Acórdão nº 01673/11.4BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Abril de 2022
Magistrado Responsável | FRANCISCO ROTHES |
Data da Resolução | 07 de Abril de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Apreciação preliminar da admissibilidade do recurso excepcional de revista interposto no processo n.º 1673/11.4BELRS Recorrente: “A……., SGPS, S.A.” Recorrida: Autoridade Tributária e Aduaneira (AT) 1. RELATÓRIO 1.1 A sociedade acima identificada, inconformada com o acórdão proferido pelo Tribunal Central Administrativo Sul em 30 de Setembro de 2020 (Disponível em http://www.dgsi.pt/jtca.nsf/-/faa4511dfcc3a9d1802585f3006be118.
) – que negou provimento ao recurso por ela interposto da sentença proferida no Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou improcedente a impugnação judicial por ela deduzida, na sequência do indeferimento do recurso hierárquico interposto do indeferimento da reclamação graciosa, contra a liquidação adicional de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Colectivas (IRC) do exercício do ano de 2002 –, dele interpôs recurso para o Supremo Tribunal Administrativo, ao abrigo do disposto no art. 285.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), apresentando as alegações de recurso, com conclusões do seguinte teor: «a. Revestindo as questões em apreço nos autos uma relevância manifestamente prática, em atenção à susceptibilidade da questão controvertida de se expandir para além dos limites da situação singular, independentemente da sua relevância teórica, resultando da mesma a possibilidade de repetição da questão noutros casos e da necessidade de garantir a uniformização do direito pela instância de cúpula do sistema judicial tributário, verifica-se – à luz da interpretação que vem sendo firmada pelo Supremo Tribunal Administrativo quanto a cada um dos requisitos legais previstos n.º 1 do artigo 285.º do CPPT, para a admissão do Recurso de Revista quanto a uma decisão de mérito emanada pelo Tribunal Central Administrativo – estarem reunidos os pressupostos para o conhecimento do mérito do presente Recurso de Revista; b. Atendendo ao disposto no n.º 3 do artigo 63.º da LGT, que consagra o princípio da irrepetibilidade da inspecção, verifica-se que, considerando a factualidade dada como provada nos presentes autos, a liquidação impugnada é manifestamente ilegal porquanto resulta de uma segunda apreciação dos mesmos factos tributários por parte da Autoridade Tributária, concluindo-se que “as instâncias [trataram] a matéria de forma ostensivamente errada ou juridicamente insustentável, sendo objectivamente útil a intervenção do STA na qualidade de órgão de regulação do sistema”, verificando-se, assim, estar preenchido o segundo requisito a que alude a 2.ª parte do n.º 1 do artigo 285.º do CPPT (necessidade de garantir a melhor aplicação do direito) para efeitos de admissão do Recurso de Revista; c. No presente Recurso discute-se uma questão que não é de natureza meramente casuística, sendo previsível que a sua solução tenha, ou possa vir a ter, repercussões noutras situações, dada a sua abrangência, que de facto é extensível a todos os casos em que se verifique a repetição de mais do que um procedimento de inspecção (materialmente) externo, estando, portanto, verificado o requisito da relevância social fundamental da referida questão a que alude a 1.ª parte do n.º 1 do artigo 285.º do CPPT, pelo que, estando preenchidos, in casu, os pressupostos legais para a admissão do presente Recurso de Revista, deverá o mesmo ser admitido por Vossas Excelências; d. Atendendo à existência de uma outra acção inspectiva anterior à operada em 2006 (in casu, a inspecção credenciada pelas Ordens de Serviço n.º 03/1/260, 03/1/261 e 04/1/1, de âmbito geral, efectuada aos exercícios de 2000, 2001 e 2002 e notificada em 2004), em relação ao mesmo sujeito passivo (PETROGAL), imposto (IRC) e período de tributação (2002), no âmbito da qual a Autoridade Tributária teve acesso aos elementos de facto subjacentes ao pedido de reconhecimento de desvalorização excepcional formulado pela sociedade e que poderia, se assim quisesse, ter inspeccionado e efectuado todas as correcções que entendesse serem devidas, será de concluir que o caso vertente se subsume à factispécie prevista no n.º 3 do artigo 63.