Acórdão nº 433/04.3BELSB de Tribunal Central Administrativo Sul, 10 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelPATRÍCIA MANUEL PIRES
Data da Resolução10 de Março de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul

I-RELATÓRIO B…, SA (doravante B…, ou Recorrente), e o DIGNO REPRESENTANTE DA FAZENDA PÚBLICA (doravante DRFP ou Recorrente), interpuseram recurso da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa, a qual julgou parcialmente procedente a impugnação deduzida contra a liquidação de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC), respeitante ao exercício de 1998, no valor de €324.651,64.

*** A Recorrente B… termina as suas alegações de recurso formulando as seguintes conclusões: “ A. O presente recurso vem interposto da sentença proferida pelo Tribunal Tributário de Lisboa que julgou parcialmente improcedente a impugnação apresentada contra a liquidação adicional de IRC, derrama e juros compensatórios relativa ao exercício de 1998, no montante global de €324.651,64.

B. O Recorrente considera que a sentença recorrida padece de erro de julgamento, discordando do enquadramento jurídico resultante da valoração que dos factos provados foi efectuada e, bem assim, da decisão perfilhada pelo Tribunal a quo.

C. O Relatório Final da Inspecção Tributária não contém os elementos necessários previstos no artigo 62.° do RCPIT, omitindo a menção às datas do início e fim dos actos de inspecção, como lhe é imposto expressamente pelo artigo 62.º, n.º 2, alínea c) do RCPIT e falhando em proceder igualmente à descrição dos motivos que deram origem ao procedimento de inspecção, limitando-se a indicar o número da Nota de Serviço que supostamente a motivou.

D. A AT não justificou, em momento algum do procedimento de inspecção ou ao longo do presente processo, os seus juízos sobre a dedutibilidade dos juros suportados pela Recorrente ou os fundamentos em que se baseou para acrescer ao lucro tributável declarado em 1998 “juros eventuais” devidos, designadamente, com que bases factual e jurídica seria admissível realizar semelhante correcção.

E. Carecendo a notificação das conclusões resultante da inspecção tributária de fundamentação factual suficiente, clara e expressa, os actos tributários que a incorporaram igualmente se encontram não fundamentados, pelo que violaram o disposto nos artigos 268.°, n.° 3 da CRP e 77.“ da LGT.

F. Da matéria assente na sentença recorrida resulta provado que: a) «[d]urante o ano de 1998, a Recorrente adquiriu o capital social das empresas «F… e E…», tendo adquirido também, em simultâneo, os saldos de dívidas que aquelas empresas tinham registado para com o anterior detentor dos respectivos capitais sociais» - cfr. ponto 11 dos factos dados como provados (sublinhado da Recorrente, cit.); b) «[o]s saldos referidos no ponto anterior consubstanciavam empréstimos accionistas, e se deviam a razões comerciais decorrentes da maior dificuldade de recurso daquelas sociedades – F… e E… - ao crédito externo, pelo que consubstanciaram um acto de boa gestão de tesouraria» - cfr. ponto 12 dos factos dados como provados (cit.).

G. Foi considerado provado pelo Tribunal a quo que a ora Recorrente não efectuou quaisquer empréstimos às suas participadas no exercício de 1998. pelo que os empréstimos contraídos pela Recorrente em 1998 não podem ter servido a finalidade de as financiar.

H. À luz dos factos que deu como provados não podia o Tribunal a quo decidir, como fez, em evidente oposição com eles, aplicando jurisprudência do STA que pressupõe que a Recorrente recorreu ao crédito externo com vista ao financiamento, a custo zero, das suas participadas.

I. Extraindo dos factos considerados provados conclusões opostas ao que deles resulta, o Tribunal a quo incorre inevitavelmente em erro de julgamento, devendo a sentença recorrida ser revogada e o acto de liquidação adicional em crise, na parte recorrida, ser consequentemente anulado.

J. A dedutibilidade fiscal dos custos depende apenas de uma relação causal e justificada com a actividade produtiva da empresa, e esta indispensabilidade verifica-se sempre que as operações societárias se insiram na sua capacidade, por subsunção ao respectivo escopo societário, e em especial, desde que se conectem com a obtenção de lucro ainda que de forma indirecta ou mediata.

K. A celebração de um contrato de empréstimo - tendo ficado provado, recorde-se, que a Recorrente não canalizou os montantes obtidos por essa via para o financiamento gratuito das suas associadas - insere-se na capacidade da Recorrente e está relacionada com a gestão da sua actividade e com a obtenção de lucro, e é portanto indispensável à realização de proveitos ou ganhos e à manutenção da sua fonte produtora.

L. A Recorrente não fez mais do que contrair um empréstimo junto de entidades bancárias para financiar a sua actividade económica, e no âmbito dessa actividade — o núcleo do seu objecto social - a financiar a sua exploração de forma a que esta possa prosseguir normalmente a sua actividade económica.

