Acórdão nº 4406/11.1TBVFX.L1-A.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 31 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelNUNO PINTO OLIVEIRA
Data da Resolução31 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

ACORDAM EM CONFERÊNCIA NO SUPREMO TRIBUNAL DE JUSTIÇA I. — RELATÓRIO 1.

Nos presentes autos de expropriação por utilidade pública, I. — FF, LL, MM, NN, OO, PP e QQ; II. — GG, JJ, II, SS, HH, AA, DD, EE, BB e KK a. — invocaram a caducidade da declaração de utilidade pública expropriativa constante do despacho nº 17829/2009, de 27 de Julho, do Secretário de Estado Adjunto das Obras Públicas e das Comunicações, publicado no Diário da República — II Série, de 03 de Agosto de 2009; b. — interpuseram recurso da decisão arbitral de 19 de Abril de 2011 em que se fixou a indemnização devida, pela expropriação da parcela 21 - com a área de 19.863 m2, a destacar do prédio rústico, denominado “F...”, sito na freguesia ..., concelho ..., descrito na Conservatória do Registo Predial ... sob o nº ...66 e inscrito na respectiva matriz predial rústica sob o artigo ...º, seção ... da referida freguesia — em € 119.178,00; c. — interpuseram recurso do despacho de adjudicação proferido em 18 de Agosto de 2011.

  1. O Tribunal de 1.ª instância julgou parcialmente procedentes os recursos interpostos pelos expropriados.

  2. O dispositivo da sentença proferida pelo Tribunal de 1.ª instância é do seguinte teor: Pelo exposto, tudo visto e ponderado, julgo parcialmente procedente os recursos interpostos pelos recorrentes expropriados e fixo em € 1.350.684,00 (um milhão trezentos e cinquenta mil seiscentos e oitenta e quatro euros) a indemnização a atribuir pela expropriante aos expropriados, valor a ser atualizado nos termos do artº 24º, nºs 1 e 2 do C.E. até à data da notificação do despacho que autorizou o levantamento do montante depositado pela expropriante nos autos, incidindo a atualização, a partir de então e até à decisão final, sobre a diferença entre o montante atualizado até essa data e o montante depositado.

  3. Inconformada, a expropriante Brisa – Concessão Rodoviária, SA., interpôs recurso de apelação.

  4. Finalizou a sua alegação com as seguintes conclusões: 1. A douta sentença recorrida fixou a indemnização pela expropriação da parcela 21, com a área de 19.863 m2, em € 1.350.684,00 (€ 68,00/m2).

  5. Em arbitragem havia sido fixado o valor em € 119.178,00 (€ 6,00/m2).

  6. O laudo maioritário atribuiu o valor indemnizatório de € 186.712,20 (€ 9,40/m2).

  7. A sentença recorrida desprezou a prova pericial, tendo optado pelo valor de € 68,00/m2 com base na “autoridade do caso julgado”.

  8. A sentença copiou o valor de € 68,00/m2 fixado para a Parcela 15.2.

  9. A aderência ao valor fixado para a Parcela 15.2 foi justificada pela utilização da “autoridade do caso julgado”, quer com base numa razão de prejudicialidade, quer com base em acórdão do Supremo Tribunal de Justiça.

  10. Ora, a prejudicialidade só surge quando uma decisão é necessária para decidir outra, ou quando o conhecimento do mérito de uma ação está dependente da resolução de outra ação, o que vincadamente não sucede no presente processo.

  11. O acórdão no qual a sentença se apoiou emergiu de uma realidade factual distinta, que faz uma avaliação (subjetiva) da responsabilidade por um acidente viação, em função do comportamento dos respetivos condutores, nada comparável com a avaliação (objetiva) de uma parcela de terreno, efetuada com base em parâmetros fixados por via legal.

  12. Consequentemente, não poderia a sentença recorrida sustentar a errada utilização da “autoridade do caso julgado” relacionada com um contexto factual e legal completamente diferente do que o tratado nos presentes autos.

  13. Por sua vez, suportada no conceito de prejudicialidade e de “autoridade do caso julgado”, a sentença parte do errado princípio que as Parcelas 15.2 e 21 são idênticas apenas por existir coincidência quanto às partes, à declaração de utilidade pública e ao PDM.

  14. Tão reduzida coincidência ofende profundamente o princípio da comparabilidade, que exige, como reconhece a jurisprudência, a demonstração de uma essencialidade quanto às características dos prédios comparados.

  15. De igual modo, concluiu a sentença erroneamente que a Parcela 15.2 é contígua à Parcela 21.

  16. Efetivamente contígua à Parcela 21 é a 22 e até apresenta os mesmos critérios para ser considerada idêntica.

  17. Acontece que a contígua Parcela 22, embora com decisão deste Tribunal da Relação não transitada em julgado, por se encontrar pendente recurso de revista, obteve a fixação de um valor distinto, quer da Parcela 15.2, quer da Parcela 21.

  18. Esta constatação, que nem tem em conta os valores verificados nas demais parcelas da mesma declaração de utilidade pública, só permite evidenciar que o critério utilizado pela sentença recorrida é destituído de razoabilidade.

  19. Ademais, a sentença desconsiderou, por completo, sem justificação, a prova pericial determinada no Código das Expropriações e nas complementares normas processuais aplicáveis.

