Acórdão nº 01892/14.1BELRS de Supremo Tribunal Administrativo (Portugal), 16 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelJOSÉ GOMES CORREIA
Data da Resolução16 de Fevereiro de 2022
EmissorSupremo Tribunal Administrativo (Portugal)

Acordam, em conferência, na Secção de Contencioso Tributário do Supremo Tribunal Administrativo 1.– Relatório Vem interposto recurso jurisdicional pela Representante da Fazenda Pública, visando a revogação da sentença de 10-05-2020, do Tribunal Tributário de Lisboa, que julgou totalmente procedente a impugnação deduzida por A……….

– Serviços e Representações, S.A.

, com os sinais dos autos, contra as liquidações de Imposto sobre o Rendimento das Pessoas Coletivas (IRC) e juros compensatórios relativas aos exercícios de 2010 e 2011.

Inconformada, nas suas alegações, formulou a recorrente Representante da Fazenda Pública, as seguintes conclusões: I.

Visa o presente recurso reagir contra a douta decisão que julgou a presente impugnação judicial totalmente procedente, determinando, em consequência, a anulação das liquidações adicionais de IRC n.ºs 2014 9810032132, e 2014 83100321 e liquidação de juros compensatórios n.º 2014 00000891993, referente aos exercícios de 2010 e 2011, no valor global de €65.546,27, bem como o pagamento de juros indemnizatórios “da quantia de €67.395,19, acrescida de juros indemnizatórios desde 13-11-2014 até à sua restituição”; II.

Salvaguardando melhor e mais avisado entendimento, a matéria deste Recurso, o thema decidendum de que depende o respetivo mérito, é exclusivamente jurídica e reconduz-se à concreta questão da interpretação e aplicação do regime consagrado no art. 69.º do CIRC (na redação ao tempo em vigor que é a que se refere nestas alegações), a saber: Se pelo facto de uma sociedade incluída pela sociedade dominante no perímetro de tributação através do regime especial de tributação dos grupos de sociedades não reunir os requisitos necessários para tal inclusão, tal determinará automaticamente a cessação de aplicação desse regime de tributação relativamente às restantes sociedades incluídas no perímetro de tributação, e ainda que se verifiquem os pressupostos de aplicação desse regime especial de tributação quanto às demais sociedades; III.

Os atos de liquidação adicional de IRC, que constituem o objeto dos autos de impugnação judicial sub judicie, foram emitidos no seguimento da ação de inspeção tributária, interna e parcial, com incidência em IRC, realizada através das Ordens de Serviço n.ºs OI201400883 e OI201400855, com referência aos exercícios de 2010 e 2011; IV.

As Ordens de Serviço supraditas tiveram origem no entendimento vertido nas informações n.º 1172/2012 de 21/06/2012 e n.º 2313/13 de 04/11/2013, proferidas pela Divisão de Conceção da Direção de Serviços de IRC, nas quais foi decidido que a inclusão indevida, nos exercícios de 2010 e 2011, da Sociedade B………., S.A. (de ora em diante designada por B…………..) no perímetro fiscal do Grupo de Sociedades, dominado pela Sociedade Comercial C………….., S.A. (em diante designada por C..................), abrangido pelo RETGS, determinava a cessação da aplicação daquele regime especial a todas as empresas que integravam o grupo, com referência aos períodos de tributação em causa; V.

Da ação inspetiva realizada, atendendo às informações proferidas pela Divisão de Conceção da Direção de Serviços de IRC, bem como “(…) tendo por base as declarações de rendimentos de IRC modelo 22 entregues pelo sujeito passivo (enquanto sociedade dominada do grupo), (…)”, foi efetuado o reenquadramento do sujeito passivo, alterando-se, para tanto, o regime especial de tributação para o regime geral, procedendo-se, em consequência, à alteração das declarações de rendimentos de IRC, passando estas de “declaração não liquidável”, para “declaração liquidável”; VI.

A Sociedade B.................. resulta da alteração, registada na Conservatória do registo Comercial de Lisboa em 18/02/2010, da denominação da Sociedade D…………, SA, constituída em 27/07/2009, tendo a C.................., nessa data, subscrito 59,60% do seu capital social, com idêntica proporção dos direitos de votos; VII.

Em 17/11/2009, a C.................. alienou à Sociedade, D………………., SA (posteriormente denominada de B..................), ações representativas de 60% do capital social da Sociedade E……………., S.A. (abreviado), que desde 2004 que integrava o grupo; VIII.

Em 19/02/2010, procedeu-se ao aumento do capital social da B.................. através da emissão de duzentas mil ações, passando, assim, a C.................., a deter 91,92% do total do capital social, com idêntica proporção dos direitos de votos; IX.

Em 14/10/2010 foi realizada uma operação de fusão entre a E……... e a B.................., com efeitos retroativos a 01/01/2010 e, em virtude desta operação, a C.................. passou a deter 91,77% da B.................., com idêntica proporção dos direitos de voto; X.

Por sua vez, a aqui, Recorrida, Impugnante, surge no âmbito da cisão efetuada entre a Sociedade F……………, Lda., a qual deu origem à constituição de duas empresas, denominadas G……………, Lda. e a A…………., Lda.; XI.

