Acórdão nº 01563/18.0BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 22 de Junho de 2022
Magistrado Responsável | JOSÉ GOMES CORREIA |
Data da Resolução | 22 de Junho de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Foi interposto recurso jurisdicional por A….
e B…., com os demais sinais dos autos, no Tribunal Central Administrativo Norte, visando a revogação da sentença de 29-06-2021, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou improcedente a impugnação judicial contra a liquidação de IRS de 2014, no montante global de € 9.900,91.
Irresignados, nas suas alegações, formularam os recorrentes A….
e B….
, as seguintes conclusões: A.
O processo de impugnação tem por objeto a liquidação oficiosa de IRS n.º 2015 5003707020, relativa ao ano de 2014, no montante global de € 9.900,91.
B.
Na douta sentença recorrida julgou-se improcedente a impugnação judicial deduzida pelos impugnantes, mantendo- se o ato de liquidação de IRS relativo ao ano de 2014.
C.
A decisão alicerçou-se na factualidade dada como provada, nomeadamente a que ficou a constar dos pontos 1) a 11) da matéria dada como provada.
D. Não colocando os recorrentes em causa os factos dados como provados na douta sentença recorrida, não podem concordar com o indeferimento do pedido, por considerarem que a douta sentença sofre de errada interpretação e aplicação da Lei.
E.
O Tribunal a quo cometeu um erro de enquadramento dos rendimentos, aplicando o artigo 31.º n.º 2 alínea b), ao invés do artigo 31.º n.º 2 alínea e) do CIRS.
F.
O Tribunal a quo considerou os rendimentos auferidos no exercício “de atividade de serviços prestados relacionados com a agricultura (CAE 01610)”, como integrando uma das atividades a que alude a tabela do artigo 151.º do CIRS, determinando, consequentemente, a aplicação do coeficiente de 0,75 previsto no artigo 31.º n.º 2 alínea b) do CIRS.
G.
A questão central a discutir consiste em saber qual o coeficiente aplicável aos rendimentos auferidos em 2014 pelos Impugnantes, se o coeficiente de 0,75 previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 31.º do CIRS ou o coeficiente de 0,10 previsto na alínea e) do n.º 2 do artigo 31.º do CIRS.
H.
O artigo 31.º, n.º 2, alíneas b) e e) do CIRS, na redação à data dos factos disponha o seguinte: “Até à aprovação dos indicadores mencionados no número anterior (indicadores objetivos de base técnico-científica), ou na sua falta, o rendimento tributável é obtido adicionando aos rendimentos decorrentes de prestações de serviços efetuadas pelo sócio a uma sociedade abrangida pelo regime de transparência fiscal, nos termos da alínea b) do artigo 6.º do CIRC, o montante resultante da aplicação dos seguintes coeficientes: b) 0,75 dos rendimentos das atividades profissionais constantes da tabela a que se refere o artigo 151.º; e) 0,10 dos subsídios destinados à exploração e restantes rendimentos da categoria B não previstos nas alíneas anteriores.” I.
A interpretação da Lei tem como primeiro limite o seu elemento literal, a partir do qual se impõe a descoberta do ratio legis.
J.
A LGT, através do seu artigo 11.º, estabelece as regras essenciais de interpretação das leis tributárias e, de acordo com as mesmas, dúvidas não restam que o coeficiente 0,75, previsto na alínea b) do n.º 2 do artigo 31.º do CIRS é aplicável aos rendimentos das atividades profissionais que constam da tabela, e a que alude o artigo 151.º do referido Código.
K.
Porquanto, da análise às atividades elencadas na tabela, facilmente se constata que o exercício de “atividades dos serviços relacionados com a agricultura e com a produção animal (CAE 01610)” não é suscetível de ser enquadrada em qualquer daquelas atividades a que se alude na tabela do artigo 151.º do CIRS.
L.
Assiste razão aos recorrentes, sendo de aplicar o coeficiente de 0,10 previsto no artigo 31.º n.º 2 alínea e) do CIRS, aos rendimentos por si auferidos a coberto do exercício de atividade não prevista na tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS.
M.
A douta decisão ao ter decidido que os rendimentos dos impugnantes fossem considerados na alínea b) do n.º 2 do artigo 31.º do CIRS, aplicando-lhe o coeficiente 0,75 e enquadrando-os na tabela do artigo 151.º, faz uma errada interpretação dos normativos legais e consequente aplicação do Direito.
N.
Aos rendimentos auferidos pelos impugnantes, em resultado dos serviços relacionados com a agricultura, deveria ser aplicável o coeficiente de 0,10 previsto no artigo 31.º, n.º 2, alínea e), do CIRS.
O.
Foi intenção do legislador com a norma prevista na alínea e) do n.º 2 do artigo 31.º do CIRS de não agravar a tributação dos subsídios destinados à exploração, bem como outros rendimentos de categoria B, não previstos nas alíneas anteriores.
P.