º da LGT e, como tal, não era possível à Autoridade Tributária ter efectuado uma segunda inspecção (materialmente) externa; e. Considerando que o procedimento de inspecção que antecedeu a liquidação de IRC impugnada (i) é materialmente externo, (ii) não deriva de um “facto novo” – e, ainda que derivasse (o que por mero dever de patrocínio se concebe), não foi devidamente fundamentado pelo dirigente máximo do serviço e (iii) não visou fiscalizar a confirmação de pressupostos de direito que o contribuinte tenha invocado perante a Autoridade Tributária, a liquidação de IRC impugnada é ilegal porquanto deriva de um procedimento inspectivo que viola cabalmente o disposto no n.º 3 do artigo 63.º da LGT; f. A qualificação dada pela Autoridade Tributária a um procedimento inspectivo não tem carácter vinculativo, se o conteúdo dos actos praticados pelos serviços de inspecção vier a revelar-se contrário à qualificação dada, podendo, com efeito, um procedimento formalmente interno, ser materialmente (e efectivamente) externo; g. É entendimento jurisprudencial que, nos termos do disposto no artigo 13.º do RCPIT, estamos perante um procedimento de inspecção externo quando: (i) a inspecção tiver lugar fora das instalações da Autoridade Tributária (ii) os serviços de inspecção analisarem elementos que não os da própria Autoridade Tributária ou (iii) a inspecção comportar a análise interna de elementos obtidos em diligências inspectivas externas de outros procedimentos; h. O procedimento inspectivo credenciado pela Ordem de Serviço n.º OI200600469, de 03.11.2006 não se destinou, única e exclusivamente, a proceder a uma análise formal e de coerência dos documentos, tendo igualmente procedido à verificação da contabilidade e registos contabilísticos e documentos de suporte/listagens da Recorrente, registos esses obtidos numa primeira inspecção realizada ao mesmo exercício (2002) e à qual, por mero procedimento inspectivo interno, a Autoridade Tributária não teria acesso, razão pela qual deve ser requalificado como “externo”, com todas as consequências legais, mormente a aplicação ao caso concreto da limitação prevista no n.º 3 do artigo 63.º da LGT; i. Considerando o entendimento da mais avalizada Doutrina e, bem assim, dos Tribunais Superiores, estando em causa uma realidade que a Autoridade Tributária podia (e devia), à data da realização da primeira inspecção, conhecer – in casu o pedido de reconhecimento de desvalorização excepcional de bens no activo imobilizado corpóreo –, é por demais evidente que a decisão de indeferimento não se subsume ao conceito de “factos novos” previsto no n.º 3 do artigo 63.º da LGT, por não ser, objectivamente, superveniente.
j. Ao abrigo do princípio da decisão previsto nos artigos 56.º e 57.º n.º 1 da LGT, na redacção à data dos factos, a Autoridade Tributária deveria ter conhecido do mérito do pedido de reconhecimento de desvalorização excepcional de bens no activo imobilizado corpóreo apresentado pela Recorrente no prazo de seis meses, pelo que, o eventual atraso no conhecimento do mérito do citado pedido formulado pela Recorrente em Março de 2003 – e, em consequência, a inspecção tributária instaurada pela Autoridade Tributária para concretização das conclusões do referido pedido – não pode ser imputável ao sujeito passivo; k. A ratio que presidiu à redacção do artigo 63.º da LGT e que subjaz ao princípio da irrepetibilidade da inspecção é a tutela do sujeito passivo quanto à reapreciação de factos, com excepção dos novos, não se podendo incluir nestes – sob pena de se estar perante letra morta – os factos decorrentes de outros conhecidos pela Autoridade Tributária e cuja ocorrência desta unicamente depende; l. O facto de a competência para a apreciação do pedido de reconhecimento de desvalorização excepcional de bens no activo imobilizado corpóreo ser da Direcção de Serviços do IRC, ao passo que a competência para a fiscalização tributária ser da Direcção de Serviços de Inspecção Tributária da Direcção de Finanças de Lisboa não poderá determinar a verificação de um “facto novo”, na medida em que, estando na esfera da mesma entidade (Autoridade Tributária), nos termos do n.º 3 do artigo 1.º da LGT, (i) a apreciação do mérito do pedido formulado pela Petrogal em Março de 2003 e, ainda, (ii) a...
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