M. Mesmo na hipótese de assistir razão à AT quanto aos fundamentos da correcção efectuada nunca seria possível sustentar a legalidade de uma liquidação adicional que vem «acrescer ao lucro tributável do exercício, os juros que eventualmente resultariam dos empréstimos concedidos [pela Recorrente] durante o exercício de 1998 (aplicados à taxa básica de desconto do Banco de Portugal, taxa de referência para operações de crédito no exercício de 1998)» - cfr. doc. n.° 3, junto à p.i. de impugnação.

N. A correcção realizada ao lucro tributável do exercício de 1998 da Recorrente, com os fundamentos invocados e na modalidade de cálculo utilizada, carece manifestamente de base jurídica.

O. A consequência a retirar da não demonstração da indispensabilidade de um custo é, como não pode deixar de ser, a não dedutibilidade desse custo, arredando-se o montante ilegalmente deduzido dos custos no exercício e nunca o acréscimo ao lucro tributável do contribuinte de quaisquer montantes ficticiamente calculados pela AT, sem qualquer fundamento legal.

P. Ao validar o acréscimo ao lucro tributável da Recorrente de determinadas quantias calculadas ficticiamente pela AT a título de juros que deveriam ter sido cobrados às suas participadas - com respeito, para mais, a empréstimos que a Recorrente nunca concedeu - por oposição à eliminação, dos custos deduzidos em 1998, dos juros suportados pela Recorrente nos empréstimos contraídos, o Tribunal a quo laborou em erro de julgamento devendo a sentença recorrida ser revogada.

Q. A liquidação em crise, na parte aqui recorrida, deve ser anulada por violação do disposto no artigo 23.° do Código do IRC, o qual apenas admite que a Administração Fiscal não aceite a aceitação da dedução de determinados encargos financeiros e não qualquer acréscimo oficioso ao lucro tributável a título de “juros eventuais”.

R. Como esclarece o STA, no Acórdão de 3 de Fevereiro de 1999, proferido no recurso n.° 015810 que «não pode ser rectificada a declaração do sujeito passivo e recorrer-se a estimativas e presunções para apurar o imposto, a partir de um exame à escrita que nada de irregular aponta» (cit.).

S. A conclusão formulada a final pela AT no Relatório Final de Inspecção não tem como base uma qualquer limitação válida ou sequer compreensível ao direito da Recorrente de ser tributada de acordo com o seu lucro real, representando, ao invés, um claríssima violação deste mesmo Principio Constitucional.

T. A interpretação que a Administração parece fazer do artigo 23." do Código do IRC, na sua redacção em vigor à data dos factos, no sentido de este permitir que sejam acrescidos ao lucro tributável da Recorrente os juros que presumivelmente teriam sido cobrados às suas subsidiárias (conforme calculados pela AT e sem qualquer base na contabilidade da Recorrente), ao invés de serem simplesmente desconsiderados os gastos incorridos com os juros efectivamente suportados nos empréstimos alegadamente contraídos para financiar essas mesmas subsidiárias, mostra-se INCONSTITUCIONAL por violação do direito das empresas da Tributação pelo Lucro Real, nos termos que este verte do artigo 104.º, n.º 2, da Constituição, o que desde já se argui para todos os efeitos legais.

U. A liquidação de juros compensatórios apenas seria possível se se considerasse que é devido o imposto em crise, o que já vimos não poder justificar-se ou ter qualquer base legal.

V. Não se verifica nexo de causalidade adequada entre a actuação do contribuinte e o retardamento da liquidação nem a censurabilidade, a título de dolo ou negligencia, da conduta do contribuinte.

W. Não deverá ser imputada responsabilidade por juros compensatórios caso o atraso na liquidação e respectivo reembolso de recebimento alegadamente indevido seja provocado pela conduta do contribuinte e seja errónea a sua posição, mas ele tenha actuado de boa fé e o erro seja desculpável.

X. Como resulta da jurisprudência do Acórdão do STA de 3 de Novembro de 2009, proferido no processo n.° 0961/08, ainda que se considere ser erróneo o entendimento do Recorrente sempre se diria que esse erro resulta de simples divergência, não culposa e que não permitem alegar da existência de dolo ou negligência.

Y. A liquidação de juros compensatórios de que a Recorrente foi alvo é absolutamente ilegal, por erro sobre os pressupostos de facto e direito da imputação da responsabilidade por juros compensatórios e deve ser anulada.

Termos em que deve a sentença recorrida ser revogada na parte objecto do presente recurso, com as devidas consequências legais, designadamente: a) anulação da liquidação adicional efectuada relativamente ao exercício de 1998, no que respeita à correcção referente aos juros suportados pela Recorrente e derivados de empréstimos contraídos em 1998 (no montante de € 543.978,39); b) pagamento de juros indemnizatórios sobre os montantes indevidamente pagos.” *** Notificada da interposição de recurso pela B…, o DRFP não apresentou contra-alegações.

*** O DRFP apresentou as conclusões que infra se reproduzem: “I-Pelo elenco de razões acima arroladas, ressalve-se melhor entendimento, infere-se que a sentença proferida pelo Tribunal “ad quo” julgou a procedência...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT