Acórdão nº 0629/20.0BELLE de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 14 de Julho de 2022
Magistrado Responsável | FONSECA DA PAZ |
Data da Resolução | 14 de Julho de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
ACORDAM NA SECÇÃO DE CONTENCIOSO ADMINISTRATIVO DO SUPREMO TRIBUNAL ADMINISTRATIVO: 1.
A……………….., LDA, inconformada com o acórdão do TCA-SUL, que negou provimento ao recurso que havia interposto da sentença do TAF de Loulé que julgara improcedente a acção administrativa de contencioso pré-contratual que intentara contra o MUNICÍPIO DE ALBUFEIRA e em que eram contra-interessadas a B………………, LDA. (B…….) e a C…………. UNIPESSOAL, LDA. (C……), dele recorreu, para este STA, formulando, na respectiva alegação, as seguintes conclusões: “A.
Andou mal o douto Acórdão recorrido, a fls. 42 e 43, após transcrever as normas dos artigos 53.º, 54.º e 56.º do Código dos Contratos Públicos (CCP), ao concluir que a proposta apresentada em exclusivo pela Contrainteressada B…… deve ter-se como apresentada em agrupamento, com a Contrainteressada C……… B.
Violando de forma grave a lei substantiva, face ao teor da respetiva proposta adjudicada, dada como assente em E. e F. do probatório e dos demais documentos que a acompanham, designadamente o DEUCP assente em G.
C.
A entidade adjudicante, por decisão de 04/11/2020, inicialmente adjudicou a proposta como sendo apenas da contrainteressada B………… (facto assente em V., a fls. 27) não obstante os esclarecimentos prestados por esta em sentido divergente e, só na sequência de impugnação administrativa da Autora e Recorrente, por decisão de 03/12/2020 (factos assentes em DD. e EE., a fls. 31) passou a considerar parta efeitos da adjudicação anterior, o alegado consórcio constituído pelas Contrainteressadas.
D.
O Acórdão recorrido faz uma incorreta interpretação do disposto nos artigos 53.º e 56.º, n.º 1 do CCP, trazendo para a contratação pública a total incerteza jurídica – afirmando que a proposta adjudicada não prima pela perfeição, mas que as falhas não são motivo de exclusão.
E.
E mais: Não explica com que lógica considera na proposta formal o âmbito subjetivo (concorrentes) que consta de um documento que acompanha a proposta e denominado Acordo Promessa de Constituição, quando, como resulta da proposta da Contrainteressada B………….. assente em F, a mesma encontra-se datada de 5 de agosto de 2020 e o acordo-promessa de constituição de consórcio se mostra datado de 10 de agosto de 2020 (facto assente em K).
F.
A proposta adjudicada pelo ato impugnado, correspondente a uma declaração negocial formal, apenas é apresentada expressa e claramente pela concorrente B……… (factos assentes em E. e F.), tal como também é patente que o único DEUCP apresentado, em substituição da declaração anexo I- e exigido pelo artigo 8.º do Programa do Concurso, para efeitos de aceitação do caderno de encargos, é apenas dessa mesma concorrente B………… (facto assente em G. e documento n.º 3 da petição).
G.
Não podendo a autoria da proposta, à luz do disposto nos artigos 53.º e 56.º, n.º 1 do CCP, alargar-se a qualquer outro operador económico que não tenha apresentado a proposta, nem o seu DEUCP (artigo 57.º, n.º 1 alínea a) e n.º 6 do CCP), mas cujo nome conste de um qualquer outro documento que acompanhe a proposta, designadamente um acordo promessa de consórcio ou agrupamento.
H.
Seria a total subversão, aceite pelo douto Acórdão recorrido, das regras da contratação pública acima expostas e dos princípios norteadores plasmados no artigo 1.º-A, n.º 1 do CCP, em particular dos princípios da legalidade, imparcialidade, tutela da confiança, transparência, igualdade de tratamento e não discriminação.
I.
A aceitação, pelo ato impugnado, confirmada no Acórdão recorrido, de uma proposta putativa formulada em agrupamento, para além de não ter no conteúdo da mesma o mínimo de correspondência expressa, contrariando-a frontalmente, acarreta para o próprio Réu problemas de execução de contrato – designadamente não podendo vir a exigir mais tarde da Contrainteressada C………. qualquer obrigação, designadamente as previstas nas cláusulas 5.ª, 6.ª e 7.ª, do Caderno de Encargos, porquanto perante a entidade adjudicante esta não apresentou qualquer proposta e a nada se vinculou! J.
Ao decidir em sentido contrário, admitindo que um documento, que nem sequer é o DEUCP, mas sim um documento complementar à proposta, altere os seus termos e o seu âmbito subjetivo de concorrente(s), admitindo ainda os esclarecimentos prestados e a alteração neles efetuada à própria proposta, o douto Tribunal recorrido violou o disposto nos artigos 53.º, 56.º e 57.º do CCP, conforme alegado, impondo-se a anulação dessa decisão e o provimento do recurso, anulando-se o ato de admissão de tal proposta e de adjudicação impugnado, de 04/11/2020 e de 03/12/2020, mais se devendo consequentemente reconhecer o direito da Autora à adjudicação do objeto do procedimento e à celebração do contrato.
K.
