Acórdão nº 0379/16.2BEVIS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 07 de Abril de 2022

Magistrado ResponsávelARAGÃO SEIA
Data da Resolução07 de Abril de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: MUNICÍPIO DE SÃO PEDRO DO SUL, Impugnante nos autos acima identificados, com o número de identificação fiscal 506 785 815 e sede no Largo de Camões, São Pedro do Sul, não se conformando com a douta sentença que julgou improcedente a impugnação, vem, ao abrigo do disposto no artigo 280.º do Código de Procedimento e de Processo Tributário (“CPPT”), interpor RECURSO PER SALTUM para a Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo, o qual deve subir nos autos e tem efeito meramente devolutivo, nos termos do n.º 2 do artigo 286.º do CPPT.

Alegou, tendo concluído: A. Vem o presente Recurso interposto da Decisão proferida, pelo Tribunal Recorrido, no âmbito do processo n.º 379/16.2BEVIS.

  1. Nos referidos autos, o ora Recorrente peticionou a anulação da decisão de indeferimento do Recurso Hierárquico interposto na sequência do indeferimento da Reclamação Graciosa por si apresentada face ao acto de liquidação adicional de IVA n.º 13109974 e ao acto de liquidação de juros compensatórios n.º 13109975.

  2. Pronunciando-se sobre as pretensões do Recorrente, o Tribunal a quo decidiu, a final, pela improcedência das mesmas, mantendo as liquidações de IVA e de juros ali impugnadas e absolvendo a AT dos pedidos.

  3. Não podendo concordar com a Sentença Recorrida, por padecer de manifesto erro de julgamento, vem o Recorrente apresentar o presente Recurso, nos termos e com os efeitos consagrados no artigo 280.º do CPPT.

  4. O Tribunal a quo decidiu que o sujeito passivo que, por motivo de “erro de direito”, não tenha exercido o direito à dedução do IVA na “declaração do período (…) em que se tiver verificado a receção das faturas ou de recibo de pagamento do IVA” (cf. n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA), apenas o poderá fazer i) no prazo de caducidade de quatro anos previsto no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA e ii) mediante a apresentação de uma declaração periódica de substituição, de um pedido de revisão oficiosa ou, ainda, de uma reclamação graciosa da autoliquidação.

  5. Crê, porém, o Recorrente que tal decisão não pode ser aceite, devendo a mesma ser revogada, com todas as consequências legais, nos termos e com os fundamentos expendidos de seguida.

  6. O Tribunal Recorrido, na linha do quanto havia sido alegado pelo Recorrente, decidiu pela aplicabilidade in casu do regime previsto no n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA, i.e. pela aplicabilidade do prazo de regularização de quatro anos previsto naquela norma, dado tratar-se de um erro de direito.

  7. Contudo, o Tribunal Recorrido decidiu que aquela regularização de imposto, a realizar no prazo de quatro anos, apenas seria válida se realizada através de um meio adequado para o efeito, i.e. através de uma declaração periódica de substituição, de um pedido de revisão oficiosa ou, ainda, de uma reclamação graciosa da autoliquidação.

    I. Ora, não pode o Recorrente aceitar a imposição destes meios ou formalismos para efeitos de regularização de IVA ao abrigo do n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA.

  8. De facto, a imposição destes meios de regularização é manifestamente ilegal e abusiva, não podendo ser aceite, na medida em que a mesma i) é manifestamente contrária à ratio legis e ao conteúdo literal das normas que regem a dedução do IVA e a sua regularização em situações de erro de direito – i.e., em concreto, o n.º 2 do artigo 22.º e o n.º 2 do artigo 98.º, ambos do Código do IVA –, ii) encontra-se desprovida de base legal, (iii) atenta contra os princípios base do sistema comum do IVA – princípio da neutralidade fiscal, base essencial do funcionamento do sistema-comum do IVA – e, ademais, (iv) viola o princípio da legalidade, constitucionalmente consagrado.

    Os meios de regularização – as regras do Código do IVA: n.º 2 do artigo 22.º e n.º 2 do artigo 98.º K. A imposição destes meios de regularização, alegadamente “criados pelo legislador”, (i) é manifestamente contrária à lei, na medida em que contraria a ratio e a letra do n.º 2 do artigo 22.º e do n.º 2 do artigo 98.º, ambos do Código do IVA.

    L. Desde logo, o quanto vem alegado pelo Tribunal a quo é totalmente contrário à redacção do n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA em vigor à data dos factos.

  9. Esta contradição decorre directamente do facto de a redacção da norma considerada (e citada) pelo Tribunal a quo não se encontrar em vigor à data dos factos, tendo sido a mesma profundamente alterada em 2004, com significativo impacto no tema aqui em discussão.

