Acórdão nº 22640/18.1T8LSB.L1.S1 de Supremo Tribunal de Justiça (Portugal), 02 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA CLARA SOTTOMAYOR
Data da Resolução02 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal de Justiça (Portugal)

Acordam no Supremo Tribunal de Justiça I – Relatório 1. AA e BB intentaram a presente ação popular contra VODAFONE PORTUGAL – COMUNICAÇÕES PESSOAIS, S.A., pedindo: “

  1. Que a todos os clientes da R, consumidores de serviços de telecomunicações móveis, entre os quais os ora AA., seja reconhecido o direito a não pagarem por serviços que não tenham prévia e expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constituam cumprimento de contrato válido; b) Que a todos os clientes da R, consumidores de serviços de telecomunicações móveis, entre os quais os ora AA., seja reconhecido o direito a recusarem contratar serviços adicionais de telecomunicações.

  2. Que a R. seja impedida de deduzir a partir de opções estabelecidas por defeito que o consumidor consentiu a prestação dos serviços adicionais de telecomunicações por falta de recusa expressa dos mesmos e em consequência ativar por defeito e automaticamente tais serviços extras; d) Que a todos os clientes da R., consumidores de serviços de telecomunicações móveis, entre os quais os ora AA., seja reconhecido o direito ao reembolso do pagamento adicional por serviços dos quais não consentiu expressamente, mas que a R. o tenha deduzido a partir de opções estabelecidas por defeito que os clientes devessem recusar para evitar o pagamento adicional; e) Em qualquer dos casos, seja a R. condenada a devolver, a cada um dos seus clientes ou ex-clientes, consumidores de serviços de telecomunicações móveis, incluindo os AA., os montantes relativos aos pagamentos adicionais efetuados por serviços dos quais o consumidor não consentiu expressamente, desde a entrada em força da diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de Outubro de 2011 e que tal pagamento seja feito automaticamente por crédito nas contas correntes dos clientes junto da Ré quando tal seja possível ou por transferência bancária para as contas a serem indicadas por cada cliente ou ex-clientes que reclamem e que assim o pretendam em alternativa ao crédito em conta corrente junto da Ré; f) Que sejam declaradas como clausulas contratuais proibidas e consequentemente nulas qualquer cláusula contratual que contrarie o direito peticionado no pedido a) e ou b) e ou c), nomeadamente seja considerada uma cláusula contratual proibida aquela que impõe a obrigatoriedade ou a não possibilidade de recusa da contratação de serviços adicionais extra, nos termos e para os efeitos do artigo 12º e 24º DL 446/85 de 25 de Outubro e da diretiva 93/13 CEE; g) Caso não proceda o pedido em f) que sejam declaradas como clausulas contratuais gerais contrárias à boa fé qualquer cláusula contratual que contrarie o direito peticionado no pedido a) e ou b) e ou c) nos termos do artigo 15º do DL 446/85 de 25 de Outubro e da diretiva 93/13 CEE e que concomitantemente sejam consideradas proibidas nos termos e para os efeitos do artigo 25º do DL 446/85, de 25 de Outubro.”.

    Alegam, para tanto, e em síntese, que a Ré obriga os consumidores de telecomunicações a pagar por serviços que não solicitaram prévia e expressamente nem constituem cumprimento de um contrato válido, sendo nula qualquer cláusula que imponha a não possibilidade de recusa de serviços adicionais extra.

    Juntaram documentos.

    Ouvido o Ministério Público, por despacho de 15/11/2018, foi recebida a petição inicial, determinada a citação da Ré e bem assim dos interessados “utilizadores dos serviços de telecomunicações da Vodafone Portugal – Comunicações Pessoais, S.A.”.

    2.

    A Ré apresentou contestação, impugnando o alegado pelos Autores, invocando, em síntese, que cumpre a legislação nacional e comunitária aplicável e os seus clientes dispõem de toda a informação, nomeadamente no que respeita à ativação de dados móveis extra quando é ultrapassado o consumo previsto no valor da mensalidade, concluindo pela sua absolvição do pedido e bem assim assacando má fé processual aos Autores, pedindo a sua condenação na multa máxima e em indemnização não inferior a € 8.000,00 (oito mil euros).

    Juntou documentos.

    3.

    Em 27/06/2019, foi realizada audiência prévia, na qual foram os Autores convidados a concretizar qual ou quais as cláusulas que pretendem ver declaradas nulas – convite a que responderem por requerimento de 12/07/2019 – não foi admitido o pedido de reenvio prejudicial, foi proferido despacho saneador, identificando o objeto do litígio, e enunciados os temas da prova.

    Procedeu-se a julgamento, com observância do formalismo legal, como resulta da respetiva ata.

    4.

    O tribunal de 1.ª instância incidiu sobre as seguintes questões: «- saber se a Ré obriga os consumidores de telecomunicações a pagar por serviços que não tenham prévia e expressamente encomendado ou solicitado ou que não constituem cumprimento de um contrato válido; - saber se a Cláusula 2ª, alínea d), do Contrato de Adesão ao Serviço Fixo e/ou Serviço Móvel, por referência ao “pacote Red” se mostra contrária às regras imperativas do diploma que regula as cláusulas contratuais gerais, por obrigar o consumidor a adquirir automaticamente e sem hipótese de recusa serviços extra, pagos; - saber se a Ré é responsável, e em que medida, pelo reembolso de quantias pagas pelos seus clientes/consumidores; - da má fé dos Autores».

