Acórdão nº 399/20.2YHLSB.L1-PICRS de Court of Appeal of Lisbon (Portugal), 10 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelMARIA DA LUZ SEABRA
Data da Resolução10 de Fevereiro de 2022
EmissorCourt of Appeal of Lisbon (Portugal)

Decisão Texto Parcial:


Acordam na Secção da Propriedade Intelectual e da Concorrência, Regulação e Supervisão do Tribunal da Relação de Lisboa: I. RELATÓRIO: 1.

Gil … & Filhos, Lda intentou acção declarativa, sob a forma de processo comum, contra Rita …, Unipessoal, Lda, formulando os seguintes pedidos: - a) condenar-se a R. a abster-se de usar, para se identificar ou promover na sua actividade comercial e em qualquer suporte ou meio de comunicação, as expressões e marcas registadas ‘GIL …’, ‘MESTRE GIL’ ou ‘GILINHO’; b) condenar-se a R. a pagar à A. a quantia indemnizatória a estabelecer pelo Tribunal com recurso à equidade, considerando não ser possível fixar o montante dos prejuízos efectivamente sofridos pela A. e, bem assim, a conduta gravosa e reiterada da R., nos termos dos nºs 5 e 6 do artigo 347º do CPI; c) determinar-se a sanção pecuniária compulsória no valor de 500,00€ por dia no sentido de ser assegurada a execução da decisão.

Como fundamento das referidas pretensões, alegou, em síntese que, existe como sociedade comercial desde 1986, é titular da marca nacional registada “Gil … e Filhos”, com o nº 618509, de 11.09.2019, para a actividade de serviço de vendas a retalho ou a grosso de peças e acessórios para veículos terrestres e serviços de oficinas para reparação de veículos motorizados, nas Classes 35 e 37 da Classificação Internacional de Nice, assim como é titular da marca nacional registada com o nº 573486 “Mestre Gil, Rectificação e Torneiro Mecânico” desde 1955”, desde 10 de Março de 2017, com a actividade de peças e acessórios para veículos na Classe 10 da Classificação Internacional de Nice, bem como é titular da marca nacional registada “Gilinho” sob nº 636031, desde 4 de maio de 2020, para as actividades 12 e 37 da Classificação Internacional de Nice e, que a Ré desde que foi criada em 2015, com oficina a cerca de 100 m da oficina da Autora, na mesma cidade e concelho, e com um colaborador que tem o mesmo nome do fundador da Autora, tem provocado e fomentado a confusão nos clientes das duas empresas, usando o nome do colaborador como forma de atrair a clientela, fazendo-se passar pela empresa “Gil … e filhos”, “oficina do Mestre Gil” e “Gilinho”, usando o nome GIL em diferentes meios e objectos, visando objectiva e inequivocamente criar o erro e a confusão a seu favor e em prejuízo da Autora, com grande impacto porque ambas têm o mesmo ramo de actividade- torneiro mecânico e rectificação- e actuam no mesmo meio geográfico.

A Ré tentou, através do registo de logótipo “RS Retificadora Gil ...” , adquirir algum direito sobre a utilização comercial do nome cuja marca já se encontra registada a favor da Autora, o que lhe foi recusado pelo INPI em 11.07.2019, no entanto é público que a Ré tem usado como modo de se apresentar aos clientes a expressão “Gil …/Gilinho”, nomeadamente nas fachadas e portas da oficina, em veículos, na rede social Facebook na qual tem página com essa designação e, perante o uso abusivo da referida marca por parte da Ré, muitos clientes confundem as duas empresas recorrendo aos serviços da Ré pensando que estão a recorrer a serviços da Autora, clientes habituais da Autora passaram a solicitar serviços á Ré porque lhes faziam chegar a falsa informação de que a Autora teria cessado a sua actividade ou teria falido e teria sido substituída pela Ré.

Após o início de actividade da Ré, a Autora teve uma redução dos seus lucros na sequência da diminuição de facturação e de actividade, prejuízos causados pelo benefício que a Ré tira do uso das marcas registadas a favor da Autora, violando os seus direitos protegidos por lei, sendo que a utilização das expressões “Gil ...” e “Gilinho” corresponde às marcas registadas a favor da Autora e a expressão “Gil …” corresponde à sua denominação social, não se tratando de confundibilidade mas da mesma denominação, para o mesmo tipo de actividade, que leva a uma associação evidente entre a actividade desenvolvida e serviços prestados pela Ré e as marcas registadas a favor da Autora, devendo ser determinada a inibição da violação desse direito de marca e da continuação dessa violação, que continua a ocorrer apesar da decisão de proibição imposta à aqui Ré na providência cautelar prévia a esta acção, tendo a Autora direito a ser indemnizada na sequência da conduta reiterada e gravosa da Ré, em importância a fixar pelo tribunal com recurso á equidade.

  1. A Ré/Apelada deduziu contestação, impugnando os factos que fundamentam as pretensões da Autora/Apelante, sustentando que o uso da identificação “Gil”, que resulta do nome de baptismo do seu colaborador (filho do antigo fundador da Autora) insere-se no âmbito do direito de publicidade de que goza a requerida e visa promover a qualidade dos seus serviços por causa da experiência e reconhecimento público de que goza aquele seu colaborador, inexistindo qualquer confusão entre ambas as entidades; as marcas registadas pela Autora revelam-se idênticas ao nome do reputado colaborador da Ré, que é, aos olhos da clientela a grande mais valia da oficina da Ré, não existindo quaisquer sinais capazes de induzir os consumidores em erro ou confusão, nem nunca tendo a Ré pretendido criar qualquer confusão, sendo que, o legislador não terá pretendido que o uso de um nome próprio possa, por si só constituir-se como elemento distintivo de referência, não tendo a Autora concretizado quaisquer danos que se relacionem com a conduta da Ré.

    Alegou ainda que, os registos das marcas “Gil ... e Filhos” e “Mestre Gil, Rectificação e Torneiro Mecânico desde 1955”, apresentam menções ao falecido Gil ..., sem que tenha sido prestada qualquer autorização por parte dos seus herdeiros, tornando tais registos anuláveis e, que quanto ao registo da marca “Gilinho” trata-se de um comportamento abusivo da Autora, guiado por evidente má-fé.

    Concluiu, formulando dois pedidos reconvencionais: -pedido reconvencional de anulação do registo de marca “Gilinho” nº 636031, por constituir a usurpação de uma menção, alcunha, designação que se refere única e exclusivamente ao colaborador da Ré Gil MT ..., tal como é conhecido na ilha e na região por ocasião da actividade que desenvolve e das qualidades que lhe são reconhecidas enquanto profissional de mecânica, nos termos do art. 232º nº 1 al. g) do PI; -pedido de anulação do registo das marcas “Mestre Gil” nº 573486 e “Gil ... e Filhos”nº 618519, nos termos do art. 232º nº 1 al.g) do CPI por não ter sido obtida dos herdeiros, em particular do colaborador da Ré e da sua filha, qualquer autorização que tornasse lícito o uso das expressões, menções e figurações referentes ao falecido Gil ... (falecido em 2011), sendo a sócia gerente da Ré Rita … herdeira do falecido Gil ….

  2. A Autora apresentou réplica, deduzindo oposição aos pedidos reconvencionais, sustentando que é titular do nome comercial que lhe dá proteção às designações em causa nos autos, bem como registou as marcas sem que a Ré ou o dito colaborador da Ré tenha contestado esses registos, concluindo como na PI.

  3. Foi realizada audiência prévia, com elaboração de despacho saneador, no âmbito do qual foi absolvida a Autora/Reconvinda da instância reconvencional por ilegitimidade da Ré/Reconvinte, foi fixado o objecto do litígio, bem como os temas de prova, que não foram objecto de reclamação.

  4. Realizada a audiência de julgamento, foi proferida sentença pela qual se decretou o seguinte: “Por todo o exposto, julga-se parcialmente procedente e provada a presente acção e, em consequência, condena-se a R. Rita …, Unipessoal, Lda.: a) a abster-se de usar, para se identificar ou promover na sua actividade comercial e em qualquer suporte ou meio de comunicação, as expressões ‘GIL ...’, ‘MESTRE GIL’ ou ‘GILINHO’; b) a pagar à A. a quantia de € 5.000,00 a título de indemnização pelos prejuízos causados em resultado da utilização das ditas expressões.

    Absolve-se a R. do demais peticionado.

    Custas pela A. e R., na proporção do decaimento, que fixo em ¼ para aquela e ¾ para esta (artigo 539º, 1 e 2, e 527º, 1 e 2, do CPC).

    Valor: o indicado pela A..

    Notifique e registe.” 6.

    Inconformada, a Ré/Apelante interpôs recurso de apelação da sentença final, em que, nas conclusões: i) suscita a nulidade da sentença, nos termos do art. 607º nº 4 do CPC; ii) requer a ampliação de dois factos aos factos provados; ii) impugna a decisão de direito, com fundamento em errada interpretação do art. 249º nº 1 do CPI e inexistência de danos a indemnizar.

    Conclui, pedindo que seja declarada a nulidade da sentença, nos termos do n.º4 do art.º 607.º do CPC, em alternativa ser o tribunal de primeira instância convidado ao suprimento da falta de fundamentação da decisão sobre a matéria de facto, conforme peticionado; em todo o caso, e se assim não se entender, deve a decisão impugnada ser substituída por outra que, face à requerida alteração da matéria de facto a operar nos termos do n.º1 do art.º 662.ºn.º 1 do CPC, considere improcedente a presente ação, com absolvição da recorrente dos pedidos contra si formulados.

  5. A Autora/Apelada ofereceu contra-alegações, pugnando pela confirmação do julgado.

  6. Foram observados os vistos legais.

  7. No presente recurso de apelação, a Ré/Apelante formulou as...

Para continuar a ler

PEÇA SUA AVALIAÇÃO

VLEX uses login cookies to provide you with a better browsing experience. If you click on 'Accept' or continue browsing this site we consider that you accept our cookie policy. ACCEPT