Acórdão nº 00264/14.2BEPRT de Tribunal Central Administrativo Norte, 03 de Fevereiro de 2022

Magistrado ResponsávelRos
Data da Resolução03 de Fevereiro de 2022
EmissorTribunal Central Administrativo Norte

Acordam em conferência os Juízes da Secção de Contencioso Tributário do Tribunal Central Administrativo Norte: 1. RELATÓRIO 1.1. O Exmº Representante da Fazenda Pública vem recorrer da sentença proferida no Tribunal Administrativo e Fiscal do Porto em 10.11.2015, pela qual foi julgada procedente a impugnação judicial que a “P” intentou contra o indeferimento da reclamação graciosa que apresentara contra a autoliquidação de IRC do ano de 2012, no valor de €473.094,09.

1.2. A Recorrente Fazenda Pública terminou as respetivas alegações formulando as seguintes conclusões: A. Vem o presente recurso interposto da sentença que julgou procedente a impugnação sub judice, deduzida da autoliquidação de IRC de 2012, declarando que “prosseguindo a impugnante eminentemente um serviço público – o de recolha e tratamento de resíduos”, (…) “não restam dúvidas de que a impugnante sempre usufruiria de isenção à luz do artigo 9º, al.b), do CIRC”.

B.

Com o assim decidido, e salvo o devido respeito, não pode a Fazenda Pública conformar-se, por entender que a sentença recorrida se mostra afetada de erro sobre os pressupostos de direito, em termos que afetam irremediavelmente a validade substancial da sentença.

C.

Sem prescindir nem conceder da inaplicabilidade da isenção referida no art. 36º da L. nº 11/2003 à tributação da impugnante em sede de IRC, a Fazenda Pública defende que, tendo a L. nº 11/2003, de 13.05, sido revogada pela L. nº 45/2008, de 27.08, não havia sequer que ponderar a aplicação da norma remissiva constante do seu art. 36º, porque a ressalva do nº6 do art. 38º da L. nº 45/2008 refere-se exclusiva e precisamente à manutenção em vigor da natureza de pessoa coletiva de direito público, indicada pelo nº2 do art. 2º da L. nº 11/2003, e não a todo o regime consagrado nesta lei.

D.

A manutenção da natureza de direito público não significa que se possa invocar para as associações de municípios de fins específicos a manutenção do benefício das isenções fiscais previstas na lei para as autarquias locais, porque este benefício decorria tão só do art. 36º da L. nº 11/2003 e não é inerente à natureza de pessoa coletiva de direito público.

E.

Ao permitir a manutenção em vigor, estritamente, da natureza de direito público para as associações de municípios de fins específicos constituídas até à entrada em vigor da L. nº 45/2008, como é o caso da impugnante, esta lei pretendeu restringir o alcance do regime pretérito que aceitou continuasse a reger essas associações, devendo entender-se, do seu conjunto normativo, que a L. nº 45/2008 pretendeu que após a sua entrada em vigor só as associações de municípios de fins múltiplos ou comunidades intermunicipais beneficiariam das isenções fiscais previstas na lei para as autarquias locais.

Sem embargo, F.

A Fazenda Pública entende também ser de rejeitar a afirmação que admite que a remissão do art. 36º da L. nº 11/2003, de 13.05, é realizada para os termos previstos na al. a) do art. 9º, nº1, do CIRC, em que as associações de municípios são equiparadas a autarquias locais e como tal estão isentas de IRC, "por mais discutível que seja a opção legislativa ou a redação da norma remissiva e da norma de isenção".

  1. Se o legislador pretendesse que as associações de municípios beneficiassem da isenção que vale para as autarquias locais a que se refere a al.a) do nº1 do art. 9º do CIRC não só não restava espaço para a aplicação da al.b) do mesmo preceito, havendo que considerá-la implicitamente revogada a partir da entrada em vigor da L. nº 11/2003, como igual conclusão teria de se retirar para qualquer norma constante de qualquer diploma fiscal que previsse, em condições específicas de cada tipo fiscal, isenções para as associações de municípios.

  2. Revela-se mais razoável e plausível que o legislador tenha querido salvaguardar a aplicação das normas especiais que fixem tratamento especial para as essas associações, preservando o efeito útil destas - assim, a remissão genérica do art. 36º da L. nº 11/2003 não prejudica a aplicação de normas especiais, caso da al.b) do nº1 do art. 9º do CIRC I. No que concerne à aplicação à impugnante da isenção da al.a) do nº1 do art. 9º do CIRC, razão de ser do enquadramento da associação de municípios impugnante como sujeito passivo não isento de IRC que exerce a título principal atividades de natureza comercial e industrial decorre da reconhecida realização de operações económicas por parte da impugnante com caráter empresarial, ie, buscando a melhor combinação dos fatores de produção para a perceção de acréscimos patrimoniais, visando obter uma diferença positiva entre os valores do património líquido no início e no fim do período de tributação, que a impugnante destina segundo a gestão dada pela sua administração.

