Acórdão nº 01683/12.4BEBRG de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 09 de Março de 2022

Magistrado ResponsávelANÍBAL FERRAZ
Data da Resolução09 de Março de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acórdão do Supremo Tribunal Administrativo (STA), com sede em Lisboa; # I.

A representação da Fazenda Pública (rFP) recorre de sentença, proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal (TAF) de Braga, em 18 de dezembro de 2020, que julgou procedente ação administrativa (especial), apresentada por A………… e B………….., …, visando “o ato administrativo que ordenou a realização de uma ação inspetiva à contabilidade dos autores relativamente aos exercícios de 2008, 2009 e 2010”.

A recorrente (rte) produziu alegação e concluiu: « I. Visa o presente recurso reagir contra a douta sentença a qual, julgou procedente a acção administrativa e em consequência anulou o acto administrativo sindicado, escorando o seu entendimento na jurisprudência propalada acerca de idêntica matéria pelo Tribunal Central Administrativo Norte proferido no acórdão de 22.02.2018 no âmbito do Proc. n.º 1290/17.5BEBRG, e no âmbito do acórdão vertido no Proc. n.º 3244/15.7BEBRG, entendendo que a Recorrente no acto determinativo da realização da acção inspectiva não deu a conhecer a motivação de facto e de direito, não tendo igualmente a carta aviso e a respectiva ordem de serviço fundamentado a decisão da realização da acção inspectiva.

  1. É contra tal entendimento que se insurge a Recorrente.

  2. Importa referir que, as questões subjacentes ao presente recurso subsumem-se a questões de direito e sendo a acção de valor indeterminado encontram-se verificados os pressupostos para a admissão do recurso per saltum a que alude o disposto no Art.º 151.º do CPTA.

  3. No que concerne à fundamentação dos actos a jurisprudência desse Venerando Tribunal tem uniformemente vindo a entender que a fundamentação do acto é um conceito relativo que varia conforme o tipo de ato e as circunstâncias do caso concreto, sendo que a fundamentação é suficiente quando permite a um destinatário normal compreender o itinerário cognoscitivo e valorativo seguido pelo autor do ato, ou seja, quando o destinatário possa conhecer as razões que levaram o autor do ato a decidir daquela maneira e não outra (v.d. acórdão proferido 13.04.2000 no âmbito do recurso n.º 31.616 e de 1998-10-28 in Acórdãos Doutrinais do Supremo Tribunal Administrativo, págs. 503-512, e ainda os Acórdão de 15.02.2007 proferido no âmbito do Proc. n.º 1096/06 de 11.11.2004, Proc. n.º 504/04 de 23.12.2003, Proc. n.º 48.168-A (Pleno) de 30.04.2003, Proc. n.º 46556 (Pleno) de 10.07.2002 e Proc. n.º 274/2002 e de 29.10.2009 proferido no âmbito do Proc. n.º 0778/09).

  4. Extrai-se assim que, a fundamentação é um conceito relativo, que varia consoante o tipo legal de ato administrativo em concreto, havendo que entender a exigência legal em termos hábeis, dada a funcionalidade do instituto e os objectivos essenciais a prosseguir.

  5. Aqui chegados importa, para efeitos de enquadramento, referir que a acção inspectiva teve por finalidade efectuar um procedimento externo com referência aos anos de 2008, 2009 e 2010 aos Recorrentes tendo disso feito menção a carta aviso bem como, os despachos exarados nas ordens de serviço, os quais preenchem claramente os requisitos da fundamentação plasmada na lei, ou seja identificava os sujeitos passivos, o âmbito e a extensão da acção inspectiva, e a identificação dos funcionários.

  6. Pelo que, à revelia do entendimento propugnado na sentença os actos sob escrutínio com vista comprovação dos elementos declarados e das obrigações tributárias preenchem claramente os requisitos da fundamentação legal, procedendo a sentença a uma errónea interpretação e aplicação das normas jurídicas, não se padecendo os aludidos actos do vício de falta de fundamentação, que lhe imputa.

