Acórdão nº 0407/13.3BEPNF de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 19 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelSUZANA TAVARES DA SILVA
Data da Resolução19 de Maio de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam na Secção do Contencioso Administrativo do Supremo Tribunal Administrativo: I – Relatório 1 – A……………….

, com os sinais dos autos, propôs no Tribunal Administrativo e Fiscal de Penafiel (TAF de Penafiel), em 18 de Julho de 2013, acção administrativa especial, contra o Município de Baião, na qual formulou o seguinte pedido: “[…] Nestes termos, e nos melhores de direito que V. Ex.ª doutamente suprirá, se requer mui respeitosamente se digne: A) Anular o acto administrativo praticado a 24 de Maio de 2013 pela Câmara Municipal de Baião, de ordem de retirada de marcos de delimitação da propriedade da Autora; B) Reconhecer à Autora o direito livremente delimitar a sua propriedade, mesmo tratando-se, o que não se concede, de uma zona non aedificandi segundo a CMBaião; C) Reconhecer o direito da Autora, de numa parte do seu terreno com 30 metros que confronta com um leito de terra batida e que se limita a dar acesso a uma propriedade privada, de construir um muro de vedação no limite da propriedade, uma vez que não se trata de uma zona non aedificandi e segundo a Câmara Municipal de Baião não existir interesse público; D) Reconhecer o direito da Autora de na parcela de terreno com 70 metros, que confronta com um caminho municipal, de construir um muro de vedação em pedra no limite da sua propriedade, uma vez que a Ré tem permitido a edificação de muros em betão por todo o concelho, estribada no artigo 60.º, n.º 2 da Lei 2110 de 19.08.1961 (princípio da igualdade de tratamento) e tal edificação não causar qualquer embaraço ao trânsito automóvel naquela artéria municipal; E) Condenar a Ré a indemnizar a Autora pelos gastos que a mesma suportou com a edificação do muro de vedação, bem como com os prejuízos e outros encargos que a Autora desembolsou com todo o processo administrativo que melhor se quantificarão em liquidação de sentença.

F) Condenar a Ré em custas judiciais e procuradoria condigna […]».

2 – Por sentença de 23 de Abril de 2018 foi a acção julgada parcialmente procedente, designadamente o pedido formulado pela A. sob a alínea C), tendo-lhe sido reconhecido o direito a construir um muro de vedação no limite da sua propriedade, na parte em que esta confronta com um caminho a Leste.

3 – Inconformada a A. recorreu daquela decisão para o TCA Norte, que, por acórdão de 18 de Dezembro de 2020, negou provimento ao recurso.

4 – Inconformada com o acórdão, a A. interpor recurso de revista para este Supremo Tribunal Administrativo, que, por acórdão de 4 de Novembro de 2021, admitiu a revista.

5 – A A. e aqui Recorrente apresentou alegações que rematou com as seguintes conclusões: «[…] 25. Salvo o presente recurso vem interposto, pela Autora A…………., da sentença proferida pelo Mmo. Juiz a quo, que: (a) julgou improcedente o pedido de anulação do despacho de 24.05.2013, que ordenou a retirada, por parte da autora, dos marcos por si colocados; (b) julgou procedente o pedido formulado pela autora sob a alínea C), reconhecendo-lhe o direito a construir um muro de vedação no limite da sua propriedade, na parte em que esta confronta com um caminho a leste; (c) julgou improcedentes todos os restantes pedidos formulados pela autora, absolvendo nomeadamente o Município da indemnização peticionada em E) do petitório.

  1. A decisão da Mmo. Juiz a quo, aqui posta em causa, não foi acertada, nem bem fundada no que respeita a várias questões de direito suscitadas nos autos.

  2. Entende a aqui Recorrente que, a ser decididas, devidamente, as questões de direito em apreciação nos autos, se impunha/se impõe, com o devido respeito, que a presente acção seja julgada procedente, por provada, devendo o réu Município ser condenado em todos os pedidos contra ele formulados, excepto o pedido E) [alínea c) das “Questões a Decidir” da douta sentença a quo].

  3. A Autora/ Recorrente pretende, em primeiro lugar, a anulação do despacho de 24 de Maio de 2013, que ordenou a retirada dos marcos de delimitação da sua propriedade. Além disso, a Autora/ Recorrente pretende, também, que o tribunal lhe reconheça o direito de delimitar livremente a sua propriedade, mesmo tratando-se de uma zona non aedificandi, bem como o direito de, na parte do seu terreno que confronta com um leito de terra batida e se limita a dar acesso a uma propriedade privada, construir um muro de vedação, por não se tratar de uma zona non aedificandi. A autora pede ainda, com relevância para o presente recurso, que o tribunal lhe reconheça o direito a construir um muro em pedra no limite da sua propriedade.

  4. A interpretação jurídica dada pelo Réu às regras relativas à servidão non aedificandi e à vedação de propriedades confinantes com vias municipais, constantes da Lei n.º 2110, de 19.08.1961, que foi sufragada na douta sentença a quo, levaria à criação das condições para a apropriação, pelo decurso do tempo, de tais faixas de terreno, sem qualquer indemnização, algo evidentemente inconstitucional.