  10. Com efeito, o n.º 2 do artigo 22.º, até 31 de Dezembro de 2003, dispunha que: “Sem prejuízo da possibilidade de correcção prevista no artigo 71.º, a dedução deverá ser efectuada na declaração do período em que se tiver verificado a recepção das facturas, documentos equivalentes ou recibo de pagamento de IVA que fizer parte das declarações de importação”.

  11. Contudo, com efeitos a partir de 1 de Janeiro de 2004, a redacção desta norma foi alterada, passando a dispor nos seguintes termos: “Sem prejuízo do disposto no artigo 71.º, a dedução deverá ser efectuada na declaração do período ou de período posterior àquele em que se tiver verificado a recepção das facturas, documentos equivalentes ou recibo de pagamento de IVA que fizer parte das declarações de importação”.

  12. De facto, na redacção aplicável, o n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA prevê expressamente que a dedução de imposto pode ser realizada numa declaração de período posterior àquele em que “se tiver verificado a recepção das facturas, documentos equivalentes ou recibo de pagamento (…)”. Redacção esta que se mantém actualmente.

  13. Assim, ao contrário do quanto foi invocado pelo Tribunal a quo – porque erradamente assente na anterior redacção da norma –, o n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA confere a possibilidade de dedução do imposto numa declaração “de período posterior”.

  14. Também a jurisprudência deste Supremo Tribunal aqui invocada pelo Tribunal Recorrido – i.e. o “Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo de 18/05/2011, rec. n.º 0966/10” – não pode ter aplicação in casu, uma vez que a mesma versou sobre uma situação de regularização de imposto realizada na vigência da anterior redacção do n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA.

  15. Aquela jurisprudência decidiu sobre uma situação de regularização de IVA realizada, pelo sujeito passivo, em Dezembro de 2003, com referência a imposto de 2001 – pelo que, naturalmente, nesta situação foi considerada a anterior redacção do n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA, onde era prevista apenas a possibilidade de dedução “na declaração do período em que se tiver verificado a recepção das facturas, documentos equivalentes ou recibo de pagamento”.

  16. De salientar que, o Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, Relator no processo deste Supremo Tribunal acima mencionado (Recurso n.º 0966/10), veio posteriormente decidir, enquanto Presidente de um Tribunal Arbitral, sobre a legalidade de uma liquidação adicional de IVA emitida, pela AT, numa situação de facto em tudo idêntica à situação em causa naquele processo e, bem assim, à situação aqui controvertida, mas referente a regularizações de imposto promovidas, pelo sujeito passivo, em data posterior a 31 de Dezembro de 2003 e referentes a IVA incorrido em períodos posteriores àquele (Processo n.º 502/2014-T).

  17. E, neste âmbito, já à luz da redacção do n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA em vigor desde 1 de Janeiro de 2004, aquele Tribunal Arbitral, presidido pelo Juiz Conselheiro Jorge Lopes de Sousa, decidindo pela aplicação do n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA – por se tratar de um erro de direito –, aceitou a regularização realizada através da inscrição do imposto no campo 40 de declaração periódica de período posterior, não impondo qualquer meio ou formalismo de regularização de imposto.

    V. De facto, à luz da redacção do n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA, na sua redacção posterior a 1 de Janeiro de 2004, não restam quaisquer dúvidas de que a regularização de imposto pode ser efectuada em períodos de imposto posteriores àquele em que se tiver verificado a receção das faturas ou de recibo de pagamento do IVA.

  18. Resulta, assim, evidente que a imposição dos “meios” de regularização acima descritos – todos com referência ao período em que o imposto em causa deveria ter sido deduzido – é manifestamente contrária ao disposto no nº 2 do artigo 22.º do Código do IVA, na sua redacção em vigor à data dos factos.

    X. Atento o exposto, o quanto foi invocado pelo Tribunal a quo com fundamento na alegada redacção do n.º 2 do artigo 22.º do Código do IVA – i.e. com base no argumento de que a mesma não permitiria a dedução de imposto noutro período além daquele em que se tiver verificado a recepção das facturas ou dos recibo de pagamento do IVA – não pode proceder, por manifesto erro de julgamento do direito aplicável.

  19. Acresce que, o quanto vem alegado pelo Tribunal a quo também é totalmente contrário à ratio e à letra do n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA.

  20. De facto, o n.º 2 do artigo 98.º do Código do IVA prevê a regularização de imposto nas situações em que, por erro, tenha sido entregue imposto em excesso e, para o efeito, fixa apenas um prazo limite de quatro anos. Nada mais.

    AA. Com efeito, ao contrário do que o Tribunal Recorrido pretendeu demonstrar, o n.º 2 do artigo 98.º não impõe, nem tácita, nem expressamente, qualquer meio ou formalismo para a regularização de imposto a realizar naquele prazo de quatro anos.

    BB. De resto, a previsão do prazo de quatro anos a par com a imposição daqueles...

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