Acórdão nº 01276/14.1BEAVR de Tribunal Central Administrativo Norte, 27 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | Helena Ribeiro |
Data da Resolução | 27 de Maio de 2022 |
Emissor | Tribunal Central Administrativo Norte |
Acordam, em conferência, os juízes desembargadores da Secção Administrativa do Tribunal Central Administrativo Norte: I.RELATÓRIO 1.1.
AA...
, residente em (…), intentou a presente ação administrativa contra o INSTITUTO DA SEGURANÇA SOCIAL, I.P.
, com sede na Rua Rosa Araújo, n.º 43,1250- 194 Lisboa, pedindo a declaração de nulidade do ato administrativo praticado pelo Vice-Presidente do Conselho Diretivo, datado de 16/09/2014, que julgou improcedente o recurso hierárquico por si interposto, da nota de reposição nº 5546269, emitida pelo Centro Distrital de Aveiro do ISS, I.P., que lhe foi comunicada pelo ofício de 24/11/2008 e que determinou a obrigatoriedade de reposição da quantia de € 4.107,16, por alegadamente ter sido indevidamente paga à Autora a título de prestações de desemprego no período de dezembro/2007 a setembro/2008.
Para tanto, alega, em síntese, que o ato impugnado padece do vício de falta de fundamentação, por não referir com a devida clareza a base legal na qual sustenta “que com a notificação da suspensão da prestação se deve considerar que existiu revogação da decisão de atribuição do subsídio” e omitir a apreciação das questões de facto e de direito que foram suscitadas (cf. artigos 5.º e 6.º da petição inicial).
Só com a notificação do despacho proferido em 29.09.2014, a Autora tomou conhecimento da fundamentação do ato de suspensão do pagamento das prestações, porque nunca foi notificada desta suspensão, e nunca foi notificada dos fundamentos da decisão de restituição das prestações de 25.11.2008; E não tendo o Réu revogado o ato de atribuição do subsídio, nos termos legais e no prazo legalmente previsto, não é exigível a reposição do valor em causa, sendo evidente a violação dos princípios da justiça, proporcionalidade, legalidade, boa fé e da confiança.
1.3. Citado, o Réu contestou a ação, defendendo-se por exceção e por impugnação.
Na defesa por exceção, invocou a inimpugnabilidade do ato de segundo grau e, bem assim, a caducidade do direito de ação quanto ao ato de primeiro grau.
Na defesa por impugnação, alegou, em síntese, que em 03/05/2005, na sequência de ter cessado o contrato de trabalho com a entidade empregadora, e do requerimento apresentado para a concessão de subsídio de desemprego, foi atribuído à Autora subsídio de desemprego por 720 dias, com início em 14/10/2005.
Em outubro de 2007, a Autora requereu a atribuição de subsídio de desemprego parcial, uma vez que havia celebrado contrato de trabalho a tempo parcial e reunia as demais condições legalmente previstas, tendo-lhe sido concedido o mesmo, por um período de 72 dias, com início em 03/07/2007.
Finda tal prestação começou a auferir subsídio social de desemprego subsequente por 360 dias com início em 15/12/2007, mas durante esse período nunca deixou de exercer a atividade profissional que havia cumulado com o subsídio de desemprego parcial, pelo que, em 30/09/2008, tendo os serviços do Réu apercebido da concessão indevida da prestação social de desemprego subsequente, foi determinada a suspensão, com efeitos a 15/12/2007.
Nessa sequência, foi emitida, a 24/11/2008 a correspondente nota de reposição referente ao período durante o qual a Autora recebeu indevidamente tal subsídio.
A regra da prestação é a da inacumulabilidade com rendimentos do trabalho, com exceção do subsídio de desemprego parcial, pelo que, tendo a Autora sido notificada da suspensão do pagamento da prestação e da data da produção dos seus efeitos, na esteira do preceituado nos artigos 52.º, n.º1, alínea a) e 56.º do D.L. 220/2006 em virtude do exercício da atividade profissional, antes de decorrido o prazo de um ano previsto no artigo 141.º do CPA, tal implica para a Autora a obrigação de restituição dos valores indevidamente recebidos.
Daqui decorre que a obrigação de restituir é independente do ato administrativo considerado em si mesmo, pois ela nasce diretamente do recebimento indevido de prestações, não podendo assim a Autora, ao contrário do alegado no artigo 36 da p.i., vir dizer que a não revogação do ato administrativo de atribuição do subsídio importa a não exigibilidade do valor em causa.
Conclui, pugnando pela improcedência da ação.
1.3. Em 10/09/2021, proferiu-se despacho a ordenar ao Réu a junção aos autos do original da notificação à Autora da decisão de suspensão do pagamento das prestações de subsídio de desemprego.
1.4. O Réu respondeu que “de acordo com informação prestada pelos respetivos serviços, o processo físico já não se encontra disponível em arquivo, sendo que o mesmo terá sido eliminado ao abrigo do Regulamento Arquivístico do ISS, I.P.” (cf. fls. 205 do SITAF).
