Acórdão nº 4705/17.9T8VIS-K.C1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 22 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelLUIS ESPÍRITO SANTO
Data da Resolução22 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Processo nº 4705/17.9T8VIS-K.C1.S1.

Acordam, em Conferência, os Juízes do Supremo Tribunal de Justiça (6ª Sessão).

Apresentada a presente revista ao relator para apreciação liminar, foi por este proferida decisão singular nos seguintes termos: “Nos autos do incidente de qualificação da insolvência de DOUROMEL –FÁBRICA DE CONFEITARIA, LDA, em que é Requerido AA, a correr termos pelo Juízo de Comércio ..., Comarca ..., foi por este interposto recurso do despacho de 3 de Setembro de 2019, que considerou que o prazo para deduzir oposição se iniciava com a notificação do indeferimento do recurso de impugnação da decisão da Segurança Social sobre o apoio judiciário requerido.

Em 10 de Março de 2020, no Tribunal da Relação ..., foi proferida decisão singular que negou provimento ao recurso e confirmou a decisão recorrida.

Consta da mencionada decisão: “No âmbito do incidente de qualificação da insolvência de Douromel –Fábrica de Confeitaria Lda, em que é requerido AA, foi proferido, em 03.09.2019, despacho do seguinte teor: “Informe o Requerido AA que o despacho que declara cessada a interrupção da instância (que efectivamente não lhe foi notificado), é meramente declarativo e não determina o início do prazo para deduzir oposição. Este prazo inicia-se com a notificação da decisão do indeferimento do pedido de apoio judiciário ou com a decisão de indeferimento do recurso de impugnação da decisão da Segurança Social sobre a concessão do apoio judiciário.” Inconformado com tal decisão, dela interpôs recurso o requerido AA, visando a sua revogação para ser substituída por outra que considere que, só com a notificação do despacho que julga cessada a interrupção da instância, por improcedência da impugnação judicial do indeferimento do pedido de protecção jurídica, se inicia o prazo para deduzir oposição ao incidente de qualificação de insolvência.

Em síntese, são os seguintes os fundamentos do recurso: I - A Recorrente deduziu pedido de apoio judiciário, que foi indeferido, e impugnou judicialmente a decisão de indeferimento, que foi indeferida por despacho de 10.04.2019.

II – Foi notificada do indeferimento da impugnação judicial, mas não foi notificada se: i) podia recorrer para instância superior; ii) qual o prazo do recurso, iii), a data do trânsito, e iv) se era obrigatória a constituição de mandatário; III – A Recorrente não estava patrocinada por Mandatário Judicial; IV – Só a partir da notificação do despacho, com os elementos referidos em III, começava a correr o prazo para deduzir oposição ao incidente de qualificação da insolvência; V – Ao não notificar a Recorrente nos termos supra referidos, o tribunal omitiu o dever de cooperação; VI – Acresce que a própria notificação/citação de que tinha sido aberto o incidente de qualificação da insolvência como culposa, também não cumpre o disposto no art. 227º do CPC.

Não foram apresentadas contra alegações.

Por a questão decidenda revestir manifesta simplicidade, profere-se decisão sumária nos termos do art. 656º do CPC.

Fundamentação.

Elementos que relevam para a decisão do recurso: 1. O Recorrente AA, requerido no incidente de qualificação de insolvência de “Douramel – Fábrica de Confeitaria, Lda”, deduziu pedido de apoio judiciário, que foi indeferido pelos Serviços da Segurança Social competente.

  1. O Recorrente impugnou judicialmente a decisão de indeferimento, sem sucesso pois que por despacho do Sr. Juiz de Comércio de ..., de 10.04.2019, foi julgada improcedente a impugnação e mantida a decisão de indeferimento.

  2. Por requerimento de 25.07.2019, o Recorrente, em resposta à notificação para se pronunciar sobre a data sugerida para a realização da audiência (03.10.2019), veio dizer “não ter sido notificado da declaração de cessação da interrupção do prazo para apresentar oposição (…)”, e que se encontra em prazo para apresentar oposição (…).

