Acórdão nº 1931/09.8BELRS de Tribunal Central Administrativo Sul, 24 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelTÂNIA MEIRELES DA CUNHA
Data da Resolução24 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Sul
  1. RELATÓRIO O Ministério das Finanças (doravante Recorrente) veio apresentar recurso da sentença proferida a 31.10.2020, no Tribunal Tributário de Lisboa, na qual foi julgada procedente a ação administrativa especial apresentada por D…., AS, representada por D…, Lda.

    (doravante Recorrida ou A.), que teve por objeto o indeferimento do pedido de reembolso de imposto sobre o rendimento de pessoas coletivas (IRC), relativo ao exercício de 2005.

    Nas alegações apresentadas, o Recorrente concluiu nos seguintes termos: “A.

    A Entidade ora Recorrente, salvo o devido respeito entende que, contrariamente ao que se entendeu na douta sentença, não podia, in casu, a A., ora recorrida, beneficiar da isenção de retenção na fonte decorrente da Directiva 90/435/CEE.

    B.

    Sobre a matéria relativa à isenção de retenção na fonte dos “dividendos distribuídos por uma sociedade de direito português a uma sociedade de um Estado membro da União Europeia”, rege o nº3 do artigo 14º do CIRC, que transpôs para a ordem jurídica interna a Directiva 90/435/CEE. Entende-se na sentença recorrida que a administração deveria ter aplicado esse regime no caso em apreço, pois que tal aplicação decorreria do Acordo sobre o Espaço económico Europeu (de ora em diante EEE).

    C.

    De acordo com a jurisprudência constante do Tribunal de Justiça, “incluem-se no âmbito de aplicação material das disposições do Tratado relativas à liberdade de estabelecimento as disposições nacionais que se aplicam á detenção, por um nacional do Estado-Membro em causa, de uma participação no capital de uma sociedade com sede noutro Estado-Membro que lhe confira uma influência certa sobre as decisões dessa sociedade e lhe permita determinar as respectivas actividades”.

    D.

    Uma vez que a participação que a A. detém na sociedade Det Norske Veritas Portugal – Classificação Certificação e Serviços Lda, SA alegadamente corresponde a 88,24% do respectivo capital social, mesmo admitindo, sem conceder, que a legislação portuguesa em apreço pudesse ter efeitos restritivos sobre a livre circulação de capitais, tal deveria ser apreciado à luz do regime da liberdade de estabelecimento.

    E.

    No Acordo EEE, enquanto a matéria da Liberdade de Circulação de Capitais se encontra estabelecida no artigo 40º, a Liberdade de Estabelecimento aparece regida no artigo 31º.

    F.

    Ora, embora no resto idêntico ao artigo 43.° do Tratado CE, o artigo 31.° do Acordo EEE remete para as disposições específicas constantes dos anexos VIII a XI desse Acordo e os signatários do acordo EEE entenderam não fazer constar desses anexos a Directiva 90/435/CEE do Conselho, de 23 de Julho de 1990.

    G.

    Daí decorrendo a inexistência de base legal para aplicação do regime da Directiva 90/435/CEE ao caso em apreço.

    H.

    Acresce que, ainda que assim não entendesse, não poderia a sentença recorrida deixar de analisar, como tem entendido o TJUE, se estava assegurado, através da CDT, “que o imposto retido na fonte seja compensado pelo Estado da Sociedade-mãe, neutralizando o efeito da aplicação da retenção na fonte”.

    I.

    É que, ademais, nos termos do n.°3 do artigo 23.° da Convenção da CDT com a Noruega, a A. tem a possibilidade de deduzir no imposto pago na Noruega uma importância correspondente às importâncias retidas cujo reembolso está em causa, pelo que nunca poderia considerar verificar-se qualquer violação das disposições do Acordo EEE.

    J.

    Acresce ainda que, como de resto decorre da douta sentença, mesmo que, hipoteticamente, a A. fosse uma entidade susceptível de beneficiar da isenção de retenção na fonte prevista na Directiva 90/435/CEE, bem como no artigo 14º do CIRC, para tal tinha de cumprir o disposto no nº4 desse artigo 14º do CIRC, cabendo-lhe fazer prova de que se encontrava nas condições de que dependia a isenção aí prevista.

    K.

    Ora, contrariamente ao que se entendeu na sentença recorrida, a ora recorrida não apresentou prova: nem da percentagem de participação que detinha na sociedade portuguesa; nem que ainda tinha essa participação dois anos depois da sua aquisição; nem que manteve essa participação de modo ininterrupto na sua titularidade durante esses dois anos.

    L.

    Na realidade relativamente a isso a A. apenas apresentou os modelos RFI (mod.8 RFI e mod.22 RFI) e, como se pode ver pela análise do quadro IX da Mod.8-RFI e quadro IX da mod.22-RFI (que constam do verso da folha de cada um desses modelos, juntos ao PA), dos mesmos apenas consta uma declaração da própria A. de que tem determinada percentagem de participação no capital da sociedade portuguesa, bem como de qual a data em que terá adquirido tal participação (e nada consta, sequer, relativamente à questão da titularidade ininterrupta).

    M.

    Pelo que, contrariamente ao que se entendeu na sentença recorrida, não foi feita prova de que “a Autora manteve de forma ininterrupta por período superior a dois anos, quotas representativas de 88,24% da sociedade D… Portugal Lda”.

