Acórdão nº 00933/11.9BEBRG de Tribunal Central Administrativo Norte, 25 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelH
Data da Resolução25 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Administrativo do Tribunal Central Administrativo Norte: I – RELATÓRIO Recorrente: J. e outros Recorrido: Ministério da Cultura (Direcção-Geral do Livro, dos Arquivos e das Bibliotecas) Vem interposto recurso da decisão do Tribunal Administrativo e Fiscal de Braga, que julgou improcedente a acção administrativa que visava, designadamente, impugnar acto punitivo que aplicou à originária Autora a pena disciplinar de "despedimento por facto imputável ao trabalhador" e ordenou a restituição nos Cofres do Estado de quantia de € 35.012,38, acrescida de juros.

O objecto do recurso é delimitado pelas conclusões da respectiva alegação, do seguinte teor: “1. O art. 9.º, al. d) e os n.º 5 e 6 do art. 10.º do Estatuto Disciplinar fazem a destrinça entre a pena de demissão e a pena de despedimento por facto imputável ao trabalhador, sendo que a pena de demissão aplica-se aos trabalhadores nomeados definitivamente, ao passo que a de despedimento se aplica aos trabalhadores vinculados por contrato de trabalho.

  1. Com a alteração do quadro legal, a relação de emprego público da primitiva Autora transitou da modalidade de nomeação definitiva para a de contrato de trabalho por tempo indeterminado; essa transição não se operou no que diz respeito aos modos de cessação do vínculo funcional, por força da exclusão prevista no art. 88.º, n.º 4 da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro.

  2. O vínculo funcional da primitiva Autora só poderia cessar por qualquer dos modos de cessação previstos para o vínculo de nomeação definitiva, por força do disposto na norma acima referida.

  3. Não está em causa a questão de saber se o modo de cessação da relação de emprego público teria, ou não, de procurar-se no Estatuto Disciplinar, mas antes a de saber se, dentre as penas previstas nesse Estatuto, deveria ter-lhe sido aplicada a sanção de despedimento (prevista nos arts. 9.º, al. d) e 10.º, n.º 6 do Estatuto Disciplinar) ou de demissão (prevista nos art. 9.º, al. d) e 10.º, n.º 5 do mesmo diploma).

  4. E a resposta a tal questão só poderia ser uma: se o art. 88.º, n.º 4 da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, impunha a manutenção do regime de cessação do vínculo funcional previsto para o vínculo de nomeação definitiva, a sanção disciplinar a aplicar à primitiva Autora nunca poderia ser a de despedimento, já que esta não era aplicável àquela modalidade de emprego público.

  5. Ao julgar improcedente o vício acima referido, concluindo pela improcedência da acção, a douta sentença recorrida violou, além de outras, as disposições dos arts. 88.º, n.º 4 da Lei n.º 12-A/2008, de 27 de Fevereiro, e dos arts. 9.º, al. d) e 10.º, n.º 5 e 6 da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, bem como a norma do art. 163.º, n.º 1 do Cód. Proced. Administrativo.

  6. Daí que se imponha julgar procedente a presente apelação, com a consequente revogação da douta sentença recorrida, na parte em que absolveu o Réu dos pedidos, a qual deverá ser substituída por Douto Acórdão que julgue integralmente procedentes os pedidos formulados na p.i.

  7. O recurso hierárquico previsto no n.º 3 do art. 37.º da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, é facultativo, e não necessário.

  8. Estando em causa um recurso hierárquico facultativo, não releva o facto de a primitiva Autora não ter lançado mão desse meio de impugnação administrativa, afigurando-se que tal questão é totalmente irrelevante para a tomada de posição quanto à verificação, ou não, da nulidade prevista no art. 37.º, n.º 1 do Estatuto Disciplinar.

  9. A falta de inquirição da primitiva Autora, bem como da quase totalidade do rol de testemunhas por ela indicado é, por si só, susceptível de configurar um grave atentado ao direito de defesa em processo disciplinar.

  10. Basta dizer que algumas das testemunhas eram colegas de serviço da Autora (incluindo-se nesse rol quatro colegas de serviço (M., M.., M... e I., como se pode constatar pelo domicílio profissional das testemunhas, indicado na parte final da defesa apresentada no p.d.) para se constatar que a sua inquirição na presença do mandatário da Arguida, a fim de serem questionadas sobre factualidade exclusivamente invocada em sede de defesa, era um formalismo essencial para assegurar o necessário contraditório e, por inerência, a descoberta da verdade.

  11. As últimas duas testemunhas, por sua vez, eram prestadores de serviços que fizeram trabalhos para o Arquivo e que foram pagos sem emissão de recibo, o que permitiria justificar o paradeiro de parte dos valores cuja apropriação era imputada à primitiva Autora.

  12. Isso mesmo foi alegado, de forma expressa e inequívoca, nos arts. 105.º a 122.º da p.i., onde foram indicadas as razões de facto que levaram ao pedido de inquirição dessas testemunhas.

  13. Ao indeferir as diligências probatórias acima referidas, o Senhor Instrutor omitiu diligências necessárias para a descoberta da verdade e para o regular exercício do direito de defesa, o que inquina o acto final do processo disciplinar com vício de anulabilidade.

  14. Nessa medida, ao julgar improcedente a acção, a douta sentença recorrida violou, entre outras, as disposições dos arts. 37.º, n.º 1 da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, e do art. 163.º, n.º 1 do Cód. Proced. Administrativo, pelo que deve ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue integralmente procedentes os pedidos formulados na p.i.

  15. Na parte final da sua defesa apresentada no processo disciplinar, a primitiva Autora requereu a junção aos autos de prova documental.

  16. Essa prova foi deferida pelo Senhor Instrutor, o qual, contudo, não determinou a notificação à primitiva Autora da sua junção nem do teor dos documentos juntos.

  17. A agravar, a documentação junta serviu de base à prolação de decisão de despedimento, sem que a primitiva Autora tenha tido possibilidade de se pronunciar sobre a mesma e de exercer o contraditório – remete-se para fls. 7 e do relatório final.

  18. Uma tal omissão inquina o processo disciplinar com vício de nulidade, por força do disposto no art. 37.º, n.º 1 do Estatuto Disciplinar.

  19. Só com o relatório final é que a Recorrente tomou conhecimento da junção aos autos de tais documentos, o que significa que não lhe foi possível invocar a nulidade decorrente de tal omissão de notificação antes da prolação da decisão final, precisamente por só ter tomado conhecimento da mesma com a notificação desta decisão.

  20. Apesar do que se vem de expor, o Tribunal recorrido julgou que o acto impugnado não estava inquinado com vício de anulabilidade, decorrente da nulidade do processo disciplinar.

  21. Ao fazê-lo, julgando improcedente a acção, a douta sentença recorrida violou, entre outras, as disposições dos arts. 37.º, n.º 1 da Lei n.º 58/2008, de 9 de Setembro, e do art. 163.º, n.º 1 do Cód. Proced. Administrativo, pelo que deve ser revogada e substituída por Douto Acórdão que julgue integralmente procedentes os pedidos formulados na p.i.

Nestes termos, deve o presente recurso ser julgado procedente, com a consequente revogação da douta sentença recorrida e prolação, em sua substituição, de Douto Acórdão que esteja em conformidade com as conclusões acima formuladas, com o que se fará Justiça!”.

O Recorrido contra-alegou em termos que se dão por reproduzidos e, tendo formulado conclusões, aqui se vertem: “a) A presente acção foi Intentada pela Autora com o propósito de impugnar o Despacho de 16 de Fevereiro de 2011, proferido pelo Senhor Director Geral dos Arquivos no âmbito de processo disciplinar que cessou a relação funcional de emprego público da Autora com a Ré b) Entre os anos de 2005 a 2009, Inclusive, foram entregues à Autora para efeitos de registo, guarda em cofre e depósito na conta de receitas próprias da Ré, activos financeiros no valor de 132A90,45 € (cento e trinta e dois mil quatrocentos e noventa euros e quarenta e cinco cêntimos), dos quais 35.012,38 € (trinta e cinco mil e doze euros e trinta e oito cêntimos) Em sede de procedimento criminal, como se viu, foi apurado que a Autora deveria ter depositado o valor de 121.065,45€ (cento e vinte e um mil e sessenta e cinco euros e quarenta e cinco cêntimos) sendo que depositou 85.064,41€ (oitenta e cinco mil e sessenta e quatro euros e quarenta e um cêntimos), tendo-se, ilegitimamente, apropriado de 36.001,04€ (trinta e seis mil e um euros e quatro cêntimos).

não deram entrada nos cofres da Ré.

  1. Razão pela qual, e tal como proposto no relatório final do processo disciplinar, para efeitos de cumprimento do disposto no artigo 8º do ED, foi dado conhecimento ao Ministério Público para promover o competente procedimento criminal, d) No âmbito do qual foi proferida sentença em 27 de Janeiro de 2014, transitada em julgado, pela qual a Autora foi condenada pela prática de crime de peculato, conforme resulta do ponto 27 da matéria de facto provada fixada na sentença ora recorrida.

  2. Resultando claro que a, legal e justa, pena expulsiva aplicada no...

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