  3. Sobre o requerimento referido no número anterior, recaiu o despacho ora impugnado do seguinte teor: “ “Informe o Requerido AA que o despacho que declara cessada a interrupção da instância (que efectivamente não lhe foi notificado), é meramente declarativo e não determina o início do prazo para deduzir oposição. Este prazo inicia-se com a notificação da decisão do indeferimento do pedido de apoio judiciário ou com a decisão de indeferimento do recurso de impugnação da decisão da Segurança Social sobre a concessão do apoio judiciário.” O direito.

Está em causa no recurso saber se o Recorrente - que deduziu pedido de apoio judiciário na modalidade de nomeação de patrono, na pendência da acção, o que determinou a interrupção da instância -deveria ter sido notificado de despacho a declarar cessada a interrupção.

Vejamos.

O pedido de apoio judiciário, que pode revestir as modalidades de dispensa de taxa de justiça e demais encargos com o processo e a nomeação e pagamento da compensação ao patrono (art. 16º do DL nº 34/2004 de 29.07), é apresentado nos serviços de segurança social, competindo a decisão sobre a concessão do apoio ao dirigente máximo dos serviços de segurança social da área da residência do requerente – art. 20º.

Quando o pedido é apresentado na pendência de acção judicial e o requerente pretenda a nomeação de patrono, o prazo que estiver em curso interrompe-se com a junção aos autos do documento comprovativo da apresentação do requerimento com que é promovido o procedimento administrativo – art. 24º, nº4 do DL 34/2004.

Nos termos do nº5 deste artigo 24ª: 5 - O prazo interrompido por aplicação do disposto no número anterior inicia-se, conforme os casos; a) A partir da notificação ao patrono nomeado da sua designação; b) A partir da notificação ao requerente da decisão de indeferimento do pedido de nomeação de patrono.

Acrescente-se ainda que a decisão administrativa é passível de impugnação judicial, nos termos estabelecidos no art. 27º: a impugnação deve ser entregue no serviço de segurança social que apreciou o pedido de protecção jurídica, o qual dispõe de 10 dias para revogar a decisão ou, mantendo-a, enviar aquela e o processo administrativo ao tribunal competente.

Recebida a impugnação no tribunal, “é imediatamente conclusa ao juiz que, por meio de despacho concisamente fundamentado, decide, concedendo ou recusando o provimento, por extemporaneidade ou manifesta inviabilidade” – nº 4 do art. 28º.

A decisão proferida é irrecorrível – nº5 do art. 28º.

Expostos em traços breves o procedimento que rege a concessão do apoio judiciário, é altura de aplicar os princípios legais ao caso dos autos.

A pretensão do Recorrente no sentido que a notificação da decisão que manteve o indeferimento deveria também informá-la se “podia recorrer para tribunal superior, prazo do recurso, se era obrigatória a constituição de advogado”, não tem qualquer apoio legal.

Uma notificação judicial esgota-se na notificação do acto a notificar ou da própria decisão, como sucedeu no caso vertente.

O dever de cooperação (art. 7º do CPC), citado pela Recorrente, não tem o sentido que esta lhe dá, nem elimina o princípio da auto-responsabilidade das partes na prática dos actos processuais.

Não é o tribunal que determina o início do prazo para a prática de acto processual, interrompido pela junção de comprovativo do pedido de apoio judiciário, mas sim a lei, no nº5 do art. 24º da Lei nº 34/2004, que o fixa com a notificação ao requerente da decisão de indeferimento.O Recorrente não podia desconhecer que assim é, pois o próprio despacho que declarou a “interrupção do prazo em curso”, em consequência da apresentação do comprovativo do pedido de apoio judiciário, referiu que a interrupção se mantinha “até ser proferida decisão pelos serviços de Segurança Social” (despacho de 31.07.2018, fls. 31).

O Recorrente não pode assim invocar o desconhecimento da lei, ou a sua má interpretação, em face do princípio geral de direito que “a ignorância ou má interpretação da lei não justifica a falta do seu cumprimento nem isenta as pessoas das sanções nela estabelecidas” (art. 6º do Cód. Civil).

A alegada violação da art. 227º do CPC, que rege sobre os elementos a transmitir obrigatoriamente ao citado no acto da citação, é despropositada uma vez que não constitui...

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