Acórdão nº 01744/06.9BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 13 de Julho de 2022

Magistrado ResponsávelPEDRO VERGUEIRO
Data da Resolução13 de Julho de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Processo n.º 1744/06.9BELSB (Recurso Jurisdicional) 1.

RELATÓRIO A…………, devidamente identificado nos autos, inconformado, veio interpor recurso jurisdicional do despacho proferido no início da audiência de inquirição de 01-02-2010, que, pronunciando-se sobre o requerido a fls. 108 e seguintes, pelo ora Recorrente, decidiu indeferi-lo e considerar o IFADAP parte legítima para estar em juízo neste processo, com fundamento no art. 15º, nº 1, al. a) do CPPT e da decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, datada de 05-02-2020, que julgou parcialmente procedente a pretensão pelo mesmo deduzida na presente OPOSIÇÃO relacionada com a execução fiscal contra si instaurada para cobrança coerciva de dívidas ao IFADAP - Instituto de Financiamento e Apoio ao Desenvolvimento da Agricultura e Pescas e os correspondentes juros à taxa legal.

Formulou nas respectivas alegações, as seguintes conclusões que se reproduzem: A. Quanto ao despacho de 01-02-2010 “ (…) 1. No processo de execução fiscal, promovida pelo Representante da Fazenda Pública, em representação do Estado, é este o competente e quem tem legitimidade para a contestação da oposição, nos termos do art. 15º, nº 1, aI.

  1. CPPT.

    1. Não tendo o Representante da Fazenda Pública contestado, por parte do Estado, apesar de lhe ter sido deferida a prorrogação do prazo para contestar, que requereu, deve dar-se como provada a matéria alegada na contestação, nos termos e por força do nº 2 do artº 490º do CPC, aplicável ao caso “ex vi” aI. e) do artº 2º do CPPT.

    2. O IFADAP não pode contestar em representação do Estado, nem em processo que não seja parte, ou em que não tenha sido admitido a intervir, quando isso tenha sido requerido pelos meios processuais e legais apropriados. No caso, o IFADAP não é parte no processo nem foi admitido a intervir.

    3. O IFADAP não é parte legítima, pelo que não podia contestar, como decorre do artº 15º, nº 1, aI. a) do CPPT.

    4. Mas, inopinadamente, o IFADAP veio apresentar uma contestação, mas extemporânea, porque fora do prazo.

    5. Pela decisão recorrida (se salvo o devido respeito e melhor opinião) foi feita errada aplicação do artº 15º, nº 1, aI. a) do CPPT, que confere a representação do Estado ao Representante da Fazenda Pública.

    6. Tendo sido notificado, o Representante da Fazenda Pública, para contestar e tendo-lhe sido deferida a prorrogação do prazo para o efeito, ao abrigo da prerrogativa que lhe assiste, estabeleceu-se caso julgado no processo sobre a parte legítima, o Estado, e a sua representação pelo Representante da Fazenda Pública, pelo que a decisão recorrida o violou.

    7. Em obediência ao princípio da estabilidade da instância, o IFADAP não poderia ter sido admitido a contestar, sem prévio pedido de intervenção, processado nos termos legais (cfr. arts. 320º e segs., CPC), nem poderia contestar sem previamente ter sido admitido, cfr. arts. 268º e segs., CPC). Essas normas foram desrespeitadas, com o cometimento das correspondentes nulidades, que se assacam à decisão recorrida e à omissão de decisão quanto ao mais nela não apreciado, inclusive quanto à inquirição de testemunhas não admitidas.

    8. Não é admitido e constitui nulidade processual que, por parte da mesma entidade, o Estado, intervenham dois representantes ou um representante legal e outra entidade na mesma posição processual e de representação (e ambos admitidos a contestar), pois trata-se de uma situação anómala e manifestamente irregular, padecendo de nulidade, para mais sem que tenha havido um qualquer despacho a admitir e fundamentar tal acaso.

      Termos em que pede o deferimento do peticionado neste recurso e a reparação do agravo, com a declaração da ilegitimidade do IFADAP, dando sem efeito a sua contestação e ordenando que a mesma seja desentranhada dos autos, com as legais consequências, inclusive quanto à admissão dos factos da oposição à execução (ex vi artº 490º, nº 2, CPC) e com a verificação das nulidades invocadas, como é de Justiça!” B. Quanto à sentença recorrida: “(…) (a) a douta sentença, no segmento relativo à prescrição da dívida em execução, ao considerar que a prescrição observa o prazo de 20 anos previsto no artigo 309º do Código Civil, enferma de erro de julgamento por desconsiderar o do Regulamento CEE nº 2988/95, aplicável ao caso, face à fixação de jurisprudência ínsita no Acórdão nº 1/2015 do STA; na verdade, (b) o Tribunal “a quo” encontrava-se vinculado ao que foi decidido no douto acórdão do STA nº 1/2015 e que uniformizou jurisprudência no sentido de que “na ausência de legislação nacional consagrando prazo de prescrição mais longo do que o previsto no art. 3, nº 1, do Reg. (CE Euratom) n.º 2988/95, do Conselho, de 18 de Dezembro, é este o aplicável”; (c) o prazo dentro do qual podia ser pedida, ao Recorrente, a devolução de ajudas financeiras concedidas ao abrigo do Regulamento CEE nº 797/85, ajudas cujo recebimento foi titulado pelo contrato celebrado entre o Recorrente e o Recorrido no âmbito do projeto nº 87.53.6528.0, é de 4 anos, face ao que se dispõe no nº 1 do artigo 3º do Regulamento CEE nº 2988/95; (d) as irregularidades que o Recorrido considerou relevantes para determinar a devolução das ajudas e que consubstanciam a dívida exequenda, reportam-se aos anos de 1989 e 1990; (e) o Recorrente somente foi notificado da rescisão unilateral do contrato relativo ao projeto nº 87.53.6528.0, em 18/03/2005, pelo que já se encontrava precludido o prazo de 4 anos, previsto no nº 1 do artigo 3º do sempre invocado Regulamento CEE nº 2988/95, para que o Recorrido o pudesse fazer; (f) por outro lado, tendo o Tribunal “a quo” desconsiderado a aplicação do questionado Regulamento, ele sempre teria de aplicar o regime decorrente do artigo 40º do Dec. Lei nº 155/92, que tutela a devolução, ao erário público, de verbas deste recebidas.

