Acórdão nº 275/21.1T8TMR.E1 de Tribunal da Relação de Évora, 26 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelPAULA DO PA
Data da Resolução26 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Évora

Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Évora[1] I. Relatório Na presente ação de impugnação judicial da regularidade e licitude do despedimento que M.L.J.R.

intentou contra Templazul – Organização Hoteleira do Centro, S.A.

foi proferida sentença, com o seguinte dispositivo: « 4.1. Pelo exposto, decido: a) Julgar procedente a exceção de caducidade e declarar ilícito o despedimento da autora M.L.J.R. promovido pela sua entidade empregadora e aqui ré Templazul- Organização Hoteleira do Centro, S.A., b) Igualmente, na parcial procedência da reconvenção, condenar a R. a pagar à A.: - A indemnização de € 26.655,50 pelo despedimento; - A indemnização correspondente às retribuições que esta deixou de auferir desde a data do seu despedimento até ao trânsito em julgado da decisão do tribunal, que se relega para liquidação; - As retribuições devidas pelo comprovado trabalho suplementar prestado nos anos de 2016 a 2019, com dedução das 6 horas já pagas, que se relega para liquidação; - A compensação de € 388,50 devida pela formação profissional; - A indemnização de € 5.000 pelos danos não patrimoniais; - Os juros de mora vencidos desde as datas em que lhe deviam ter sido pagas as remunerações e os juros de mora vincendos sobre as restantes quantias acima indicadas desde a presente data e até integral pagamento, à taxa legal que estiver em vigor; c) Absolver a ré de tudo o mais o que foi peticionado pelo autor; d) Condenar a autora e a ré a suportarem o pagamento das custas na proporção do respetivo decaimento e sem prejuízo do decidido em sede de benefício de apoio judiciário; e, e) Fixar o valor da causa no montante peticionado de € 86.307,75 – art.º 98.º-P, do Código de Processo do Trabalho.

4.2. Notifique.

4.3. Uma vez que se desconhece se a autora auferiu subsídio de desemprego no período em causa, comunique com cópia ao I.S.S., para os fins tidos por convenientes.» A autora veio interpor recurso desta decisão, extraindo das suas alegações as seguintes conclusões: «1.

O presente recurso restringe-se a dois segmentos da decisão, a saber: Que o Dano existencial sofrido pela recorrente, decorreu de assédio moral; e Que o Trabalho suplementar, diuturnidades e descanso compensatório a liquidar em execução de sentença, tal como foi peticionado, não foi declarado na decisão recorrida; 2.

Quanto ao primeiro, entendemos – salvo melhor opinião – que os factos dados como provados, são suscetíveis de integrar o assédio moral, destacando-se os seguintes: • Autora foi admitida ao serviço da ré, por meio de contrato de trabalho a termo certo, no dia 20 de maio de 1991, com a categoria de aprendiz de hotelaria, com horário de trabalho das 8h às 17h, almoço das 12h às 13h e folga de meio-dia de terça e quarta-feira todo o dia; • Em maio de 1992, passou a exercer as funções inerentes à categoria profissional de empregada de mesa de 2.ª; • A partir daí, passou a ter o seguinte horário: das 7h às 12h; das 12h30m às 14h30m e das 19h30m às 22h30m, com folga ao domingo e segunda.

• Em fevereiro de 2003, A. e R., acordaram um novo horário de trabalho, a saber: terça a sábado, entre as 7h e as 15h30m, com folga ao domingo e à segunda-feira; • Em fevereiro de 2003, A. e R., acordaram um novo horário de trabalho, a saber: terça a sábado, entre as 7h e as 15h30m, com folga ao domingo e à segunda-feira; • No dia 25 de julho de 2019, o Diretor do Hotel disse aos trabalhadores, entre os quais a autora, que ou faziam o que ele queria ou estavam todos fodidos (SIC) consigo, pois punha os trabalhadores todos na rua e fazia como no Lago Azul que foi despedir a prima da patroa; • No dia 12 de setembro de 2019, o Diretor do Hotel voltou a convocar uma nova reunião de trabalhadores, para falar sobre alteração dos horários de trabalho, folgas e outros assuntos, e disse aos trabalhadores “têm que fazer o eu quero e como eu quero” e “só folgam consoante o trabalho”; • O Diretor do Hotel perguntou à autora se aceitava trabalhar com horários semanais; • Esta respondeu-lhe que não, porque tem família, e necessita de saber antecipadamente o seu horário e a as suas folgas, para poder planificar a sua vida; • Como resposta ouviu daquele, que a “punha na rua” com três processos disciplinares, por faltas injustificadas; • O Diretor disse-lhe que, a partir desse dia, tinha que cumprir o horário que nele constava, passando a folgar à terça e quarta-feira; • No dia 5 de outubro de 2019, a ré colocou uma carta timbrada do hotel, por baixo da porta da casa da autora, que esta não abriu, por entender não ser esta a forma adequada de comunicar, devolvendo-a; • A autora esteve baixa médica desde o dia 5 de outubro de 2019 até ao dia 24 de agosto de 2020; • No dia 8 de setembro de 2020, o Conselho de Administração da ré Templazul, S.A., decidiu instaurar procedimento disciplinar à autora M.L.J.R., com intenção de despedimento; 3.

