Acórdão nº 950/21.0T8SXL-A.L1-2 de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 24 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelLAURINDA GEMAS
Data da Resolução24 de Março de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam, na 2.ª Secção Cível do Tribunal da Relação de Lisboa, os Juízes Desembargadores abaixo identificados I - RELATÓRIO PT interpôs o presente recurso de apelação da decisão que julgou procedente o incidente de atribuição provisória da casa de morada de família deduzido por MT, no âmbito do processo de divórcio em que são partes (Réu e Autora, respetivamente).

O requerimento inicial, foi apresentado em 13-07-2021, constando do seu proémio que a Requerente “vem por apenso à ação de divórcio sem consentimento de outro cônjuge” e, no formulário do Citius, que a finalidade era “Apensar a Processo Existente”. A Requerente veio - invocando (certamente por lapso) o disposto no art. 1407.º, n.º 7, do CPC (a que corresponde o art. 931.º, n.º 7, do atual CPC) - pedir que fosse fixado um regime provisório de utilização da casa de morada de família, alegando, para tanto e em síntese, que: - Requerente e Requerido casaram a 19 de julho de 1987; - Ambos vivem na mesma casa, mas dormem em quartos separados e têm vidas económicas separadas; - O Requerido agrediu a Requerente, tendo esta receio dele; - O Requerido continua a ameaçá-la e o ambiente é insustentável, não existindo diálogo, apenas discussões permanentes; - Ambos são proprietários de outra casa, na Cruz de Pau, (um andar), onde o Requerido poderia viver; - O filho mais velho do casal ainda vive com a Requerente e Requerido, assistindo aos conflitos entre ambos, temendo a Requerente que o filho e o pai se possam envolver fisicamente, criando um mau ambiente que afeta negativamente a relação entre ambos; - Vive igualmente na casa de família a mãe da Requerente, com 93 anos de idade; - O Requerido tem vida autónoma e condição económica independente, sendo sócio gerente de uma empresa de viagens.

Foi proferido despacho liminar que convocou a tentativa de conciliação para o dia 21-10-2021, mandando aplicar o disposto no art. 931.º, n.ºs 1 e 5, ex vi do art. 990.º, n.º 2, ambos do CPC.

Em 19-07-2021, foi enviada carta registada para citação do Requerido, para a morada da sua casa (Rua …, n. …, Amora), a qual veio devolvida em 09-08-2021 pelo motivo de não ter sido reclamada.

No processo de divórcio, após ter sido devolvida, por não ter sido reclamada, a carta para citação do Réu enviada (a 12-05-2021) para tal morada, foi realizada a citação do Réu através de carta registada com a/r enviada para o seu domicílio profissional, a qual foi recebida, conforme a/r junto aos autos a 27-07-2021.

No dia 21-10-2021, realizou-se a tentativa de conciliação, na qual compareceram ambas as partes, fazendo-se constar na respetiva ata que a diligência apenas se iniciou após a chegada do Requerido e ainda que, quanto ao apenso A, pela Requerente foi dito que a casa morada de família é Rua …, n.º …, Amora, tendo o Sr.º Juiz solicitado que clarificasse qual a situação da casa morada de família, ao que foi dito que as partes adquiriram a casa durante o casamento e que, por isso, a casa é bem comum.

Ademais, conforme consta da respetiva ata, “As partes não se entenderam quanto à casa de morada de família.”, tendo, de seguida, sido proferido pelo Sr. Juiz o despacho com o seguinte teor: “Não tendo havido conciliação quanto a casa morada de família notifique o requerido para querendo contestar presente acção nos termos do art.º 990, n.º 2 do CPC, advertindo-se o mesmo que nos termos do art.º 293.º n.º 2, a oposição é apresentada em 10 dias.” Na parte final da ata consta ainda a seguinte menção: “Consigno que quando sai da sala de julgamento para entregar a cópia da PI o réu já não se encontrava presente neste tribunal, tendo inclusive deslocado à portaria, mas sem sinal do mesmo.” Nessa data realizou-se igualmente tentativa de conciliação no âmbito do processo de divórcio.

Em 25-10-2021, foi expedida carta registada para notificação do Requerido, com cópia do requerimento inicial, mais tendo sido enviada, no processo de divórcio, carta registada para notificação do Requerido, com cópia da Petição Inicial, cartas essas que, em 18-11-2021, vieram devolvidas, por não terem sido reclamadas.

Em 16-11-2021, a Requerente apresentou requerimento defendendo que o Requerido deve ser considerado notificado.

A 17-11-2021, foi proferido despacho que designou o dia 30-11-2021 para prestação de declarações pelas partes e inquirição das testemunhas arroladas; nesse despacho refere-se ainda que, conforme pesquisa efetuada nos CTT, se verificara que a carta enviada para notificação do Requerido já estava em devolução, pelo que se determinou que fosse efetuada a notificação do mesmo por órgão de policial criminal, na morada da PI ou, em alternativa, no local de trabalho, considerando o “A/R que o mesmo assinou no local de trabalho na anterior citação nos autos principais”.

