Acórdão nº 01436/21.9BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 04 de Maio de 2022
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 04 de Maio de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 1436/21.9BELRS 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada como Recorrente, não se conformando com o acórdão proferido em 10 de Fevereiro de 2022 (Disponível em http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/-/28c3e9166b459894802587e900407f84.
) nos presentes autos pelo Tribunal Central Administrativo Sul – que, negando provimento ao recurso por ela interposto, manteve a sentença do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou procedente a reclamação judicial deduzida pela sociedade acima identificada como Recorrida ao abrigo do art. 276.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT) contra o acto de transferência para a conta da exequente, a ora Recorrente, do montante que lhe foi penhorado no âmbito do processo de execução, instaurado contra ela para cobrança coerciva de dívidas relativas a uma tarifa de ligação de um imóvel à rede pública de saneamento –, interpôs recurso de revista excepcional, nos termos do art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT).
1.2 A Recorrente apresentou as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «1.ª Com o presente recurso de revista pretende a Recorrente obter uma melhor aplicação do direito, bem como obter pronúncia sobre uma questão com relevância jurídica e social de importância fundamental (concretamente a lesividade e legalidade da transferência para a conta da Recorrente/órgão de execução fiscal de montante anteriormente penhorado e depositado em conta bancária; e subida imediata da reclamação), temática esta que é bastante recorrente na relação AT-contribuintes e, por conseguinte, tem significativa capacidade de ser replicada e que não tem sido muito abordada pela jurisprudência.
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A situação de facto em causa (se o acto de transferência de saldo penhorado é ou não um acto lesivo, bem como a consequência das duas reclamações pendentes em Tribunal face ao novo n.º 8 do artigo 278.º do CPPT) nunca foi tratada por um Tribunal superior.
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O presente recurso preenche os requisitos previstos no n.º 1 do artigo 285.º do CPPT, pelo que se encontra em condições de ser recebido na apreciação liminar sumária prevista no n.º 6 do mesmo normativo.
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A sentença recorrida considerou que a reclamação deveria subir de imediato por verificação de prejuízo irreparável e a Recorrente, no recurso interposto para o TCAS, sustentou que a Recorrida não tinha alegado e muito menos provado qualquer prejuízo irreparável (e percebe-se que assim seja porque se o montante já estava penhorado a Recorrida não podia fazer uso do mesmo), tendo o acórdão recorrido (sem se pronunciar directamente sobre este fundamento do recurso) aditado que equivale a prejuízo irreparável a perda de utilidade da reclamação em caso de não subida imediata.
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Analisado o acórdão do STA de 15.02.2012 invocado no acórdão recorrido confirma-se que a reclamação não poderia ter subida imediata, pois naquele arresto apela-se a uma ideia de irreversibilidade dos bens, o que não sucede neste caso (por a transferência do saldo de um montante penhorado de uma conta para a outra não ser irreversível), tendo, por isso, o acórdão recorrido incorrido em erro de julgamento de direito, concretamente do artigo 278.º/n.ºs 1 e 3 do CPPT.
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O acto reclamado não causa qualquer prejuízo à Recorrida, pois, salvo melhor opinião, é uma mera operação material, de execução de anterior acto administrativo (o acto que ordena a penhora).
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A situação patrimonial da Recorrida mantém-se totalmente inalterada em caso de procedência da reclamação (com a única diferença do montante penhorado ficar guardado à ordem de uma instituição bancária ou da Exequente), razão pela qual não se verifica qualquer lesão nos direitos ou interesses da Recorrida.
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O acto objecto de reclamação não é lesivo e ao decidir em sentido contrário o acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento de Direito, concretamente do artigo 276.º do CPPT e do artigo 51.º do CPTA.
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O artigo 223.º do CPPT, na versão aplicável aos autos (anterior à Lei n.º 7/2021, de 26.02), não regula a situação em causa, ou seja, nada dispõe sobre a possibilidade do credor/exequente requerer a transferência para si de montantes penhorados ao devedor que se encontrem em instituições bancárias e, por conseguinte, ao não proibir o acto praticado pela Recorrente a sua actuação não se afigura ilegal.
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O acórdão recorrido julgou o acto em apreço ilegal por violação dos artigos 52.º da LGT, 169.º e 278.º/n.º 6 do CPPT; no entanto, estas normas visam regular outras situações (a existência de outras reclamações pendentes de outros actos praticados) e não a que está aqui em causa (o objecto aqui é um acto concreto que a Recorrida reputa de ilegal).
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Os acórdãos do STA de 21.02.2018 e de 30.09.2020 invocados pelo acórdão recorrido em seu favor não se aplicam a este caso (em que está em causa apenas a transferência para conta da Recorrente do montante penhorado), pois os mesmos dizem respeito à aplicação no pagamento coercivo de um montante penhorado e à legalidade do pedido de novas penhoras na pendência de uma reclamação.
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Face ao vazio normativo do artigo 223.º do CPPT seria caso de aplicar, subsidiariamente, o disposto nos artigos 227.º, 228.º/n.º 2 e 229.º/n.º 2 do CPPT, pois nestes casos – penhora de quantias – o legislador previu a transferência imediata dos montantes para o órgão de execução.
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Inexistindo diferença substantiva entre todas as situações (na verdade são iguais no sentido de se tratar de penhoras sobre dinheiro), considera-se que é de aplicar à penhora de depósitos bancários as normas dos artigos 227.º, 228.º/n.º 2 e 229.º/n.º 2 do CPPT, pelo que se reforça o entendimento da legalidade da actuação da Recorrente.
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O acórdão recorrido incorreu em erro de julgamento de direito, concretamente dos artigos 52.º da LGT e 169.º, 223.º e 278.º/n.º 6 do CPPT.
TERMOS EM QUE deve o presente recurso ser julgado procedente, revogando-se o douto acórdão recorrido e substituindo-o por outro que julgue a reclamação totalmente improcedente, assim se fazendo inteira JUSTIÇA».
1.3 A Recorrida apresentou contra-alegações, com conclusões do seguinte teor: «I. A Recorrente faz uma utilização errónea e abusiva da válvula de segurança que representa o regime recursivo previsto no artigo 285.º do CPPT...
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