Acórdão nº 617/08.5BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 30 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução30 de Junho de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO J… e A… (doravante 1.ºs Recorrentes ou Impugnantes) e a Fazenda Pública (doravante 2.ª Recorrente ou FP) vieram recorrer da sentença proferida a 15.02.2022, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada parcialmente procedente a impugnação apresentada pelos primeiros, que teve por objeto o ato de liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), referente ao ano de 2003.

Nas suas alegações, os 1.ºs Recorrentes concluíram nos seguintes termos: “A. O presente recurso tem por objeto reagir contra a decisão proferida nos autos de impugnação judicial identificados à margem, na parte em que decidiu no sentido da não anulação do ato liquidação adicional de IRS nº 2007 50…………. e juros compensatórios, que vem impugnado, mantendo a qualificação como adiantamentos por conta dos lucros, os montantes pagos ao Recorrido, de € 798.623,54 e € 117.323,68, recebidos da I…. e da QUINTA DO M…..

  1. Com o fundamento de que o ora recorrente não ilidiu a presunção constante do n.º 4 do artigo 6.º do CIRS, tendo ficado demostrado que, embora existindo contrato de suprimento entre aquele e as sociedades I… e da QUINTA DO M…, os montantes recebidos têm a natureza de rendimento, ao abrigo do artigo 5.º, n.º 1, alínea h) do CIRS.

  2. Não pode o ora recorrente conformar-se com o assim decidido, por ter sido inequivocamente provado que não se encontram preenchidos os pressupostos para acionamento da presunção prevista no artigo 6.º, n.º 4 do CIRS, subsumindo-se os montantes ao artigo 5º, nº 1, alínea h) do CIRS.

  3. Para o efeito, a sentença recorrida conclui que, neste caso, estamos perante “mútuos não comprovados" pese embora ter sido comprovado que os suprimentos foram efetivamente prestados, ainda que o hajam sido mais tarde.

  4. Neste sentido, embora estejam documentalmente provadas nos autos as entradas de valores provenientes das contas bancárias dos anteriores sócios, e hajam todas as testemunhas ouvidas confirmado essas entradas, ainda assim, conclui erradamente, com a devida vénia, a sentença recorrida pela procedência da correção, o que não se pode aceitar face à prova documental e testemunhal produzida e aos factos provados quanto a ambas as empresas I… e QUINTA DO M….

  5. Com feito, a sentença recorrida reconhece expressamente que em 21.05.2002, foi outorgada escritura pública de cessão de quotas, nomeação de gerentes e alteração parcial do contrato, onde intervieram J…, R… e o Impugnante na qual, designadamente, o ora recorrente adquiriu juntamente com o seu irmão, as quotas representativas do capital social da sociedade “I…, LDA.” tendo cada um adquirido uma quota no valor de € 2.500,00, pelo preço igual ao respectivo valor nominal (cfr. Doc. 3 junto com a p.i.); G. Que, na mesma data, por escrito particular, foi celebrado “Contrato de Cessão de Suprimentos” entre os antigos sócios e os novos sócios da sociedade I…, através do qual os primeiros declararam transmitir aos segundos o direito à totalidade dos suprimentos por si efetuados na sociedade, no montante global de € 1.797.247,08, na proporção de 50% para cada um (€ 898.623,54) (cfr. Doc. 4 junto com a p.i.); H. Que nessa mesma data, foi também outorgada escritura pública de cessão de quotas, nomeação de gerentes e alteração parcial do contrato, com os mesmos intervenientes – J…, R… e o ora recorrente, na qual, designadamente, o ora recorrido, como segundo outorgante, adquiriu a totalidade das quotas representativas do capital social da sociedade “QUINTA DO M…, LDA.”, no valor de € 5.000,00, tendo passado a ser titular de uma quota de € 2.500,00, pelo preço igual ao respectivo valor nominal (cfr. Doc. 3 junto com a p.i.); I. E que na mesma data, por escrito particular, foi celebrado “Contrato de Cessão de Suprimentos” entre os antigos sócios, J… e R…, e os novos sócios da sociedade QUINTA DO M…, através do qual os primeiros declararam transmitir aos segundos o direito à totalidade dos suprimentos por si efectuados na sociedade, no montante global de € 1.995.440,00, na proporção de 50% para cada um (€ 997.720,00) (cfr. Doc. 4 junto com a p.i. e prova testemunhal); J. Mais considera provado Tribunal a quo que os anteriores sócios receberam dos novos sócios o pagamento das participações sociais e dos suprimentos a que se referem as alíneas anteriores (prova testemunhal – depoimento de J…); K. E que em 23.05.2002, J… emitiu o cheque nº 32092……. à ordem da I…, no montante de € 2.081.678,00, o que foi depositado no dia seguinte (cfr. Doc. 7 junto com a p.i.); L. E que em 24.05.2002, foram emitidos à ordem de J…, os cheques nº 800……. e 98…….. do BPN, no valor respectivamente de € 2.493.989,49 e € 897.836,21, perfazendo o montante de € 3.391.825,70, montante que foi depositado na mesma data (cfr. Docs. 5 e 6 juntos com a p.i.); M. E que em 24.05.2002, J… emitiu cheque nº 2309….. à ordem da I…, pelo valor de € 1.212.697,68, o qual foi depositado no Crédito Predial Português, na mesma data (cfr. Doc. 7 junto com a p.i.); N. Tendo sido registados na contabilidade da I…, nas contas #25.5.01 e #25.5.02 – Accionistas J… e R…, movimento a crédito, em 31.05.2002, de € 898.623,54 em cada um, e em 31.12.2002, movimento a débito no mesmo valor (cfr. fls. 343 a 346 do PA apenso); O. Ficou também provado que em 31.12.2002, foi registado na contabilidade da I…, a crédito, na conta #25.5.1.03 (A…) e #25.5.1.04 (J…), as quantias de € 898.623,54 cada (cfr. fls. 344 a 346 do PA apenso); P. Tendo sido emitido o cheque nº 2814247523, sore a conta nº 14645664101, do BPN, de que era titular a sociedade I…, à ordem do Impugnante, datado de 22.12.2003, no valor de € 798.623,54, valor por este recebido (cfr. fls. 340 e 341 do PA apenso).

