Acórdão nº 5850/19.1T8BRG.G1 de Tribunal da Relação de Guimarães, 03 de Fevereiro de 2022
Magistrado Responsável | ALDA MARTINS |
Data da Resolução | 03 de Fevereiro de 2022 |
Emissor | Tribunal da Relação de Guimarães |
Acordam na Secção Social do Tribunal da Relação de Guimarães: 1.
Relatório M. G.
intentou acção declarativa de condenação, com processo comum, contra IRMANDADE DE X, formulando os seguintes pedidos: a. Seja declarada a ilicitude da sanção disciplinar de suspensão de trabalho com perda de retribuição e antiguidade pelo período de cinco dias que foi aplicada à autora; b. A sanção disciplinar que foi aplicada seja retirada do cadastro disciplinar e seja reposta a quantia que foi descontada e a antiguidade da autora; c. A ré seja condenada a pagar à autora a quantia de € 1.875,00 (mil oitocentos e setenta e cinco euros), correspondente a dez vezes a retribuição que foi descontada, pela natureza abusiva da sanção disciplinar; d. A ré seja condenada a pagar à autora a quantia de € 3.500,00 (três mil e quinhentos euros), a título de indemnização por danos não patrimoniais; e. A ré seja condenada a pagar os juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento.
A autora alega que a ré aplicou-lhe a sanção disciplinar de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade pelo período de cinco dias, que o processo disciplinar padece de nulidades, que não praticou qualquer infracção disciplinar e que a sanção é desproporcionada e abusiva.
A ré contestou, alegando que o processo disciplinar não padece de nulidades e a autora praticou uma infracção disciplinar, sendo que a sanção disciplinar de suspensão do trabalho com perda de retribuição e antiguidade pelo período de cinco dias é adequada.
Realizou-se a audiência de julgamento, após o que foi proferida sentença, que terminou com o seguinte dispositivo: «Pelo exposto, decido julgar a presente acção parcialmente procedente e, em consequência: 1.Declaro a ilicitude da sanção disciplinar de suspensão de trabalho com perda de retribuição e antiguidade pelo período de cinco dias que foi aplicada à autora; 2.Condeno a ré a retirar a sanção disciplinar que foi aplicada do cadastro disciplinar e a repor a quantia que foi descontada, acrescida juros de mora a calcular à taxa legal supletiva desde a citação até integral pagamento, caso o desconto já tenha ocorrido, e a antiguidade da autora; 3.No mais, absolvo a ré dos pedidos contra si formulados.
Custas a cargo da autora e da ré na proporção do decaimento e sem prejuízo do benefício de apoio judiciário que foi concedido.» A autora interpôs recurso da sentença, formulando as seguintes conclusões: «1. Em 28 de junho de 2019, a Ré instaurou um processo disciplinar à Autora.
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O processo disciplinar instaurado à Autora foi consolidado numa comunicação remetida pela superiora hierárquica.
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Essa comunicação refere que a trabalhadora recusou prestar serviço na sala de 1 ano, alegando que tem problemas de saúde que a impossibilitam de trabalhar em ambiente creche.
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Quando a nota de culpa foi remetida à Autora, verificava-se que a prova contida no processo disciplinar se resumia à referida comunicação.
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A comunicação era vaga, imprecisa, não referindo o local onde a ordem foi dada, a hora, apenas referindo “da parte da tarde”, não identificava a valência a que estava afeta a trabalhadora nesse dia, quem poderia ter assistido à suposta ordem, etc.
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A Autora negou a desobediência a qualquer ordem legítima.
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Não resultou provado que a superiora hierárquica deu a ordem constante da nota de culpa.
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A Autora pugnou pela nulidade da nota de culpa, atendendo a que a mesma violava o preceituado no art. 382º do Código de Trabalho, por não conter a descrição circunstanciada dos factos imputados à Autora.
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Após o envio da nota de culpa e da resposta da trabalhadora, a Ré decidiu ouvir duas testemunhas, sem disso dar conhecimento à Autora e nem lhe permitindo defender-se desses novos factos, violando assim o princípio do contraditório.
