Acórdão nº 02202/08.2BEPRT 01280/16 de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2022
Magistrado Responsável | ARAGÃO SEIA |
Data da Resolução | 09 de Março de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acordam os juízes da secção do Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo: A……….., SGPS, S.A. melhor identificada nos autos, vem recorrer para este Supremo Tribunal da sentença do Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que, julgou improcedente a impugnação judicial por si intentada contra os actos de liquidação de IVA e juros compensatórios relativos aos períodos de janeiro, fevereiro, março, abril, junho, julho, agosto, outubro e dezembro de 2005, no valor global de € 1.088.675,77.
Termina as suas alegações de recurso, formulando as seguintes conclusões: «1. O presente recurso vem interposto da parte da Sentença proferida pelo Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto que julgou totalmente improcedente a impugnação judicial deduzida pela A………., SGPS, S.A. (doravante também designada como Recorrente ou Impugnante) contra os actos de liquidação de IVA e juros compensatórios relativos aos períodos de Janeiro, Fevereiro, Março, Abril, Junho, Julho, Agosto, Outubro e Dezembro de 2005, no valor global de € 1.088.675,77.
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A impugnação judicial que lhe esteve na base vem deduzida contra os actos tributários supra identificados e na respectiva Fundamentação, assente na conclusão de que a Impugnante terá deduzido, alegadamente de modo indevido, o IVA suportado com a aquisição de diversos serviços de consultoria às sociedades B…….. e C…….. Ltd., relacionados com a prospecção de mercado com vista à aquisição de partes do capital da sociedade operadora de telecomunicações D……., SA e, bem assim, com o pagamento ao BCP de uma comissão pela organização e montagem de um empréstimo obrigacionista destinado a integrar a estrutura de financiamento das sociedades suas participadas.
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Na opinião da Recorrente, a Sentença está ferida de anulabilidade, porquanto o Tribunal fez uma interpretação e aplicação inidóneas do Direito consequentemente aplicável, em termos de se poder mesmo alegar a violação de princípios basilares do direito comunitário, em que aquele essencialmente assenta: o Tribunal não captou adequadamente a razão de ser das normas e o tipo de casos que as mesmas pretendem abranger, para o que terá contribuído uma aplicação insuficiente da doutrina disponível e uma submissão forçada dos dispositivos legais aos factos alegados e provados.
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Em primeiro lugar, não faz sentido tratar as SGPS como se lhes correspondesse uma isenção subjectiva - que, de resto, não existe na mecânica do IVA - capaz de estender-se a todas e quaisquer operações por elas praticadas: a verdade irredutível é a de que este tipo de sociedades pode, efectivamente (na modalidade “mista” que já se identificou), levar a cabo operações incluídas na circunscrição de incidência do IVA, assim se tomando sujeitos passivos desse imposto e sendo legalmente autorizadas a deduzir o imposto pago a montante, tendo em conta a proporção dessa sua actividade que não esteja isenta.
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É esta, aliás, a posição unânime da actual Jurisprudência Comunitária, sumariada no Acórdão, de 6 de Setembro de 2012, proferido no âmbito do processo C-496/11, conhecido por «Acórdão Portugal Telecom», Acórdão este de que resultam, aliás, particularmente expressivas as semelhanças com o presente caso.
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Trata-se de uma orientação que a própria Jurisprudência dos tribunais superiores portugueses tem vindo a seguir de perto, como é disso exemplo o Acórdão do Tribunal Central Administrativo - Sul de 29/05/2007, proferido no processo de recurso jurisdicional n.º 00833/03, no qual se averigua precisamente, como na situação sub judice, a dedutibilidade do IVA suportado por uma SGPS na aquisição de serviços de consultoria (contabilística, publicitária, jurídica, fiscal, etc.) que foram posteriormente repercutidos nas respectivas participadas.
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As SGPS exercem, com efeito e indubitavelmente, uma “actividade económica”, tal como esse conceito é recortado pela Sexta Directiva, constituindo, nessa medida, sujeitos passivos de IVA.
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A este respeito, insista-se: a actividade económica prosseguida por este tipo de sociedades - de aquisição e gestão de participações sociais, de intermediação financeira (obtenção e concessão de crédito) e de direcção dos negócios - envolve uma sucessão integrada e coordenada de actos projectados sobre um conjunto de participações sociais, tendo por objectivo a sua detenção estratégica, auferindo os respectivos dividendos ou tendo por objecto a realização de ganhos com a sua alienação. Esta gestão de participações sociais efectuada pelas sociedades deste tipo envolve uma centralização e especialização na forma de exercer o conjunto de direitos e deveres sociais, de índole patrimonial e de controlo das participadas, inerentes à titularidade de cada participação, tendo em vista intervir na maximização da rentabilidade dessas participações, seja por via dos dividendos a obter, seja por via da realização de ganhos com a que alienação.
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Por conseguinte, tendo por base a matéria de facto carreada para os presentes e dada como provada pelo Tribunal a quo, a Recorrente afigura-se, indubitavelmente, como uma holding “mista”. A sua interferência na gestão das sociedades participadas é reiterada e relevante, nomeadamente através da cooperação na definição da sua estratégia e na prestação de serviços remunerados, para o que frequentemente necessita, por sua vez, de adquirir de terceiros fornecimentos e serviços da mais variada natureza.
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Aliás, conforme se demonstrou nos autos, e o Tribunal aceita, quer a aquisição da D………, quer a construção e montagem de um empréstimo obrigacionista destinado à satisfação das necessidades de tesouraria das sociedades suas afiladas relacionadas, conforme referido supra, com a concretização de um investimento específico («Triple Play»), foram decididas tendo essencialmente em vista os benefícios económicos que o seu sucesso poderia trazer às participadas da Impugnante, o que, desde logo, demonstra, não só que a sua política de aquisição de participações é orientada pelo critério do interesse específico das suas subsidiárias, mas também, e principalmente, que até através dessa actividade de aquisição de participações sociais a Impugnante interfere na gestão das sociedades operacionais de cujo capital é detentora.
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Por outro lado, ao contrário do que parece vir insinuado na Sentença, o facto de a referida aquisição não ter sido concretizada não releva em sentido contrário do que vem dito, porquanto tal vicissitude não impede a consideração, à luz de tudo o que atrás dissemos, de que a aquisição dos serviços na qual se suportou o IVA foi efectuada no âmbito de uma actividade da Recorrente que inclui a realização de operações sujeitas e não isentas do imposto.
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Aliás, havendo ligação é até indiferente o objectivo último prosseguido pelo-sujeito passivo, o que, de resto, é confirmado pela Jurisprudência, designadamente pelo Acórdão Portugal Telecom (considerando 38) - “quanto ao regime aplicável ao direito a dedução, para conferir o direito a dedução previsto no artigo 17.º, n.º 2, da Sexta Directiva, os bens ou os serviços devem apresentar um nexo directo e imediato com as operações a jusante com direito a dedução. A este respeito, é indiferente o objectivo último prosseguido pelo sujeito passivo” - e pelos acórdãos Midland BanK (considerando 20), Abbey National (considerando 25) e Cibo Participations (considerando 28) - uso da expressão “utilizados... para” demonstra que, para conferirem direito à dedução prevista no nº 2, os bens ou serviços em causa devem apresentar uma relação directa e imediata com as operações sujeitas a imposto e que, para este efeito, o objectivo final prosseguido pelo sujeito passivo é indiferente”.
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Para além disso, a actividade financeira da...
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