O douto Tribunal recorrido concluiu, igualmente em erro de direito e clamorosa violação de lei, que a Contrainteressada podia validamente – como provado em P., apresentar esclarecimentos (em resposta a audiência prévia da Autora) aí afirmando textualmente que no presente procedimento a B……..“apresenta-se em consórcio a ser constituído posteriormente com a C…….
” (v. fls. 23, 44 e 45).
L.
Cometendo grave violação do disposto no artigo 72.º, n.º 1 e 2 do CCP.
M.
É o Acórdão recorrido que, textualmente, a fls. 44 (2.º parágrafo) refere que o declarado “entra em contradição” com o teor do acordo de promessa de consórcio, para por fim concluir que o que disse que entrava em contradição, afinal não contradiz nem modifica subjetivamente a proposta, mas clarifica-a.
N.
Perante a dúvida colocada pelo Júri, a Contrainteressada B……. poderia ter esclarecido que juntou o Acordo de Consórcio por lapso e que, como resulta da proposta, a mesma só é da sua titularidade. Mas não: em sede de esclarecimentos, solicitados ao abrigo do disposto no artigo 72.º do CCP, comunicou ao Júri do procedimento que, afinal, se apresentava em Consórcio.
O.
O artigo 72º do CCP não tem por fito suprir erros, omissões, contradições ou insuficiências das propostas, mas apenas e tão só, aclarar ou fixar o sentido de algum elemento menos apreensível, desde que não altere o conteúdo da proposta ou os elementos que com ela tenham sido juntos e dela façam parte integrante, sob pena de violar o princípio da estabilidade (objetiva e subjetiva), imutabilidade e intangibilidade das propostas, enquanto decorrência do princípio da concorrência, plasmado no artigo 1.º-A do CCP.
P.
Em momento algum da proposta da Contrainteressada B…………., enquanto declaração formal essencial ao procedimento, é possível extrair, ainda que imperfeitamente expressa, a vontade negocial séria, firme e irrevogável de uma outra entidade, a Contrainteressada B……… Q.
Ao assim proceder, aceitando em esclarecimentos uma verdadeira modificação subjetiva da proposta, o tribunal recorrido interpretou erradamente o disposto no artigo 72.º, n.º 2, do CCP, o princípio da estabilidade das propostas e o princípio da transparência, plasmado no artigo 1.º-A, n.º 1, do CCP.
R.
Sendo que, ao contrário do decidido, perante o teor da proposta da Contrainteressada e os esclarecimentos prestados, era e é inexorável a exclusão da respetiva proposta, por violação do artigo 72.º, n.º 2, do artigo 70.º, n.º 2, alínea a) e do artigo 146.º, n.º 2, alíneas e), m) e o), todos do CCP.
S.
Que o douto Acórdão em crise desaplicou, ao julgar improcedente o recurso e a impugnação dos atos administrativos de adjudicação, de 04/11/2020 e 03/12/2020, em causa nos autos.
T.
Contra tal modificação da proposta, aceite ilegalmente pelo tribunal recorrido, milita igualmente uma refração do princípio da igualdade: no contexto da contratação pública tal princípio postula o tratamento não discriminatório dos concorrentes ao longo de todo o procedimento, tendo consistido num privilégio ilegal às Contrainteressadas.
U.
É evidente a violação de lei cometida no Acórdão recorrido, ao assim admitir tais esclarecimentos, pois que os mesmos contrariam - e é até o tribunal recorrido quem inexplicavelmente também o afirma a fls. 44, 2.º parágrafo - os termos da proposta apresentada (quer da declaração negocial formal, quer do próprio DEUCP que a integra).
V.
Razões pelas quais deveria o tribunal recorrido ter julgado a apelação procedente, declarado nulos ou anulado tais atos administrativos de adjudicação impugnados nos presentes autos, por erro nos seus pressupostos de direito e violação de lei, devendo excluir-se essa proposta da Contrainteressada B………….. que, em esclarecimentos, ilegalmente se alargou à Contrainteressada C……… W.
A Autora e Recorrente, cumprindo o ónus previsto no artigo 640.º do CPC (como aceite pelo douto tribunal recorrido a fls. 33) impugnou a decisão do tribunal de 1.ª instância, quanto ao teor exato dos factos assentes em H. e K.
X.
Em H., o tribunal de 1.ª instância deu como provado, em parte, o teor da certidão permanente da Contrainteressada B………, no que respeita à identificação dos seus gerentes D…………… e E……… não dando, contudo, por provada a forma de obrigar dessa Contrainteressada, que igualmente consta da referida certidão permanente, integrando a proposta junta na petição como documento n.º 3 e da qual se retira: - Forma de obrigar: Com a intervenção de dois gerentes.
Y.
No que tange ao facto assente em K., alegou-se na apelação que não podia o douto Tribunal recorrido, ao dar como assente o teor do Acordo-promessa de Constituição, e que vem, aliás, a ser o documento decisivo para a formação da sua convicção e para a sua decisão, deixar de integrar no teor desse facto provado quem, e quando, assinou o referido documento.
Z.
Tal é, desde logo, diga-se, um pressuposto lógico e necessário ao raciocínio empreendido pelo tribunal recorrido.
AA.
Concluindo-se na apelação que deveria ser aditada a alínea K dos factos assentes nos seguintes termos: “Do documento intitulado Acordo-Promessa de Constituição, a que alude a alínea E), assinado de forma digital por D………., em 14/08/2020 e por F……….., em 10/08/2020, consta, designadamente o seguinte.
(…) BB.
O doutro...
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