Acórdão nº 00230/13.5BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 01 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelAntero Pires Salvador
Data da Resolução01 de Julho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, os Juízes Desembargadores do Tribunal Central Administrativo Norte – Secção do Contencioso Administrativo: I RELATÓRIO 1 .

A“Freguesia A...

, com sede no Largo ..., freguesia A..., ..., inconformada, veio interpor recurso jurisdicional da decisão do TAF de Braga, datada de 15 de Julho de 2021, que julgou improcedente a acção administrativa comum, instaurada pela A./Recorrida, contra a Freguesia B...

, com sede na Rua ..., Freguesia B..., ..., na qual peticionava, em provimento da acção, que: - seja declarado que a delimitação das circunscrições entre a Freguesia A... e a Freguesia B... se desenvolve no sentido Nascente/Poente, partindo do Templo de ..., numa linha recta, em direcção ao local onde se situava a porta do Campo de ..., indicada no ponto 27 da legenda do documento ..., inflectindo, antes de chegar a essa porta, no local onde se cruza com a linha recta traçada da foz do rio ..., correspondente ao rio ..., em direcção ao respectivo afloramento, e acompanhando esta última linha, até ao rio..., correspondente à linha imaginária definida a vermelho, na planta junta como documento ...; - sejam condenados os órgãos representativos da Freguesia B... a deixar de exercer quaisquer poderes relativamente ao espaço situado e às pessoas residentes para além daquela delimitação”.

* 2 .

No final das suas alegações, a recorrente freguesia A...

formulou as seguintes conclusões (renumeradas, na medida em que, por lapso, se omitiu o n.º 23 e se suplicou o n.º 26): "1- Vem o presente recurso interposto, com impugnação da decisão sobre a matéria de facto, para o Tribunal da Centra Administrativo Norte, a processar como de Apelação, a subir imediatamente e nos próprios autos, com efeito devolutivo, sendo o presente recurso alargado à impugnação da decisão da matéria de facto (artigos 638º, 639º e 640º NCPC).

2- Em primeiro lugar, como é consabido, é imperativo legal consagrado no artigo 607.º, n.º 3 e 4 do CPC, a fundamentação clara e indubitável da decisão, sob pena de nulidade da mesma nos termos do artigo 615.º n.º 1, al. b) do CPC.

3- Sucede que a sentença da qual ora se recorre deveria ter indicado as ilações tiradas dos factos instrumentais e especificado os demais fundamentos que foram decisivos para a sua convicção, compatibilizando toda a matéria de facto adquirida e extraindo dos factos apurados as presunções impostas pela lei ou por regras de experiência.

4- Notoriamente assim não sucedeu, sendo, portanto, a sentença da qual se recorre nula por falta de fundamentação.

5- Na verdade, a sentença do tribunal “a quo” limitou-se ao mero repositório da contestação, não trançado o iter lógico e racional que levaram à sua conclusão, sendo a mesma obscura e não permitindo uma imediata compreensão e apreensão dos factos ainda que essa exposição fosse sumária mas contextualizada.

6- Por outro lado, a Apelante entende, salvo melhor opinião, que, atenta a prova documental e testemunhal, a decisão deveria ser precisamente a contrária, ou seja deverá antes a douta sentença ser revogada e julgar-se totalmente procedente a acção.

7- Em rigor, o ónus da prova nos termos do artigo 342.º do Código Civil competia à Autora, o que, com o devido respeito por melhor opinião, foi cumprido sobejamente.

8- Ora, da análise crítica e histórica da prova documental carreada para os autos, designadamente dos documentos ... e ... juntos com a Petição Inicial (Foral de D. Afonso III e respectiva leitura paleográfica), conjugada com a prova testemunhal, mormente aquelas que pela sua idade e experiência nos trouxeram relatos na primeira pessoa, deveria a ação ter sido julgada totalmente procedente.

9- Assim, não deveriam os factos dos “pontos 3 a 6” da matéria provada, ter dado como assente que: “Os limites territoriais reais (ou a linha divisória territorial) entre a Freguesia A... (Autora) e a Freguesia B... (Ré) são e foram, desde que há memória das pessoas vivas, os que foram acolhidos na Carta Administrativa de Portugal (CAOP)”.

10- Outrossim, deveria ter sido declarado que o limite da Freguesia A... com a Freguesia B... é conforme com a linha traçada a vermelho no documento ... da Petição Inicial, e que, consequentemente, se desenvolve no sentido Nascente/Poente, partindo do ... de ..., numa linha recta em direcção ao local onde se encontrava a porta do Campo de ..., indicada no ponto 27 do documento ..., inflectindo antes de chegar a essa porta no local onde se cruza com a linha recta traçada da foz do rio ..., correspondente ao rio ..., em direcção ao respectivo afloramento e, acompanhando esta última linha até ao rio....

11- Ora, tal conclusão resulta da apreciação crítica e coerente dos depoimentos conjugados de AA (gravação 3:46:50 às 4:33:34 do dia 01/03/2018) e BB (gravação 02:25:45 às 03:46:15 do dia 01/03/2018), que de uma forma clara, objectiva e imparcial esclarecem os fundamentos lógicos das suas exposições, contextualizadas na prova documental.