  20. A douta sentença recorrida viola o princípio constitucional da separação de poderes, expresso no artigo 112.º da Constituição, na medida em que ignora o que sobre a determinação da avaliação se encontra estabelecido no Código das Expropriações, em favor de uma regra extraída de um acórdão.

    Nestes termos, Deve ser julgado procedente o presente recurso, revogando-se a douta decisão que fixou em € 1.350.684,00 a indemnização a atribuir pela expropriante aos expropriados.

  21. Os expropriados contra-alegaram, pugnando pela improcedência do recurso.

  22. Em 5 de Novembro de 2020, o Tribunal da Relação ... julgou procedente o recurso de apelação.

  23. O dispositivo do acórdão de 5 de Novembro de 2020 é do seguinte teor: Em face do exposto, acordam na ... Secção Cível do Tribunal da Relação ..., julgar o recurso procedente e, em consequência revogam parcialmente a sentença decorrida e fixam em 186 712,20€ (cento e oitenta e seis mil setecentos e doze mil euros e vinte cêntimos) a indemnização a atribuir pela expropriante aos expropriados, valor a ser actualizado nos termos do artº 24º nºs 1 e 2 do CE até à data da notificação do despacho que autorizou o levantamento do montante depositado pela expropriante nos autos, incidindo a actualização, a partir de então e até à decisão final sobre a diferença entre o montante actualizado até essa data e o montante depositado.

  24. Em 24 de Novembro de 2020, os expropriados requereram a reforma do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação ... em 5 de Novembro.

  25. Finalizaram o seu requerimento com as seguintes conclusões: 1ª. O Acórdão reclamado padece de uma nulidade processual por terem sido proferidas decisões-surpresa: de facto, nenhuma das 3 questões (e correspondentes pré-decisões) que suportaram o julgamento do Acórdão reclamado (PDM de 1993 RAN art. 27º, nº 3, do Código das Expropriações) vinha invocada na apelação interposta pela Expropriante (basta ler essas Alegações e, sobretudo, as respectivas Conclusões), pelo que não era nem legalmente permitido nem expectável que este douto Tribunal se viesse a pronunciar sobre as mesmas – antes de ter proferido decisão sobre essas questões, este douto Tribunal deveria ter notificado os Recorridos para, querendo, se pronunciarem sobre as mesmas ou sobre o projecto de decisão que se ponderava proferir (art. 195º do CPC); 2ª O Acórdão reclamado errou na determinação da norma/regime aplicável à determinação do valor indemnizatório devido por esta expropriação: falamos, essencialmente, da relevância, maior ou menor, formal ou material, do PDM de ... de 2009 que já havia sido aprovado na data da declaração de utilidade pública desta expropriação e que o Acórdão reclamado ignorou de todo (art. 616º, nº 2, a., do CPC); 3ª Do processo constam documentos que, só por si, determinam decisão diversa da proferida (art. 616º, nº 2, b., do CPC).

  26. Em 14 de Dezembro de 2020, os expropriados interpuseram recurso de revista, arguindo, designadamente, a nulidade do acórdão proferido pelo Tribunal da Relação ... em 5 de Novembro.

  27. Finalizaram a sua alegação com as seguintes conclusões: 1ª O Acórdão recorrido é nulo por excesso de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, d), do CPC, na medida em que conheceu questões que não foram invocadas pela Expropriante/Recorrente no seu recurso; 2ª O Acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, d), do CPC, na medida em que, pretendendo fixar a indemnização de acordo com a metodologia/critérios adotados, ignorou todas as questões jurídicas que se discutiam no processo a propósito dessa metodologia e critério, bem como os factos assentes e os documentos juntos aos autos; 3ª O Acórdão recorrido é nulo por omissão de pronúncia, nos termos do art. 615º, nº 1, d), do CPC, na medida em que ignorou a questão jurídica fundamental em discussão nos presentes autos: o valor de mercado da parcela expropriada demonstrado por várias escrituras públicas de compra e venda/expropriação amigável e por diferentes decisões judiciais; 4ª O Acórdão recorrido viola a autoridade de caso julgado do Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09.03.2017, proferido sobre a mesma situação de facto e sobre as mesmas questões de direito que se discutem nos presentes autos, onde se decidiu que a justa indemnização deve ser fixada de acordo com o valor de mercado do terreno expropriado e fixou o valor de mercado deste tipo de terrenos nesta zona em € 68/m2 (art. 629º, nº 1, a., do CPC); 5ª O Acórdão recorrido viola o caso julgado formado na Sentença da 1ª Instância quanto à atendibilidade do valor unitário fixado para a parcela contígua e idêntica 15.2 (€ 68/m2) por força do princípio da igualdade e por ter suporte na avaliação pericial minoritária apresentada nos autos; 6ª O Acórdão recorrido está em oposição com o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09.03.2017 quanto ao critério e metodologia indemnizatória a atender na expropriação por utilidade pública de solos – art. 629º, nº 2, d), do CPC; 7ª O Acórdão recorrido está em oposição com o decidido no Acórdão do Tribunal da Relação de Lisboa de 09.03.2017 quanto às “circunstâncias objetivas suscetíveis de influir no...

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