Acórdão nº 5999/20.8T8SNT-B.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 21 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelROSA TCHING
Data da Resolução21 de Abril de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA 2ª SECÇÃO CÍVEL *** I. Relatório 1. A sociedade Enthusiastic Mermaid Unipessoal, Lda., com sede na Avenida do Brasil, 43, 3.º Dtº., Sala 2, 1700-062 Lisboa, intentou ação executiva para pagamento de quantia certa contra AA, BB, CC, DD e EE, dando à execução duas livranças subscritas pela sociedade Penaferrim - Construções e Urbanizações, Lda. e avalizadas pelos executados, com vencimento em 03/07/2017 e emitidas pelos valores de € 520.746,28 e de € 116.800, respetivamente.

Alegou, para tanto e em síntese, que é legítima portadora das livranças dadas à execução, por efeito de cessão dos créditos subjacentes aos referidos títulos executivos e que a sociedade mutuária e subscritora das mencionadas livranças-caução veio a ser declarada insolvente no âmbito do processo n.º 18267/12...., que corre os seus termos no Juiz ... do Juízo do Comércio ....

  1. Citados, vieram os executados BB, CC e EE, deduzir, por apenso, a presente oposição à execução, mediante embargos de executado, invocando as exceções da “prescrição da livrança dada à execução”, do “abuso de direito” e da “iliquidez da obrigação exequenda”.

  2. A exequente contestou, pronunciando-se sobre as exceções invocadas e pugnando, a final, pela improcedência da oposição.

  3. Foi proferido saneador-sentença, com data de 17.03.2021, que julgou improcedente a exceção da prescrição da livrança exequenda bem como o abuso de direito invocado pelos embargantes executados.

    Concluiu, porém, pela procedência da exceção de inexequibilidade dos títulos executivos, por iliquidez das obrigações exequendas e, consequentemente, julgou procedente a oposição.

  4. Inconformada com esta decisão, na parte em que julgou procedente a exceção de inexequibilidade dos títulos executivos, por iliquidez das obrigações exequendas, dela apelou a exequente para o Tribunal da Relação ..., tendo os executados interposto recurso subordinado.

  5. O Tribunal da Relação ..., por acórdão proferido em 4 de novembro de 2021, decidiu: a) julgar improcedente o recurso subordinado, confirmando a decisão recorrida na parte em que julgou improcedente a exceção da prescrição da livrança exequenda bem como o abuso de direito invocado pelos embargantes executados; b) julgar procedente o recurso principal e, revogando a sentença recorrida, julgar improcedente a exceção de inexequibilidade dos títulos cambiários dados à execução e determinar o prosseguimento dos ulteriores e normais termos dos presentes autos de oposição à execução, face à subsistência de matéria de facto impugnada e controvertida.

