Acórdão nº 01721/21.0BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 15 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelRog
Data da Resolução15 de Julho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

EM NOME DO POVO Acordam em conferência os juízes da Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: A Caixa Geral de Aposentações veio interpor RECURSO JURISDICIONAL da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto, de 09.05.2022, pela qual foi julgada (totalmente) procedente a providência cautelar intentada por AA para suspensão da eficácia da decisão da ora Recorrida, notificada em 20.05.2021, na parte que determinou a reposição, mediante o mecanismo de compensação, dos valores recebidos pelo aqui Recorrido a título de pensão de aposentação e para a regulação provisória do pagamento dessas importâncias, assim como do acto que procedeu ao recálculo da pensão, diminuindo-o.

Invocou para tanto, em síntese, que, ao contrário do decidido, não se verifica o pressuposto fumus boni iuris e deve prevalecer o interesse público na devolução das importâncias pagas a título de pensão de aposentação, de elevado montante.

O Recorrido contra-alegou, defendendo a manutenção do decidido.

O Ministério Público neste Tribunal não emitiu parecer.

*Cumpre decidir já que nada a tal obsta.

* I - São estas as conclusões das alegações que definem o objecto do presente recurso jurisdicional: 1.ª A CGA vem recorrer da decisão proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 2022-05-09, na parte em que julgou verificada a aparência de “bom direito” no que concerne à probabilidade de violação, pelo ato suspendendo, do direito à audiência dos interessados (cfr. pág. 19 da Sentença recorrida), à probabilidade de inobservância dos limites de penhorabilidade, quer na perspetiva da violação do princípio da dignidade humana, contido no princípio do Estado de Direito, e que resulta das disposições conjugadas do artigo 1º e dos nºs 1 e 3 do artigo 63º da Constituição (cfr. pág. 20 a 23 da Sentença), quer na perspetiva da possível violação do disposto no n.º 3 do artigo 174.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho (cfr. pág. 27 e 28 da Sentença).

  1. A CGA considera que não existe qualquer preterição do direito de audiência prévia pois a restituição dos montantes indevidamente recebidos pelo Requerente não resulta (nem tem de resultar) de qualquer ato administrativo, antes resulta diretamente da lei, a saber do disposto no artigo 36.º, nº 1, do Decreto-Lei nº 155/92, de 28 de Julho.

  2. Por outro lado, o Requerente já se havia pronunciado no procedimento sobre as questões que importam à decisão (cfr. pontos 9, 11 e 15 dos Factos Assentes), ou seja, já havia exposto as razões pelas quais, no seu entender, deveria a CGA proceder ao pagamento da pensão. Por assim ser, nos termos do artigo 124º do CPA, estava a CGA dispensada de audiência do requerente.

  3. Relativamente à probabilidade de terem sido inobservados os limites de penhorabilidade, quer na perspetiva da violação do princípio da dignidade humana, contido no princípio do Estado de Direito, e art.º 1º e dos nºs 1 e 3 do art.º 63.º da Constituição (cfr. pág. 20 a 23 da Sentença), quer na perspetiva da possível violação do disposto no n.º 3 do artigo 174.º da Lei Geral do Trabalho em Funções Públicas, aprovada pela Lei n.º 35/2014, de 20 de junho e artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 155/92, de 18 de julho (cfr. pág. 27 e 28 da Sentença), a CGA considera que o Tribunal a quo não analisou corretamente os normativos que fundamentam a sua decisão.

  4. Tal como melhor explicitado supra em Alegações, analisado quer o n.º 4 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 155/92, de 28 de julho, quer o n.º 3 do artigo 174.º da Lei n.º 35/2014, o qual tem de ser lido em articulação com os restantes números do artigo 174.º, por para eles remeter, constata-se que, um e outro, não se aplicam à CGA 6.ª O nº 4 do referido artigo 36.º tem de ser lido em articulação com n.º 3 do artigo 174.º da Lei n.º 35/3014, o qual tem de ser lido em articulação com os restantes números do artigo 174.º, por para eles remeter.

  5. Tais preceitos normativos – o n.º 4 do artigo 36.º do Decreto-Lei n.º 155/92 e o artigo 174.º da Lei nº 35/2014 - não se aplicam à CGA na medida em que esta não é um empregador público, é, isso sim, uma instituição de previdência social.

  6. Ainda que assim se não entenda, o nº 3 do artigo 174.º da Lei n.º 35/2014 expressamente ressalva, da regra da garantia de 1/6 da remuneração, os descontos a favor do Estado ou da segurança social previstos na alínea a) do seu n.º 2.

  7. Não há, assim, na perspetiva da CGA qualquer inobservância dos limites de penhorabilidade, contrariamente ao que concluiu a decisão recorrida.

  8. Na Resposta à pretensão cautelar, a CGA expôs que estamos perante uma situação de recebimento indevido de prestações sociais e que os Tribunais superiores têm vindo a decidir, consistentemente, que os pilotos da TAP, reformados da Força Aérea, estão, de facto, abrangidos pelo regime de incompatibilidades previsto nos art.ºs 78.º e 79.º do Estatuto da Aposentação, não podendo receber em simultâneo pensões de reforma e remunerações da TAP. (cfr. Acórdãos proferidos pelo TCA Sul nos processos n.ºs 02111/14.6BESNT e 0243/15.2BELSB, de 2020-0521 e de 2020-07-02 e, também, o entendimento recentemente explanado no Acórdão do TCA Sul, proferido no proc.º n.º 405/21.3BESNT em 2022-05-19respetivamente - todos disponíveis na base de dados do IGFEJ em www.dgsi.pt).

  9. Certo é que o Requerente recebeu em simultâneo, entre 2011-01-01 e 2014-05-31, as pensões de reforma e remunerações da TAP, pelo que pagar-se ao Requerente uma pensão mensal de € 3.219,25 (de acordo com o ponto 26 dos Factos Assentes) quando este tem um avultado montante a repor aos cofres públicos parece constituir um facto que, só por si, é suscetível de lesar o interesse público.

* II –Matéria de facto.

A decisão recorrida deu como indiciariamente provados os seguintes factos, sem reparos nesta parte: 1) O Requerente ingressou, nos termos da Carta Patente de 05.01.1998, no Quadro de Oficiais de Pilotos Aviadores, por via da Portaria de 25.07.1994, Ordem à Força Aérea n.º 35 (2.ª série) de 29.08.1994 – cfr. fls. 69 a 73 do SITAF.

2) Entre 28.05.2001 e 31.03.2021, o Requerente desempenhou funções de piloto de aviação, na TAP, S.A., ao abrigo de um contrato individual de trabalho por tempo indeterminado – cfr. fls. 75 a 78 do SITAF.

3) Por força da Portaria de 21.09.2005, publicada na Ordem à Força Aérea n.º 12, transitou para a situação de reforma, sendo pensionista da CGA– cfr. fls. 69 a 74 do SITAF.

4) Pelo Ofício n.º ...12 LS/CF 1222561-00, datado de 30.05.2014, a Entidade Requerida informou o Requerente da suspensão do pagamento da sua pensão de aposentação com fundamento na cumulação ilegal de funções, nos termos previstos nos artigos 78.º e 79.º do Estatuto da Aposentação – cfr. fls. 79 do SITAF e fls. 64 do processo administrativo, junto a fls. 586 e seguintes do SITAF.

5) Em 2014, o Requerente apresentou, no Tribunal...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT