Acórdão nº 1647/10.2BESNT de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução10 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I. RELATÓRIO A Fazenda Pública (doravante Recorrente ou FP) veio apresentar recurso da sentença proferida a 22.11.2019, no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Sintra, na qual foi julgada procedente a impugnação apresentada por H… e J… (doravante Recorridos ou Impugnantes), que teve por objeto o indeferimento da reclamação graciosa que versou sobre a liquidação de imposto sobre o rendimento das pessoas singulares (IRS), atinente ao ano de 2006.

Apresentou alegações, nas quais concluiu nos seguintes termos: “

  1. Visa o presente recurso reagir contra a decisão proferida nos presentes autos que julga procedente a impugnação judicial deduzida por H… (e Outros), devidamente identificado nos autos, contra o indeferimento da reclamação graciosa deduzida do acto de liquidação de IRS referente ao exercício de 2006.

  2. Tendo o aqui Impugnante auferido rendimentos no estrangeiro e sendo residente em Portugal, os mesmos encontram-se sujeitos a tributação no território nacional em virtude do princípio da universalidade ou da tributação mundial ínsito no n.º 1 do artigo 15.º do Código do Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Singulares (CIRS), princípio este decorrente também do n.º 2 do artigo 13.º da Lei Geral Tributária.

  3. Contudo, para obviar à dupla tributação dos rendimentos, no país da origem e no país da residência, prevê o CIRS na alínea i) do n.º 1 do artigo 78.º, em conjugação com o n.º 1 do artigo 81.º do CIRS, mecanismo legal reconduzido à dedução à colecta do crédito de imposto por dupla tributação internacional, dedutível até à concorrência da parte da colecta proporcional a tais rendimentos líquidos, considerados nos termos do disposto na alínea b) do n.º 6 do artigo 22.º, crédito esse que corresponderá à menor das seguintes importâncias: imposto pago no estrangeiro ou fracção da colecta de IRS, calculada antes da dedução, correspondente aos rendimentos que no país em causa possam ser tributados, líquidos das deduções específicas previstas neste Código.

  4. Mais, de acordo com o prescrito no n.º 2 do artigo 81.º do CIRS, existindo convenção para eliminar a dupla tributação celebrada por Portugal, a dedução a efectuar não poderá ultrapassar o imposto pago no estrangeiro nos termos previstos pela Convenção, mais resultando da aplicável no caso sub judice que pode o impugnante deduzir do imposto uma importância igual ao imposto sobre o rendimento pago na Suíça.

  5. Resultando da legislação aplicável que a dedução à colecta admitida sempre se reconduzirá ao imposto efectivamente pago pelo Impugnante no estrangeiro em virtude dos rendimentos aí auferidos em 2006, pelo que, essencial seria que o Impugnante tivesse feito prova do imposto efectivamente pago, o que não aconteceu, pois que procede para o efeito à junção de documento de que decorre o imposto retido e não o imposto efectivamente pago na Suíça por efeito da percepção dos rendimentos.

  6. Ora, cabendo ao Estado Português, enquanto Estado da residência, eliminar a dupla tributação assim gerada, através da concessão de um crédito de imposto, para que tal mecanismo possa ser accionado é necessária a apresentação de documento comprovativo do montante do rendimento auferido, natureza do mesmo, e do pagamento do imposto, o qual deverá ser emitido ou autenticado pelas autoridades fiscais do respectivo Estado de onde são originários os rendimentos.

  7. E a errónea apreciação dos factos levada a cabo pela douta sentença centra-se precisamente na equiparação a que procede entre montantes retidos na fonte pela entidade pagadora suíça e montantes efectivamente devidos e pagos a título de imposto às autoridades fiscais suíças por virtude dos rendimentos aí auferidos.

  8. Sendo que, para efeitos de prova do montante de imposto pago no estrangeiro não se configura suficiente um documento, emitido pela entidade que procedeu à retenção na fonte, do qual conste o montante do imposto retido na fonte, uma vez que apenas certifica que tal retenção foi efectuada, não atestando ou provando que o imposto retido foi, efectivamente, entregue nos cofres do Estado estrangeiro.

  9. Ainda é afirmado na douta sentença que a AT aceitou os documentos, contudo, aceitar o documento não significa que desse próprio documento resulte, ou se mostre suportado, o facto alegado pelo Impugnante, pelo que, não podia o Tribunal a quo chegar à conclusão de que do documento resulta o quantum de imposto pago no país da fonte do rendimento com referência ao ano de 2006, pois que nos posicionamos perante exigências probatórias situadas ao nível do efectivo pagamento do imposto num outro Estado que não o território português, que se reconduzem, por isso mesmo, à determinação inequívoca do imposto pago e não do imposto retido, - facto que pode apenas ser atestado pela entidade a quem é efectuado o pagamento do imposto – a autoridade fiscal suíça - , e não pela entidade pagadora dos rendimentos a quem está reservada faculdade de emitir declaração que ateste os rendimentos pagos, precisamente por ser quem procede ao pagamento dos mesmos.