O capital social da Recorrida, Impugnante, é detido, na sua totalidade, pela Sociedade H………….., SA, a qual, por sua vez, é detida pela C..................; XII.

Nos exercícios em causa (2010 e 2011), a Recorrida, Impugnante, integrou o grupo de sociedades, cuja sociedade dominante era a C.................., tendo sido abrangida pelo regime especial de tributação definido no art. 69º do CIRC e sujeita às regras de determinação do lucro tributável e dedução de prejuízos definida nos arts. 70º e 71º do CIRC; XIII.

Sucede, porém, que nesse mesmo grupo integrou, igualmente, para os exercícios de 2010 e 2011, a B.................. tendo esta inclusão comunicada à Recorrente, Fazenda Pública, para os períodos de 2010 e 2011; XIV.

Em requerimento dirigido à Direção de Serviços do IRC (DSIRC), em 06/06/2012, a C.................. solicitou esclarecimentos sobre a aplicação do art. 69º do CIRC, a fim de avaliar da legalidade da inclusão da B.................. no perímetro fiscal do grupo para os exercícios em causa; XV.

Na sequência de tais esclarecimentos, considerou a AT que, a B.................. tinha sido indevidamente incluída no perímetro fiscal do grupo, porquanto à data de 01/20/2010, a participação detida pela C.................. não cumpria o limiar mínimo exigido no n.º 2 do art. 69º do CIRC, razão pela qual, o regime especial de tributação a todas as sociedades integradas no grupo deveria cessar, para os exercícios de 2010 e 2011, com efeito a 31/12/2009, nos termos e para os efeitos da al. a) do n.º 8 e al. c) do n.º 9, ambos do art. 69º do CIRC; XVI.

Como reflexão sobre a tributação dos grupos de sociedades ou “empresa plurissocietária” nas palavras do TCA SUL, veja-se o sumário proferido por este Tribunal no âmbito do processo n.º 05376/12, de 30-04-2014: “(…) O RETGS é dominado por uma lógica de tributação conjunta, sendo a tributação em sede de IRC feita tendencialmente pelo seu resultado agregado, como se de uma só sociedade se tratasse, correspondendo à unidade económica do conjunto que se comporta no mercado como se efetivamente fosse uma única empresa.

Contudo, cada sociedade do grupo não perde a sua personalidade jurídica e individualidade jurídico-organizativa e patrimonial nem deixa de ser sujeito de relações tributárias próprias pelo facto de passar a integrar o grupo de sociedades.

A tributação em sede de RETGS baseia-se na soma algébrica dos lucros tributáveis e prejuízos fiscais individuais das sociedades do perímetro do grupo de sociedades, permitindo que os prejuízos fiscalmente reconhecidos sejam relevantes para os lucros fiscais das demais sociedades deste, traduzindo-se, efetivamente, numa redução dos impostos pagos por estas. A soma é efetuada a final do exercício, sendo feito com base na declaração periódica apresentada pela sociedade dominante. No entanto, cada uma das sociedades incluídas no perímetro deve apresentar também uma declaração periódica de rendimentos, que todavia não é objeto de liquidação (…)”; XVII.

O RETGS constitui assim um regime de tributação de grande significado pelas vantagens fiscais, pois possibilita a tributação de um grupo pelo resultado fiscal deste, correspondendo à soma algébrica dos lucros tributáveis, bem como a comunicabilidade dos prejuízos entre as sociedades do grupo. Contudo, a sua aplicação depende da observância das condições substanciais e formais para o efeito legalmente estabelecidas; XVIII.

Mais se refere que as condições de acesso ao RETGS são rigorosas e exigentes, pois trata-se de um regime optativo, que tem como finalidade simplificar, e até beneficiar os grupos de sociedade; XIX.

Conforme referido pelo STA, no âmbito do processo n.º 021/12, de 29/12/2012 “(…) A admissibilidade de opção dos sujeitos passivos de IRC pela aplicação do RETGS, com a possibilidade de obtenção de vantagens fiscais por estes e consequente perda de receitas tributárias, justifica-se por fins extrafiscais, designadamente facilitar a reestruturação do tecido empresarial e a recuperação dos grupos económicos, através da promoção das sinergias entre empresas integradas num grupo, reforçando e consolidando o tecido empresarial, para assim alcançar maior competitividade e favorecer a concorrência», não sendo justificável para obtenção de «finalidades exclusivamente fiscais (…)”; XX.

À data dos factos este regime que se encontra consagrado no art. 69.º do CIRC, contemplava a seguinte redação: “(…) 1 — Existindo um grupo de sociedades, a sociedade dominante pode optar pela aplicação do regime especial de determinação da matéria colectável em relação a todas as sociedades do grupo.

2 — Existe um grupo de sociedades quando uma sociedade, dita dominante, detém, directa ou indirectamente, pelo menos 90% do capital de outra ou outras sociedades ditas dominadas, desde que tal participação lhe confira mais de 50% dos direitos de voto.

3 — A opção pela aplicação do regime especial de tributação dos grupos de sociedades só pode ser formulada quando se verifiquem cumulativamente os seguintes requisitos: a) As sociedades pertencentes ao grupo têm todas sede...

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