Acórdão nº 0783/11.2BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução09 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1. – Relatório Vem interposto recurso jurisdicional por INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL,S.A., com os sinais dos autos, visando a revogação da sentença de 16-03-2021, do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou procedente a impugnação intentada por A............, S.A.

, também sinalizado nos autos, no âmbito da liquidação da taxa no valor de €13.631,44 relativa à ligação entre duas vias públicas - construção de troços viários a realizar em terrenos do município e a integrar a rede rodoviária municipal.

Irresignada, nas suas alegações, formulou a recorrente INFRAESTRUTURAS DE PORTUGAL,S.A.

, as seguintes conclusões: I – Em 1994 a Recorrida solicitou licenciamento de acesso à EN 105 ao km …… de grande superfície comercial, com a área de 25.775 m2, o que foi deferido, tendo sido emitido diploma de licença pela ex-JAE e paga a respetiva taxa.

II – Em 2009 o Município de Guimarães submeteu a aprovação da Recorrente projeto de reformulação de acessos envolvendo aquela superfície comercial e a EN 105 e EN 206.

III – Desconhecendo a existência daquele licenciamento de 1994, quando a Recorrente analisou o projeto rodoviário constatou a existência de uma acessibilidade direta à EN 105 por parte da superfície comercial, pelo condicionou a sua aprovação à legalização daquele acesso.

IV – Em 2010 a Recorrida apresentou pedido de legalização de toda a área da superfície comercial servida pela estrada nacional EN 105 e EN 206 (96.689m2) em 2010, tendo sido emitido o respetivo alvará de licença e paga a taxa de 213.631,44€ (93.689m2 x 2,20€).

V – Apesar de não ter questionado a legalização do acesso, de ter apresentado pedido de legalizado e de ter pago a taxa, a Recorrida veio depois reclamar com a invocação de que afinal o acesso já estaria licenciado, o que se confirmou, pelo que se procedeu à reformulação da taxa sobre a área ampliada tendo em conta o licenciamento de 1994, ou seja: 67.923m2 = 93.698m2 (2010) – 25.775 (1994), restituindo-se a quantia de 58.767,00€ (213.631,44€ - 154.864,44€) VI – Além disso, mais alegou e alega que a liquidação é indevida já que foi ela quem realizou, por conta e em nome do Município, as obras de reformulação de acessos, as quais têm natureza pública, pelo que a aprovação do projeto consumiria o eventual licenciamento do mesmo acesso.

VII – Pretende assim a Recorrida desviar a liquidação da taxa para as obras de reformulação dos acessos, ignorando a ampliação da superfície comercial que continua a servir-se da estrada nacional EN 105 e agora também da EN 206.

VIII – É facto assente que a superfície comercial desde 1994 que tem acesso à EN 105 e que após as obras de reformulação continuou a mantê-lo (agora também à EN 206), pelo que a Recorrente não podia deixar de liquidar a vantagem que aquele equipamento tira do acesso à rede rodoviária nacional.

IX – Portanto, o que agora se discute, não é a obra de reformulação dos acessos, a qual foi objeto de aprovação, mas de uma obra particular, em terreno particular e situada à margem de uma estrada nacional com acesso direto à mesma.

X - Não se está a tributar uma obra do particular, a realizar em nome ou por conta do Município, na zona da estrada, mas sim uma obra do particular a realizar-se dentro do estabelecimento comercial (ampliação da superfície) que é servido pela rede rodoviária nacional.

XI – A Recorrente não discute que a obra submetida a aprovação pelo Município (reformulação do nó rodoviário) não tenha natureza pública, o que discorda é que a obra de ampliação da superfície comercial também tenha natureza pública.

XII – Pelo facto de ambas as obras terem sido contemporâneas e até executadas pelo mesmo empreiteiro, não concede à Recorrida o direito a que esta confusão de facto contagie as normas de proteção às estradas nacionais, isto é, que a natureza pública de uma obra se estenda à obra de ampliação do centro comercial, passando a serem ambas de interesse público.

XIII - Se a taxa a suportar pela Recorrida junto da Recorrente não foi contemplada no acordo celebrado com o Município (contrato de direito de superfície da antiga estação de camionagem para criação da NOVA PRAÇA do A............), sib imputet.

XIV – É inconstitucional a alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º do DL 13/71 de 23 de janeiro, quando interpretada no sentido de considerar como de interesse público obra de estabelecimento de acesso a estrada nacional por parte de centro comercial ou a ampliação da sua superfície, se realizada no âmbito ou em conjunto com obras de interesse público promovidas pela requerente, por violação do n.º 1, do artigo 13.º e n.º 2 do artigo 266.º da ambos da CRP, o que desde já se invocado, nos termos e para os efeitos dos artigos 70.º, n.º 1 e 72.º, n.º 1, alínea b) e n.º 2 da Lei n.º 28/82, de 15 de novembro, na sua redação atual.