12- E, se assim não bastasse, temos o depoimento das testemunhas CC (gravação 03:54 e 52:00 do dia 01/03/2018), DD (gravação 55:00 a 01:24:00 do dia 01/03/2018), EE (gravação 1:25:00 a 1:43:00 do dia 01/03/2018), FF (gravação 1:43:00 às 1:58:58 do dia 01/03/2018) e GG (02:00:00 às 2:23:00 do dia 01/03/2018).

13- Daí que, nos termos do artigo 662º, n.º 1 do NCPC, entende a Autora que deve ser dada por provada a matéria que se encontra alegada e foi objecto de prova documental e testemunhal acima transcrita, designadamente que o limite da Freguesia A... com a Freguesia B... é conforme com a linha traçada a vermelho no documento ... da Petição Inicial, e que, consequentemente, se desenvolve no sentido Nascente/Poente, partindo do Templo de ..., numa linha recta em direcção ao local onde se encontrava a porta do Campo de ..., indicada no ponto 27 do documento ..., inflectindo antes de chegar a essa porta no local onde se cruza com a linha recta traçada da foz do rio ..., correspondente ao rio ..., em direcção ao respectivo afloramento e, acompanhando esta última linha até ao rio....

14- Daí que, entende a Autora que deve a acção ser antes julgada procedente, atento os concretos meios de prova alegados e citados.

15- Sem prescindir, é nosso entendimento que faz o tribunal “a quo”, uma errada aplicação da lei, designadamente do artigo 1354.º, n.º 2 do Código Civil, sendo, aliás, o nosso entendimento contrário a alguma jurisprudência já produzida.

16- O entendimento da não aplicação do artigo 1354.º do Código Civil ao acaso dos autos resulta numa decisão contrária ao que é o princípio assumido pela jurisprudência dos tribunais administrativos.

17- Se por um lado se tem entendido, e bem, que é da competência dos tribunais administrativos a fixação da delimitação administrativa das freguesias e municípios, é contraditório dizer que o tribunal não decide mantendo a delimitação de uma CAOP que é criada por uma figura administrativa e indicações dadas por um município e que, no caso, nunca mereceram concordância.

18- Como supra alegado, a decisão do tribunal “a quo” representa uma demissão deste da sua função decisora quanto à delimitação, a qual tem que ser devidamente fundamentada e alicerçada em factos históricos, documentos e testemunhos.

19- Caso contrário, tal demissão de função decisora resulta em rendição à delimitação feita pela autoridade administrativa e município.

20- Ora, a não aplicação ao caso dos autos da citada norma do Código Civil conduz a uma justiça “ad hoc” e cerceada de fundamentação factual e sem que para tal encontre sequer suporte na legislação em vigor.

21- Como se afirma supra, mal se compreenderia que a regra da demarcação substancial do direito público fosse distinta do direito privado e mais ainda que aquela não tivesse acolhimento normativo.

22- Aliás, mais flagrante o seria no caso dos autos, uma vez que a delimitação/demarcação das fronteiras entre Autora e Ré não emana de nenhum diploma da Assembleia da República.

23- Assim, a concluir-se que da prova carreada para os Autos pela Ré, designadamente dos documentos n.º ... a ... da Contestação, não existem elementos que confirmem que os limites entre as duas freguesias são os constantes da CAOP, outro critério não pode o Tribunal usar na sua decisão que o artigo 1354.º do Código Civil.

24- É sabido que a CAOP ora em discussão nos autos é da autoria da Direcção Geral do Território sendo que esta foi criada pela Lei orgânica, aprovada a coberto do Decreto-Lei n.º 7/2012, de 17 de janeiro.

25 - Pelo que sendo a lei do conhecimento oficioso e considerando que a CAOP junta pela Ré é desprovida de qualquer suporte científico que firme a razões que levaram ao traçado elaborado, não pode o tribunal “a quo” pura e simplesmente concluir que esse documento é exacto, rigoroso e verdadeiro, e daí dar como provado que é esse o limite que deve vigorar.

26- Por outro lado, não tendo havido alteração dos limites legais do território da Autora, não pode ser outra pessoa coletiva territorial pública (outra Freguesia) a ter jurisdição sobre aquela área geográfica.

27- Pelo que faz o tribunal “a quo” não só uma errada interpretação da prova, impondo-se assim a apreciação da prova gravada, como faz uma errada aplicção do direito.

28- Deste modo foram violadas as disposições legais citadas devendo a apelação ser julgada procedente e no sentido das conclusões".

* 3 .

A Ré/Recorrida Freguesia B...

apresentou contra alegações.

que concluiu nos seguintes termos: "I.

Não se verifica qualquer nulidade da douta sentença, contendo a mesma uma fundamentação clara e indubitável, a qual não tem de ser prolixa nem tem de conter a apreciação da prova produzida ponto por ponto em relação a cada uma das testemunhas, nem muito menos ilações tiradas dos factos instrumentais se não os houver, sendo que a recorrente não indica, afinal, a que facto ou factos instrumentais se refere e sendo que, de resto, para além da motivação constante da douta sentença, a Mª. Juíza a quo acrescentou ainda...

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