Em 19-11-2021, no processo de divórcio, foi proferido o despacho com o seguinte teor: “O prazo para a contestação começou a correr desde o dia em que o R. não recebeu a cópia da P.I. porque se quis voluntariamente ausentar, não obstante lhe ter sido claramente explicado que iria no final da diligência receber cópia da PI e que teria 30 dias para contestar; cf. art. 224 n. 2 do CC.

Assim aguarde-se o termo do prazo (+ 3 dias úteis).” O Réu não deduziu oposição (nem tão pouco apresentou Contestação na ação de divórcio).

Solicitou-se à PSP a notificação do Requerido, a qual não foi possível efetuar, constando na certidão negativa, junta aos autos em 02-12-2021, que o mesmo reside na morada indicada, mas se furta ao contacto policial.

No dia 30-11-2021, o Requerido não compareceu e foram ouvidas as testemunhas arroladas pela Requerente, tendo previamente sido proferido despacho - exarado em ata - com o seguinte teor: “Antes de iniciar a diligência consultei no Citius que existe uma certidão negativa da PSP.

Contudo e como já referimos nos autos de divórcio, o requerido foi informado e na tentativa de conciliação de 21 de Outubro de 2021, da existência do pedido de atribuição da casa morada de família e foram-lhe dados 10 dias, para querendo se opor e o mesmo não obstante ter sido advertido de que seria entregue a petição de divórcio e da casa morada de família, optou por se ausentar do tribunal sem aguardar que lhe fossem entregues as cópias, além disso não recebe as cartas, nem se consegue notificar pela entidade policial, sendo que estas últimas tentativas são supérfluas pois o mesmo deve considerar-se regulamente notificado e dizemos supérfluas porque interessa ao tribunal que exista um pleno contraditório que na procura da solução mais justa e equitativa e tal só será cabalmente possível se tivermos a contribuição de todos. O requerido opta por ostensivamente por não contribuir, não havendo dúvidas que o mesmo se deve considerar notificado para deduzir oposição uma vez que só não recebeu a petição por facto que lhe é imputável, tudo conforme já referimos no divórcio, (art.º 224 n. 2 do CC) pelo que a diligência prosseguirá.” De seguida, em 04-12-2021, foi proferida a decisão (recorrida), da qual consta - além de relatório, saneador tabelar, decisão da matéria de facto e fundamentação de direito - o segmento decisório com o seguinte teor: “Pelo exposto, atribuo provisoriamente a casa de morada de família ao cônjuge mulher.

Custas pela A. atenta a falta de oposição do R.

Reg., not. e dê baixa.

* Verifico agora que o presente processo não se trata de ação não provisória para atribuição da casa de morada de família, mas de incidente provisório de atribuição da casa de morada de família. Aquele corre por apenso ao divórcio, nos termos do art. 990. n. 4 do CPC e este corre nos próprios autos nos termos do art. 931, n. 7 do CPC.

Assim sendo, após trânsito, incorpore os presentes autos no divórcio.” Inconformado com esta decisão, veio o Requerido interpor o presente recurso de apelação, formulando na sua alegação as seguintes conclusões (que reproduzimos, salvo passagem que constitui citação do despacho proferido em 30-11-2021): I. A A. instaurou contra o ora R. incidente de atribuição da casa de morada de família, a qual foi tramitada até á sentença nos termos do art. 990º do CPC.

  1. Citação e notificações, foram elaboradas nos termos e para os efeitos do art.º 990.º do CPC.

  2. O incidente de atribuição da casa de morada de família previsto no artigo 990º do CPC constitui procedimento distinto daquele que visa regular a utilização da casa de morada de família durante a pendência do processo de divórcio, nos termos previstos no artigo 931º, n.º 2, do CPC.

  3. O erro na forma do processo consubstancia nulidade processual de conhecimento oficioso (cfr. arts. 193º e 196º, do CPC).

  4. O qual deverá ser conhecido no despacho saneador (cfr. art. 595º, n.º 1, al. a), do CPC) ou, não existindo este, até à sentença final (cfr. art. 200º, n.º 2, do CPC).

  5. Nos autos em apreço não houve lugar a despacho saneador, pelo que, esta nulidade teria de ser apreciada oficiosamente até à sentença final, conforme decorre da lei; V. E não sanada, como parece ter sido intenção do Tribunal, após a prolação da sentença e em momento subsequente à decisão final.

  6. Considerando o erro na forma de processo e não sendo possível o aproveitamento de qualquer dos actos praticados, ao abrigo do disposto no artigo 193º CPC, impõe-se declará-los anulados e indeferir liminarmente a petição inicial.

  7. Quanto á falta de fundamento da sentença de que se recorre, resulta do disposto no art. 607º, n.º 3, do CPC que, na elaboração da sentença, e após a identificação das partes e do tema do litígio, deve o juiz deduzir a fundamentação do julgado; VIII. Por outro lado, sancionando o incumprimento desta injunção, prescreve o art. 615º, n.º 1, al. b), do CPC que é nula a sentença que “não especifique os fundamentos de facto e de direito que justificam a decisão”, o que se verifica no caso em apreço; IX. Não é bastante e suficiente que o juiz decida a questão posta; X. É indispensável, do ponto de vista do convencimento das partes, do exercício fundado do...

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