1.5. Em 03/11/2021, proferiu-se despacho saneador que julgou improcedentes as exceções dilatórias deduzidas, e ordenou-se a notificação das partes para apresentarem, querendo, alegações escritas (cf. fls. 236 e 256 do SITAF).
1.6. Ambas as partes apresentaram alegações escritas, reiterando a posição assumida nos respetivos articulados.
1.7. Em 11/01/2022, foi proferida sentença, contendo essa sentença o julgamento de facto e de direito, onde se julgou improcedente a presente ação, a qual consta da seguinte parte dispositiva: «Em face do exposto, porque não provada, julga-se a presente ação totalmente improcedente e, consequentemente, mantém-se o ato administrativo na ordem jurídica.
Custas a cargo da A., sem prejuízo do apoio judiciário.
Registe e notifique.
Aveiro, 11.01.2022 » 1.8. Inconformada com o assim decidido, a Autora interpôs o presente recurso de apelação, em que formula as seguintes Conclusões: «Considerando que: 1.ª - No que se refere ao ato contido no despacho de 16/09/2014 exarado pelo Vice- Presidente do Conselho Diretivo do Instituto da Segurança Social, I.P. que negou provimento ao recurso interposto e determinou a obrigatoriedade de reposição do montante de € 4.107,16, consta do referido despacho, levado ao ponto 11 dos factos provados, em 14. e 15, o seguinte “Encontra-se demonstrado por consulta ao processo administrativo que o subsídio social de desemprego subsequente atribuído à beneficiária foi suspenso com efeitos ao início da concessão (15/12/2007), e que a interessada foi desse ato notificada, por oficio de 30/09/2008, com o seguinte fundamento: "Exercer atividade profissional por conta própria ou por conta de outrem (...) A suspensão produz efeitos em 2007-12-15", "sem prejuízo da restituição de prestações indevidas, se for caso disso"; “Assim, conclui-se que a interessada foi oportunamente notificada dos motivos pelos quais se constituiu na obrigação de repor, ainda que, com menor rigor, os serviços tenham notificado a interessada da "suspensão da prestação" com efeitos à data de início e não, como deviam, da revogação da decisão de atribuição do citado subsídio, por violação de lei, pelo que o prazo geral de um ano aplicável à revogação dos atos administrativos e previsto no artigo 141º do CPA se mostra cumprido na presente situação.”; 2.ª - Dispõe o artigo 124º CPA (DL 442/91 de 15 de Novembro) sob a epígrafe “Dever de Fundamentação” que, “devem ser fundamentados os atos administrativos que, total ou parcialmente: neguem, extingam, restrinjam ou afetem por qualquer modo direitos e interesses legalmente protegidos” e o artigo 125º do mesmo diploma legal que “A fundamentação deve ser expressa, através de sucinta exposição dos fundamentos de facto e de direito da decisão, podendo consistir em mera declaração de concordância com os fundamentos de anteriores pareceres, informações ou propostas, que constituem nestes casos, parte integrante do respetivo ato”; Estes preceitos vêm regular o direito fundamental à fundamentação expressa e acessível a todos os atos que afetem direitos ou interesses legalmente protegidos, consagrado no artigo 268º n.º 3 da Constituição da República Portuguesa; 3.ª - No caso dos autos está em causa a fundamentação de um ato de “suspensão” que a entidade demandada entende dever considerar-se como “ato de revogação”, que não foi notificado à Autora, que assim desconhecia em absoluto, até à data em que é proferido o despacho recorrido, a fundamentação subjacente ao ato executório de restituição; Ato de revogação legalmente imposto que determina a produção de efeitos especialmente gravosos para os interessados, circunstância que, por isso, implica a existência de um dever acrescido de fundamentação, na medida em que a fundamentação será determinante para o interessado identificar e acompanhar as efetivas motivações do autor do ato; 4.ª - Como doutamente explana o STA ”A fundamentação do ato administrativo é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, mas a fundamentação só é suficiente quanto permite a um destinatário normal aperceber-se do itinerário cognoscitivo valorativo seguido pelo autor do ato para proferir a decisão, isto é, quando aquele possa conhecer as razões por que o autor do ato decidiu como decidiu e não de forma diferente, de forma a poder desencadear os mecanismos administrativos ou contenciosos de impugnação”(AC STA de 18.12.2022, proc. 048366, in ww.dgsi.pt); 5.ª - Há que aferir então se foi possível à Autora, destinatária do ato de anulação, aperceber-se do itinerário cognoscitivo e valorativo efetuado pela entidade demandada, por tal forma que possam considerar-se cumpridas as três funções do dever de fundamentação; habilitar o interessado a optar pela impugnação do ato, a de assegurar uma ponderação das decisões e a de permitir um controlo judicial eficaz; 6.ª - Dos autos decorre que o Vice-Presidente do Conselho Diretivo considerou que a Autora teve conhecimento da fundamentação subjacente à decisão que determinou a reposição das quantias, através da notificação de “suspensão” e que esta deveria ser tida como revogação, encontrando-se assim cumprido o prazo de 1 ano que dispunham para a revogação dos atos; 7.ª - Não comprovando a Entidade Demandada do Réu que a Autora foi notificada, por ofício de 30/09/2008, do ato de suspensão...
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