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Deve ser declarado nulo o processo disciplinar por a nota de culpa não conter uma descrição circunstanciada dos factos, por falta de prova e por violação do princípio do contraditório.
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O Tribunal a quo não reconheceu a nulidade do processo disciplinar.
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É manifesto que existe nos autos prova suficiente para condenar a Ré no pagamento das quantias peticionadas pela Autora, a título de danos não patrimoniais e pela aplicação de sanção abusiva.
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No dia 7 de julho de 2018, a Autora foi submetida a uma intervenção cirúrgica à coluna vertebral.
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A Autora regressou ao trabalho no dia - de setembro de 2018.
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A Autora informou a Ré que estava impedida de realizar esforços ou levantar cargas, conforme prescrição médica.
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A Autora foi avaliada em medicina do trabalho, e foi considerada apta condicionalmente.
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A ficha de aptidão resultante da avaliação efetuada no dia 7 de março de 2019 avaliou os concretos riscos do posto de trabalho que a Autora ocupava à data.
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A médica de medicina no trabalho que avaliou a Autora indicou que a Autora estava apta para aquele concreto posto de trabalho (na sala dos 3 anos), mas esqueceu-se de colocar a indicação de que a Autora continuava com limitações para o levantamento de cargas ou realização de esforços.
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A médica de medicina no trabalho informou a Autora de que esta continuava com limitações para mobilizar cargas.
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Os relatórios médicos e as fichas de aptidão para o trabalho continuam até à presente data, sem exceção, a considerar a Autora como apta condicionalmente.
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Os relatórios da especialidade de Ortopedia do Hospital de … atestam a impossibilidade de a Autora mobilizar cargas.
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A prova constante dos autos é suficiente para permitir esclarecer que a Autora foi, após a cirurgia, colocada em salas nas quais se exigia maior esforço físico (sala do 1 e dos 2 anos).
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A prova junta aos autos permite verificar que nessa altura as avaliações da medicina do trabalho constantes das fichas de aptidão consideravam, sem exceção, que a Autora mantinha limitações e com apto condicional.
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As avaliações da medicina do trabalho consideravam que Autora deveria retornar ao seu posto de trabalho anterior (Jardim de Infância).
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A Ré sempre recusou colocar a Autora a trabalhar em salas do Jardim de Infância, mantendo-a nas salas do 1 e dos 2 anos durante o ano letivo completo.
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A testemunha C. V. referiu que ia buscar o filho à sala do 1 ano e depois dos 2 anos e no pós-operatório da autora a via sempre a trabalhar naquelas salas.
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A testemunha da Ré, A. V., confirmou que a Autora, no ano letivo de 2019/2020, trabalhou ininterruptamente na sala dos 2 anos.
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As testemunhas da Ré demonstraram não saber a hora a que foi dada a ordem, em que parte da sala se encontravam por referência à Autora e que tarefas concretas realizavam.
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A testemunha F. C. pretendia recusar-se responder às perguntas do mandatário da Autora.
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Resulta inequívoco que a Autora foi por várias vezes obrigada a ficar em salas da creche e sujeita a cargas e a esforços físicos e não apenas aquando da alegada ordem que deu origem ao processo disciplinar.
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Por esse motivo, a Autora realizou esforços que lhe causaram dores e constante sofrimento.
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A Autora sofreu vergonha, perturbações, tristeza, insónia, ansiedade.
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O comportamento da Ré causou danos à Autora, os quais são suscetíveis de indemnização.
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Deve ser condenada a Ré a indemnizar a Autora pelos danos. Em suma: No entender da Recorrente, de toda a prova produzida, seja ela testemunhal ou documental, resultam provados: - A nulidade do processo disciplinar; - Os danos causados à Autora e a aplicação de sanção abusiva.
NESTES TERMOS e nos melhores de direito com o suprimento de Va.s Ex.as, deve o presente...
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