Acórdão nº 0361/04.2BELSB de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 21 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelFRANCISCO ROTHES
Data da Resolução21 de Abril de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 361/04.2BELSB Recorrente: A………… Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 A acima identificada Recorrente, inconformada com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 29 de Abril de 2021 (Disponível em http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/-/c3b9e67a510d6c7b802586c600482000.) – que, concedendo provimento ao recurso por ela interposto, revogou a decisão do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgara caducado o direito de impugnar e, conhecendo em substituição, julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida contra a liquidação oficiosa de sisa e respectivos juros compensatórios, que lhe foi efectuada por a AT ter considerado que se deve ter como ajuste de revenda a cessão de posição contratual efectuada pela ora Recorrente, enquanto promitente-compradora de um imóvel, a um terceiro, que veio a figurar como comprador no contrato definitivo –, dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), apresentando as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «A. A primeira questão que se pretende ver melhor analisada é a de saber se a alegada presunção simples, natural ou judicial do “ajuste de revenda” é suficientemente ilidida pelo abalo da convicção a que ela conduz, ou se, como parece decorrer da decisão recorrida, a ilisão só poderia decorrer de prova cabal do contrário.

  1. Saber se para ilidir a tal presunção simples, natural ou judicial do ajuste de revenda é necessário fazer prova contrária desse facto presumido ou se bastará abalar a convicção a que ela conduz, constitui uma questão de direito.

  2. O § 2.º do artigo 2.º do CIMSISSD estabelece, para o caso em que ocorra um ajuste de revenda nas promessas de compra de bens imobiliários, uma presunção legal de que existiu uma prévia tradição jurídica do bem para aquele que realizou o ajuste.

  3. São dois os pressupostos de facto que têm de estar reunidos para fazer operar a referida presunção legal – e para legitimar a liquidação do imposto SISA: - ocorrência de ajuste de revenda entre promitente comprador originário e terceiro; - celebração da escritura entre o promitente vendedor e terceiro.

  4. Quanto à prova destes dois pressupostos de facto, a lei não estabelece qualquer presunção, pelo que compete à AT, nos termos gerais (artigo 342.º n.º 1 do CC e 74.º, n.º 1 da LGT) demonstrar a verificação de tais pressupostos, como factos constitutivos do seu direito à liquidação do imposto.

  5. Na verdade, o Tribunal a quo, desconsiderando os contornos específicos dos autos, e apesar de admitir que a Recorrente recebeu do cessionário o mesmíssimo valor que tinha pago pelo CPCV, presume, ainda assim, ter ocorrido um ajuste de revenda por, invocando um entendimento da Jurisprudência Tribunais Superiores: “(…) constatando-se que o promitente-comprador originário cedera a sua posição contratual a terceiro, e que este intervinha, como comprador, no contrato definitivo de compra e venda com o promitente-vendedor, podia e devia (pode e deve) considerar-se ter havido ajuste de revenda entre ambos para efeitos de tributação nos termos do § 2.º do artigo 2.º do aludido Código (…)” G. A Recorrente insurge-se precisamente contra a forma de aplicação desta presunção judicial de ajuste de revenda e com a imposição de um ónus de ilisão superior ao ónus de ilisão das presunções simples ou naturais.

  6. Tendo o Tribunal constatado que os elementos constantes do processo conduzem à conclusão de que houve um mero reembolso de sinal, então a existência de (pelo menos) uma contraprova, de um abalar da convicção que resultaria da presunção judicial, é ponto assente.

    I. A presunção de tradição inferida do ajuste de revenda é uma presunção legal (estabelecida expressa e directamente na lei), mas a presunção de ajuste da revenda constitui uma presunção simples, apenas natural ou judicial.

  7. Se é verdade que para ilidir toda e qualquer presunção legal é necessário fazer prova em contrário, nos termos do artigo 350.º, n.º 2 do CC, também é verdade que para ilidir toda e qualquer presunção simples, natural ou judicial, bastará pôr em causa convicção do facto presumido.

  8. De acordo com o Tribunal a quo, conforme flui das transcrições supra, a presunção legal de tradição deveria ter sido ilidida por prova de que “(…) não existiu (…) qualquer ajuste de revenda (…)”.

    L. Sucede que o ajuste de revenda foi presumido – por meio de uma presunção simples, natural ou judicial – não foi alegado nem provado.

  9. Pelo que, abalada a convicção da ocorrência de ajuste de revenda, cai um dos pressupostos de facto que teriam de estar reunidos para fazer operar a presunção legal de tradição e, em consequência disso, não se verifica um dos factos constitutivos do direito da liquidação do imposto SISA.

  10. Porém, o Tribunal a quo, ciente de que o ajuste de revenda foi presumido – através de presunção simples, natural ou judicial –, concluiu, ainda assim, que cabia à Recorrente ter feito prova da inexistência de ajuste de revenda/prova em contrário, como se de uma presunção juris tantum se tratasse.

  11. Tal conclusão, para além de se traduzir numa clara violação da lei, por erro na interpretação ou aplicação do direito, ou no limite por erro na determinação da norma aplicável (o n.º 2 do artigo 350.º do CC não se aplica às presunções judiciais), salvo o devido respeito, onera o contribuinte com um ónus desproporcionadamente superior ao que seria permitido pelos limites impostos pela legalidade fiscal.

  12. Breve menção seja feita ao recente Acórdão do Tribunal Central Administrativo Norte, 03.10.2018, processo 01250/07.4BEPRT, ainda que aí tenha decidido que o contribuinte tem de fazer prova da inexistência do ajuste de revenda, mesmo nos casos em que ele é presumido, julgou ilidida a presunção legal de tradição precisamente com a prova de que os impugnantes cederam a sua posição no contrato-promessa de compra e venda pelo valor correspondente às entregas efectuadas ao promitente-vendedor: Q. O caso citado do TCA Norte incorre ainda numa confusão, que não existe, entre as duas presunções; porém, o sentido final desta decisão acaba por confirmar a suficiência da existência de uma mera reposição do sinal para afastar a aplicação do imposto de SISA ao caso.

  13. No caso da Recorrente, igual prova foi alcançada, porém, o Tribunal a quo entendeu que tal factualidade não é suficiente para demonstrar não ter sido obtido qualquer ganho ou vantagem patrimonial com a cessão da posição contratual no contrato-promessa de compra e venda e, em consequência disso, entendeu não ter sido ilidida a presunção legal aludida.

  14. Em suma, é imperioso 1) distinguir as presunções legais das presunções judiciais; 2) e determinar que se os factos base que estão na origem das presunções legais forem presumidos – portanto não alegados, nem provados – bastará aos interessados abalar a convicção a que eles conduzem para se considerarem ilididos.

  15. E no caso em apreço foi já admitido nas instâncias que (pelo menos) esse abalar de convicção já resulta dos elementos documentais constantes dos autos – dos quais decorre a existência de um mero reembolso do sinal anteriormente pago pelos cedentes – pelo que tal questão de facto já se encontra resolvida nas instâncias de forma favorável à pretensão da ora Recorrente.

  16. Por tudo o exposto, ao invés de ter exigido a prova da inexistência do ajuste de revenda, deveria o Tribunal a quo ter considerado 1) ilidida a presunção de ajuste de revenda; 2) não verificados os pressupostos da presunção legal de tradução jurídica do...

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