Acórdão nº 1836/21.4T8VCT.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 11 de Maio de 2022

Magistrado ResponsávelPAULO REIS
Data da Resolução11 de Maio de 2022
EmissorTribunal da Relação de Guimarães

Acordam na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães: I. Relatório S. M.

intentou em 20-06-2021 ação de divórcio sem consentimento do outro cônjuge contra M. A.

pedindo que seja decretado o divórcio entre ambos com base na rutura definitiva do casamento.

Foi realizada a tentativa de conciliação, sem sucesso.

O réu foi citado para contestar, o que veio a fazer, pugnando pela improcedência da ação.

Foi realizada audiência prévia na qual foi proferido despacho saneador e fixado o objeto do litígio com enunciação dos temas da prova.

Realizou-se a audiência final, após o que foi proferida sentença julgando a ação improcedente Inconformada com esta decisão dela recorreu a autora, pugnando no sentido da revogação da sentença.

Termina as respetivas alegações com as seguintes conclusões (que se transcrevem): «1. A Recorrente/Apelante não concorda com a decisão em crise, proferida pelo tribunal a quo, porquanto padece a mesma da mais elementar sustentação legal, entendendo pois que deveria o pedido de divorcio formulado ter tido total procedência.

  1. Foram alegados pela recorrente factos cuja amplitude/expressividade integram a previsão legal da alínea d) do artigo 1781.º do Código Civil, factos esses cuja prova logrou a Autora/ Recorrente alcançar.

  2. O Tribunal a quo ao decidir como decidiu afastou-se do melhor enquadramento jurídico da causa e dos pressupostos fáticos alcançados pela prova testemunhal e documental junta aos autos, existindo por isso erro na apreciação da prova produzida nos autos. 4. Não foram atendidos pelo tribunal a quo, factos que provam, sem margem para duvidas, a rutura definitiva dos laços matrimoniais que uniram em tempos Recorrente e Recorrido.

  3. Ficou provado que, recorrente e recorrido discutiam regularmente, concomitantemente, na presença das três filhas do casal na altura ainda menores.

  4. Também resultou da prova produzida que o Recorrido, desde há vários anos, não demonstra afeto, respeito e lealdade pela Recorrente, provocando-lhe sentimentos de mal-estar, angústia, sofrimento e até, decorrentes das atitudes agressivas perpetradas pelo Recorrido - de entre as quais existe ainda a correr termos no DIAP de Ponto de Lima, um processo crime por suspeitas da pratica pelo recorrido contra a recorrente de um crime de violência doméstica-processo n.º 84/21.8GAPTL cuja certidão consta dos autos.

  5. Tais atitudes do recorrido contra a recorrente são o verdadeiro culminar e efeito de rutura deste casamento, agora movido pelo medo e pavor, e face à sentença proferida e ora recorrida, de tremenda injustiça, sentimentos claramente demonstrativos de que inexiste qualquer proximidade afetiva entre o ainda casal.

  6. A situação de rutura não é, de todo, passageira e passível de emenda, como pretendeu o tribunal a quo querer demonstrar com a sentença proferida, obrigando a recorrente a continuar “presa” a um casamento que já não deseja e que tanto mal lhe tem feito.

  7. Para que se verifique o fundamento previsto na alínea d) do artigo 1781.º do Código Civil demonstrativo é que, perante os factos provados, seja possível ao Tribunal asseverar com segurança que o vínculo/laço matrimonial/conjugal está destruído, e que essa situação não é passageira, mas antes real e consolidada, inexistindo quaisquer perspetiva de ser remediada, sendo irremediável a ruptura do casamento tal como bem refere a nossa jurisprudência - ibidem Acórdão do STJ, Proc. n.º 8992/14.6T8LSB.L1.S1, de 09.01.2018.

  8. Tanto do articulado da Autora/Recorrente, como da prova testemunhal e ainda da prova documental produzida, designada e especificamente da Certidão emitida pelo Ministério Público do Tribunal da Comarca de Viana do Castelo – DIAP – Secção de Ponte de Lima, a atestar a existência de processo crime de violência doméstica contra cônjuge, praticado em 11.04.2021, que nessa secção do DIAP se encontra a correr termos sob o proc. n.º 84/21.8GAPTL, datada de 27.10.2021, e ainda do Relatório da Perícia de Avaliação do dano corporal em Direito Penal, elaborado pelo Gabinete Médico-Legal e Forense do Minho-Lima, datado de 16.04.2021, resulta piamente que a Recorrente e o Recorrido se desentendem constantemente, mesmo na presenças das filhas do casal, gerando muito mal-estar entre o casal e até agressões testemunhadas pelas filhas e do conhecimento quer do seio familiar da recorrente quer do recorrido.

  9. Este casamento deixou de ser/ constituir o centro de realização pessoal para a Recorrente, pois que a angústia, sofrimento e medo que a mesma sente não deixam mais lugar para haver afeto entre a mesma e o Recorrido.

  10. Aliás, é a própria Recorrente que, no uso da palavra em sede de audiência e discussão de julgamento, expressa a vontade de não permanecer mais casada com o Recorrido, por força de toda a situação de conflito e de falta de proximidade, de confiança e de amor existente entre ambos – situação que já dura desde há anos, apesar da separação de facto apenas ter ocorrido em Abril de 2021, e que apenas lhe traz tristeza, sofrimento, medo, repulsa e que muito a aflige.