  3. Relevante‚ para o caso delineado nos autos, é, então, a natureza e modo de exercício da atividade pela impugnante, que gerou os valores objeto de tributação, pois que ao direito fiscal importa sobretudo a real configuração das situações de facto, a realidade económica, a realidade de facto, conforme estatui, de forma genérica, no nº 3 do art. 11º da LGT.

  4. Sendo certo que a impugnante dispõe de organização comercial e industrial em ordem ao exercício de uma atividade de produção ou troca de bens e serviços que é capaz de gerar rendimentos e, portando de acréscimo patrimonial.

    L. Daí que a omissão do escopo legal ou estatutário da impugnante de qualquer finalidade lucrativa efeito não assuma relevo excludente, pois que as atividades exercidas pela impugnante são reconhecidamente dirigidas à obtenção sucessivos acréscimos patrimoniais, obtidos pela eficiente combinação de fatores de produção, conseguindo não apenas economias de escala, mas ¯maior rentabilidade‖, ¯redução de custos‖ e, por isso, aumento de proveitos.

  5. Tais acréscimos destinam-se a ser aplicados na estrutura produtiva, reduzindo as contribuições financeiras que os Municípios associados têm o dever de prestar, repartindo assim, indiretamente, os proveitos entre esses associados.

  6. É esse acréscimo patrimonial verificado na associação impugnante em consequência do modo como exerce a sua atividade que determina a sua tributação em IRC.

  7. A prossecução de finalidades típicas de um serviço público não obsta em si mesma, na perspetiva da Fazenda Pública, ao preenchimento das condições para que a associação de municípios impugnante se constitua em sujeito passivo não isento de IRC, desde que exerça as atividades atribuídas em vista daquela prossecução com natureza empresarial, nos termos do nº4 do art. 3º do CIRC.

  8. As atividades de tratamento e valorização dos resíduos urbanos sólidos que compõem a parte do objeto da associação impugnante indicada no nº1 do art. 2º dos seus Estatutos podem ter sido estabelecidas em função da satisfação de fins ou interesses da coletividade, podem manifestar a prossecução de um serviço público, Q. mas o modo empresarial através do qual é exercida, em conjunto com as demais, e o resultado lucrativo que, em repetidos exercícios económicos é conseguido, reintegrado em toda a estrutura produtiva, preenche a estatuição da lei fiscal de sujeição e não isenção, e deve determinar a tributação daquela entidade em sede de IRC.

  9. Posto que a impugnante exerce a sua atividade de modo empresarial, buscando acréscimos patrimoniais entre o início e o fim de cada exercício económico, tem de concluir-se que os seus custos ou gastos, tal como os seus proveitos ou ganhos, fazem parte do apuramento do resultado líquido desse exercício.

  10. Em face do exposto, a associação aqui impugnante exercendo sua atividade de modo empresarial em vista do contínuo incremento do seu património, aliviando a carga financeira que impende sobre os seus membros, e evidenciando capacidade contributiva, é sujeito passivo não isento de IRC.

    T. Como tal, a situação da impugnante subsume-se à al.b) do nº1 do art. 9º do CIRC, dado que, no ano fiscal a que respeita a liquidação impugnada, se demonstrou exercer a título principal actividade comercial, industrial ou agrícola com carácter empresarial e escopo lucrativo.

  11. Adicionalmente, e sem reserva dos fundamentos do presente recurso até aqui expostos, a Fazenda Pública não se conforma com a condenação em custas proferida na sentença recorrida na vertente em que, de modo implícito, e ao abrigo do nº7 do art. 6º do RCP, considera não haver fundamento bastante para dispensar a Fazenda Pública do pagamento do remanescente da taxa de justiça correspondente ao valor da causa superior a € 275.000,00.

    V. Entende a Fazenda Pública, com respeito por diversa opinião, que se encontram preenchidas todas as condições previstas no art. 6º do RCP, nºs 1 e 7, para a dispensa do pagamento do remanescente, pois a causa não se mostra de decisão especialmente complexa, não houve incidentes, nem má conduta processual das partes.

  12. Como tal, a Fazenda Pública pugna, com o maior respeito, que a decisão recorrida deve ser alterada quanto às custas, por erro de julgamento, e substituída por outra que dispense a Fazenda do pagamento do remanescente da taxa de justiça na parte devida pelo valor da causa superior a € 275.000,00, nos termos do nº7 do art. 6º do RCP Termos em que, e nos melhores de direito aplicáveis, deve ser dado provimento ao presente recurso, revogando-se a douta sentença recorrida, com o que se fará inteira JUSTIÇA.

    ».

    1.3. A Recorrida ““p” – Serviço Intermunicipalizado de Gestão de Resíduos do Grande Porto” apresentou contra-alegações, que concluiu nos seguintes termos: A. Inconformada com a decisão a Fazenda Pública interpôs o presente recurso, a cujas alegações se apresenta agora resposta.

    B. Entende a recorrida que a decisão de que vem interposto o presente recurso não merece censura, não lhe sendo imputável qualquer erro de julgamento de direito, por a mesma se encontrar em conformidade com as exigências de fundamentação impostas pelo artigo 123º do CPPT e pelos nº 2 e 3 do artigo 659º do CPC, ou, bem assim, qualquer nulidade das...

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