    5.

    O tribunal de 1.ª instância decidiu o seguinte: «Pelo exposto, julgo improcedente a presente ação, e consequentemente, decido absolver a Ré do pedido.

    Mais decido absolver os Autores do pedido de condenação como litigantes de má fé.

    Custas pelos Autores».

    6.

    Inconformados, os autores BB e AA, vieram interpor Recurso de Revista “Per Saltum” sobre a matéria de direito, nos termos e ao abrigo nos artigos 627.º, 629.º, n.º 1, 631.º, 637.º, 639.º, 672.º, 675.º, 678.º, n.º 1 ex vi artigo 644.º, n.º 1, alínea a) e 678.º, n.º 3 todos do CPC, formulando as seguintes conclusões, que terminam peticionando o reenvio prejudicial para o Tribunal de Justiça da União Europeia (TJUE) e, em qualquer caso, a revogação do acórdão recorrido: «1. Por muito respeito que mereça o vertido na decisão a quo, com a mesma não se pode de modo algum concordar e a presente decisão veio surpreender sobremaneira os aqui Recorrentes, considerando que o Tribunal recorrido não julgou corretamente e nem resolve as questões e responde aos pedidos efetivamente formulados.

    2. Ressalvado sempre o devido respeito, que é o maior, a Mma. Juíza recorrida decidiu mal, não avaliando convenientemente o caso sub judice.

    3. Desde logo porque inquina toda a questão nos direitos de informação do consumidor, quando a questão a resolver não se pretende, nem remotamente, com essa problemática.

    4. A decisão foi, “em suma” que uma vez que “a oferta do pacote «Red», cumprindo que seja, em cada caso concreto de contratação, o dever de informação, mostra-se de acordo com as exigências legais, num quadro de proteção do consumidor, mas também da liberdade contratual” [negrito nosso], levando isso à absolver a Ré do pedido.

    5. Quando as questões, simples, de direito a resolver são saber somente se: 6.

    os consumidores de serviços de telecomunicações móveis (como os Autores e demais Autores Populares) tem o direito a recusarem contratar serviços adicionais de telecomunicações; 7.

    se as operadoras de serviços de telecomunicações móveis (como a Ré) podem deduzir a partir de opções estabelecidas por defeito que o consumidor tenha consentido a prestação dos serviços adicionais de telecomunicações por falta de recusa expressa dos mesmos e em consequência ativar por defeito e automaticamente tais serviços extras; 8.

    se os consumidores de serviços de telecomunicações móveis (como os Autores e demais Autores Populares) tem o direito a não pagarem por serviços que não tenham prévia e expressamente encomendado ou solicitado, ou que não constituam cumprimento de contrato válido.

    9. É somente estas questões de direito que os Autores pediram ao tribunal para resolver e que em síntese se resume a saber se os consumidores podem ou não recusar os serviços adicionais de telecomunicações.

    10. Essencialmente, os Autores vêm pedir que o tribunal decida sobre os problemas que o artigo 22.º da Diretiva 2011/83/EU, o artigo 3.º, n.º 4, e os artigos 8.º e 9.º (d) e do anexo I, ponto 29, da Diretiva 2005/29/CE. e o artigo 9.º - A, n.ºs 1 e 2 da Lei n.º 24/96, pretendem acautelar.

    11. E que depois sejam assacadas as consequências do reconhecimento desses direitos, nomeadamente “que a todos os clientes da R., consumidores de serviços de telecomunicações móveis, entre os quais os ora AA., seja reconhecido o direito ao reembolso do pagamento adicional por serviços dos quais não consentiu expressamente mas que a R. o tenha deduzido a partir de opções estabelecidas por defeito que os clientes devessem recusar para evitar o pagamento adicional” e que “seja a R. condenada a devolver, a cada um dos seus clientes ou ex-clientes, consumidores de serviços de telecomunicações móveis, incluindo os AA., os montantes relativos aos pagamentos adicionais efetuados por serviços dos quais o consumidor não consentiu expressamente, desde a entrada em força da diretiva 2011/83/UE do Parlamento Europeu e do Conselho de 25 de Outubro de 2011 e que tal pagamento seja feito automaticamente por crédito nas contas correntes dos clientes junto da Ré quando tal seja possível ou por transferência bancária para as contas a serem indicadas por cada cliente ou ex-clientes que reclamem e que assim o pretendam em alternativa ao crédito em conta corrente junto da Ré” 12. Como se percebe, nenhum dos direitos supra elencados, que os Autores pretende ver reconhecidos na esfera de todos os consumidores de telecomunicações, clientes da Ré, incluindo os próprios, se relaciona com o direito de informação dos consumidores ou, de alguma forma, são ultrapassados, resolvidos, ampliados ou reduzidos perante tal direito de informação dos consumidores.

    13. Só a título de exemplo, o segundo pedido, o qual tem repercussões na relação passada, atual e futura de todos os consumidores de serviços de telecomunicações móveis...

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