª Diretiva, entre os quais se encontram “renovation and repair of private dwellings” expressão traduzida para português como “obras de reparação e renovação em residências particulares”.

I. Portugal foi um dos nove países que requereu autorização para efetuar esta alteração numa base experimental. Ao abrigo do artigo 28º da 6ª Diretiva, o Conselho, por decisão de 28/02/2000 (conforme Ofício-Circulado 30025, de 07/08/2000), deu autorização a Portugal para introduzir no ordenamento jurídico interno um preceito prevendo a aplicação da taxa reduzida aos serviços acima referidos, incluídos no anexo K daquela Diretiva.

J. Nesta medida, a Lei nº 3-B/2000, de 4 de Abril (Orçamento de Estado para 2000), veio aditar à Lista I anexa ao Código do Imposto sobre o Valor Acrescentado, a verba 2.24 (atual 2.27) com a seguinte redação: “2.24 - As empreitadas de beneficiação, remodelação, renovação, restauro, reparação ouconservação de imóveis ou partes autónomas destes afetos à habitação, com exceção dos trabalhos de limpeza, de manutenção dos espaços verdes e das empreitadas em bens imóveis que abranjam a totalidade ou uma parte dos elementos constitutivos de piscinas, saunas, minigolfe, campos de ténis ou golfe e instalações similares. A taxa reduzida não abrange os materiais incorporados, salvo se o respetivo valor não exceder 20% do valor global da prestação de serviços”.

K. Assim, a taxa reduzida passou a abranger algumas empreitadas sobre bens imóveis afetos a habitação, excluindo, no entanto, os materiais que constituíssem uma parte significativa do serviço prestado.

L. Esta verba deveria vigorar, à partida, entre 01/01/2000 e 31/12/2002, tendo sido prorrogada a sua aplicação até final de Dezembro de 2003, pela Lei n.º 32-B/2002, de 30 de Dezembro (OE 2003), seguindo indicações de uma diretiva comunitária (Council Directive 2002/92/EC) a estender o período de aplicação da taxa reduzida aos serviços indicados.

M. A Lei que aprovou o Orçamento de Estado para o ano de 2005 (Lei n.º 55-B/2004, de 30 de Dezembro), e no seguimento de novas instruções comunitárias, voltou a introduzir esta verba naquela lista, resultando na prática que, desde a sua criação, só não existiu aplicação da mesma durante o ano de 2004.

N. No sentido de esclarecer o conteúdo daquela verba, foi divulgado, por altura da sua introdução no CIVA, o Ofício-Circulado n.º 30025, de 07/08/2000, e, posteriormente, o Ofício-Circulado n.º 30036 (Doravante OFCD), de 04/04/2001, ambos da Direção de Serviços do IVA e que vinculam a Administração Fiscal, conforme indica a atual redação do artigo 68º-A da LGT (o ofício-circulado n.º 30135, de 2012-09-26, veio reiterar o entendimento naqueles vertido).

O. O OFCD 30025 esclareceu, quanto ao âmbito de aplicação, que os serviços considerados são as empreitadas de beneficiação, remodelação, renovação, restauro, reparação ou conservação realizadas em imóveis para habitação. Os imóveis ou partes de imóvel considerados serão os que, não estando licenciados para outros fins, estejam afetos à habitação, a ser utilizados como tal no início das obras e que, após a execução das mesmas, continuem a ser efetivamente utilizados como residência particular.

P. Quanto aos beneficiários da taxa reduzida é o próprio OFCD 30025 que esclarece que podem ser beneficiários da taxa reduzida quer o dono da obra seja o proprietário ou o locatário. Nos casos em que o dono da obra é um condomínio, este é também beneficiário da taxa reduzida, desde que a obra seja realizada em imóvel afeto à habitação e o condomínio esteja abrangido pela isenção do nº 23 do art. 9.º do CIVA.

Q. Refere ainda o OFCD 30025 que, face à redação da verba 2.24 (atual verba 2.27), estão excluídos da aplicação da taxa reduzida as obras de construção e similares (acréscimos, sobre-elevação e reconstrução de bens imóveis), do mesmo modo que estão claramente afastadas do preceito as empreitadas sobre bens imóveis utilizados para o exercício de uma atividade profissional, comercial, industrial ou administrativa.

R. Considerando que a taxa reduzida não abrange a transmissão de bens, conforme esclarece o OFCD referido, não têm enquadramento nesta verba, nomeadamente, os fornecimentos de elevadores, meios de aquecimento ou refrigeração, sanitários, pavimentos, equipamentos domésticos e mobiliários, tais como fornecimento de cozinhas e lareiras.

S. Quanto aos serviços prestados com incorporação de materiais, resulta da redação da referida verba, que "a taxa reduzida não abrange os materiais que constituam uma parte significativa do valor do serviço prestado", considerando-se que os materiais revestem uma parte significativa do valor do serviço prestado quando representam mais de 20% do custo da obra realizada.

T. O OFCD 30036, de 4/04/2001 da DSIVA, completou o esclarecimento do âmbito de aplicação desta previsão legal, considerando que a expressão “imóveis afetos à habitação” constante daquela verba deve ser interpretada restritivamente, de modo a assegurar a sua conformidade com o estabelecido no direito comunitário, concretamente no ponto 2 do anexo K da 6ª Diretiva, pelo que não cabem neste conceito equipamentos como elevadores, escadas rolantes, antenas e outros, entendendo, deste modo, que “a ratio legis deste preceito não contempla a sua aplicação a serviços de reparação e manutenção de equipamentos que sejam partes integrantes de imóveis”.

U. Conclui-se, assim, que os serviços de reparação e manutenção de elevadores e escadas rolantes não têm enquadramento na verba 2.24 (atual verba 2.27) da Lista I Anexa ao CIVA, devendo ser sujeitos a liquidação de IVA à taxa normal, pelo que fica afastado o conceito, para efeitos fiscais, indicado na alínea b) do nº 2 do artigo 1421.º do Código Civil que, relativamente às partes comuns do prédio, inclui os ascensores.

V. Neste caso, estabeleceu-se o conceito de habitação para efeitos fiscais, completando de forma esclarecedora a tipificação prevista no CIVA e que resulta, conforme foi já referido, da transposição de uma diretiva comunitária para o ordenamento nacional respeitando a imposição prevista no Tratado da UE (Ex-Tratado da CE) relativamente aos efeitos pretendidos pelas diretivas.

W. Sobre a aplicação das taxas reduzidas, deverão ter-se em conta as...

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