  7. Importa referir que à revelia do arguido na sentença recorrida, inexiste similitude entre as questões apreciadas pelo acórdão do TCA e os presentes autos, porquanto naquele estava em causa a realização de uma acção inspectiva de âmbito parcial, a qual foi depois aproveitada para a realização de uma acção inspectiva global e neste está em causa a realização de uma acção inspectiva externa, tendo os Recorridos sido notificados da fundamentação elencada na lei para a carta aviso, alegando-se na notificação que ao abrigo do Art.º 15.º do RCPIT a eventual alteração ao âmbito e extensão da acção inspectiva, resultará de despacho fundamentado da entidade que o ordenou.

  8. Recorta-se assim que não tendo havido uma alteração do âmbito e extensão da acção inspectiva no caso sob escrutínio, não é admissível independentemente de os Recorridos serem idênticos, similitude entre o entendimento vertido na jurisprudência citada e a sentença recorrida.

  9. Refira-se que, no Art.º 49º do RCPITA, o primeiro acto formal do conhecimento do sujeito passivo consiste numa comunicação, prévia ao procedimento inspetivo, através de carta-aviso, a avisá-lo de que vai ser objeto de uma ação inspectiva, (cfr. ainda Art.º 59.º, n.º 3, alíneas l) e m), da LGT).

  10. Ora, entende a Recorrente que o acto formal de comunicação prévia, por carta-aviso, deve fundamentar-se, segundo a lei, obedecendo apenas aos elementos expressamente previstos na norma, constantes das alíneas a) e b) do n.º 2 e n.º 3, do RCPIT (conjugado com o disposto no Art.º 59.º, n.º 3. alíneas l) e m), da LGT).

  11. Por outro lado, no Art.º 62.º, n.º 3, alínea e), do RCPITA, o legislador prevê que é com a notificação do teor do relatório da ação inspectiva que o sujeito passivo toma conhecimento da Descrição dos motivos que deram origem ao procedimento e, igual entendimento será propugnado com respeito à Ordem de Serviço, em face do disposto no Art.º 46.º, n.º 3, do RCPITA, em conjugação com o Art.º 62.º, n.º 3, al. e), do RCPITA.

  12. Mostrando-se cumprida a formalidade expressa na lei na Carta aviso e dada a conhecer os elementos que a compõem, entende a Recorrente que logo no momento em que os Recorridos foram notificados da determinação da realização da inspeção (com o envio da Carta-Aviso) não se impõe à revelia do propugnado na sentença, que se tenha conhecimento de outros elementos que não aqueles que a citada norma pré estabelece.

  13. Conforme decorre do Art.º 62.º, n.º 3, alínea e), do RCPITA, o relatório deve conter os seguintes elementos: e) Descrição dos motivos que deram origem ao procedimento, com a indicação do número da ordem de serviço ou do despacho que o motivou., determinando o RCPITA que é o relatório que deve integrar as razões de facto e de direito que levaram à realização da ação inspetiva (quanto aos motivos/critérios, faz-se uma remissão para o Art.º 27.º, do RCPITA).

  14. Logo, antes de iniciado o procedimento inspetivo, foi dado pleno cumprimento ao disposto no Art.º 49.º do RCPITA, não tendo ocorrido qualquer violação do dever de fundamentação como concluiu a sentença recorrida.

  15. Apraz referir que o legislador prevê, expressamente, quais os elementos e os meios que permitem ao inspecionado melhor compreender e nela participar, colaborar e exercer o contraditório, dotando-o de um conjunto de direitos plasmados ao longo do RCPITA, entre os quais, a receção prévia ao procedimento da Carta-Aviso bem como, a credenciação do inspetor que dará inicio ao procedimento inspetivo.

  16. Pelo que, o RCPITA densifica de modo expresso e taxativo quais os elementos a integrar na comunicação prévia ao desencadeamento da actividade inspectiva, sendo certo que, do conjunto desses elementos, não se estatui que haja de levar-se, nessa fase procedimental, ao conhecimento do sujeito passivo os motivos/razões que levaram à sua seleção, tendo o legislador estabelecido normas de regulação da atividade administrativa inspetiva e, salvaguardando, por previsão normativa...

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