  5. Uma solução jurídica que não permita a vedação, qualquer tipo de vedação, mais ou menos sólido (não se diz permanente, pois este conceito tem que ver com a finalidade da construção e não com a sua solidez), de um terreno confinante com a via pública junto a tal limite é uma solução que conduzirá, com o tempo, à perda dessa faixa de terreno a favor do domínio público e sem qualquer indemnização para o proprietário.

  6. Esta solução jurídica é inconstitucional por violação do disposto no art. 62.º, nº 2 da CRP, que impõe indemnização a todo o acto ablativo de propriedade, inconstitucionalidade que se invoca para todos os efeitos.

  7. O Tribunal a quo identifica, correctamente, quais os concretos artigos daquela Lei aplicáveis ao caso: os arts. 43.º e segs. e sobretudo artigos 58º e 60º daquela Lei n.º 2110, de 19.08.1961.

  8. O que o Tribunal a quo faz, todavia, uma incorrecta interpretação dos artigos em causa, dos princípios a eles subjacentes.

  9. Não está em causa no presente acção, nem nunca esteve, quais sejam os limites da propriedade da Autora/Recorrente, até porque os mesmos não serviram de fundamento ao despacho em crise, nem em momento algum, o Réu/ Recorrido impugna ou põe em causa esses limites, tal como definidos pelos marcos de delimitação ali implantados, quer seja no limite a Norte, com cerca de 70 metros, quer seja no seu limite Leste, com cerca de 30 metros, confrontante com o caminho conhecido por “Caminho do………” (e a propósito do qual a douta sentença a quo faz a observação que aqui se transcreveu).

  10. Começamos pelo julgamento feito na douta sentença a quo quanto aos pedido D) e B) da Autora/ Recorrente, julgados improcedentes, porque a argumentação ali seguida quanto ao sentido do disposto no artigo 60º, parágrafo 2º, da Lei 2110 de 19.08.1961, sendo errada, está na base daquilo que foi, também, a errada abordagem jurídica feita quanto aos demais pedidos também eles julgados improcedentes.

  11. uma correcta interpretação do disposto no artigo 60º, parágrafo 2º, da Lei 2110 de 19.08.1961, conjugado com o princípio da proporcionalidade, levará necessariamente a uma decisão diferente quanto a alguns dos pedidos julgados improcedentes.

  12. QUANTO AO RECONHECIMENTO DO DIREITO À DELIMITAÇÃO DA PROPRIEDADE E À CONSTRUÇÃO DE MUROS DE VEDAÇÃO NO LIMITE DA PROPRIEDADE [questão a decidir b)].

  13. Pedido D): O pedido para reconhecer o direito da Autora de na parcela de terreno com 70 metros, que confronta com um caminho municipal, de construir um muro de vedação em pedra no limite da sua propriedade, uma vez que a ré tem permitido a edificação de muros de betão por todo o concelho, estribada no art. 60º n.º 2 da Lei 2110 de 19.08.1961 (princípio da igualdade de tratamento) e tal edificação não causar qualquer embaraço ao trânsito automóvel naquela artéria municipal.

  14. A Autora/ Recorrente estribou esta sua pretensão no artigo 60º, parágrafo 2º, da Lei 2110 de 19.08.1961, no facto de o Réu ter permitido a edificação de muros de betão por todo o concelho (princípio da igualdade de tratamento) e ainda na circunstância de tal edificação não causar qualquer embaraço ao trânsito automóvel naquela artéria municipal [alínea D) do petitório].

  15. Atenta esta exigência legal de provisoriedade das vedações, conclui a douta sentença que «dificilmente se concebe que um “muro em pedra”, constitua uma vedação provisória, admissível à luz do regime legal.» 41. A douta sentença a quo considerou, pois, que era ilegal a pretensão da Autora/ Recorrente de construir um muro em pedra, que considera ser um muro não provisório e ainda que não cabe invocar o princípio da igualdade na ilegalidade.

  16. É esta errada interpretação dada na sentença e acórdão a quo relativamente ao sentido da expressão “vedação provisória” que o leva a concluir, erradamente, pela ilegalidade ou falta de fundamento do presente pedido da Autora/ Recorrente, bem como da generalidade das suas restantes pretensões.

  17. Qual seja a correcta interpretação da expressão “vedação provisória” é, pois, o cerne do presente recurso e o critério para avaliar do acerto da douta sentença quanto à generalidade dos pedidos da Autora/ Recorrente.

  18. A provisoriedade da vedação de que fala a norma em causa não diz respeito ao tipo de construção (ao concreto tipo de construção do muro/ vedação), ao “carácter de permanência” da construção, como sugere a douta sentença a quo, mas antes à sua condicionalidade (resolutiva), à sua provisoriedade temporal: decidido que seja o alargamento da via a vedação terá de ser removida, sem direito a indemnização.

  19. O adjectivo “provisória” com que a norma designa a vedação (que é por ela permitida) nada tem que ver com o conceito de “permanência” (como seu antónimo) que a douta sentença usa para qualificar o tipo de muro (em pedra) pretendido pela Autora/ Recorrente, na medida em que qualquer vedação que se imagine, por mais aligeirada que seja, terá sempre carácter de permanência, no sentido jurídico do termo: implantação ao solo através de elementos vários que permitam a sua fixação ou ligação ao solo dos vários...

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