      Termos em que, dando V. Ex.cias provimento ao recurso e revogando a sentença recorrida, farão a costumada JUSTIÇA.

      ” Não houve contra-alegações em qualquer das situações.

      O Ministério Público junto deste Tribunal emitiu parecer no sentido de dever ser negado provimento a ambos os recursos, sem prejuízo de se ordenar o reenvio ao T.J.U.E., a título prejudicial.

      Por despacho de 17-12-2021, foi determinada, ao abrigo do art. 272º nº 1 do C. Proc. Civil ex vi art. 2º al. e) do CPPT, a suspensão da instância até à decisão do reenvio prejudicial suscitado por este S.T.A. no processo nº 03138/12.8BEPRT.

      Por acórdão de 7 de Abril de 2022, o TJUE, nos processos apensos C-477/20 e C-448/20, esclareceu o seguinte: «[…] 1) O artigo 3.º, n.º 1, do Regulamento (CE, Euratom) n.º 2988/95 do Conselho, de 18 de dezembro de 1995, relativo à proteção dos interesses financeiros [da União Europeia], deve ser interpretado no sentido de que, sob reserva do respeito dos princípios da equivalência e da efetividade, não se opõe a uma regulamentação nacional por força da qual, para efeitos de impugnação de uma decisão de cobrança de montantes indevidamente pagos, adotada após o decurso do prazo de prescrição do procedimento previsto nessa disposição, o seu destinatário é obrigado a invocar a irregularidade dessa decisão num determinado prazo perante o tribunal administrativo competente, sob pena de caducidade, e já não se pode opor à execução da referida decisão ao invocar a mesma irregularidade no âmbito do processo judicial de cobrança coerciva intentado contra si.

      2) O artigo 3.º, n.º 2, primeiro parágrafo, do Regulamento n.º 2988/95 deve ser interpretado no sentido de que tem efeito imediato nas ordens jurídicas nacionais, sem que seja necessário que as autoridades nacionais tomem medidas de aplicação. Daqui resulta que o destinatário de uma decisão de cobrança dos montantes indevidamente recebidos deve, em qualquer caso, poder invocar o termo do prazo de execução previsto no artigo 3.º, n.º 2, primeiro parágrafo, desse regulamento ou, se for caso disso, de um prazo de execução prolongado em aplicação do artigo 3.º, n.º 3, do referido regulamento, a fim de se opor à cobrança coerciva desses montantes.

      3) O artigo 3.º, n.º 2, primeiro parágrafo, do Regulamento n.º 2988/95 deve ser interpretado no sentido de que se opõe a uma regulamentação nacional que prevê que o prazo de execução que estabelece começa a correr a partir da adoção de uma decisão que impõe o reembolso dos montantes indevidamente recebidos, devendo esse prazo correr desde o dia em que essa decisão se torne definitiva, ou seja, do dia do termo dos prazos de recurso ou do esgotamento das vias de recurso.

      4) O artigo 3.º, n.º 2, segundo parágrafo, do Regulamento n.º 2988/95 deve ser interpretado no sentido de que não se opõe a uma regulamentação nacional por força da qual o prazo de execução previsto no primeiro parágrafo deste número é interrompido pela citação para a cobrança coerciva da dívida objeto de uma decisão de cobrança.

      […]».

      Notificadas as partes para se pronunciarem, querendo, sobre o teor do acórdão do TJUE antes mencionado, apenas o Recorrente tomou posição sobre a matéria, concluindo no sentido de que o exequente IFADAP, quando emitiu a certidão de dívida que serviu de base à execução a que o Requerente se opôs, já não podia proceder à sua execução da tal dívida, uma vez que a mesma, por se reportar aos anos de 1989 e 1990, já não poderia ser executada.

      O Ministério Público junto deste Tribunal reiterou o parecer no sentido de dever ser negado provimento a ambos os recursos.

      Cumpre decidir.

    9. DELIMITAÇÃO DO OBJECTO DO RECURSO - QUESTÕES A APRECIAR Cumpre apreciar e decidir as questões colocadas pelo Recorrente, estando o objecto do recurso delimitado pelas conclusões das respectivas alegações, sendo que a matéria apontada nos autos resume-se, em suma, em analisar a invocada excepção de ilegitimidade do IFADAP para intervir nos autos, não tendo, por isso, legitimidade para apresentar a contestação que apresentou nos autos, a qual competia ao representante da FP e ainda em apreciar se as dívidas exequendas em cobrança coerciva no processo de execução fiscal...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT