Acórdão nº 4207/19.9T8PRT.P1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 07 de Setembro de 2022

Magistrado ResponsávelPEDRO BRANQUINHO DIAS
Data da Resolução07 de Setembro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Proc. n.º 4207/19.9T8PRT.P1.S1, da 4.ª S.

(Reclamação para a Conferência) Acordam, em Conferência, na Secção Social, do Supremo Tribunal de Justiça I. Relatório 1.

A Autora AA vem, nos termos dos arts. 641.º, 643.º e 652.º n.º 3, todos do C.P.C., reclamar para a Conferência do despacho do Juiz Relator, de 13/05/2022, que lhe admitiu o recurso de revista, relativamente à nulidade por falta de fundamentação quantos aos factos 49, 54 e 62 dos factos provados e 57 da Contestação e ao uso incorreto dos poderes previstos no art. 662.º, do C.P.C., na apreciação dos factos 49, 54 e 62 dos factos provados e 57 da Contestação.

Já em relação à nulidade do procedimento disciplinar e à ilicitude do despedimento por justa causa, foi considerado que existia dupla conforme, pelo que não poderiam constituir objeto do recurso.

Mais foi declarado que, oportunamente, e se fosse caso disso, os autos iriam à Formação, para os efeitos previstos no art. 672.º n.º 3, do C.P.C.

Apresentou as seguintes Conclusões, que passamos a transcrever: 1. Não se conforma nem concorda a Recorrente com a decisão singular proferida nos presentes autos, e, por isso, considera-se prejudicada com mesma.

  1. Razão pela qual apresenta a presente Reclamação para a conferência, nos termos do disposto nos artigos 641.º, 643.º e 652.º, n.º 3 do CPC.

  2. Com efeito, foi pela mesma decidido admitir o recurso de revista relativamente à nulidade por falta de fundamentação, quanto aos factos 49, 54 e 62 dos factos provados e 57 da contestação e ao uso incorreto dos poderes previstos no art.º 662.º do C.P.C. na apreciação dos factos 49, 54 e 62 dos factos provados e 57 da contestação, e não tomar conhecimento do recurso de revista pela mesma interposto em relação à nulidade do procedimento disciplinar e à ilicitude do despedimento por justa causa, por considerar existir dupla conforme.

  3. Contrariamente ao decidido, considera a Recorrente que a admissão do recurso de revista relativamente ao uso incorreto dos poderes previstos no art.º 662.º do C.P.C., não se pode restringir ao uso realizado na apreciação dos factos 49, 54 e 62 dos factos provados e 57 da contestação.

  4. É que a Recorrente invocou e submeteu à apreciação deste Supremo Tribunal o incorreto uso dos poderes previstos no art.º 662.º do C.P.C. feito pelo Tribunal da Relação ... também na apreciação da impugnação dos factos julgados provados sob os n.ºs 44, 45, 46 e 47 e na apreciação da impugnação dos factos provados mas que pura e simplesmente não foram considerados, em concreto, o facto que entendeu devia constar da matéria de facto julgada provada de que “Os registos de username nas operações no sistema informático e no dispositivo de multifunções da Ré podem não coincidir com o colaborador que na realidade levou a cabo tal operação.” 6. A decisão proferida não apresenta qualquer fundamento para a limitação feita de se admitir o recurso apenas em relação a parte da matéria em que invocou ter ocorrido um incorreto uso dos poderes do Tribunal da Relação.

  5. Recurso que, naturalmente, deve igualmente ser admitido porque em causa está também e precisamente o uso incorreto dos poderes previstos no art.º 662.º do C.P.C., e portanto, matéria que deve ser apreciada por este Supremo Tribunal de Justiça.

  6. Devendo, consequentemente, o despacho proferido ser revogado e determinar-se que o recurso de revista seja admitido em relação ao uso incorreto pelo Tribunal da Relação dos poderes previstos no art.º 662.º do C.P.C. na apreciação de todos os concretos factos identificados pela Recorrente - factos julgados provados sob os n.ºs 44, 45, 46 e 47 e na apreciação da impugnação dos factos provados mas que pura e simplesmente não foram considerados - e não apenas dos factos 49, 54 e 62 dos factos provados e 57 da contestação.

  7. Acresce que, sendo admitido recurso de revista relativamente à apreciação de todos os referidos factos, uns julgados provados, outros julgados não provados e outros pura e simplesmente omitidos da decisão de facto, necessariamente tem que se admitir o recuso de revista relativamente à decisão sobre a ilicitude do despedimento por justa causa.

  8. A impugnação da decisão sobre a matéria de facto, por si só, não teria relevância nem se justificaria se se encontrasse desacompanhada da impugnação da decisão de mérito, pois que assume um cariz instrumental desta última.

  9. Em causa está um vício na formação da decisão do Tribunal da Relação, que constitui um fundamento de recurso de revista, o qual deve ser admitido na sua plenitude e não restringido à apreciação da matéria de facto, pois esta é uma parte da formação da decisão de mérito, e, portanto, não pode ser da mesma separada.

  10. Inexiste qualquer dupla conforme porque se a decisão proferida pelo Tribunal da Relação assentou numa incorreta formação e, portanto, forneceu um novo fundamento para a interposição do recurso de revista que não pode deixar de abranger a decisão quanto à ilicitude do despedimento.