A este propósito o Senhor Juiz escreveu: “Não há dúvida que tal comportamento por parte de uma pessoa com funções de grande responsabilidade na ré – além de incompreensível no âmbito laboral, é de lastimar num sector que deveria primar pelo profissionalismo e pelas boas práticas – revela o início do comprometimento da subsistência da relação laboral.

  1. “No caso dos autos, tendo a ré acordado individualmente com a autora o horário de trabalho, não podia haver lugar à sua alteração unilateral. Aliás, só assim se percebe a postura do novo Diretor do Hotel a propósito da questão dos horários de trabalho: a força do direito deve ceder ao direito da força. O que desde logo provoca o desmoronamento da argumentação da empregadora sobre incumprimento dos tempos de trabalho e faltas.” 5.

    “(…) É necessariamente desvalorizado pela própria conduta da ré que já andava há muito tempo a pressionar, condicionar e, possivelmente, provocar este tipo de incidentes, nomeadamente com a referida conduta do seu Diretor de Hotel.” 6.

    “Não há dúvida que tal comportamento por parte de uma pessoa com funções de grande responsabilidade na ré – além de incompreensível no âmbito laboral, é de lastimar num sector que deveria primar pelo profissionalismo e pelas boas práticas – revela o início do comprometimento da subsistência da relação laboral. Além disso, tal comportamento, também é apto e idóneo a condicionar e a perturbar a vida e as decisões dos trabalhadores, como é o caso da autora.” A autora não demonstrou que os factos ocorridos em 2019 tenham sido a causa da doença que motivou a baixa. Aliás, os factos extraordinários sempre exigiriam provas extraordinários.” 7.

    “Os factos ocorridos em 2019, apesar de inquestionavelmente sérios e deploráveis, muito dificilmente seriam aptos a casuar um extensíssimo período de doença, particularmente porque que ocorreram num contexto de litígio eminentemente laboral e não pessoal.” No caso dos autos, encontram-se demonstrados factos suficientes para a atribuição à A. de uma indemnização pelos danos não patrimoniais sofridos.” 8.

    “Basta atentarmos na conduta da ré ao longo do tempo em que manteve o litígio laboral para se reconhecer a sua relevância, sendo de destacar a persistência e repetição do comportamento abusivo por parte da empregadora.” 9.

    “São incómodos e perturbações que, pela sua natureza, extensão e duração, merecem a tutela do direito.” 10.

    “Na verdade, os factos apurados não podem ser considerados isoladamente, mas sim em função da sua interdependência.” 11.

    “Por conseguinte, tendo presente as disposições legais em sede de obrigação de indemnização (art.º 562.º a 564.º e 496.º, do Código Civil), o circunstancialismo evidenciado pela matéria de facto, decido arbitrar à A. a compensação global de €5.000 pelos danos não patrimoniais sofridos.”.

  2. Na verdade, a prova não evidencia comportamentos isolados, pelo contrário, foram repetidos, e tiveram a capacidade de hostilizar o ambiente de trabalho da autora, alterando-lhe as relações com os colegas e principalmente depreciaram a perceção que ela tem de si, como trabalhadora e como pessoa.

  3. A recorrente começou a perceber a malicia e a maldade do seu superior hierárquico e de que estava a ser alvo, a partir da famigerada reunião de 25 de julho de 2019.

  4. Humilhada e vexada, por tal comunicação, sentiu-se afetada psicologicamente, pois percebeu que o Diretor a quis magoar e prejudicar.

  5. E quando no dia 29 de setembro de 2019, o Diretor lhe disse, que a partir desse dia, teria de cumprir o horário que nele constava, passando a folgar à terça e quarta-feira e não ao domingo e 2ª feira como sempre acontecera, “mostrou quem manda”, caindo por terra a feliz expressão do Senhor Juiz.

  6. Afinal a força do direito cedeu ao direito da força! 17.

    Não conseguindo “quebrar-lhe a espinha”, o Diretor ordenou que colocassem uma carta timbrada do hotel, com o seu “novo horário”, por baixo da porta da sua casa, que não abriu, devolvendo-a.

  7. Não nos esqueçamos, que estamos a falar do Hotel dos Templários, prestigiada unidade hoteleira, que mereceu na sua inauguração há muitos e muitos anos, o presidente da nação.

  8. E como bem escreveu o Meritíssimo Juiz, a autora não revelou um perfil facilmente impressionável ou particularmente suscetível às desmandas do empregador.

  9. De facto, foi a sua força e raça, que permitiu que o primado da força não prevalecesse sobre a sua dignidade de mulher e a sua condição de trabalhadora.

  10. Mas pagou um preço elevado: “não lhe partiram a espinha”, mas chegou o momento em que as suas forças soçobraram e então caiu na fragilidade inerente à sua condição, adoecendo! 22.

    No dia 5 de outubro de 2019, entrou de baixa médica, que manteve até 24 de agosto de 2020, conforme documentos que foram juntos à P.I., sob os nºs 4; 23.

    Os relatórios médicos, juntos sob os docs. nº 13º a 16º, estabelecem o nexo de causalidade, entra a conduta da empregadora e a doença da trabalhadora, ao declararem “perturbação depressiva, relativa a problemas laborais” 24.

    O Senhor Juiz não se pronunciou sobre eles, afirmando “(…) a autora não demonstrou que os factos...

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