  6. Toda esta prova está em consonância com o facto de o anterior sócio se haver obrigado efetivamente a prestar suprimentos, havendo-o feito posteriormente, é certo, mas em cumprimento de uma estrita obrigação jurídica por si anteriormente assumida, sendo que tal dever não se extinguiu quando cedeu esses direitos, antes permanecendo na sua titularidade passiva o dever legal de os prestar e na das sociedades em causa, o direito legal de os receber.

  7. Pelo que provado fica que em ambas as sociedades foram depositados cheques, registados depósitos e efetuados movimentos financeiros a crédito nas sociedades I… e QUINTA DO M…, relevados nas contas #25.5.1.03 e #25.5.1.04 e nas contas #25.5.01 e #25.5.02 – Acionistas, com plena evidência de que os suprimentos do sócio J… e do ora recorrente foram efetivamente prestados e regularizados saldos de caixa de cada sócio e transferidos para a conta de Suprimentos.

  8. No caso, ficou provado, quanto à sociedade I…, que nada na lei impede que haja uma dilação entre o momento em que ocorre a constituição do dever de realizar a prestação suprimentícia e o momento da sua realização / transferência efetiva, pelo que não constitui óbice ao dever de prestar o facto de ele ter sido realizado pelo antigo sócio J… no espaço e no tempo em que o permitiram as suas forças económicas, isso é, quando teve, ele mesmo, as correspondentes disponibilidades financeiras ou patrimoniais para fazer esse reforço.

  9. De tudo o que antecede se demonstra que os suprimentos pelo sócio J… foram efetivamente prestados na sociedade I… e que, a não se aceitar essa prestação, como erradamente o decidiu a sentença recorrida, alcança-se um resultado ainda mais iníquo do que aquele que resulta do decidido, quando é certo que o referido cheque do sócio J… nº 230……. emitido à ordem da I…, pelo valor de € 1.212.697,68, mais não é do que a entrega da prestação suprimentícia.

  10. Erra, pois, a Douta sentença recorrida ao não aceitar a prova documental do depósito bancário para entrega de prestações suprimentícias anteriormente assumidas pelo sócio J… da sociedade I…, e feita adicionalmente a prova testemunhal desse facto – por todas e cada uma das testemunhas inquiridas a este respeito.

    V. No que especificamente respeita à sociedade QUINTA DO M… provou - se que estão registados na sua contabilidade, nas contas #25.5.01 e #25.5.02 – Accionistas J… e R…, movimento a crédito, em 31.05.2002, de € 997.720,00 cada, e em 30.11.2002, movimento a débito no mesmo valor (cfr. fls. 250 e 251 do PA apenso); W. E que em 30.11.2002 foi registado na contabilidade desta empresa, nas contas #25.5.1.03 (A…) e #25.5.1.04 (J…), a crédito, as quantias de € 997.720,00 cada, e a débito, as quantias de 872.896,32, apurando-se um saldo de € 124.823,68 (cfr. fls. 251, 252, 258 do PA apenso); X. E que em 29.11.2002, foi efetuada transferência bancária pela sociedade QUINTA DO M… a favor do Impugnante, pelo montante de € 872.896,32 (cfr. fls. 266 do PA apenso); Y. Tendo em 31.12.2003, sido registado, na contabilidade da QUINTA DO M…, o movimento a débito da conta #25.5.1.04 (José Santos), no valor d e € 117.323,68 (cfr. fls. 277 do PA apenso); Z. E emitido cheque, em dezembro de 2003, de conta bancária de que era titular a sociedade QUINTA DO M…, à ordem do Impugnante, no valor de € 117.323,68 (cfr. fls. 280 do PA apenso).

    AA. De facto, é dado como provado pela sentença recorrida haver a testemunha A… dito que a prática contabilística das sociedades passava por registar na conta Caixa as despesas em que os sócios incorriam em nome das sociedades e, em determinado momento, o saldo de cada sócio era regularizado ou transferido para a conta de Suprimentos, afiançou que os acertos quanto aos suprimentos estavam bem identificados e declarando que os suprimentos, no âmbito das sociedades I… e QUINTA DO M… foram transferidos dos anteriores para os novos sócios.

    BB. Mais deu como provado a sentença recorrida que a testemunha J… evidenciou prova documental de algumas transferências bancárias entre as contas particulares destes, que sustentam as suas declarações – prova documental essa que a sentença ignorou.

    CC. Foi pelas testemunhas ainda dito que o facto de o Impugnante e o seu Pai, V… serem accionistas/sócios de diversas sociedades, e procederem a diversos...

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