  11. De resto, ambas as decisões assentaram em matéria de facto diferente e a correspondente fundamentação jurídica também se apresentou, consequentemente, diferente e diversa em ambas as decisões.

  12. A decisão proferida pela primeira instância considerou não se verificar a ilicitude do despedimento assente nos factos julgados provados sob os números 49, 56, 39, 41, 43, 50 e 55, 44, 45, 46 e 47, 53 e 62, já a decisão proferida pelo Tribunal da Relação teve o mesmo sentido, porém assente nos factos julgados provados sob os números, 49 e 54 (cuja redação havia decidido alterar) e sob os números 31, 32, 41, 42, 43, 55,39, 53, 62.

  13. Ambas as decisões assentaram em matéria de facto diferente e a correspondente fundamentação jurídica também se apresentou, consequentemente, diferente e diversa em ambas as decisões.

  14. O que é confirmado no segmento decisório do Acórdão proferido pelo Tribunal da Relação, quando se afirma “Em face do exposto, acorda-se em: Julgar o recurso interposto da ação, na parte nele impugnada [referente à (i)licitude do despedimento e pedidos consequentes – reintegração, retribuições intercalares e indemnização por danos não patrimoniais] improcedente, confirmando-se a sentença recorrida, com fundamentação apenas parcialmente coincidente com a da sentença recorrida.” 17. Face ao que deve o recurso de revista interposto pela Recorrente ser admitido em relação a toda a matéria pela mesma invocada relativamente à qual entende ter ocorrido um não uso ou o uso deficiente dos poderes da Relação sobre a matéria de facto no julgamento da apelação.

  15. Como deve ser admitido em relação à decisão proferida sobre a ilicitude do despedimento.

  16. O Réu Banco Santander Totta, S.A.

    respondeu ao requerimento da Autora, defendendo que o mesmo não tinha qualquer fundamento, devendo ser confirmado o mencionado despacho do Senhor Juiz Relator.

  17. Submetidos os autos à Conferência, cumpre, agora, apreciar e decidir.

    1. Fundamentação 1.

    Resulta dos autos que, por acórdão do Tribunal da Relação ..., de 15/12/2021, foi julgado, por unanimidade, o recurso interposto da ação, na parte nele impugnada, referente à ilicitude do despedimento e pedidos subsequentes – reintegração, retribuições intercalares e indemnização por danos não patrimoniais – improcedente, confirmando-se a sentença recorrida, com fundamentação apenas parcialmente coincidente.

    Mais foi julgado o incidente de fixação de valor da ação procedente e, em consequência, revogada a decisão recorrida, nesta parte, fixando-se à ação o valor de € 88 506,17.

    Inconformada, veio a Autora interpor recurso de revista, com as seguintes Conclusões (Transcrição): 1- Ascende à douta cognição deste Superior Tribunal “ad quem”, o presente recurso de revista, sobre o Douto Acórdão de fls...., que julgou o recurso de apelação pela mesma interposto na parte nele impugnada [referente à (i)licitude do despedimento e pedidos consequentes – reintegração, retribuições intercalares e indemnização por danos não patrimoniais] improcedente, confirmando-se a sentença recorrida, com fundamentação apenas parcialmente coincidente com a da sentença recorrida, e que julgou o incidente de fixação do valor da acção procedente, em consequência do que revogou a decisão recorrida, nessa parte, e fixou à acção o valor de € 88.506,17.

    2 – Acórdão com o qual não concorda nem sem conforma, por considerar ser o referido Acórdão nulo, e considerar, ademais, que o mesmo viola e faz uma errada aplicação de normas de direito substantivo e processual aplicáveis.

    3 - Sem prejuízo da aplicação do disposto no n.º1 do art.º 671.º do NCPC, o certo é que em causa está não só uma questão cuja apreciação, pela sua relevância jurídica, é claramente necessária para uma melhor aplicação do direito, como se trata de uma questão em que se apreciam interesses de particular relevância social.

    4 - Na realidade, é indiscutível a relevância jurídica e a relevância social da questão em apreço:- invalidade do procedimento disciplinar por não ponderação dos pareceres da comissão de trabalhadores e apreciação da justa causa de despedimento.

    5 - Com efeito, a apreciação desta questão pressupõe uma tomada de posição sobre questão que permanece bastante controvertida, ocorrendo interpretações que em rigor afastam por completo a letra da lei. É imperativo definir-se qual o valor do parecer das comissões e trabalhadores no âmbito de um procedimento disciplinar com vista ao despedimento, e por questões de segurança e certeza jurídicas que explicite se a decisão de despedimento deve ou não fazer a ponderação de tais pareceres da comissão de trabalhadores sob pena de invalidade do procedimento, ou se pelo contrário, se está perante disposição legal sem qualquer aplicação prática.

    6- É pois absolutamente necessária para uma melhor aplicação do direito, pelo que sempre o presente recurso, no que concerne à sua apreciação, deve ser admitido nos termos do disposto no art.º 672.º do C.P.C..

    7 – O Acórdão proferido deve ser julgado nulo na parte referente à decisão sobre a...

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