A aplicação dos coeficientes para determinação do rendimento tributável de serviços prestados, em sede de Categoria B com aplicação das regras do regime simplificado, efetua-se pela verificação da atividade realmente e especificamente exercida e não pela constatação do código que consta do cadastro das finanças (CAE).
Q.
Trata-se de uma situação em que se aplica o princípio de substância sobre a forma.
R.
A Lei n.º 82- E/2014 (Orçamento de Estado para 2015), ao aditar à redação do artigo 31.º n.º 2, alínea b), do CIRS, o advérbio “especificamente”, não é de molde a introduzir um regime inovatório, e, como tal, inaplicável aos exercícios que precediam essa alteração legislativa, outrossim reveste carácter declaratório, coincidindo o âmbito lógico de uma e outra, do que resulta ser o mesmo quadro normativo, quer antes, quer depois da alteração legislativa citada.
S.
A douta sentença recorrida socorre-se da interpretação da Circular 5/2014 para aplicar o artigo 31.º n.º2 b) do CIRS, no entanto, os Tribunais, enquanto órgãos de soberania, estão apenas vinculados à Lei, pelo que não os vincula quaisquer orientações administrativas de que decorra uma certa interpretação da mesma.
T.
Nestes termos, deverá a sentença ora recorrida ser revogada e substituída por douto Acórdão que considere a impugnação procedente.
Termos em que, Deve ser julgada provada e procedente a presente IMPUGNAÇÃO, revogando-se a sentença recorrida, assim se fazendo JUSTIÇA! Não foram apresentadas contra-alegações.
Por Decisão Sumária de 16/02/2022, ficou decidido declarar o Tribunal Central Administrativo Norte incompetente, em razão da hierarquia, para o conhecimento deste recurso jurisdicional e competente para o efeito, a Secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo (STA).
Neste Supremo Tribunal Administrativo, o Exmo. Procurador-Geral Adjunto, notificado nos termos do art. 146.º, n.º 1, do CPTA, pronunciou-se no sentido da improcedência do recurso, com os seguintes fundamentos: I. OBJECTO DO RECURSO 1. O presente recurso vem interposto da sentença do TAF de Braga, proferida a 29/06/2021, que julgou improcedente a ação de impugnação judicial intentada contra o ato de liquidação de IRS, relativo ao ano de 2014, no valor de € 9.900,91 euros.
Os Recorrentes insurgem-se contra o assim decidido, por considerar que a sentença recorrida padece do vício de erro de julgamento, por errónea interpretação e aplicação do disposto nos artigos 31º e 151º do CIRS.
Para o efeito alegam que «Facilmente se constata da análise às atividades elencadas na tabela, que o exercício de “atividades dos serviços relacionados com a agricultura e com a produção animal (CAE 01610)” não é suscetível de ser enquadrada em qualquer daquelas atividades a que se alude na tabela do artigo 151.º do CIRS. Deste modo, … sendo de aplicar o coeficiente de 0,10 previsto no artigo 31.º n.º 2 alínea e) do CIRS, aos rendimentos por si auferidos a coberto do exercício de atividade não prevista na tabela de atividades do artigo 151.º do CIRS».
Mais invocam em abono do seu entendimento o caráter interpretativo das alterações introduzidas ao artigo 31º, nº2, alínea b) do CIRS, pela Lei nº 82-E/2014, ao aditar o advérbio “especificamente”.
E terminam pedindo a revogação da sentença.
-
FUNDAMENTAÇÃO DA SENTENÇA.
2.1 Na sentença recorrida deu-se como assente que o Recorrente marido está registado com o CAE 01610 – “Atividades de serviços relacionados com a agricultura”, tendo na declaração de IRS relativa ao ano de 2014 feito constar no Anexo B, quadro 4B (rendimentos agrícolas, silvícolas e pecuários), o valor de € 59.073,00 euros, e na sequência da qual foi emitida pela AT a liquidação em que foi apurado imposto a pagar no valor de € 9.900,91 euros.
Mais se deu como assente que tendo o ato de liquidação sido impugnado graciosamente, o procedimento foi indeferido com o fundamento de que «tratando-se de prestação de serviços relacionados com Agricultura (CAE 01610) enquadráveis na alínea b) do nº1 do art. 3º do CIRS, os rendimentos encontram-se abrangidos pelo coeficiente de 0,75 constantes na alínea b) do nº1 do artº 31 do referido código» e de que «…dúvidas não restam de que a actividade do SP se enquadra na alínea b) do nº 1 do artº 31º e não na alínea e) do CIRS à data vigente aplicando-se assim o coeficiente de 0,75 em vez de 0,10 como pretende o recorrente».
2.2 Para se decidir pela improcedência da ação considerou o tribunal “a quo” que «….constando esta prestação de serviço, a que corresponde a actividade do impugnante, elencada na tabela a que se refere o artigo 151.º do Código do IRS, fica vedada, qualquer outra interpretação, que não seja a da aplicação do disposto no nº 2 da alínea b) do artigo 31.º do Código do IRS, à...
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