Acórdão nº 48/11.0TBVNC-G.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 10 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | JOS |
Data da Resolução | 10 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Cível do Tribunal da Relação de Guimarães*1 – RELATÓRIO Nos autos de Inventário/Partilha de bens em casos especiais (1) para partilha de bens do extinto casal, em que são interessados a requerente C. B.
e o requerido/ex-marido M. A.
, foi designado este para o exercício de funções de cabeça de casal. O processo corre por apenso a uma execução, em que é exequente D. P. e executados os ex-cônjuges M. A. e C. B., tendo esta, notificada para o disposto no art. 825º/5 do CPC vindo requerer se procedesse à separação dos bens do extinto casal.
Os autos de inventário tiveram a sua legal tramitação, tendo no dia da conferência de interessados realizada, os ex-cônjuges acordado na venda extrajudicial do imóvel que fora a casa de morada de família.
No decurso das diligências com vista à venda do imóvel em causa, foi proferido em 13-01-2021, o seguinte despacho: Em Dezembro de 2015 foi determinada a venda do imóvel em causa pelo valor base de €126.000,00, sendo aceites propostas de valor superior a 85% daquele.
Decorridos 5 anos, com várias propostas, não cumpridas, incidentes, pedidos de espera, etc, foi agora apresentada pelo Sr EV proposta de €75.000,00.
Atento o tempo decorrido para a realização e concretização da venda pelo melhor preço; que o presente inventário para separação de meações, corre por apenso a uma execução, entende-se que a proposta apresentada é razoável, considerando que em 2015 seriam aceites propostas de €107.100,00.
Pelo exposto, decide-se aceitar a proposta apresentada pelo Sr Encarregado da Venda supra identificada, notificando-se o mesmo para encetar as diligências necessárias à formalização da venda.
Notifique Posteriormente, em 12-02-2021, foi proferido o seguinte despacho: Notifique a interessada, possuidora do imóvel cuja venda foi ordenada, nos precisos termos requeridos pelo Sr. Encarregado da Venda, com cominação legal de multa por falta de colaboração com o Tribunal no caso de não cumprimento do ordenado: facilitar a avaliação do imóvel e acesso ao seu interior, com aviso prévio por parte do Sr. Encarregado da Venda, a fim de viabilizar a venda já determinada.
Em 4-03-2021, é apresentado o seguinte requerimento: I. S.
, filha de M. A. e de C. B., respectivamente Executado e Requerente nos presentes autos, e tendo tomado conhecimento do douto despacho de V. Exa. datado de 06/02/2021, vem, muito respeitosamente, formalizar e exercer o seu Direito de Remição sobre o bem em venda.
Para o efeito, a ora Requerente junta comprovativo de depósito do valor de 75.000,00€ (setenta e cinco mil euros), conforme resulta do campo das custas judiciais do formulário de que este requerimento é anexo, bem como certidão de nascimento relativa à sua qualidade.
A Requerente protesta juntar Procuração Forense a favor da aqui signatária em 3 dias.
A que se segue em 05-03-2021, o seguinte despacho: Reqº que antecede: A presente acção configura um processo especial de separação dos bens comuns do ex-casal, é certo que por apenso a uma execução.
No dia da conferência de interessados realizada no dia 4/3/2015, acordaram os ex-cônjuges na venda extrajudicial do imóvel em causa. Não tendo conseguido tal desiderato, optaram os ex-cônjuges pela sua venda judicial (21/9/2015), o que veio a concretizar-se finalmente – cf. despacho de 13/1/2021.
Ora, atendendo à natureza do presente processo, que se trata de uma venda voluntária e acordada pelos ex-cônjuges, proprietários em comum dos imóveis objecto da venda, e atendendo aos fundamentos do direito de remição (cf. artigos 842º e ss CPC) que apenas opera no âmbito do processo executivo, entende-se que não assiste à requerente tal direito.
Ao presente processo apenas se aplicam as regras do processo de execução relativamente às formas da venda e do incidente de reclamação de créditos – artigo 549º, nº2 CPC.