  10. Assim, constituindo a prova do imposto pago no estrangeiro condição sine qua non do reconhecimento do direito à dedução à colecta do montante reconduzido ao crédito por dupla tributação internacional em causa nos presentes autos, mostra-se incontornável que discordemos do entendimento vertido na douta sentença, conforme entendimento vertido no Acórdão, supra parcialmente transcrito, do TCA Norte de 22/02/2012, proferido no processo n.º 00434/09.5BEMDL, não sendo de admitir ademais a inversão do ónus da prova.

  11. Não carreando aos autos o Impugnante documentos capazes demonstrar o montante de imposto pago na Suíça, com referência ao ano de 2006 não logrou fazer a prova que lhe incumbia à luz dos normativos aplicáveis – artigo 81.º do CIRS e artigos 74.º, n.º 1, da LGT e 342.º do Código Civil, não lhe sendo devido o sindicado crédito de imposto.

  12. Atento o exposto, incorreu a douta sentença, ao decidir anular a liquidação de IRS nos presentes autos impugnada, em errónea apreciação da matéria de facto e de direito, por essa via violando o disposto nos n.ºs 1 e 2 do artigo 81.º do CIRS.

    Termos em que, concedendo-se provimento ao recurso deve a decisão ser revogada e substituída por acórdão que julgue totalmente improcedente a impugnação judicial.

    Sendo que Exas. Decidindo farão a Costumada Justiça”.

    Os Recorridos apresentaram contra-alegações, nas quais formularam as seguintes conclusões: “A.

    Em causa nos presentes autos está a questão de saber se os Recorridos fizeram prova bastante do imposto pago na Suíça relativo ao rendimento de juros e dividendos aí obtido, a fim de poderem beneficiar do direito ao crédito de imposto com vista à atenuação da dupla tributação. A este propósito, e para demonstração de tal imposto pago, os Recorridos apresentaram documentos emitidos pelos agentes pagadores (extratos bancários) evidenciando quer os rendimentos quer a retenção na fonte sofrida, assim como troca de e-mails com as autoridades fiscais suíças que expressamente declararam não emitir qualquer outro documento a este propósito.

    B.

    A AT considerou os mesmos documentos válidos e suficientes para a prova dos rendimentos, mas insistiu na primeira instância e reitera no presente recurso que tais documentos são insuficientes para a demonstração do imposto pago no estrangeiro, o que faz i) pondo em causa a sentença recorrida, que está bem fundamentada e não merece reparo; ii) pondo em causa a jurisprudência superior maioritária sobre este tema; iii) ignorando o direito internacional a que Portugal se vinculou, nos termos do qual, e tratando-se de rendimentos de juros, o Estado português se obrigou a aceitar como documento suficiente para a prova do imposto pago no estrangeiro os documentos emitidos pelo agente pagador.

    1. Da factualidade assente na sentença recorrida (cf. ponto R da factualidade assente) resulta que os Recorridos auferiram dividendos na Suíça no valor total de € 7.985,72, relativamente aos quais foi retido imposto no valor total de € 1.197,86 e juros no valor total de € 410.365,96, relativamente aos quais foi retido imposto no valor de € 34.672,76.

    2. A AT não põe em causa tal factualidade (nem quanto aos rendimentos nem quanto à retenção na fonte), que resulta dos documentos emitidos pelas entidades bancárias pagadoras de tais rendimentos.

    3. Desde logo, lidas detalhadamente as alegações de recurso e as suas conclusões (que delimitam o mesmo recurso), conclui-se que o que a AT impugna é exclusivamente a apreciação da prova e decisão da matéria de facto, ainda que nunca especifique (como se lhe impunha) os concretos meios probatórios ou a diferente apreciação dos meios de prova existentes que levariam a concluir por factos diversos e, menos ainda, que factos diferentes dos provados seriam afinal os que deveriam constar da matéria factual assente F. Ao não atacar concretamente os factos assentes da sentença recorrida, não indicando com precisão qual a valoração que se impunha ou que factos deveriam ser retirados ou aditados do probatório e com base em que elementos de prova constantes do autos assim deveria acontecer, deve o recurso em apreço interposto pela AT ser rejeitado quanto ao alegado erro de julgamento de facto por incumprimento do seu ónus de impugnação nos termos do artigo 640.º do CPC, ex vi art.º 2.º e) do CPPT.

    4. Em qualquer caso, por contribuírem para a análise da questão decidenda e clarificar a factualidade a partir da qual o Tribunal a quo efetivamente partiu para a análise que efetuou na sentença recorrida, requer-se, nos termos conjugados dos art.ºs 636º, n.º 2, e 640º, n.º 2 b), ambos do CPC, ex vi art.º 2º, e) do CPPT, se dignem aditar à matéria de facto provada (apenas no caso, repita-se, de ser apreciado o recurso) os seguintes factos R. Os Impugnantes solicitaram às autoridades fiscais suíças a emissão de um certificado indicando o montante total dos dividendos pagos nos anos de 2005 e 2006, bem como o montante do imposto suportado e do...

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