  6. Inconformados com esta decisão, os embargantes dela interpuseram recurso de revista para o Supremo Tribunal de Justiça, terminando as suas alegações com as seguintes conclusões, que se transcrevem: A) A sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância é omissa quanto a matéria de facto dada como provada e não provada; B) O Tribunal “a quo” ao fixar a matéria de facto dada como provada não fundamentou com clareza, objetividade e discriminadamente, de modo que as partes, destinatárias imediatas da decisão, saibam o que o Tribunal considerou provado e não provado e qual a fundamentação dessa decisão reportada à prova fornecida pelas partes e adquirida pelo Tribunal; C) O Tribunal “a quo” limitou-se a enunciar os factos dados como provados, sem qualquer justificação, sem indicação dos meios de prova que o levaram a proferir tal decisão e à formação da sua convicção; D) O Tribunal “a quo” não especifica os factos dados como não provados; E) O julgamento da matéria de facto efetuado pelo Tribunal “a quo” viola o preceituado no art.º 607.º n.º 3 e 4 do C. P. C. e; F) É nulo o Acórdão por falta de fundamentação nos termos do art.º 615.º n.º 1 alínea b) do C. P. Civil; G) Deverá assim anular-se a decisão quanto ao julgamento da matéria de facto e declarar-se a nulidade do Acórdão recorrido; H) O contrato celebrado entre a Exequente e os Executados, na qualidade de avalistas, é um contrato de adesão sujeito ao regime previsto e regulamentado pelo Decreto-Lei n.º 446/85, de 25 de Outubro; I) A cláusula relativa ao pacto de preenchimento das livranças subscritas pelos Executados confere um direito discricionário a Exequente na fixação da data do vencimento das livranças e na fixação, de facto, do incumprimento contratual da obrigação pelos avalisadas; J) A ampla margem de discricionariedade concedida à Exequente torna a referida cláusula contratual abusiva, porque faz depender a fixação da data do vencimento da livrança exclusivamente da vontade da Caixa Geral de Depósitos, independentemente do incumprimento definitivo da obrigação pela devedora principal, colocando na inteira disponibilidade de uma das partes contratantes o momento a partir do qual o título deve ser preenchido e executado; K) É assim nula a cláusula 19.ª, “livrança em branco”, correspondente ao pacto de preenchimento da livrança, constante do contrato celebrado entre a Exequente e os Executados, por violar os artigos 15.º e 16.º, do Decreto Lei n.º 446/85, de 25/10; L) A nulidade da referida cláusula é de conhecimento oficioso e pode ser conhecida pelo Tribunal “ad quem” em sede de recurso de revista; M) Se assim é, terá que se entender que as livranças dadas à execução são inválidas, nos termos do art.º 76º da L.U.L.L., e considerar-se os títulos dados a execução nulos; N) Os títulos dados à Execução correspondem a livranças incompletas porque, caso se considere nulo pacto de preenchimento das livranças, não houve autorização ou pacto para o seu preenchimento e estas foram entregues a Exequente em branco; O) As letras dadas a execução pela Exequente, são assim letras incompletas porque não preenchem os requisitos exigidos pelo art.º 75º números 1, 2 e 3 da L.U.L.L., nomeadamente não tinham a “promessa pura e simples de pagar uma quantia determinada”, “a época do pagamento”, “a indicação do lugar em que se deve efetuar o pagamento” e estão desacompanhadas do referido pacto de preenchimento; P) Se assim não se entender terá que se considerar os títulos dados à execução como ineficazes, nos termos do art.º 76º da L.U.L.L.; Q) Em qualquer dos casos os títulos dados a execução não poderão valer como livranças; R) Pelo que deverá declarar-se a nulidade ou a ineficácia dos títulos dados a execução e determinar-se a extinção da execução por falta de título executivo; S) A nulidade e a invalidade dos títulos executivos, no caso dos autos, é de conhecimento oficioso; T) Andou mal o Tribunal “a quo” ao não ter declarado a nulidade ou a invalidade das livranças dadas a execução pela Exequente; U) O exequente limitou-se a afirmar no requerimento executivo e na contestação aos embargos de executados que os valores apostos nas livranças dadas à execução estão em dívida, desconhecendo-se a composição de tais quantias, nomeadamente o que corresponde a capital; o que corresponde a juros remuneratórios; o que corresponde a juros compensatórios e; o que corresponde a comissões, penalizações ou outras; V) Tendo os executados, em sede de embargos à execução, invocado a relação subjacente e o preenchimento abusivo da livrança, impugnando expressamente a dívida, a Exequente tem o ónus de justificar o montante nela por si aposto, alegando discriminadamente os valores que a compõem, de modo a poder ser questionado pela contraparte e aferido pelo tribunal; W) No caso dos autos, nem do requerimento executivo, nem da contestação resultam especificados os componentes incluídos nas quantias inscritas nas livranças, de forma a espelhar, parcela a parcela, os valores relativos ao capital, juros remuneratórios, comissões, juros de mora, eventuais penalizações, imposto de selo, etc; X) Também não resulta, desde logo, alegado o incumprimento ou a resolução dos contratos subjacentes à emissão e preenchimento dos títulos; Y) Ao contrário do alegado no acórdão recorrido, a sentença revogada não diz que a Exequente não especificou os valores no requerimento executivo ou na contestação aos Embargos de Executado, o que diz é que nas referidas peças processuais a Exequente são omissas quanto à forma como foi alcançado o valor inscrito nas livranças dadas à execução, no sentido de se perceber a natureza das quantias inscritas nas ditas livranças; Z) O Acórdão recorrido faz uma interpretação incorreta da fundamentação da decisão por si anulada, nomeadamente porque a referida decisão tem o cuidado de transcrever a liquidação efetuada pela Exequente no requerimento executivo.

    A

    1. A questão não é a de se saber se a Exequente especificou os valores que deram origem ao montante aposto na livrança, é a de se saber como é que a Exequente chegou a tais valores, nomeadamente porque os referidos valores foram colocados em crise pelos ora Recorrentes; BB) Não eram os Executados quem tinha de provar a incorreção da liquidação da obrigação exequenda, mas era a Exequente quem tinha de demonstrar, num primeiro momento, como é que tinha chegado aos valores constante das livranças dadas à execução e, num segundo momento, como tinha sido feita a liquidação da obrigação exequenda em concreto porquanto o valor reclamado não correspondia ao valor das livranças executadas; CC) Não é assim verdade que a Exequente tenha especificados os componentes incluídos nas quantias inscritas nas livranças, de forma a espelhar, parcela a parcela, os valores relativos ao capital, juros remuneratórios, comissões, juros de mora, eventuais penalizações, imposto de selo e outros; DD) Andou bem a sentença anulada pelo Acórdão recorrido quando entendeu que faltou, por parte da Exequente, a liquidação das obrigações cartulares e das obrigações exequendas; EE) Termos em que deverá ser revogado o Acórdão recorrido e confirmada integralmente a sentença proferida pelo Tribunal de primeira instância, ou se assim, não se entender, FF) Declarar-se procedentes, por provados, os Embargos de Executado porquanto é ilíquida a obrigação exequenda, o que consubstancia uma insuficiência do título executivo...

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