    N.

    Nem, diga-se, tal prova consta de fls.27 dos autos, como é afirmado na douta sentença, e isso porque naquela fl.27 dos autos se encontra, precisamente, o acima referido Mod. 8-RFI e apenas a parte da frente dessa folha (não constando sequer aí o verso da folha desse modelo RFI).

    O.

    Ao ter considerado provados os factos supra - ponto nº2 da matéria dada como provada na douta sentença - incorreu a sentença recorrida em erro de julgamento em matéria de facto.

    P.

    Por fim, dado que, como demonstrámos nos presentes autos, o acto impugnado nos presentes autos não padece de qualquer vício ou erro, de facto ou de direito, carece de sentido, a condenação da Administração no pagamento de juros indemnizatórios nos termos do artigo 43º da LGT.

    Q.

    Temos, pois, que a douta sentença recorrida padece dos apontados erros de julgamento em matéria de facto e de direito, apresentando-se, ademais, desconforme com todos os preceitos acima referenciados, e, em consequência, não deve ser mantida.

    R.

    Ao que acresce que o despacho da Directora de Serviços das Relações Internacionais não padece de qualquer vício, designadamente dos que lhe foram assacados pela sentença recorrida, traduzindo, antes, a correcta interpretação e aplicação da lei aos factos, pelo que merece ser confirmado na ordem jurídica.

    Termos em que, com o mui douto suprimento de V. Ex.as, deverá ser dado provimento ao presente recurso jurisdicional e anulada a douta sentença recorrida; E confirmar-se, atenta a sua manifesta legalidade, o despacho da Directora de Serviços das Relações Internacionais impugnado nos autos, como é de Direito e Justiça”.

    A Recorrida não apresentou contra-alegações.

    O recurso foi admitido, com subida imediata nos próprios autos e efeito suspensivo.

    O Ilustre Magistrado do Ministério Público (IMMP) neste TCAS foi notificado nos termos do art.º 146.º, n.º 1, do Código de Processo nos Tribunais Administrativos (CPTA), ex vi art.º 279.º, n.º 2, do Código de Procedimento e de Processo Tributário (CPPT), tendo emitido parecer, no sentido de a sentença ser anulada, para a realização de diligências instrutórias e eventual ampliação da matéria de facto.

    As partes foram notificadas do mencionado parecer, nada tendo dito.

    Colhidos os vistos legais, vem o processo à conferência.

    São as seguintes as questões a decidir: a) Há erro na decisão proferida sobre a matéria de facto? b) Há erro de julgamento, uma vez que a A. não podia beneficiar da isenção de retenção na fonte decorrente da Diretiva 90/435/CEE, em virtude de tal não decorrer do Acordo sobre o Espaço Económico Europeu (Acordo EEE)? c) Há erro de julgamento, em virtude de a A. ter a possibilidade de deduzir o imposto pago, ao abrigo dos instrumentos de direito internacional? d) Há erro de julgamento, uma vez que a Recorrida não provou as condições de que depende a isenção? II. FUNDAMENTAÇÃO DE FACTO II.A.

    O Tribunal recorrido considerou provada a seguinte matéria de facto: “1) A Autora, D…., AS, é uma sociedade com “residência” na Noruega para efeitos de imposto sobre o rendimento do exercício de 2006 - cf. teor de fls. não numeradas do Processo Administrativo (PA) apenso aos autos.

    2) A Autora, D…, AS, participa em 88,24% no capital social da sociedade D…., Lda., desde 01.01.89 - cf. doc. de fls. 27 dos autos, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

    3) Em Assembleia-Geral realizada em 04.07.2005, os acionistas da D… Portugal, deliberaram a distribuição de resultados transitados num total de € 400.000,00 dos quais € 352.960,00 foram distribuídos à D…, AS, e os restantes €47.040,00 à A/S V… - cf. doc. n.º2, junto com a petição inicial (PI), cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

    4) Os dividendos foram colocados à disposição da D…, AS, no dia 22.08.2005 e, foram sujeitos à taxa de retenção na fonte de 10% - cf. doc. n.º3, junto com a PI, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

    5) Em 02.09.2005, a Autora procedeu à liquidação do imposto retido no valor total de € 35.296,00 - cf. doc. n.º4, junto com a PI, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

    6) Em 28.12.2006, a Autora deduziu junto da Direção de Serviços de Relações Internacionais da Direção Geral dos Impostos, pedido de reembolso do imposto retido na fonte, tendo apresentado o Mod. 8-RFI e juntando o certificado de residência emitido na Noruega e a guia de pagamento das retenções na fonte - cf. doc. n.º5, junto com a PI, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

    7) No Projeto de Decisão do pedido de reembolso entendeu a DSRI que o pedido de reembolso seria de indeferir - cf. doc. n.º6, junto com a PI, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

    8) Por despacho de 08.07.2009 da Diretora de Serviços da Direção de Serviços das Relações Internacionais foi indeferido o pedido de reembolso da retenção na fonte no valor de €35.296,00 - cf. doc. n.º7, junto com a PI, cujo teor aqui se dá por reproduzido para todos os efeitos legais.

    9) Por ofício datado de 10.07.2009 e...

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