Por outro lado: Este «instituto incidental da remição analisa-se na faculdade de, potestativamente, determinados interessados poderem fazer-se substituir ao adjudicatário ou ao comprador, na preferencial aquisição de bens penhorados, mediante o pagamento do preço por eles oferecido» - cfr. Acórdão da Relação de Guimarães de 05/06/2008, in www.dgsi.pt/jtrg. Quanto à natureza do direito de remição, veja-se Alberto dos Reis, in «Processo de Execução», Vol. II, pág. 477: “Analisando o art. 912 do C.P.C., verifica-se que o direito de remição é nitidamente um benefício de carácter familiar. Dá-se ao cônjuge do executado e aos descendentes e ascendentes deste o direito de adquirir para si os bens adjudicados ou vendidos, pelo preço da adjudicação ou da venda. Na sua actuação prática, o direito de remição funciona como um direito de preferência: tanto por tanto os titulares desse direito são preferidos aos compradores ou adjudicatários. A família prefere aos estranhos. Porque admitiu a lei esta preferência a favor da família? A razão é clara. Quis-se proteger o património familiar; quis-se evitar que os bens saíssem para fora da família”. Como ensina, Lebre de Freitas in, “A Acção Executiva” à luz do Código revisto, 3ª ed., pág. 281 e 282, «a lei processual concede ao cônjuge e aos parentes em linha recta do executado um especial direito de preferência, denominado direito de remição, o qual, tendo por finalidade a protecção do património familiar, evita, quando exercido, a saída dos bens penhorados do âmbito da família do executado».
A protecção da família, através da preservação do património familiar, evitando a saída dos bens penhorados do âmbito da família do executado, é, deste modo, o objectivo da consagração legal do direito de remição.
Ora, estando em causa uma venda acordada entre os ex-cônjuges, não há lugar ao direito de remição.
Por último, sendo certo que a requerente junta uma referência de um DUC, não faz prova efectiva do pagamento do preço da venda.
Pelo que se indefere ao requerido.
Notifique, incluindo o Sr. Encarregado da Venda.
*Notificada do transcrito despacho de 5-03-2021, a requerente I. S. veio nesse mesmo dia juntar comprovativo do pagamento do DUC em causa, que se encontrava pago desde o dia 4-03-2021, quando veio formalizar e exercer o seu Direito de Remição sobre o bem em venda.
* Inconformada com o acima transcrito despacho de 5-03-2021, veio I. S.
interpor recurso de apelação, finalizando as suas alegações com a apresentação das seguintes conclusões: I- A Lei 4-B/2021, de 1 de Fevereiro, estabeleceu um regime de suspensão de prazos processuais e procedimentais decorrente das medidas adotadas no âmbito da Pandemia da doença Covid-19.
II- A citada Lei produz os seus efeitos desde 22 de Janeiro de 2021, encontrando-se nesta data ainda em vigor.
III- Nos termos do artigo 6º-B, nº11 da mesma lei, estão suspensos os atos relacionados com a concretização de diligências de entrega judicial de casa de morada de família.
IV- Os autos de que se recorre dizem respeito à casa de morada de família da Recorrente.
V- Maxime, atente-se no despacho datado de 12/02/2021, o qual comina em multa a mãe da Recorrente no caso de esta não permitir a entrada de terceiros em sua casa, VI- Tudo isto, em pleno pico pandémico, em que morriam mais de 300 pessoas por dia vitimas da SarsCov2 e com milhares de infeções a serem reportadas diariamente.
VII- Ou seja, os despachos identificados nas alegações supra promoveram, ilegalmente, atos relativos à entrega da casa de morada de família da Recorrente, violando flagrantemente o disposto na Lei 4-B/2021, de 1 de Fevereiro.
VIII- Termos em que, devem ser declarados nulos e sem qualquer efeito os Despachos de 12/02/2021 e 05/03/2021 e todas as diligências decorrentes dos mesmos, designadamente, as destinadas à entrega da casa de morada de família da Recorrente.
Sem prescindir, IX- A aqui Recorrente foi notificada, em 05/03/2021, do despacho dos autos com a referência 46569474, nos termos do qual se conclui pelo indeferimento do exercício do seu direito de remição.
X- Tal decisão recaiu sobre aquela que sempre foi e é a sua habitação/casa morada de família desde sempre.
XI- Os pais de Recorrente encontram-se divorciados desde 28/10/2010.
XII- A Recorrente, a sua mãe e o seu irmão ficaram a residir no imóvel objeto dos presentes autos após o mencionado divórcio.
XIII- Em finais de fevereiro de 2011, a mãe da Recorrente foi surpreendida por uma execução contra si e o seu ex-marido, que visava a penhora do imóvel aqui em causa.
XIV- Execução essa, cujos presentes autos são apensos.
XV- Citada para tal execução, foi a mãe da Recorrente instada a requerer a separação da sua meação.
XVI- O que fez, dando origem aos presentes autos.
XVII- Mas mais, no âmbito da dita execução veio-se apurar que a assinatura da mãe da Recorrente no título executivo não era dela, era falsa.
XVIII- Naturalmente, a mãe da Recorrente foi expurgada da dita execução, isto é, dos autos principais, correndo a mesma única e exclusivamente contra o pai da aqui Recorrente.
XIX- Assim, no decorrer destes autos acabou por ser determinada a venda judicial do imóvel em 21/09/2015.
XX- Note-se que, a execução...
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