Acórdão nº 0700/09.0BEPRT 0791/15 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 29 de Junho de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução29 de Junho de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam no Pleno da Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Z……….. – Serviços de Comunicações, S.A.

, melhor sinalizada nos autos, vem, nos termos do artigo 284.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), interpor recurso de uniformização de jurisprudência para o Pleno do Contencioso Tributário do STA, do acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Norte em 28/05/2021, por ter manifestado contradição quanto à mesma questão fundamental de direito ao que foi perfilhado no Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo, no Processo n.º 01170/05.7BELSB, de 4 de Dezembro de 2019, no que respeita à dedutibilidade em sede de IRC, dos custos relativos a prémios de seguros de doença suportados a favor de trabalhadores e seus familiares.

Inconformada, formulou a recorrente Z……….. – Serviços de Comunicações, S.A.

, as seguintes alegações: A. Enquadramento do recurso 1. Nos termos do disposto no n.º 1 do artigo 284.º do CPPT, sob a epígrafe “Recurso para uniformização de jurisprudência”, “[a]s partes e o Ministério Público podem dirigir ao Supremo Tribunal Administrativo, no prazo de 30 dias contado do trânsito em julgado do acórdão impugnado, pedido de admissão de recurso para uniformização de jurisprudência, quando, sobre a mesma questão fundamental de direito, exista contradição: Entre um acórdão do Tribunal Central Administrativo, e outro acórdão anteriormente proferido pelo mesmo ou outro Tribunal Central Administrativo ou pelo Supremo Tribunal Administrativo;” 2. Ora, nos presentes autos de recurso está em causa a reapreciação parcial do acórdão proferido pelo TCA Norte, no âmbito do processo identificado em epígrafe, em 28 de maio de 2021, à luz do acórdão proferido pelo Supremo Tribunal Administrativo (“STA”) no processo n. º 01170/05.7 BELSB de 4 de Dezembro de 2019, nos termos que de seguida se precisarão.

  1. A ação subjacente ao presente recurso teve início em 13 de março de 2009, com a propositura, pela ora Recorrente – que resultou da fusão por incorporação da sociedade X…………..– TELECOMUNICAÇÕES, S.A. na sociedade V……….. – TELECOM, S.A., adotando esta última a firma Z………. – SERVIÇOS DE COMUNICAÇÕES, S.A –, da impugnação sobre o ato de liquidação n.º 2009 8310000212, relativo a Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (“IRC”) do exercício de 2006, consubstanciado na demonstração de acerto de contas n.º 2009 00000062660, com saldo a pagar de € 15.726,37, junto do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto (doravante, TAF do Porto), e que teve na sua origem uma inspecção tributária incidente sobre o exercício de 2006 ora Recorrente.

    B. Thema decidendum 4. Em concreto, e com relevância para o presente recurso, a AT entendeu ser de desconsiderar, para efeitos da sua dedutibilidade em sede de IRC, os custos relativos a prémios de seguros de doença suportados pela Recorrente a favor dos seus trabalhadores e familiares, no valor de € 95.687,53, por não os considerar enquadráveis no disposto no artigo 40.º do Código do IRC, aplicável por remissão do n.º 4 do artigo 23.º do Código do IRC (nas redações vigentes à data), tendo o TCA Norte, no douto acórdão de que ora se recorre, entendido ser de se manter esta correção ao lucro tributável da Recorrente.

  2. Recordando os referidos preceitos legais, e começando por analisar o disposto nos n.º 2 e n.º 4 do artigo 40.º do Código do IRC (na redação vigente à data), nas partes relevantes para a apreciação da legalidade da presente correção, este dispunha: “2 - São igualmente considerados custos ou perdas do exercício, até ao limite de 15% das despesas com o pessoal escrituradas a título de remunerações, ordenados ou salários respeitantes ao exercício, os suportados com contratos de seguros de doença e de acidentes pessoais, bem como com contratos de seguros de vida, contribuições para fundos de pensões e equiparáveis ou para quaisquer regimes complementares de segurança social, que garantam, exclusivamente, o benefício de reforma, pré-reforma, complemento de reforma, invalidez ou sobrevivência, a favor dos trabalhadores da empresa.

    4 - Aplica-se o disposto nos n.ºs 2 e 3 desde que se verifiquem, cumulativamente, as seguintes condições, à excepção das alíneas d) e e), quando se trate de seguros de doença, de acidentes pessoais ou de seguros de vida que garantam exclusivamente os riscos de morte ou invalidez:

    1. Os benefícios devem ser estabelecidos para a generalidade dos trabalhadores permanentes da empresa ou no âmbito de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho para as classes profissionais onde os trabalhadores se inserem; b) Os benefícios devem ser estabelecidos segundo um critério objectivo e idêntico para todos os trabalhadores ainda que não pertencentes à mesma classe profissional, salvo em cumprimento de instrumentos de regulamentação colectiva de trabalho; c) Sem prejuízo do disposto no n.º 6, a totalidade dos prémios e contribuições previstos nos n.ºs 2 e 3 deste artigo em conjunto com os rendimentos da categoria A isentos nos termos do n.º 1 do artigo 15.º do Estatuto dos Benefícios Fiscais não devem exceder, anualmente, os limites naqueles estabelecidos ao caso aplicáveis, não sendo o excedente considerado custo do exercício; d) Sejam efectivamente pagos sob a forma de prestação pecuniária mensal vitalícia pelo menos dois terços dos benefícios em caso de reforma, invalidez ou sobrevivência, sem prejuízo da remição de rendas vitalícias em pagamento que não tenham sido fixadas judicialmente, nos termos e condições estabelecidos em norma regulamentar emitida pela respectiva entidade de supervisão, e desde que seja apresentada prova dos respectivos pressupostos pelo sujeito passivo; e) As disposições de regime legal da pré-reforma e do regime geral de segurança social sejam acompanhadas, no que se refere à idade e aos titulares do direito às correspondentes prestações, sem prejuízo de regime especial de segurança social, de regime previsto em instrumento de regulamentação colectiva de trabalho ou de outro regime legal especial, ao caso aplicáveis; f) A gestão e disposição das importâncias despendidas não pertençam à própria empresa, os contratos de seguros sejam celebrados com empresas de seguros que possuam sede, direcção efectiva ou estabelecimento estável em território português, ou com empresas de seguros que estejam autorizadas a operar neste território em livre prestação de serviços, e os fundos de pensões ou equiparáveis sejam constituídos de acordo com a legislação nacional ou geridos por instituições de realização de planos de pensões profissionais às quais seja aplicável a Directiva n.º 2003/41/CE, do Parlamento Europeu e do Conselho, de 3 de Junho, que estejam autorizadas a aceitar contribuições para planos de pensões de empresas situadas em território português; g) Não sejam considerados rendimentos do trabalho dependente, nos termos da primeira parte do n.º 3) da alínea b) do n.º 3 do artigo 2.º do Código do IRS.” (destaques nossos).

  3. Termos em que, esta norma, que tem por epígrafe “Realizações de utilidade social” (e que hoje corresponde ao artigo 43.º do Código do IRC), não tem em vista a finalidade principal ou essencial de uma norma de cariz fundamentalmente tributário – a obtenção de receitas –, mas antes objetivos de natureza económica e, acima de tudo, social: na verdade, a norma do artigo acabado de citar corresponde a um verdadeiro incentivo fiscal para a promoção de finalidades sociais, como o são, inegavelmente, as finalidades de proteção na doença e acidentes pessoais dos trabalhados e dos respetivos agregados familiares.

  4. Neste caso, para que a dedutibilidade fiscal seja permitida, os requisitos exigidos são, não só os previstos naquele n.º 2 – isto é, que os custos com os seguros não ultrapassem 15% do total das despesas com pessoal e que o benefício seja estabelecido para a generalidade dos colaboradores da empresa –, mas também os que resultam da alínea a) e b) do n.º 4: “a) [o]s benefícios devem ser estabelecidos para a generalidade dos trabalhadores permanentes da empresa ou no âmbito de instrumento de regulamentação colectiva de trabalho para as classes profissionais onde os trabalhadores se inserem; e [o]s benefícios devem ser estabelecidos segundo um critério objectivo e idêntico para todos os trabalhadores ainda que não pertencentes à mesma classe profissional (…)” (sublinhado nosso).

    VEJAMOS: 8. Ora, desde logo, o douto acórdão proferido em 1.ª instância pelo TAF do Porto, considerou que estes custos não poderiam, à luz da legislação vigente, ser dedutíveis para efeitos fiscais, uma vez que foram constituídos não apenas a favor dos trabalhadores da empresa, mas também dos seus familiares, referindo que «[p]or sua vez, no que se refere à extensão do seguro de doença aos familiares dos trabalhadores da Impugnante, diga-se desde já que tal possibilidade encontra-se legalmente vedada. (…) de acordo com a redacção do então artigo 40.º do CIRC, apenas são fiscalmente dedutíveis os gastos com seguros de saúde dos trabalhadores e não dos seus familiares, sendo legalmente irrelevantes as razões de natureza intrinsecamente empresariais apresentadas pela Impugnante.» (cf. pág. 22 da sentença exarada pelo TAF do Porto, sublinhados nossos).

  5. Todavia, ao contrário do que tinha sido determinado em 1.ª instância pelo TAF do Porto, o douto acórdão do TCA Norte decidiu – e bem! – que, em abstrato, o facto de os seguros de doença abrangerem não apenas trabalhadores, mas também os seus familiares, não é impeditivo de que estes sejam dedutíveis à matéria coletável da Recorrente, como se retira do seguinte excerto: «Impõe-se desde logo esclarecer que não se acompanha o entendimento vertido na sentença a quo de que os encargos suportados com o pagamento do prémio das apólices de seguros de saúde, na parte em que são beneficiários os familiares dos trabalhadores, não estão abrangidos pelo disposto no art.° 40.° do Código do IRC, e como tal não são aceites...

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