Acórdão nº 1481/09.2 BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução10 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 03.05.2021, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por E…, S.A.

    (doravante Recorrida ou Impugnante), que teve por objeto o indeferimento do recurso hierárquico relativo ao indeferimento da reclamação graciosa que, por seu turno, versou sobre a liquidação adicional de imposto sobre o valor acrescentado (IVA) e a dos respetivos juros compensatórios, referentes ao ano de 2000.

    Apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “I. Vem o presente recurso interposto da sentença proferida pelo Tribunal a quo, que julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida por E… S.A., NIPC …….. contra o indeferimento expresso parcial da reclamação graciosa nº 3……/400305.5, que apresentou contra a liquidação de IVA e respetivos juros compensatórios, respeitantes ao ano de 2000, no valor de €29.837,54.

  2. A Fazenda Pública considera que a douta decisão do Tribunal a quo ora recorrida, não faz, salvo o devido respeito, uma correta apreciação da matéria de facto relevante no que concerne à aplicação dos artigos 18.º, 19.º e 23.º CIVA.

  3. Se bem entendemos o decidido na douta sentença, no caso sub judice, não obstante se reconhecer que os encargos financeiros relativos às vendas em prestações não representam o objetivo principal da atividade da Impugnante e serem acessórios a essa mesma atividade principal que era a venda de livros, os mesmos não deveriam ter sido incluídos na fração de cálculo do método pro rata, por forma a assegurar-se a neutralidade do sistema de IVA.

  4. Como característica fundamental deste imposto, destaca-se o facto de ser um imposto plurifásico, porquanto incide em todas as fases do processo produtivo, pois o IVA atinge toda a cadeia de atos de consumo através do método subtrativo indireto em que o IVA incorrido nas aquisições de bens e serviços (inputs) é deduzido ao cobrado nas transmissões efetuadas (outputs), garantindo assim que não ocorre a cumulatividade do imposto em nenhuma das suas fases da cadeia económica, garantindo ainda a sua neutralidade e proporcionalidade, na medida em que todo o IVA incidente sobre a transação de bens e serviços utilizados nas atividades económicas tributadas é deduzido - cfr. artigo 19.º do CIVA e 17.º da Diretiva.

  5. O princípio da neutralidade e da proporcionalidade é alcançado através do direito à dedução e do reembolso, constituindo a regra, no apuramento do imposto devido, a dedução do imposto incidente sobre as operações tributáveis que efetuaram.

  6. Confere direito à dedução integral o imposto suportado nas aquisições de bens ou serviços exclusivamente afetos a operações que, integrando o conceito de atividade económica para efeitos de imposto, sejam tributadas, isentas com direito a dedução ou, ainda, não tributadas que conferem esse direito, nos termos da alínea b), do n.º 1 do artigo 20.º CIVA.

  7. Caso o imposto seja suportado na aquisição de bens ou de serviços exclusivamente afetos a operações sujeitas a imposto, mas sem direito a dedução ou a operações que em sede de IVA não se insiram no exercício de atividades económicas, não é, naturalmente, admissível o exercício do direito à dedução.

  8. Decorre do artigo 23.º CIVA que o legislador impôs determinadas limitações ao direito à dedução, que decorrem da 6ª Directiva, prevendo, além de outras, a não inclusão das operações acessórias imobiliárias e financeiras isentas de IVA, ou seja, o imposto é dedutível apenas na percentagem correspondente ao montante anual das operações que conferem direito à dedução, sendo excluída a dedução, com relevo para o caso sub judice, das mencionadas operações acessórias.

  9. Ora, se por um lado, não descoramos que não serão de incluir, naquele calculo, as operações financeiras que tenham um carácter acessório em relação à atividade exercida pelo sujeito passivo; por outro lado, também não podemos ignorar que esta possibilidade se encontra condicionada ao caracter acessório e materialmente irrelevante deste tipo de operações isentas que não conferem direito à dedução.

  10. Nesta matéria e por ser da sua competência, entenderam os Serviços do IVA que esta possibilidade apenas se aplica quando o montante das operações do setor isento não ultrapasse 5% do volume total de negócios.

  11. Ora, considerando o princípio da neutralidade, intrínseco a este imposto, temos que o carácter acessório deve ser definido com base nos custos e respetivo IVA.

  12. Vale isto por dizer que, tendo em conta que a lógica do IVA é a da dedução de IVA incorrido nas operações tributadas e a não dedutibilidade do IVA incorrido nas atividades isentas, a acessoriedade advém do facto de o sujeito passivo não suportar IVA e de não existirem custos na atividade do sujeito passivo ou estes terem significado pouco expressivo na sua atividade global. O que não sucede in casu.

  13. No caso que nos ocupa, embora os encargos financeiros relativos às vendas a prestações não representarem o objeto principal da atividade e serem acessórias a essa mesma atividade principal que é a venda de livros, os mesmos apresentam, contudo, um valor materialmente relevante (6.2%) que supera os 5% atras referidos e devem, consequentemente, ser incluídos no calculo para obter a percentagem que é definida no artigo 23.º CIVA.

  14. Todavia, ao contrario do decidido na douta sentença, entende a Fazenda Pública que não podem considerar-se “pontuais” e muito menos “insignificantes” os encargos financeiros relativos às vendas a prestações suportados pela Impugnante, ora recorrida, quando os mesmos consubstanciam 6.2% do seu volume de negócios.

  15. Efetivamente, no CIVA não existe nenhuma norma que defina quando é que uma atividade é acessória e, por consequência, quando é que os respetivos proveitos não devem entrar no cálculo de percentagem. Contudo, verificando-se a inexistência na lei de um critério definidor do conceito de acessoriedade, a mesma deve-se pautar por critérios o mais objetivos ou concretos possíveis.

  16. Da mesma forma, à semelhança do que sucede na Sexta Diretiva, também o CIVA não especifica o que deve entender-se por “Operações financeiras acessórias”. Nessa conformidade, tem entendido a administração fiscal que o caracter acessório das operações financeiras em relação à atividade de um sujeito passivo ocorre quando o montante destas não exceda 55 do volume de negócios daquele, deixando, assim, de considerar-se acessórias quando ultrapassem a referida percentagem.

  17. Ou seja, a análise da acessoriedade deve assentar na maior ou menor importância dessa operação na atividade económica da sociedade e não às condições subjetivas da realização das operações financeiras, como defende a impugnante. Em bom rigor, o que importa é o impacto real da operação na atividade económica da sociedade, o impacto na órbita do imposto em que incide. E neste sentido, só se pode concluir que a impugnante praticava tais operações no âmbito comercial, enquadrando-se assim no nº 4 do art.23º do CIVA.

  18. Pelo que, o douto Tribunal a quo, ao ter decidido da forma como decidiu, lavrou em erro de interpretação e aplicação do direito e dos factos, nos termos supra explanados, violando o consagrado nos artigos 19.º e 23º do CIVA.

    TERMOS EM QUE, CONCEDENDO-SE PROVIMENTO AO PRESENTE RECURSO, DEVE A DOUTA SENTENÇA, ORA RECORRIDA, SER REVOGADA, ASSIM SE FAZENDO A COSTUMADA JUSTIÇA!”.

    A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    O recurso foi...

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