  11. A acrescer a tudo isto, existe a constante violação do dever de respeito e de cooperação do Recorrido para com a Recorrente, que se constatou nos autos – pese embora a sentença faça tábua rasa de tal questão – na violação do dever de fidelidade por parte do Recorrido, tendo resultado provado que o mesmo, pelo menos uma vez, traiu a Recorrente com outra mulher! 14. A verdade é que o Recorrido teve um relacionamento afetivo com uma terceira pessoa – conforme a testemunha J. S. asseverou, porque ouviu o Recorrido a assumir essa traição de viva voz – o que é absolutamente incompatível com o casamento.

  12. Situação essa que, ainda que de forma subtil, o próprio recorrido assumiu em julgamento ao confirmar que chegou a trocar mensagens com outras mulheres enquanto esteve emigrado em França.

  13. Dúvidas não restam acerca da violação do dever de fidelidade por parte do Recorrido em relação à Recorrente, e consequentemente, também, por força dessa circunstância se verifica a ruptura definitiva deste casamento que ainda persiste entre a Recorrente e a Recorrida.

  14. A Recorrente referiu, expressamente que não pretende reatar a relação de comunhão de vida com o Recorrido, pelo que, em face disto e em face da prova carreada para os autos, competia ao Tribunal a quo decidir no sentido de ser decretado o divórcio entre ambos – Recorrente e Recorrido -, pois, como não pode aquele Tribunal ignorar, não é possível – ou pelo menos é extremamente difícil – construir a harmonia familiar sobre o sacrifício e o mal-estar de algum dos seus membros.

  15. Existem in casu, motivos mais do que suficientes e concretos para que se declare findo e se dissolva o casamento entre a Recorrente e o Recorrido por incumprimento dos mais elementares e essenciais deveres conjugais por parte do recorrido.

  16. Resulta ainda suficientemente provada, em nosso entender, a embriaguez habitual, persistente ou mesmo frequente do requerido que põe em causa a subsistência da própria sociedade conjugal, afetando a dignidade e estabilidade desta relação conjugal.

  17. Como se pode perceber dos testemunhas prestados, o Recorrido é uma pessoa de difícil trato, que responde com exaltação a uma contrariedade, que usa expressões ameaçadores contra a Recorrente, que a mesma claramente entende como uma ameaça de possível agressão física ou mesmo uma agressão psicológica, o que, mais uma vez, evidentemente desemboca numa patente violação do dever de respeito, e que sustenta a situação de ruptura definitiva deste casamento.

  18. Esta constante ameaça por parte do Recorrido perante a Recorrente, gera na mesma um medo imediato e condiciona em muito a sua liberdade de agir e as suas atuações no futuro, porque a Recorrente sente que está sempre associada às mesmas, uma punição por parte do Recorrido.

  19. Ora, não pode haver dúvidas de que, efetivamente, o Recorrido usa da ameaça e da intimidação constante para obter da Recorrente aquilo que quer/pretende.

  20. O Recorrido pelo recurso da força e da ameaça exige da sua ainda esposa, Recorrente, os comportamentos e atitudes que o próprio quer, independentemente se tais comportamentos são licitos e são da livre vontade da Recorrente ou a que grau de sacrifício for para esta.

  21. O dever de respeito mútuo dos cônjuges é o mais importante dos deveres conjugais e poderá definir-se como o dever que recai sobre cada um deles de não praticar actos que ofendam a integridade física ou moral do outro.

  22. Contudo, e como resulta das declarações da Recorrente, não foram só estas atitudes ameaçadores e de puro desrespeito pela integridade psicológica da Recorrente que o Recorrido incorreu na violação do dever conjugal de respeito e também da própria sociedade conjugal.

  23. Veja-se que o constante estado de embriaguez do Recorrido foi também aquilo que vulgarmente se chama de “pé de cabra” da ruptura definitiva deste casamento.

  24. Estado de embriaguez esse que se verificava quer enquanto o recorrido estava emigrado (nas conversas telefónicas que o ainda casal tinha) quer quando vinha a Portugal de férias e por fim mesmo após o seu regresso a Portugal.

  25. Estado e condição esse que o recorrido não admite ter e tão pouco mudar, pois que para ele “está tudo bem como está”, não se importando com a vida que dá á sua ainda mulher e nem se importando com os danos que certamente causou e causa nas suas filhas que a vários episódios de embriaguez atestaram assistir.

  26. E como se tudo isto já não bastasse e fosse suficientemente triste para a Recorrente, ainda foi a mesma sujeita a vivenciar o penoso episódio do dia onze de Abril de 2021, em que o Recorrido, após tentar partir os produtos da Y que a Recorrente tinha para vender e de o Recorrido ter discutido e gritado com a Recorrente, enquanto a mesma se encontrava barricada no quarto com as três filhas do casal, ainda, conforme e usando a exacta expressão da Recorrente: “Meteu-me a mão ao pescoço, no dia onze”.

  27. Episódio esse em que o Recorrido usou claramente...

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