XV – O TAF de Braga ao considerar que o que está em causa é a obra de reformulação dos acessos como um todo, desprezando o acesso direto do centro comercial à rede rodoviária nacional (EN 105 e EN 206) e a obra de ampliação do centro comercial, e dessa forma, restringir a atuação da Recorrente à aprovação do projeto, bem como a integrar a mesma obra na alínea a), do n.º 3, do artigo 15.º do DL 13/71 de 23 de janeiro, violou não só este artigo como a alínea a), do artigo 11.º do mesmo DL.

NESTES TERMOS, E nos que V. Ex.as mui doutamente suprirão, deverá ser revogada a sentença recorrida, devendo ser substituída por outra, declarando-se válida a liquidação ora impugnada. Assim se fazendo, como sempre, inteira e sã JUSTIÇA.

A recorrida A............, S.A.

apresentou contra-alegações, que rematou com as seguintes conclusões: 1.ª Ao anular o ato de liquidação por falta de base legal habilitante à tributação, a sentença recorrida fez correta interpretação e aplicação do princípio da legalidade e do disposto nos artigos 11.º e 15.º do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, desde logo porque estão excluídos de licenciamento e de tributação as situações de estabelecimento de acessos viários a estradas municipais por conta e iniciativa do município de Guimarães.

  1. Está documentalmente provado nos autos e foi dado por assente (v. pontos 3, 8 e 12 dos factos provados) que as vias que permitem aceder ao centro comercial são estradas municipais, elaboradas por conta e iniciativa municipal, pelo que não existe qualquer acesso do Centro Comercial à EN 105 mas apenas uma ligação entre a EN105 e as ruas municipais circundantes do centro comercial.

  2. A sentença recorrida fez correta interpretação e aplicação do disposto no artigo 15.º, n.º 1, al. g) do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, ao anular o ato de liquidação por falta de base legal habilitante à tributação, já que, nem o citado artigo nem qualquer outra norma legal, autorizam a tributação do estabelecimento de acessos viários de estradas municipais a 39/42 edificações de propriedade privada (nem de estradas nacionais a estradas municipais), como é o caso do acesso em causa nos autos.

  3. Ao anular o ato de liquidação por falta de base legal habilitante à tributação, a sentença recorrida fez correta interpretação e aplicação do princípio da legalidade e do disposto no artigo 15.º, n.º 1, al. g) do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, dado que, nem a citada previsão nem qualquer outra, autorizam a liquidação de taxas para a simples ampliação de pavimento de instalações servidas por acessos a estradas, sendo o facto tributário a constituição ou modificação do acesso às instalações e não a ampliação da área de instalações (v. ac. do STA, de 30.05.2018, no Proc. n.º 0352/18, in www.dgsi.pt).

  4. Ao anular o ato de liquidação por falta de base legal habilitante à tributação, a sentença recorrida fez correta interpretação e aplicação do princípio da legalidade e do disposto no artigo 15.º, n.º 1, al. g) do Decreto-Lei n.º 13/71, de 23 de janeiro, pois a norma em causa apenas autoriza a tributação da constituição de acessos a “instalações industriais”, o que não é o caso de um centro comercial - cfr. ANTÓNIO PEREIRA DA COSTA, Servidões Administrativas, pág. 470 e, na jurisprudência, Ac. Rel. Évora, de 22.02.90, in Col. Jur. Ano XV, I, 309, Ac. do STJ, 11.12.1990, Proc. 079646, in www.dgsi.pt, Ac. da 2.ª Subsecção do CA do STA, de 02/12/92, no Proc. n.º 031033, in www.dgsi.pt.

  5. Como muito bem decidiu a sentença recorrida, ao liquidar à impugnante 40/42 uma taxa pelo estabelecimento de acessos viários que são obras públicas da iniciativa do município e ao liquidarem a tal taxa com fundamento no estabelecimento de acessos viários a um estabelecimento comercial ou por via da ampliação do pavimento desse estabelecimento comercial, aplicando uma norma de incidência que contempla a tributação do estabelecimento de acessos a “instalações industriais”, o ato impugnado viola o princípio da legalidade fiscal e envolve poderes tributários e/ou lançamento de taxas não previstas na lei.

  6. Independentemente do juízo que possa recair acerca do julgamento expresso na douta sentença recorrida, o ato de liquidação anulado pelo Tribunal a quo sempre seria de julgar ilegal e deverá ser anulado pelos demais fundamentos de ilegalidade expressos pela Recorrida na sua impugnação e cujo conhecimento veio a ficar prejudicado.

  7. Como se deixou alegado junto do Tribunal a quo em questão cujo conhecimento ficou prejudicado, os atos impugnados enfermam não só de erro de direito, mas também de erro de facto ou sobre o objeto por fazerem incidir a liquidação sobre uma área de expansão de “67.923m2 = 93.698m2 (2010) – 25.775 m2 (1994)” (cf. Doc. 2), quando tal expansão foi apenas de uma área bruta locável ou para comércio de 3.200 m2.

  8. Como se deixou alegado junto do Tribunal a quo em questão cujo conhecimento ficou prejudicado, ao contrário do pressuposto pela Recorrida, a demonstração da qualidade e da quantidade de área de “instalações 41/42 industriais” não pode deixar de ser ónus...

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