Acórdão nº 0411/15.7BEPRT de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2022
Magistrado Responsável | ANÍBAL FERRAZ |
Data da Resolução | 09 de Março de 2022 |
Emissor | Supremo Tribunal Administrativo (Portugal) |
Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.
A............, Lda. – Em liquidação, …, recorre de sentença, proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) do Porto, em 30 de setembro de 2021, que julgou improcedente impugnação judicial, visando o “indeferimento do recurso hierárquico deduzido da apresentação da reclamação graciosa intentada da liquidação de IVA do período de 1012 e respectiva liquidação de juros compensatórios, no montante total de € 2.144.001,06”.
A recorrente (rte) produziu alegação, onde conclui: «
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A possibilidade de requerer a passagem de certidão com os elementos omitidos na notificação originária é uma mera faculdade que a Recorrente poderia exercer, ou não, não se podendo considerar suprido o vício daquela notificação pelo não uso da dita faculdade pois que desde logo decorre daquele artigo 37º, nº 1 do CCPT que o interessado «pode» requerer a passagem de certidão e não que deve requerer a mesma, tal acentuando precisamente o facto de a possibilidade de requerer a certidão ser uma faculdade e não um qualquer dever jurídico.
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Na interpretação da lei deve o intérprete presumir que o legislador soube exprimir o seu pensamento em termos adequados – artigo 9º, nº 3 do Código Civil e no presente caso não existem razões que possam levar à conclusão de que o legislador se terá expresso de forma medíocre, dizendo menos do que aquilo que pretenderia dizer.
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E que a notificação efectuada, nos termos em que o foi, é nula dúvidas não podem subsistir, nulidade essa que não é sequer passível de sanação – artigo 137º, nº 1 do CPA na versão vigente há data dos factos.
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Bem ao contrário do que a Douta Sentença parece entender a legitimação dos juros compensatórios depende da imputabilidade de um juízo de culpa à contribuinte aqui Recorrente e essa imputabilidade, ainda que mínima, deverá constar da notificação sendo este o entendimento que tem feito vencimento nos Tribunais Superiores onde se tem continuado a decidir como citado supra no corpo alegatório.
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Pelo que não constando tal imputação de culpa à Recorrente, culpa essa causal e motivadora do atraso na liquidação, fenece de sustentáculo na lei a liquidação de juros compensatórios f) Os referidos juros compensatórios resultam de uma operação realizada após a declaração de insolvência da A............ e no âmbito da liquidação do activo para satisfazer o passivo, pelo que será correcto dizer-se que foi a situação de insolvência da A............ o nexo causal com a operação realizada sendo, assim, aquela insolvência que cumpre trazer à colação.
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A insolvência da A............ foi declarada, por decisão em julgado transitada, como fortuita e, logo, não culposa, ou seja, o tribunal com competência especializada declara que não houve culpa na situação de insolvência da A............ mas logo aparece a AT a liquidar juros compensatórios que dependem, precisamente, da existência de culpa.
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Não se pode nunca olvidar que as decisões dos tribunais transitadas em julgado, por expressa imposição constitucional, são para cumprir pois vinculam entidades públicas e privadas pois que nos termos do disposto no artigo 205.º n.º 2 da Constituição da República Portuguesa, «As decisões dos tribunais são obrigatórias para todas as entidades públicas e privadas e prevalecem sobre as de quaisquer autoridades».
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No nosso Estado de Direito democrático a lei das leis como é chamada, ou a que ocupa a primazia é a lei fundamental ou a Constituição da República Portuguesa, o que vale dizer que todas as outras leis devem obediência ao estatuído na Constituição da República Portuguesa e por outro lado, no artigo 20.º da Constituição da República Portuguesa, consagra-se o direito ao acesso à justiça que a todos os cidadãos é consagrado, para a defesa dos seus direitos e interesses.
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Este preceito, insere-se nos direitos, liberdades e garantias dos cidadãos, que nos termos do disposto no artigo 18.º da CRP são directamente aplicáveis, vinculando entidades públicas e privadas; posto isto, conclui-se que a decisão que foi proferida pelo Tribunal do Comércio que declarou a insolvência como fortuita, por ter reflexos em actos subsequentes, se terá de impor à AT a quem nada mais resta que não seja respeitar tal decisum e abster-se de tentar retirar consequências que o violem, designadamente liquidar juros compensatórios que dependem de uma culpa que já foi declarada como inexistente por um tribunal.
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O acto praticado pela Recorrente foi-o no âmbito da liquidação do seu activo não sendo o resultado do exercício de uma actividade económica pois esta a Recorrente, atento o seu estado de insolvência, já não a tinha.
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Ora a tributação em IVA depende sempre do exercício de uma actividade económica uma vez que só com tal exercício se assume a qualidade de sujeito passivo do imposto, é o que resulta claramente do artigo 2º, nº 1 a) do Código do IVA.
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Como será bom de ver o acto praticado pela Recorrente não o foi no âmbito do exercício de qualquer actividade económica, e, logo, situou-se fora do campo de aplicação do imposto.
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Como o tem entendido o TRIBUNAL DE JUSTIÇA DA UNIÃO EUROPEIA na Jurisprudência supra citada no corpo alegatório.
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Ora não se pode deixar de trazer à colação quanto à jurisprudência do TJUE que a interpretação feita por aquele Tribunal de normas de matriz comunitária prevalece sobre a interpretação feita internamente nos Estados Membros, isto por força do artigo 8º, nº 4 da Constituição da República Portuguesa.
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O que se encontra em causa nos autos, e não se discute atento o probatório fixado, não é a transmissão do direito de superfície mas sim a cessão da posição contratual atinente a um direito de superfície que consta de um contrato.
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São coisas diversas e que não se confundem.
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E se quanto à primeira figura jurídica se pode configurar, ainda que cum granum salis, uma transmissão de bens já quanto à segunda figura tal não é possível pois que ao contrário de uma simples transmissão de um bem a cessão de posição contratual juridicamente é o negócio pelo qual um dos outorgantes num qualquer contrato bilateral ou sinalagmático transmite a terceiro o complexo dos direitos e obrigações que lhe advieram desse contrato, ou seja, bem ao contrário da mera transmissão do bem é todo o feixe de direitos e obrigações decorrentes do contrato que são alvo de transmissão.
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Como o entende toda a Doutrina citada no corpo alegatório.
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Sendo ainda certo que a Jurisprudência, também supra citada, afina pelo mesmo diapasão.
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